• Nenhum resultado encontrado

O CASO DE ESTUDO DO MONUMENTO SOB TUMULUS DE VALE DE CHÃO 1 (BRAGA, PORTUGAL)

4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E INTERPRETAÇÕES

A forma, dimensões e contexto da estrutura em análise fazem-nos colocar a hipóte- se de que seria uma sepultura plana, à semelhança de muitas outras detetadas no Noroeste de Portugal.

A identificação maioritária de madeira de carvalho (Quercus de folha caduca) obtida a partir de um só tronco no interior desta estrutura, assim como a sua distribuição espacial por toda a base da mesma, faz-nos colocar a hipótese de que aqui foi queimado um grande objecto de madeira, talvez um sarcófago. Os fragmentos de madeira de arbustivas (Fabaceae,

Ritos de fogo em contextos funerários da Idade do Bronze do NW da Ibéria: O caso de estudo do monumento sob tumulus de Vale de Chão 1 (Braga, Portugal)

45

Maloideae), de pequeno calibre, poderiam corresponder à lenha utilizada para iniciar a com- bustão, pois ambas possuem um elevado poder calorífico e são bons combustíveis.

Embora não possamos descartar a possibilidade de que o tronco de carvalho possa corresponder ao combustível principal de uma pira funerária, a primeira opção parece-nos a mais provável. Apesar do uso de madeira de Quercus ter sido documentado, como com- bustível principal, em cremações de diferentes áreas geográficas e períodos cronológicos, ocasionalmente acompanhada de outras espécies arbustivas (Williams 2004; McKinley et

al. 2008; Mensua & Piqué 2008; O’Donell 2011), o volume de lenha necessário para que

tal se verifique, estimado a partir de dados actuais em sociedades onde este tipo de ritos ainda é praticado, é de c. de 200 kg ou superior (Mensua & Piqué 2008), o que não parece ser o caso da estrutura 1 de Vale de Chão 1.

Seja como for, no interior desta estrutura foi praticado um rito que implicou o uso do fogo, talvez uma cremação em sarcófago, ou seja, em contexto primário. Tal não seria inédito visto que, no Noroeste português, se conhece um sarcófago em tronco que foi introduzido no interior de uma sepultura plana e posteriormente queimado (Almeida & Fernandes 2008). Trata-se de uma das sepulturas da necrópole de Cimalha, em Felgueiras, que tinha como oferenda um recipiente cerâmico datado do Bronze Inicial ou Médio (Bettencourt 2010). A identificação de sarcófagos de madeira de carvalho em contextos fune- rários da Idade do Bronze está bem documentada no Norte de Europa (Bergerbrant 2007).

A data radiométrica obtida para os carvões da estrutura em estudo foi a de 1516- 1373 a. C., ou seja, do Bronze Médio, embora o tempo de vida do carvalho pode ter envelhecido um pouco este resultado (old wood effect), podendo este contexto ser um pouco mais recente.

Agradecimentos

Este trabalho foi desenvolvido no âmbito do projeto de dissertação de mestrado do signatário (1) intitulado “O núcleo de monumentos sob tumuli de Vale de Chão, Braga (serra do Carvalho). História de um lugar desde o Neolítico à Idade do Bronze”, que se insere no projeto “Espaços Naturais, Arquiteturas, Arte rupestre e Deposições na Pré-história Recente da

Fachada Ocidental do Centro e Norte Português: das Ações aos Significados – ENAR- DAS” (PTDC/HIS-ARQ/112983/2009), financiado pelo Programa Operacional Temáti-

co Fatores de Competitividade (COMPETE) e comparticipados pelo Fundo Comunitário Europeu (FEDER). A análise antracológica foi efetuada no contexto do projeto Enardas e da bolsa de pósdoutoramento da signatária (2) “Alén do bosque na Idade do Bronce do

Noroeste da Ibéria. Estudo dos combustibles e das manufaturas en madeira a partir da cadea técnico- operativa” financiado polo Plan Galego de investigación, innovación e crecemento 2011-

2015 (Plan I2C) da Consellería de Cultura, Educación e Ordenación Universitaria da Xun- ta de Galicia.

Luciano Vilas Boas & Maria Martín Seijo

46

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, P.B.; FERNANDES, F. 2008. O povoado da Idade do Bronze da Cimalha. Op-

pidum, número especial: 29-44.

