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6 DISCUSSÃO

No documento Eudivar Correia de Farias Neto (páginas 57-64)

A recessão gengival apresenta etiologia multifatorial, com a combinação de diversas variáveis. Entre as variáveis destacam-se o biofilme bacteriano dentário, características anatômicas, que podem estar associadas ao posicionamento dentário e que são constituídas pelas dimensões ósseas e mucogengivais locais, sendo a espessura da gengiva marginal de extrema importância, além da oclusão traumatogênica. Existem controvérsias entre os autores em relação à que fatores estão mais fortemente associados as recessões49.

Durante a revisão da literatura observou-se que, além da importante atuação etiológica do biofilme bacteriano dentário, a recessão gengival se apresenta como uma condição de etiologia multifatorial18, embora o fator predominante em determinada área seja impossível de ser identificado41.

Os resultados apresentados nesta pesquisa se aproximaram consideravelmente dos disponíveis na literatura, mostrando uma relação positiva entre as variáveis estudadas e as recessões gengivais. Na maioria das análises comparamos a média do valor da recessão dos elementos dentários com as variáveis independentes analisadas, no entanto apenas a quantidade de mucosa ceratinizada e o tipo do periodonto se mostraram estatisticamente significantes, evidenciando a dificuldade de se estabelecer um fator que seja efetivamente predominante na causa das recessões.

Dos 558 dentes avaliados 24,1% apresentaram recessão gengival igual ou superior a 1mm, número sensivelmente superior ao encontrado por Valle46, que examinou uma população semelhante em termos de características biológicas e sociais, onde dos 660 dentes examinados, 14,2% mostraram recessão gengival.

Também no estudo de Valle46, 71,3% das recessões encontravam-se em dentes posteriores e 28,7 em dentes anteriores, dados bem semelhantes aos achados desta pesquisa que encontrou 80,2% das recessões nos elementos dentários posteriores e 19,8% nos dentes anteriores.

Todas as recessões gengivais analisadas neste trabalho foram classificadas como sendo Classe I de Müller, provavelmente devido a pouca idade dos participantes, o que corrobora com o encontrado por Mariner25, que em seu trabalho descreveu que a prevalência, extensão e severidade desta condição clínica aumentava com o avanço da idade. As recessões classe I foram as mais freqüentes, mas houve um aumento gradual das recessões classe III e IV à medida que indivíduos mais idosos foram avaliados.

Quando observamos a distribuição da recessão gengival nos grupos de dentes foi revelada uma predominância dos primeiros pré-molares com 30,4%. Essa informação corresponde à mesma encontrada em diversos artigos analisados22, 42, 24, 46, 14. Löe22 ao investigar, 565 universitários noruegueses constatou que 63% dos indivíduos na faixa dos 20 anos já apresentavam recessões gengivais, estando confinadas quase inteiramente na face vestibular dos pré-molares e molares superiores e inferiores. Nos exames realizados por Solnit e Stambaugh42 foi revelada uma a maior freqüência de interferências no lado de trabalho nos dentes superiores com recessão. Este fato aconteceu mais freqüentemente nos primeiros pré-molares e primeiros pré-molares, os quais apresentavam posicionamento no arco dentário que Ihes permitiam apenas movimentos em direção vestibular, além de na maxila o osso palatino ser mais denso e inflexível do que o osso vestibular. Segundo estes mesmos autores as características anatômicas dentárias também são capazes de justificar a maior ocorrência de recessão nos primeiros pré-molares superiores comparado aos segundos pré-molares, uma vez que naqueles a cúspide vestibular é mais longa, favorecendo a ocorrência de interferência oclusal. Ainda evidenciando uma maior freqüência de acometimento dos pré-molares com recessão gengival, Valle46 observou que os primeiros pré-molares mostraram maior incidência 25,5%, assim como na pesquisa de Lopes24, que encontrou valores ainda maiores, chegando a 49,74%, desse grupo de dentes acometido por recessão gengival.

