Neste estudo observacional em amostra representativa de usuários de IBP
em farmácias comunitárias, obtivemos como resultados dois manuscritos, o primeiro
e principal abordou o perfil de utilização e fatores associados ao uso de IBP (Apêndice
I), já o segundo, enfocou aspectos farmacoeconomicos do uso de IBP (Apêndice II).
Como achados principais destacamos um padrão de uso condizente com as
indicações e posologias esperadas para os IBP. Contudo, observou-se uso
prolongado destes medicamentos numa proporção elevada, onde a maioria os utiliza
por mais de cinco anos, sobretudo indivíduos com maior idade, com maior índice de
massa corporal e sob uso de AINES e ISRS. A informação dos pacientes relacionada
a potenciais riscos durante uso prolongado de IBP é insuficiente. Verificou-se também
que apesar da eficácia semelhante dos IBP, medicamentos de alto custo são
prescritos sem levar em consideração o poder aquisitivo do paciente para custear o
tratamento.
Atualmente os IBP permanecem entre os medicamentos mais amplamente
prescritos no mundo. O uso de IBP sem indicação apropriada é de 25 a 70% nos
Estados Unidos (US), além disso os IBP respondem por mais de US $ 10 bilhões em
custos de saúde (JOSH GEFFEN AND KIERAN FORSTER, 2018). Vários estudos
têm relatado que IBP são frequentemente prescritos sem indicação apropriada. Por
exemplo, um estudo observacional transversal realizado na Espanha com 302
pacientes determinou a magnitude da prescrição não recomendada por diretrizes
(NGRP) de IBP, concluindo que esse tipo de prescrição foi observada em 192 casos
(63,6%) e o custo médio associado ao NGRP por prescrição foi de 3,24 euros por mês
(MARES-GARCÍA et al., 2017a). Porém, não tem sido suficientemente estudados os
motivos que levam a prescrição inapropriada. Um estudo recente de casos-controles
de uso inadequado de IBP em idosos o número de medicamentos recebidos, sendo
os pacientes expostos aos riscos de prescrição sem qualquer benefício esperado
(VOUKELATOU et al., 2019).
Contrariamente a esses relatos, no nosso estudo se observou um predomínio
das indicações e doses de forma adequada para os IBP e, embora essa classe de
medicamentos seja dispensada como OTC, em metade dos casos foi por prescrição
médica. Com pouca ocorrência de indicação não licenciada e seguido as orientações
corretas de uso.
A aquisição de medicamentos OTC é cerca de duas vezes maior do que os
prescritos (PANDA et al., 2017). Além disso, é prática comum a compra de
medicamentos sujeitos a prescrição sem receituário (ALJADHEY et al., 2015) ou a
reutilização do mesmo receituário várias vezes (MAHROUS, 2018). Logo, é bastante
disseminada a prática da automedicação e não restrita aos OTC. No caso dos IBP,
também predomina o uso de indicações não licenciada se automedicação em mais de
60% dos clientes de farmácia comunitária (MARES-GARCÍA et al., 2017b). Um dos
fatores associados ao uso expressivo de IBP seria seu baixo custo e a variabilidade
de marcas disponíveis (BOMBA et al., 2018). Observamos valores menores em nossa
amostra. Contudo, os estudos citados baseiam-se em análise retrospectiva de
prescrições em amostras pouco representativas. Nossos dados foram coletados
prospectivamente em uma amostra estratificada abrangendo uma população de cerca
de 800,000 habitantes.