BERGERBRANT, S. 2007. Bronze Age Identities: Costume, Conflict and Contact in Northern Europe

1600-1300 BC. Stockholm Studies in Archaeology 43. Lindome: Bricoleur Press.

BETTENCOURT, A.M.S. 2010. La Edad del Bronce en el Noroeste de la Península Ibérica:

un análisis a partir de las prácticas funerarias. Trabajos de Prehistoria 67 (1): 139-173.

BRAADBAART, F.; POOLE, I. 2008. Morphological, chemical and physical changes during

charcoalification of wood and its relevance to archaeological contexts. Journal of

Archaeological Science 35: 2434-2445.

GALE, R.; CUTLER, D. 2000. Plants in Archaeology. Identification Manual of Vegetative Plant

Materials Used in Europe and the Southern Mediterranean to c. 1500. Kew: Westbury and

Royal Botanic Gardens.

HATHER, J.G. 2000. The Identification of the Northern European Woods. A Guide for Archaeolo-

gists and Conservators. London: Archetype Publications.

LÓPEZDE CALLE, C.; IRIARTE, M.J.; ZAPATA, L. 2001. Análisis paleoambientales en el

dolmen de Collado del Mallo (Trevijano, La Rioja). Viabilidad y trabas de la paleo- ecología vegetal en estructuras dolménicas. Zubía Monográfico 13: 65-96.

MARGUERIE, D.; HUNOT, J.Y. 2007. Charcoal analysis and dendrology: data from achae-

ological sites in North-Western France. Journal of Archaeological Science 34: 1417- 1433.

MCPARLAND, L.C.; COLLINSON, M.E.; SCOTT, A.C.; CAMPBELL, G.; VEAL, R. 2010. Is

vitrification in charcoal a result of high temperature burning of wood? Journal of

Archaeological Science 37: 2679-2687.

MCKINLEY, J.I.; BARNETT, C.; MEPHAM, L; STEVENS, C. 2008. Beacon Hill Wood, Shepton

Mallet, Somerset (BHN07/W67060) Middle Bronze Age Urned Cremation Burial. Report.

MENSUA, C.; PIQUÉ, R. 2008. El combustible component bàsic del ritual: la llenya per a

foc. In E. Pons & A. Solés (coord.) La Necròpolis d’Incineració del Pi de la Lliura-

Vidreres, Vidreres: Ajuntament de Vidreres, 93-98.

O’DONNELL, L. 2011. People and woodlands: an investigation of charcoal remains as

indicators of cultural selection and local environment in Bronze Age Ireland, 5th

International Meeting of Charcoal Analysis. The Charcoal as Cultural and Biological Heritage

[Saguntum-Extra 11], 97-98.

SCHWEINGRUBER, F.H. 1990. Anatomy of European Woods. An Atlas for the Identification of

European Trees, Shrubs and Dwarf Shrubs, Stutgart: Paul Haupt,

SCHWEINGRUBER, F.H. 1996. Tree Rings and Environment. Dendroecology, Berne: Swiss Fed-

Ritos de fogo em contextos funerários da Idade do Bronze do NW da Ibéria: O caso de estudo do monumento sob tumulus de Vale de Chão 1 (Braga, Portugal)

47

SCHWEINGRUBER, F.H.; BÖRNER, A.; SCHULZE, E.D. 2008. Atlas of Woody Plant Stems.

Evolution, Structure and Environmental Modifications, Berlin: Springer Berlag.

SØRENSEN, T.F.; BILLE, M. 2008. Flames of transformation: the role of fire in cremation

practices. World Archaeology 40 (2): 253:267.

THÉRY-PARISOT, I. 2001. Économie des combustibles au Paléolithique. Expérimentation, taphono-

mie, anthracologie. DDA nº20. Paris: CNRS.

VILAS BOAS, L. 2014. Vale de Chão 1, Braga. Um tumulus da Idade do Bronze no Noroes- te português. Estudos do Quaternário 10: 15-23.

WILLIAMS, H. 2004. Death warmed up. The agency of bodies and bones in Early Anglo-

Rita Gaspar, Ricardo Ribeiro, Paulo Rebelo, Nuno Neto & Maria Luís Carvalho

49

BRONZE AGE FUNERARY CONTEXTS IN NORTHEAST

Documentos relacionados