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7 CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS

7.1 Discussão dos pontos gerais

O Quadro 35 a seguir apresenta um resumo dos resultados obtidos da análise de conteúdo das entrevistas.

Quadro 35 - Resumo dos resultados da análise de conteúdo

Categorias Resultados da análise

1. Características das transições

São imprevisíveis e não ocorrem como planejadas.

Experiências anteriores que proporcionaram sensação de prazer e satisfação influenciam a escolha da nova carreira.

Incidentes críticos revelam para o indivíduo a necessidade de fazer a mudança. Conhecimentos, habilidades e relações adquiridos em antigos papéis profissionais são utilizados na nova carreira, mas com propósitos distintos. O desejo de mudar de carreira surge meses ou anos antes da mudança se concretizar.

A transição é um processo que se desenvolve na medida em que a pessoa aprende e experimenta novas possibilidades.

Geram dor e sofrimento psicológico.

2. Motivos para mudar de carreira

Falta de identificação com os valores, as atividades, os objetivos e comportamentos associados ao trabalho.

Busca de maior equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal e familiar. Busca de realização profissional.

Busca de novos desafios.

3. Ações para mudar de carreira

Adquirir novos conhecimentos e habilidades por meio de ações formais ou informais.

Descobrir novas possibilidades testando novos papéis profissionais na prática. Afastar-se temporariamente da situação de crise para se recuperar e observar seus sentimentos, emoções e refletir sobre a mudança.

Construir uma nova rede de relacionamento na área que pretende trabalhar. Falar com outras pessoas sobre a mudança e receber feedback.

Escolher pessoas que sejam modelos de referência e fonte de inspiração e que ofereçam apoio para a mudança.

4. Comportamentos na transição

O indivíduo lista possibilidades de novas carreiras e cria expectativas em relação a elas.

Compara as expectativas e experiências anteriores com a experiência real na nova carreira.

Atribui um significado às diferenças entre os papéis, criando explicações que façam sentido.

Revisa as expectativas, crenças, prioridades, conceitos e modelos mentais. Muda a percepção de quem é a partir das interpretações que fez das diferenças.

5. Dificuldades

Abandonar a segurança de uma carreira bem estabelecida por outra incerta e medo de passar por dificuldades financeiras.

Falta de compreensão dos amigos, colegas e familiares.

“Vazio de identidade” – dificuldade da pessoa se definir no seu novo papel profissional.

Adaptação a novas normas de relacionamento, linguagem, códigos de ética, grupos de referência e papel profissional.

Construção de uma nova rede de relacionamentos.

6. Recursos para fazer transição de carreira

Ajuda de outras pessoas, como familiares, amigos ou terapeutas, que ofereçam apoio emocional e facilitem a adaptação a uma nova carreira.

Reserva financeira para compensar a queda nos ganhos durante o período de transição.

Confiança na capacidade individual para fazer a mudança e tolerância ao risco. Autoconhecimento.

Postura otimista, flexibilidade e capacidade de adaptação a novas situações e novos grupos de relacionamento.

7. Resultados da transição Maior integração entre quem a pessoa é e aquilo que ela faz. Sensação de felicidade, satisfação e realização.

A partir das análises das entrevistas foi possível concluir que as transições de carreira que envolvem uma mudança significativa do papel profissional (com mudança tanto de contexto como de conteúdo de trabalho) e que são realizadas quando o indivíduo já possui um histórico profissional relevante, ou seja, quando já possui uma identidade profissional estabelecida, demandam um grande esforço de redefinição da sua identidade profissional. Essa conclusão reforça a visão sobre as transições de carreira dos diversos autores pesquisados neste trabalho e que se dedicaram a estudar esse tema em maior profundidade (LOUIS, 1980a; ASHFORTH, 2001; IBARRA, 2004; SCHLOSSBERG et al., 2006; BRIDGES, 2009).

Foi possível concluir também que essas transições ocorrem geralmente de forma imprevisível e não são programadas pelos indivíduos de forma estruturada; são muitas vezes obra do acaso e de situações não planejadas. As pessoas convivem, muitas vezes, anos com um trabalho que já não gera satisfação e realização, mas só se dão conta da necessidade de mudar de carreira e começam a tomar alguma iniciativa quando passam por algum incidente crítico que lhes alerta sobre a urgência da mudança. Ainda assim, muitos começam a fazer uma reserva financeira anos antes da mudança imaginando que poderão enfrentar no futuro uma possível queda nos rendimentos para recomeçar a vida em uma nova carreira. A insatisfação com o trabalho e o desejo de mudar são geralmente frutos da falta de identificação com o trabalho atual e do desejo de atingir maior equilíbrio entre a vida profissional e familiar, ou de se realizar profissionalmente ou ainda de enfrentar novos desafios profissionais. Os últimos três motivos reforçam a proposta do modelo ABC de Mainiero e Sullivan (2006) para quem os principais motivos para os movimentos de opt-out estão relacionados à busca de autenticidade, balanço ou novos desafios.