Não podemos separar a ocorrência das recessões gengivais da presença de placa bacteriana e de sangramento gengival que nos da uma idéia da inflamação presente nos sítios avaliados. Encontramos uma média do índice de placa nos pacientes examinados de 48,01%, e de sangramento gengival de 6,01%. Quando comparamos a média das recessões nos dentes com presença de placa ou sangramento, não encontramos diferenças significativas (p=0,428) e (p=1,000) respectivamente. No entanto ao avaliarmos o índice sangramento, comparado as médias dos dentes com recessão e com sangramento ≥ 3,60%, encontramos valores médios de recessão de 1,88mm, maiores que naqueles sítios onde o sangramento era < 3,60% média de 1,66mm de recessão, chegando muito próximo de apresentar um nível de significância estatística (p=0,053). Achados semelhantes foram observados nos estudos de Parffit e Mjör38 onde foi demonstrado que nos dentes em que havia maior dificuldade de higienização, houve maior acúmulo de biofilme bacteriano, gengivite, com maior gravidade e maior prevalência de recessão. Corroborando com estes dados, Goutoudi, Koidis e Konstantinidis15, verificaram que os valores dos índices gengival e de placa foram, significantemente mais elevados nos sítios portadores de recessão.

Em outros estudos35, 37, 22, 19, entretanto, esta associação não pode ser considerada.

O’Leary35 em 1967 informa que os índices médios de placa nos indivíduos com recessão foi significantemente menor do que a média dos índices de placa nos indivíduos sem recessão. E em 1971 o mesmo autor37, em outro estudo, conclui que os grupos que receberam maior cuidado preventivo e instrução de escovação mostraram significantemente um maior aumento na saúde gengival e no nível de placa (escores menores) assim como houve um aumento da porcentagem de indivíduos que apresentavam recessões do que os grupos que receberam menos cuidado. Löe, Anerud e Boysen22 sugerem que as recessões gengivais estão relacionadas para ambos os pacientes que apresentam boa e má higiene oral, sendo causadas por dois fatores básicos: traumas mecânicos e doença periodontal. Nesse mesmo sentido Kassab e Cohen19 descrevem que tanto pacientes com higiene oral boa quanto pacientes com higiene oral pobre, podem apresentar recessões gengivais e que essas lesões são multifatoriais, podendo estar relacionadas com fatores anatômicos, fisiológicos ou patológicos.

Quando foi avaliado o número de contatos parafuncionais, pode-se perceber que a maioria dos dentes (65,9%) não apresentavam esse tipo de interferência. Trott e Love45, no estudo que conduziram demonstraram que apenas 11,6% dos incisivos centrais inferiores com recessão apresentavam trauma nos movimentos excursivos. Da mesma forma, Marini25 avaliando 380 indivíduos verificou que cerca de 8% dos dentes que apresentavam recessões gengivais também apresentavam interferência no movimento excursivo anterior da mandíbula e que cerca de 5% dos dentes com recessões apresentavam interferência nos movimentos de lateralidade direita ou esquerda. Gorman14 e Yared, Zenobio e Pacheco49 em concordância com as informações anteriores concluíram que os fatores etiológicos mais freqüentemente associados às recessões gengivais foram o mal-posicionamento dentário e o trauma por escovação, sendo o trauma oclusal de pouca importância. Resultado semelhante foi encontrado por Bernimoulin e Curilovic7 que em seus resultados evidenciaram que os dentes acometidos por recessão gengival não estavam sob trauma.

No entanto, apesar de o resultado não ter apresentado uma diferença estatisticamente significante (p=0,620), quando analisamos a média dos dentes que possuíam recessão e estavam sofrendo algum tipo de distúrbio oclusal, esse valor se mostrou maior (1,78mm) do que aqueles dentes que mesmo com recessão não possuíam nenhum contato anormal(1,72mm). Tal fato também pode ser observado por Solnit e Stambaugh42, quando observações clínicas levantaram a suspeita de que dentes com recessões gengivais de maiores amplitudes estavam associados à oclusão traumatogênica, o que veio a ser confirmado por

exames oclusais. Apresentando resultados semelhantes Harrel e Nunn17concluíram seu artigo afirmando que mesmo a média da perda de tecido gengival sendo maior nos dentes que apresentavam discrepâncias oclusais (0,101mm/ano) do que aqueles que não possuíam (0,055mm/ano) não representaram diferenças que fossem significativas estatisticamente.