O modelo multivariado apontou para uma relação entre o uso por longos
períodos e a maior idade, IMC, uso de AINES e uso de ISRS. Pacientes com idade
acima de 65 anos com história prévia de úlcera complicada foi observado que o
provavelmente pela presença de outros fatores e, entre eles, o papel do H. pylori
concomitante a infecção, que é frequentemente encontrada em pessoas idosas
(SAVARINO et al., 2018), justificando o uso do IBP nesses pacientes. A obesidade é
um fator de risco bem estabelecido para o desenvolvimento do DRGE, pacientes com
IMC acima 35 apresentam uma prevalência de DRGE de 3 a 6 vezes maior quando
comparado com indivíduos com IMC normal, inferior a 25 (HOLMBERG et al., 2019),
por apresentar maior ocorrência de refluxo, justifica o uso de IBP em obesos. Os anti-
inflamatórios não esteroidais estão envolvidos em eventos adversos na mucosa
gástrica, pois altera a produção de muco que protege a mucosa. Seus efeitos podem
ser percebidos após primeiros dias do início da terapia com AINE, podendo se agravar
até úlcera gástrica o que necessita do uso dos IBP (SAVARINO et al., 2018). O
desconforto abdominal também é uma reação adversa comum em usuários de
inibidores seletivos de recaptação de serotonina (MEDSCAPE, 2020), no entanto o
uso de IBP para prevenir ou tratar a dispepsia seria previsto em usuários desses
medicamentos.
A maioria dos efeitos adversos causados pelos IBP se dão após
administração a longo prazo. Levando em consideração que mais de 50% da nossa
amostra utiliza os IBP por mais de 6 meses e 30% por mais 4 anos, podemos sugerir
que esse grupo de usuários apresenta um fator de risco e estão propensos a
desenvolver uma das complicações provocadas por esses medicamentos. Segundo
Jaynes e colaboradores, os efeitos adversos incluem infecção por Clostridium difficile,
demência, pneumonia, doença renal, deficiência de macronutrientes e densidade
mineral óssea. No entanto, em situação que exigem o uso dos IBP por tempo
indeterminado, como no tratamento da DRGE, os pacientes têm a opção de fazer
terapia por demanda (JAYNES; KUMAR, 2018). A maioria dos usuários da nossa
Os dados discutidos acima se referem ao primeiro manuscrito, os resultados
relacionados a análise farmacoeconomica e geoespacial revelou que mesmo
considerando que os IBP apresentam a mesma efetividade clínica para as indicações
menos graves (PETRYSZYN; STANIAK, 2013), sobretudo as mais comuns (refluxo e
gastrite), muitos medicamentos de alto custo são prescritos. Uma metanálise sobre
custo-efetividade dos IBP realizado na Polônia recomenda que os medicamentos de
menor custo sejam priorizados no tratamento da DRGE (PETRYSZYN, 2016).
O Pantoprazol e o Omeprazol foram os medicamentos mais adquiridos para
essas indicações em nosso estudo. No entanto, o Pantoprazol 40mg é cerca de três
vezes mais caro que o Omeprazol 10mg, destacou um estudo indiano (GRAHAM, 2018). Tendo em vista que o custo dos medicamentos pode impactar diretamente na renda mensal do paciente, o que pode comprometer a qualidade de vida, dessa forma
a relação entre custo e efetividade deve ser considerada pelo prescritor na escolha do
IBP (BARGADE, 2016).
Grande parte da nossa amostra adquiriram o IBP com prescrição médica,
sobretudo por gastroenterologista, embora os IBP sejam comumente adquiridos sem
receita no Brasil (SERGIO, 2020). Dessa forma a escolha do IBP é feita pelo prescritor,
independente da renda, escolaridade e outros fatores. Que pode ser impactado pelas
estratégias agressivas de marketing da indústria farmacêutica (MOAYYEDI,2017). O
que pode acarretar em uma preferência pelo medicamento de maior custo, mesmo as
opções menos caras não terem evidência de menor efetividade (GAWRON,2014).
Este estudo teve algumas limitações. Estava restrito a apenas uma área urbana
e uma única rede de farmácias. O número de pacientes que se recusaram a participar
da pesquisa não foi coletado de forma sistemática. Não tivemos acesso à história
medicamento prescrito sem a presença de prescrição, havendo possibilidade de viés
de memória. Como perspectivas futuras, destaca-se a importância de investigar os
potenciais danos envolvidos no uso prolongado de IBP e os impactos causados na
qualidade de vida associados à manutenção desse uso crônico. Além disso, devem