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O endométrio dos mamíferos é um tecido altamente complexo e dinâmico, cuja função principal é garantir condições favoráveis ao crescimento e desenvolvimento do embrião, a sua implantação e sua sobrevivência até atingir um estadio que lhe permita a sua subsistência no exterior do organismo (Payan-Carreira et al., 2011). Em resposta aos estímulos hormonais, o endométrio dos mamíferos passa por renovações cíclicas. Este processo é controlado por fatores autócrinos e parácrinos, incluindo citocinas, fatores de crescimento bem como outras moléculas (Payan-Carreira et al., 2011). Os diferentes tipos de células do endométrio como fibroblastos, células imunocompetentes, células glandulares epiteliais e células vasculares, produzem diferentes factores, sendo descrito nos humanos que todas elas expressam TNFα que também está presente nos ovários e nos ovidutos (Philippeaux & Piguet, 1993, Wolff et

al., 1999)

Os estrogénios regulam a expressão das citocinas, dos fatores de crescimento e dos seus receptores e, possuem também um papel importante na inflamação e nos processos neoplásicos (Tabibzadeh, 1994, Gori et al., 2011) do endométrio.

O TNFα é conhecido como sendo uma das mais versáteis citocinas. Esta molécula está presente em vários tecidos funcionando como mediador da homeostasia dos tecidos, com efeitos fisiopatológicos em elevadas concentrações (Wolff et al., 1999).

Existem evidências que sugerem que o TNFα possui um papel importante nas modificações cíclicas do endométrio, sendo regulado pelos diferentes tipos celulares (Wolff et al., 1999). Estudos anteriores em cadela, realizados pelo grupo de trabalho do Laboratório de Histologia e Anatomia Patológica (LHAP) onde realizámos este nosso trabalho, verificaram que existe imunoexpressão do TNFα tanto no epitélio como no estroma do endométrio nesta espécie animal, sendo a sua expressão mais intensa neste último. Ao longo do ciclo éstrico verificou- se uma diminuição da expressão desta molécula no diestro inicial (Payan-Carreira et al., 2011).

No nosso trabalho em gata também observámos que existe imunoexpressão do TNF tanto no epitélio como no estroma, mas neste caso a expressão epitelial é mais intensa que a do estroma. Ao longo do ciclo éstrico verificámos uma maior expressão na fase estrogénica

34 (proliferativa) do que na fase progestagénica (secretora), o oposto do descrito na cadela (Payan-Carreira et al., 2011).

Estudos realizados na mulher revelaram que as glândulas do endométrio aumentam a produção de TNFα durante a fase proliferativa, diminuindo a sua produção no início da fase secretora voltando a ser elevada a sua produção no meio da fase secretora (Hazout, 1995, Laird et al., 1996, Hunt et al., 1992), e os estudos de Gori et al. (2011) na mulher relatam que a expressão desta molécula depende do ciclo hormonal, sendo influenciada principalmente pelos estrogénios, corroborando assim os resultados por nós obtidos. A presença do TNFα no endométrio humano gera diferentes respostas celulares, podendo tanto inibir como promover a tumorigénese (Erten, 2011).

Na mulher, a inflamação e uma disfunção na sinalização da produção de estrogénios, são as principais causas para as duas doenças ginecológicas mais frequentes: a endometriose e o adenocarcinoma do endométrio (Gori et al., 2011). Dentro dos tumores do trato genital os adenocarcinomas do endométrio são os mais comuns. Estes tumores são classificados em 2 tipos; tipo I- adenocarcinoma do endométrio e tipo II carcinoma seroso. O desenvolvimento do tipo I está relacionado com a exposição a uma elevada quantidade de estrogénios. Em contraste, existe uma minoria de adenocarcinoma do endométrio que parece não estar relacionada com as elevadas concentrações hormonais (Sherman, 2000).

Na bibliografia consultada é referido que as neoplasias uterinas são raras em gatas, correspondendo apenas a 0,29% das neoplasias observadas nesta espécie animal. Destas os leiomiomas e os adenocarcinomas são os mais frequentemente encontrados. Os tumores uterinos estão descritos principalmente em gatas com idades compreendidas entre os 4 e os 16 anos (Anderson & Pratschke, 2011, Miller et al., 2003).

O adenocarcinoma do endométrio é mais comum em vacas e coelhas. As coelhas apresentam uma incidência de 79% de adenocarcinomas uterinos a partir dos 5 anos de idade (Preiser, 1964, Kurotaki et al., 2007). Esta elevada incidência pode ser explicada pelo facto destes animais apresentarem uma ovulação induzida e, na maioria das vezes estão alojados individualmente (Elsinghorst et al., 1984), podendo este fenómeno explicar também os adenocarcinomas nas gatas.

Nos ratos o adenocarcinoma do endométrio espontâneo é comum nalgumas estirpes de ratos (por exemplo a estirpe Donryu), em indivíduos velhos. O mecanismo de desenvolvimento dos

35 adenocarcinomas uterinos nesta espécie ainda não é perfeitamente conhecido, embora seja aceite que os estrogénios tenham um papel fundamental na evolução desta doença nos roedores, tal como o desenvolvimento de adenocarcinomas do endométrio nos humanos (Yoshida et al., 2012).