Um dos fatores comumente relacionados a ocorrência de recessão gengival é o posicionamento do dente no arco38, 45. Este fato tem sido levado em consideração nos tratamentos ortodônticos, uma vez que durante as movimentações e até mesmo na finalização de alguns casos observa-se a formação de recessões gengivais, o que muitas vezes pode trazer desconforto para o profissional, por deixar seu paciente numa condição desfavorável, que anteriormente ele não possuía. Menezes30 e Gatrell12, ressaltam a importância do controle da mecânica ortodôntica, bem como do biofilme bacteriano, no caso de dentes mal posicionados, já que estes são mais susceptíveis ao desenvolvimento da recessão gengival. Nos pacientes examinados no nosso estudo, 91,1% dos casos de recessão gengival possuíam alinhamento dentário considerado normal. Quando o teste estatístico foi aplicado, comparando-se a média da recessão dos dentes que foram considerados alinhados, com aqueles considerados desalinhados, nenhuma diferença estatística pode ser observada (p=0,962), apresentando médias bastante próximas 1,74mm e 1,75mm, respectivamente. Esses resultados mostram uma tendência de que somente a posição do dente no arco pode não estar ligada diretamente ao surgimento de recessões, como na conclusão do trabalho de Artun4 que descreveu que o avanço acentuado dos incisivos inferiores pode ser realizado em pacientes adolescentes com retrusão dentoalveolar, sem aumentar o risco de recessão. No entanto deve ser observado que não é só o posicionamento do arco que causa a recessão, existindo a participação de outros fatores como: trauma pela escovação em uma área bastante proeminente; tecido gengival e osso alveolar subjacente bastante finos na face vestibular18, assim como o nível mais apical da gengiva marginal27, 29 cuja localização é determinada pela inclinação axial e o alinhamento dentário.

Stoner e Mazdyasna43 por meio de um estudo epidemiológico, investigaram agentes etiológicos da recessão, e diferentemente dos achados discutidos anteriormente observaram que os incisivos inferiores que apresentavam recessão estavam freqüentemente vestibularizados. No entanto, Yared50 concluiu que a inclinação final dos incisivos centrais inferiores acima de 95°, associada à espessura da gengiva marginal menor que 0,5mm, estiveram diretamente relacionadas às maiores incidência e gravidade da recessão nesses dentes, sendo a espessura mais determinante que a inclinação, reforçando a tese de que o posicionamento sozinho não influência na ocorrência de recessões gengivais.

Nos resultados obtidos durante a avaliação dos dentes com recessão, encontramos que 58,5% dos dentes possuíam mucosa ceratinizada considerada normal (3mm a 5mm) e 41,5%

reduzida (≤ 2mm). Estes resultados demonstraram que a quantidade de mucosa ceratinizada não foi determinante para a incidência das recessões. Resultado semelhante foi identificado por Tenenbaum44, quando relata que uma faixa estreita de gengiva inserida seria mais uma conseqüência da recessão gengival, do que causa propriamente dita, pois em seu trabalho, o mesmo número de recessões gengivais foi associada a áreas com menos ou com mais de 2mm de gengiva inserida. Nos estudos de Miyasato, Grigger e Egelberg32 e de Wennstrõn e Lindhe48 também foram encontrados resultados indicativos de que áreas com mínima largura de gengiva ceratinizada não seriam mais propensas a mudanças inflamatórias induzida por placa.

Independente da amplitude da gengiva inserida a ocorrência de recessão foi similar, entretanto, quando utilizamos o Teste “t” para comparar a média das recessões associadas a uma mucosa ceratinizada considerada normal ou reduzida, uma diferença estatisticamente significante pode ser observada (p=0,004). Nas recessões associadas a uma mucosa ceratinizada normal a média das recessões foi de 1,59mm, já na considerada reduzida, esse valor sobe para 1,95mm. Corroborando com esse achado a interpretação estatística dos dados do trabalho de Goutoudi, Koidis e Konstantinidis15 permitiu estabelecer uma correlação negativa entre recessão e largura de gengiva inserida, sendo sugerido que a quantidade inicial de gengiva poderia influenciar a amplitude da recessão gengival estabelecida. Isto pode ser explicado por meio da pesquisa desenvolvida por Stoner e Mazdyasna43, que observaram que quando a altura da mucosa ceratinizada era considerada mínima, apresentando- se menor que 1 ou 2 mm a saúde gengival estava normalmente comprometida. Provavelmente, a mobilidade da margem gengival, nessas condições, facilita a introdução de microorganismos e formação de placa bacteriana subgengival. Esta, uma vez instalada, é difícil de ser detectada e removida pela higienização convencional. Podemos então subentender que uma mucosa ceratinizada reduzida não é determinante para o surgimento da recessão gengival, no entanto uma vez instalada ela tende a ser maior nos dentes que possuem uma faixa estreita de mucosa ceratinizada.

