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A riqueza de primatas na Mata Atlântica será alterada ao longo do espaço com as 508

mudanças climáticas. Atualmente, zonas mais rica em espécies estão concentradas no 509

centro do bioma, e haverá um deslocamento e concentração da riqueza em áreas mais 510

próximas ao litoral no futuro. É importante destacar que áreas localizadas na costa da 511

Mata Atlântica estão mais vulneráveis às mudanças climáticas, especialmente 512

diminuição na precipitação e aumento da temperatura (Graham et al. 2016). Outra zona 513

de alta riqueza atualmente está localiza ao oeste do bioma, em áreas de transição entre a 514

Mata Atlântica e o Cerrado. Observamos que para esta região ocorrerá a maior redução 515

no número de espécies. Regiões de ecótonos são altamente dinâmicas, e estão 516

susceptíveis à forte influência das mudanças no clima (Noble 1993). Além disso, é 517

31 esperado que, no futuro, tais regiões experimentem mudanças no regime de precipitação 518

e venham a tornarem-se mais semelhantes com áreas de savanas (Scarano & Ceotto 519

2015). É importante ressaltar que as espécies de primatas aqui estudadas, possuem pelo 520

menos 3 mil ha ou mais de 50 % de sua distribuição na Mata Atlântica, então essas 521

mudanças na riqueza próximas ao Cerrado não têm influência de espécies que tem sua 522

distribuição quase inteiramente em outro bioma, com uma pequena porção na Mata 523

Atlântica. Assim, mudança nas regiões de ecótonos pode influenciar a composição de 524

espécies de primatas nessas áreas de forma direta, uma vez que as características 525

climáticas têm relação com as tolerâncias fisiológicas dos organismos, e indireta, 526

através de alterações na cobertura florestal. 527

A redução da riqueza de espécies contribui para mudança na composição da 528

comunidade, e isso pode alterar a diversidade beta tanto temporalmente quanto 529

espacialmente. A diversidade beta espacial aumentará no futuro, dessa forma, as 530

comunidades de primatas devem tornar-se mais heterogêneas no futuro em função das 531

mudanças climáticas. Atualmente os maiores valores de diversidade beta restringem-se 532

a poucas áreas nos limites a oeste do bioma. Nos cenários de mudanças climáticas o 533

número de locais com valores mais altos de diversidade beta aumenta, formando faixas 534

mais amplas ao longo da faixa oeste do bioma. Além disso, projeta-se redução da área 535

das distribuições das espécies quando comparamos as distribuições atuais e as futuras. 536

Essa redução na área de distribuição das espécies pode estar relacionada com o aumento 537

do número de locais (quadrículas) com valores altos de diversidade beta espacial ao 538

longo do bioma no futuro. Isso é previsto pela hipótese de heterogeneização, em que a 539

redução da área das distribuições e/ou extinção local promovem a heterogeneização 540

(Ochoa-Ochoa et al. 2012), ou seja, o aumento da diversidade beta espacial. O maior 541

nível de mudança espacial na composição de espécies pode ser explicado por altas taxas 542

de extinção locais direcionadas pelo clima (Lewthwait et al. 2016). Poucas espécies 543

apresentarão aumento da área de distribuição. Especificamente para essas espécies, a 544

disponibilidade de condições climáticas favoráveis para sua ocorrência deve aumentar 545

no futuro. 546

Além das mudanças na diversidade beta espacial, a composição das 547

comunidades de primatas será alterada temporalmente. As maiores mudanças na 548

composição de espécies de primatas ao longo do tempo foram observadas, 549

32 principalmente, na região central da Mata Atlântica e em áreas ao oeste do bioma 550

próximas ao Cerrado. Esses são os locais em que a composição de espécies mais 551

mudará no futuro, em função das mudanças climáticas. A alta diversidade beta temporal 552

indica que em tais áreas a composição de espécies mudará mais no futuro, quando 553

comparadas com a sua composição atual. A diminuição da riqueza teve grande 554

contribuição na mudança na composição de espécies nesses locais, pois áreas com alta 555

diversidade beta temporal foram congruentes com áreas com alta diferença na riqueza 556

de espécies atual para o futuro. Isso também é confirmado pela importância maior do 557

aninhamento do que do turnover na formação da diversidade beta espacial. 558

É importante ressaltar ainda que mudanças na composição das comunidades 559

podem ter consequências ecológicas significativas para o funcionamento dos 560

ecossistemas (Barbet-Massin & Jetz 2015; Pecl et al. 2017). Por exemplo, os primatas 561

desenvolvem diferentes relações ecológicas, sendo presas, predadores ou mutualistas 562

em redes tróficas, a perda de qualquer uma dessas relações influencia a estrutura e a 563

resiliência do ecossistema, alterando o seu funcionamento (Estrada et al. 2017). 564

Portanto, compreender como os padrões de diversidade serão influenciados no futuro é 565

importante para nortear estratégias de conservação (Angeler 2013). Tais padrões 566

permitem identificar, por exemplo, áreas com alta riqueza de espécies atualmente e no 567

futuro, e locais onde não haverá grandes perdas, como é o caso das regiões mais a oeste 568

na região central da Mata Atlântica. Além disso, do ponto de vista de representação da 569

diversidade, os locais com alta diversidade beta são importantes, pois são muito 570

diferentes, em composição de espécies dos seus vizinhos. Ainda que tenham baixa 571

riqueza, podem conter espécies endêmicas ou de distribuição restrita. 572

Utilizamos variáveis climáticas como preditoras da ocorrência de espécies, sem 573

considerar outros fatores que atuam sobre suas distribuições, como por exemplo, 574

diretamente, interações bióticas e limitações de dispersão. Entretanto, as nossas análises 575

foram realizadas apenas dentro da extensão de ocorrência conhecida de cada espécie, 576

considerando apenas os modelos de adequabilidade de habitat dentro dessas extensões. 577

Essa abordagem considera, indiretamente, aspectos conhecidos que limitam a 578

distribuição dessas espécies como, por exemplo, barreiras geográficas. Podemos 579

considerar essa abordagem conservadora, uma vez que mudanças para além da nossa 580

extensão de análise não foram consideradas, e, de forma geral, as mudanças estão 581

33 subestimadas. Sabemos que fatores climáticos devem atuar de forma sinergética com 582

outras fontes de ameaças aos primatas, por exemplo, perda e fragmentação de habitat, as 583

quais não foram avaliadas aqui. 584

Os resultados obtidos nesse estudo ajudam a entender como as mudanças 585

climáticas influenciam a diversidade no tempo e no espaço via mudanças nas 586

distribuições geográficas, e fornecem um olhar geral, em grande escala espacial, sobre o 587

impacto das mudanças climáticas sobre a diversidade de primatas da Mata Atlântica 588

brasileira. Estudos futuros devem procurar entender as reações particulares de cada 589

espécie às mudanças no clima, bem como, mudanças na disponibilidade de habitat 590

florestal, a fim de buscar encontrar medidas para minimizar os impactos sobre a 591

diversidade de primatas no bioma. 592

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