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Composição, diferenças sazonais, sexuais e ontogenéticas

Por terem consumido várias categorias de artrópodes e de material vegetal, Tropidurus

semitaeniatus e T. hispidus podem ser consideradas generalistas, embora predominantemente

insetívoras, com dietas semelhantes às registradas para outras espécies deste gênero (Colli et al. 1992, Van Sluys 1993, Vitt 1993, Vitt et al. 1996, Teixeira & Giovanelli 1999, Faria & Araújo 2004, Vans Sluys et al. 2004, Faria 2006, Lima & Rocha 2006).

Quanto à ausência de significância entre os tipos de itens consumidos por Tropidurus

semitaeniatus e por T. hispidus em todas as estações, algumas considerações merecem ser

destacadas. Na estação seca, a categoria alimentar que obteve o maior índice de importância relativa (Ix) para ambas as espécies foi folhas (Ix = 43,2 e Ix = 47,5 respectivamente, Tabela I) mostrando um alto consumo de material vegetal durante esta estação, fato que pode estar relacionado à escassez de outros recursos e à maior disponibilidade de folhas no ambiente, resultante do processo de caducifolia da vegetação. Resultado semelhante foi obtido para

Tropidurus itambere (Van Sluys 1993) e para Liolaemos lutzae (Rocha 1996), ambos

estudados em formações abertas, embora com sazonalidade menos acentuada que nas Caatingas. Portanto, o consumo de material vegetal parece ser comum para lagartos filogeneticamente próximos e habitantes de formações abertas.

Outro aspecto relevante na composição da dieta foi a alta importância de Hymenoptera/Formicidae na dieta de ambas as espécies durante as duas estações. Apesar da alta importância de formigas, a dieta não chega a ser praticamente exclusiva de formigas como acontece em T. hispidus de área florestada da Amazônia (Vitt et al. 1996). A alta importância de larvas de Lepidoptera na dieta das duas espécies na estação chuvosa também

foi registrada para T. hispidus em afloramentos rochosos na região de Diamantina - MG (Van Sluys et al. 2004). A alta importância de Orthoptera para T. hispidus na estação chuvosa deve estar relacionada com a maior disponibilidade dessa presa nesse período, além de constituir uma presa volumetricamente importante e também por este tipo de presa, assim como as formigas, serem consideradas ativas, portanto mais consumidas por lagartos que caçam de tocaia (sit-and-wait lizards; Huey & Pianka 1981, Faria, 2006).

A dieta de T. semitaeniatus não apresentou diferenças significativas sazonais nem sexuais, mas ontogenética quanto ao número e volume de itens. Já para T. hispidus esta diferença foi constatada apenas entre jovens e adultos quanto ao volume dos itens. Diferenças ontogenéticas são comuns a várias espécies de lagartos filogeneticamente próximos (Van Sluys 1993, Rocha 1998).

Relação entre a dieta das espécies e o Índice de Disponibilidade Relativa de Artrópodes no Ambiente (IDRA)

A relação significativa (por freqüência de ocorrência e número de itens) entre a dieta de T. semitaeniatus e o índice de disponibilidade relativa de artrópodes no ambiente (IDRA), nas estações seca e chuvosa, indica que essa espécie é oportunista, ou seja, se alimenta do que está mais disponível no ambiente; esta relação positiva também foi encontrada em estudo com as espécies congenéricas Tropidurus itambere e Tropidurus oreadicus (Faria 2006), fato este que concorda com o estabelecido pela teoria do forrageamento ótimo (Huey & Pianka 1981), de que espécies de lagartos que forrageiam de espreita apresentam dietas mais generalizadas, capturadas de acordo com a disponibilidade (Huey & Pianka 1981).

A dieta de T. hispidus possui relação significativa (por freqüência de ocorrência e número de itens) com o IDRA apenas na estação chuvosa; na estação seca parece desenvolver estratégia para capturar, de tocaia, presas que vivem agrupadas, como as formigas, gastando

assim menos energia do que gastaria buscando ativamente presas em ambiente durante escassez.

Tamanho dos itens alimentares: relação com as medidas morfométricas e com variações inter e intraespecíficas

Os adultos de Tropidurus semitaeniatus mostraram relação significativa entre o tamanho médio das presas e do Rostro-comissura labial, que corresponde ao tamanho da boca. Então, os indivíduos adultos de T. semitaeniatus que possuem a maior boca, se alimentam de presas maiores. Nos jovens de T. semitaeniatus todas as medidas dos indivíduos tiveram relação positiva significativa com o tamanho da presa. Essa correlação positiva entre o tamanho da presa e as medidas dos lagartos parece ser comum para outras espécies de lagartos (Vitt et al. 1996, Vans Sluys et al. 2004)

Todas as medidas dos indivíduos de T. hispidus (adultos e jovens) tiveram relação positiva com o tamanho da presa embora nenhuma dessas relações tenha sido significativa.