Depois que se conscientizam da necessidade de mudar, algumas pessoas abandonam o emprego, mesmo sem saber ainda o que irão fazer, outras continuam trabalhando enquanto exploram novas possibilidades. Essas novas possibilidades são geralmente identificadas a partir de uma reflexão pessoal, onde as pessoas buscam se conhecer melhor e identificar quais são as atividades que lhes proporcionaram prazer ou momentos de satisfação no passado. Nessa etapa, elas podem se afastar temporariamente da situação de estresse e crise em que vivem para refletir melhor sobre sua condição atual e pensar em possíveis novas alternativas de trabalho. Algumas fazem isso parando por algumas horas em alguns momentos do dia, outras buscam ajuda profissional e outras fazem longas viagens. Ainda que o façam de formas diferentes, todas elas procuram parar por um tempo para olharem para dentro de si e buscar respostas para suas inquietações.

Quando já possuem uma ideia, mesmo que ainda vaga, sobre possíveis novas carreiras, as pessoas agem rapidamente. Elas buscam obter mais informações sobre a nova carreira fazendo cursos, assistindo palestras e workshops ou conversando com profissionais da área de interesse. Além disso, elas começam também a testar essas possibilidades na prática mudando de emprego ou trabalhando em pequenos projetos de curta duração ou ainda associando-se a pessoas e grupos novos. Para isso, constroem novas redes de relacionamento aproximando-se de novas pessoas que as ajudam na mudança na medida em que geram oportunidades para que

testem suas novas identidades, ao mesmo tempo em que lhes oferecem feedback e apoio emocional. É comum também que nesse processo elas escolham alguns modelos de referência, pessoas que lhes servem de referência e que são fonte de inspiração para a mudança.

Na medida em que testam novas possibilidades na prática, as pessoas começam a comparar as expectativas que criaram sobre a nova carreira e suas experiências anteriores com a experiência no papel atual. Ao fazer essas comparações, elas atribuem significados para as diferenças, procurando explicações que façam sentido. Depois de atribuir um significado às diferenças, as pessoas revisam algumas de suas expectativas, crenças, prioridades e conceitos que orientavam seu comportamento. Quando essa revisão faz sentido para o indivíduo, ou seja, quando ele percebe que a mudança está lhe fazendo bem e que está atingindo seus objetivos, então a transição de carreira começa a se consolidar e ele muda a percepção de quem é.

O processo descrito acima gera muita dor e sofrimento uma vez que não é nada fácil para as pessoas abandonarem a segurança psicológica e financeira de uma carreira que foi construída ao longo de muitos anos e com muito esforço. A falta de compreensão da família e dos amigos mais próximos também colabora para tornar o processo ainda mais difícil. A dificuldade em construir uma nova rede de relacionamento e de se adaptar a uma nova cultura profissional também é apontada pelos entrevistados com uma das dificuldades da mudança. Mas talvez a maior de todas as dificuldades seja aquela criada pelo vazio que se forma na identidade do indivíduo durante a transição. Refere-se à dificuldade do indivíduo identificar- se no seu novo papel profissional, uma vez que ele já abandonou sua velha identidade, mas ainda não formou completamente a nova, criando aquilo que Bridges (2009) chamou de “zona neutra”.

Para enfrentar todas essas dificuldades, os indivíduos em transição buscam o apoio emocional de outras pessoas como amigos, familiares, maridos ou esposas, terapeutas ou guias espirituais. Algumas características de personalidade como a capacidade de tolerar riscos, a autoconfiança e o otimismo são também importantes recursos para se enfrentar as transições. É necessário ainda que as pessoas em transição tenham uma atitude flexível e aberta para aproveitar as oportunidades que surgem durante a mudança e para saber lidar com as novas situações, procurando adaptar-se bem a elas.

Apesar das dificuldades, é fundamental que as pessoas em transição não desistam da mudança no meio do caminho uma vez que as recompensas para aqueles que chegam ao final do processo são muito valiosas. As pessoas entrevistadas nesta pesquisa relataram terem atingido com a transição de carreira uma grande sensação de felicidade e de realização pessoal, pois conseguiram atingir uma integração maior entre quem são e aquilo que fazem e tornaram-se novas pessoas ao mesmo tempo em que se tornaram mais elas mesmas.