Normalmente nos adenocarcinomas do endométrio, as citocinas induzem o crescimento dos tumores mediando a angiogénese e a proliferação. O TNFα ativa as vias de sinalização cruciais para a invasão celular do adenocarcinoma do endométrio (Gori et al., 2011), encontrando-se nestes tumores em valores bastante superiores relativamente aos presentes no endométrio não neoplásico (Shaarawy & Abdel-Aziz, 1992, Dossus et al., 2011). Alguns autores propõem que os valores de TNF são mais altos quanto mais avançada estiver a doença (Shaarawy & Abdel-Aziz, 1992).

Segundo Chopra et al. (1997) o TNFα em baixas concentrações, tem poder angiogénico e a adição do anticorpo purificado anti TNFα inibe o crescimento dos vasos endoteliais (Chopra

et al., 1997). Os resultados obtidos no trabalho deste autor são contrários aos descritos

noutros estudos, como o de Dossus et al. (2011), assim como aqueles por nós obtidos, em que não verificámos um grande aumento do TNFα nos tumores, quando comparada com os tecidos normais. Também verificámos um ligeiro aumento desta citocina nos tumores em relação à fase progestagénica, podendo assim inferir-se que, ou o TNFα não é um fator determinante na tumorigenese nestes tumores em gata, ou estes casos por nós avaliados poderão ainda estar numa fase precoce de desenvolvimento. Outra explicação possível prende-se com o carácter clinico benigno da maior parte das lesões de adenocarcinoma utilizados neste estudo, em que não se registou, nas amostras usadas, indícios de efração vascular e invasão dos vasos sanguíneos por células neoplásicas No entanto, dado a nossa série não ser muito grande, e por falta de follow-up clinico, não poderemos tirar grandes conclusões a este respeito.

O endométrio está também sujeito ao mecanismo de regulação celular através da apoptose, para que possa ocorrer o desenvolvimento e regressão das suas glândulas ao logo do ciclo éstrico. A apoptose elimina seletivamente células danificada, com danos mínimos para as células vizinhas. Ocorre tanto no estado fisiológico como estados patológicos, incluindo a carcinogénese, onde a inibição da apoptose resulta no prolongamento da vida das células com alterações graves, permitindo a sua perpetuação e o possível desenvolvimento de tumores (Paola et al., 2005).

36 A apoptose no endométrio é regulada hormonalmente, principalmente pelos estrogénios e progesterona (Paola et al., 2005, Driak et al., 2011).

Vários estudos na mulher têm demonstrado uma maior incidência da apoptose nas células endometriais, durante a fase secretora tardia, sendo escassa na fase proliferativa e no início da fase secretora (Driak et al., 2011).

Estudos realizados na cadela, mostram que o índice apoptótico é bastante baixo quer no epitélio de superfície, quer no estroma ao longo de todo a ciclo éstrico (Cruchten et al., 2004), não sendo estes resultados coincidentes com os obtidos neste trabalho para a gata, em que o maior número de células em apoptose foram observadas na fase estrogénica ou proliferativa. No entanto, existem grandes diferenças na fisiologia do ciclo éstrico entre estas duas espécies, que se repercutem certamente na fisiologia do endométrio pois se traduzem numa dinâmica temporal distinta na alternância dos esteróides sexuais (estrogénios e progesterona), que são os principais reguladores do ciclo do endométrio.

Um estudo realizado por Kokawa et al. (2001) em adenocarcinomas do endométrio na mulher, verificou um número de células em apoptose significativamente superior do que em amostra pós-menstruais. Os autores deste estudo especulam que este aumento de células em apoptose nos adenocarcinomas indique que ocorreu um erro genético que leve à diminuição da expressão do Bcl-2 e aumento do Bax com consequente aumento da apoptose no adenocarcinomas do endométrio em relação ao endométrio normal, sendo assim um ponto critico no desenvolvimento destes tumores (Kokawa et al., 2001). Nós verificámos um grande aumento do número de células em apoptose nos FEA, resultados que estão de acordo com estes autores.

Um dos objectivos deste trabalho foi verificar se o TNFα poderia ser uma das vias preferências para a activação da apoptose, uma vez que promove a via extrínseca deste fenómeno. No entanto, os nosso resultados apresentam um grande aumento do número de apoptoses nos FEA sem serem acompanhadas por uma aumento do TNFα, pelo que podemos apenas especular que a apoptose nos FEA não foi induzida pela via do TNFα, mas por outra via.

Existem trabalhos que referem que uma disfunção da via de sinalização intrínseca envolvendo p53/Bcl-2/Bax, promove a tumorigénese e a progressão dos tumores (Sakuragi et al., 2002) e Kokawa et al. (2001), demonstraram que os adenocarcinomas do endométrio apresentavam

37 uma expressão aumentada de Bax mas não de Bcl-2, havendo assim um favorecimento da apoptose (Kokawa et al., 2001). Poderá ser esta via a afetada no caso dos FEA e assim haver um aumento da apoptose e a progressão dos tumores, sem ser por via do TNFα.

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Conclusão

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