No que se refere a diferenças intra-específicas quanto ao tamanho das presas ingeridas, as duas espécies se comportam de maneira semelhante; ou seja, machos e fêmeas não diferem significativamente quanto ao tamanho das presas ingeridas, embora adultos se alimentem de presas maiores do que os jovens. Na estação chuvosa, os indivíduos se alimentam de presas maiores do que na estação seca; essa diferença sazonal no tamanho das presas pode estar relacionada com o fato de que na estação chuvosa a diversidade de presas é maior e permite escolha por presas maiores, proporcionando melhor custo-benefício.

Tropidurus hispidus se alimenta de presas significativamente maiores do que T. semitaeniatus tanto na dieta geral de todos os indivíduos, como entre os machos adultos,

fêmeas adultas e entre os jovens; essa diferença no tamanho da dieta é explicada pelo fato de

Tropidurus simpátricas no cerrado, as quais ingerem presas do mesmo tamanho (Faria &

Araújo 2004). vale ressaltar, entretanto, que as espécies do Cerrado têm tamanhos semelhantes.

Diversidade de presas por espécie de lagartos e sobreposição nas dietas

A maior sobreposição nas dietas de T. semitaeniatus e de T. hispidus durante a estação seca deve estar relacionada com a menor disponibilidade de alimento nesta estação, fato que leva as duas espécies a se alimentarem de itens semelhantes, e coexistirem em condições limitantes. Esta alta sobreposição durante a estação seca foi encontrada para outras espécies sintópicas de Tropidurus, no Cerrado (Faria & Araujo 2004).

Quanto à diversidade de presas na dieta, T. semitaeniatus teve a diversidade semelhante, quanto ao número de itens, nas estações seca e chuvosa; já quanto ao volume, a diversidade na estação chuvosa foi bem maior. O mesmo foi observado para T. hispidus, sendo que na estação chuvosa a diversidade quanto ao volume reflete a maior disponibilidade de presas maiores durante a estação chuvosa, reforçando o caráter generalista e oportunista desta espécie.

Comportamento de forrageio

As espécies de Tropidurus são consideradas forrageadoras de tocaia (sit-and-wait

lizards), e apesar de existir um gradiente de variação na intensidade de forrageio e uma

mudança de estratégia de acordo com a disponibilidade de alimento no ambiente proposto por Huey & Pianka (1981). Neste estudo, T. semitaeniatus se mostrou mais ativo do que T.

hispidus, principalmente durante a estação chuvosa onde as diferenças na intensidade de

Para as categorias comportamentais analisadas, apenas para a estação chuvosa ocorreram diferenças significativas. Na estação seca é possível que as condições mais adversas possam afetar de igual modo as duas espécies, no que se refere à escassez de disponibilidade de diferentes recursos alimentares, a ponto de não mostrarem diferenças significativas em suas estratégias de caça. Já na estação chuvosa, T. semitaeniatus apresentou maior número de deslocamentos, permaneceu menos tempo parado e ainda exibiu maior número de tentativas de captura de presas do que T. hispidus. Nesta estação, em que há maior oferta de alimento, as espécies utilizaram estratégias de forrageio diferentes, de modo que T.

semitaeniatus se alimenta de presas menores do que T. hispidus. Aliado a isso, o maior

tamanho de T. hispidus o habilita a capturar presas maiores.

Observações de comportamento de forrageio para T. hispidus realizadas por Vitt et al. (1996) durante estação chuvosa, na região amazônica, corroboram estes resultados, uma vez que a média de deslocamentos e de tentativas de capturas de presas foram similares, respectivamente 4,9 e 0,36.

Quanto à distância percorrida pelos lagartos, não ocorreu diferença significativa entre as espécies em nenhuma das estações. Na estação seca, T. semitaeniatus e T. hispidus realizaram número similar de deslocamentos, percorrendo a mesma distância, ao passo que na estação chuvosa os espécimes de T. hispidus realizaram menor número de deslocamentos, entretanto mais longos, mantendo a distância percorrida semelhante àquela de T.

CONCLUSÕES

Tropidurus semitaeniatus e Tropidurus hispidus são generalistas, pois se alimentam

dos itens mais disponíveis no ambiente, embora possuam um certo grau de especialização em suas dietas como o consumo maior de folhas, formigas e cupins na estação seca. Estas espécies se sobrepõem amplamente quanto à composição da dieta em ambas as estações; no entanto, durante a estação chuvosa, com o aumento da disponibilidade de alimento, T.

hispidus se alimenta de presas maiores e T. semitaeniatus é mais ativo, apesar de ambas as

espécies serem forrageadoras de tocaia; estas estratégias contribuem para a coexistência destas espécies. Durante a estação seca, a alta sobreposição da dieta e a semelhança nas estratégias de forrageio, constituem fatores limitantes.

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