Já falamos anteriormente na mucosa ceratinizada e sua relação com as recessões, mas sabemos que não podemos avaliar um fator isoladamente sem levar em consideração todo o conjunto de variáveis que o cercam. Nesse sentido procuramos analisar não somente a mucosa ceratinizada, mas também todo o periodonto em que ela está envolvida. Acatando a análise feita por Maynard e Wilson27 de que quando muito fina, ou na presença de fenestrações, a

recessão (em decorrência de trauma, inflamação, entre outros) torna-se mais rápida, até encontrar uma área mais espessa do osso alveolar, resolvemos analisar como as recessões estavam relacionadas com os tipos de periodonto. Encontramos 29,6% das recessões presentes em um periodonto tipo 1 (3 a 5mm de altura gengival e espessura favorável quando da palpação), 19,3% num periodonto tipo 2 (menos de 2mm de altura da mucosa ceratinizada, osso normal), 28,1% periodonto tipo 3 (dimensões gengivais normais e espessura óssea diminuída) e 26% periodonto tipo 4 (menos de 2mm de altura da mucosa ceratinizada e espessura óssea diminuídas). Analisando esses dados, podemos perceber que pouco mais da metade das recessões (57,7%) estão presentes em periodontos tipo 1 e 3, que possuem uma boa margem de gengiva inserida, corroborando com achados anteriores neste estudo, onde a quantidade de mucosa ceratinizada não foi determinante para a incidência das recessões44, 32.

Entretanto, quando associamos o tipo do periodonto com o grau das recessões por meio da análise de variância (ANOVA), encontramos uma diferença estatisticamente significante (p=0,033), demonstrando que quanto pior o tipo do periodonto, pior será a recessão. Os periodontos 1 e 3 apresentaram valores médios de recessão de 1,58mm e 1,61mm respectivamente, enquanto que nos do tipo 2 e 4 encontramos 1,96mm e 1,94mm.

Esses dados nos levam a crer que o tipo do periodonto está ligado diretamente a amplitude recessão gengival.

Mesmo não sendo o objetivo principal deste trabalho, a sensibilidade, por se tratar de uma ocorrência relatada freqüentemente nos dentes com recessão gengival, foi analisada.

Constatamos que apenas 7,4% dos sítios com recessão apresentaram algum tipo de sensibilidade. Ficou evidente também, mesmo sem significância estatística (p=0,092), que os casos associados à recessão apresentaram valores médios maiores (2,10mm) do que aqueles que não possuíam (1,71mm). Isto pode ser justificado devido ao fato de que quanto maior a recessão, maior área de dentina será exposta, aumentando a chance de manifestação da hipersensibilidade. Valle46 encontrou no seu trabalho que a maioria dos casos com recessão gengival despertava sensibilidade nos indivíduos do seu estudo (41%), no entanto, a correlação entre recessão e sensibilidade foi inexistente (p=0,34).

Ao avaliarmos todo o conjunto dos dentes examinados e não apenas aqueles que possuíam recessão gengival, dados relevantes e estatisticamente significantes puderam ser observados com relação ao índice de sangramento gengival e aos distúrbios oclusais.

Neste universo estudado, mais uma vez o índice de placa não mostrou diferenças que pudessem ser consideradas, exibindo números semelhantes tanto para os sítios portadores de

recessão gengival (Média de 46,51%) quanto para aqueles que não possuíam (Média de 46,94%), o que coincide com diversos estudos citados anteriormente35, 37, 22, 19.

Com resultados semelhantes aos encontrados por Parffit e Mjör38 e os de Goutoudi, Koidis e Konstantinidis15, o índice gengival dos sítios portadores de recessão gengival (Média de 5,99) mostraram-se estatisticamente mais significante (p=0,006) do que aqueles que não possuíam recessão (Média de 4,20). Diferença significante (p=0,002) também pôde ser observada para aqueles dentes que possuíam recessão gengival e estavam submetidos a alguma interferência oclusal (Média 0,52), quando comparados aos que não possuíam recessão (Média 0,27), resultados confirmados por diferentes trabalhos publicados na literatura 38, 15, 46.

Analisando a significância dos dados relacionados ao índice gengival (p=0,006) e dos distúrbios oclusais (p=0,002), podemos inferir que os distúrbios oclusais estiveram mais fortemente associados aos casos de recessão gengival que o índice gengival. No entanto, mesmo com as limitações deste estudo, podemos afirmar que ambas as variáveis possuem importância na ocorrência das recessões gengivais.

No documento Eudivar Correia de Farias Neto (páginas 57-64)

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