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De forma geral, foi possível notar que o aquecimento alterou as características de ambos os solos analisados. As mudanças foram dependentes do tipo de atmosfera, temperatura e tempo de aquecimento em que as amostras foram submetidas.

A alteração do diâmetro médio das amostras e sua distribuição granulométrica, tanto nos testes preliminares, quanto nos testes em atmosfera controlada, mostram um aumento da fração arenosa. Essa alteração pode ser explicada pela cimentação das partículas promovida pela decomposição de minerais como a gibbsita e a caulinita. Essa hipótese pode ser corroborada pelos dados de análise termogravimétrica das amostras do Teste Preliminar 2, onde os picos de difração correspondentes à gibbsita e caulinita desaparecem nas amostras aquecidas a partir de, respectivamente, 252 °C e 520°C. Os dados da análise termogravimétrica do Solo 1 (Figura 10) também indicam que houve a decomposição da gibbsita e caulinita em uma temperatura de aproximadamente, 250 °C e 520 °C respectivamente. A decomposição desses minerais pode levar à cimentação por sílica e hidróxidos de alumínio, influenciando na textura e distribuição granulométrica de amostras submetidas ao aquecimento (TEREFE et al., 2008; KETTERINGS et al., 2010 e O’BRIEN et al., 2018). Os dados de área superficial específica do Solo 2 também indicaram que após o seu aquecimento (250°C) ocorreu a redução desse parâmetro, consistente com o aumento do diâmetro das partículas e diminuição do diâmetro dos poros da estrutura dos minerais.

Os picos de difração da muscovita, por sua vez, permaneceram nas amostras aquecidas pelo fato de apresentarem maior resistência ao calor que os demais minerais (O’BRIEN et al., 2018). Esse fato explica a razão pela qual não foram notadas alterações entre as imagens de microscopia eletrônica das amostras de Solo 1, que apresentava majoritariamente minerais lamelares. No Solo 2, por outro lado, não se observou a predominância desses minerais mais resistentes, resultando em alterações na morfologia das amostras aquecidas. Na amostra aquecida do Teste Preliminar 2 (TP-02), à 654 °C, os picos de difração da hematita apresentaram a mesma intensidade daqueles do Solo Controle, indicando que não houve alteração dessa fase mineral, como a formação de minerais com Fe(II). Esse resultado é corroborado pelos testes em atmosfera controlada, onde não houve registro de incremento das concentrações de minerais contendo Fe(II) em todas as condições para o Solo 1.

A alteração na coloração das amostras pós aquecimento foi uma das mudanças mais evidentes. De acordo com Sertsu e Sánchez (2010) e Katsumi et al. (2016), o aquecimento de

solos tende a tornar sua coloração mais avermelhada e escura, como ocorreu, sobretudo, com o Solo 2. Segundo os autores, essa alteração se dá devido a oxidação do ferro dos minerais e a remoção da matéria orgânica presente no solo, tornando-o mais escuro conforme o aumento da temperatura.

Para o Solo 1, o mecanismo responsável pela alteração da cor pode ter sido, principalmente, a combustão da matéria orgânica, ocorrendo a partir de 250 °C, como observado por Rodrigues (2019). No Solo 2, além da combustão da matéria orgânica, a presença de óxidos de ferro, cerca de 5 vezes maior que no Solo 1, pode ter representado maior influência na coloração do solo após o aquecimento. De acordo com Till et al. (2015) e Ulery e Graham (2010), a maghemita e hematita são minerais com alto poder de pigmentação, mesmo em pequenas quantidades e a formação desses minerais ocorre através do aquecimento de goethitas em temperaturas a partir de 300 °C.

Os resultados da análise mineralógica por DRX em amostras do Teste Preliminar 2 com o Solo 1 não indicaram a formação de novos minerais com Fe(II) como a magnetita. No entanto, os resultados da análise química realizada a partir da digestão ácida dos solos confirmaram que houve incremento do teor de Fe(II) após o aquecimento. Para o Solo 2, esse aumento nos teores de Fe(II) foram verificados em todas as amostras submetidas ao aquecimento, em ambas as condições de atmosfera (oxidante e redutora), como apresentado na Figura 37.

Geralmente o mecanismo de formação de Fe(II) e de magnetita nas amostras aquecidas de solos está associado à desidroxilação de goethitas e redução e recristalização de hematitas (TILL et al., 2015 e TILL e NOWACZYK, 2018). Till et al. (2015) demostraram que o aquecimento de nanogoethitas em atmosfera redutora foi capaz de gerar magnetitas de coloração vermelho escuro a preto puro, resultando também no desaparecimento dos picos de goethita em análises de DRX, além do aumento do magnetismo em amostras aquecidas a partir de 210 °C. De forma geral, são necessárias duas etapas para a formação de magnetitas, que consiste na perda do hidróxido (OH) da estrutura da goethita (αFeOOH), formando hematita (αFe2O3) e a interação da hematita com o agente redutor (por exemplo, CO), reduzindo-a a

magnetita (Fe3O4), de acordo com as equações a seguir (Till et al., 2015):

2 αFeOOH(s)→ αFe2O3 (s)+ H2O(g) (6)

Desta forma, os incrementos observados no Solo 2 em atmosfera redutora podem estar associados a este mecanismo, já que este solo é rico em óxidos de ferro, principalmente hematitas e goethitas, de acordo com a análise de DRX do mesmo. No entanto, o fato das fases formadas com Fe(II) não se encontrarem bem cristalizadas, a sua identificação pela técnica de DRX também fica dificultada. Na análise de DRX das amostras aquecidas de Solo 2, também verificou-se redução e desaparecimento dos principais picos de difração da goethita conforme o aumento da temperatura, assim como foi observado por Till et al. (2015).

Assim como a presença de matéria orgânica em solos submetidos a queimadas pode promover uma atmosfera redutora necessária para a transformação de goethitas em hematitas e, posteriormente, magnetitas (TILL e NOWACZYK, 2018), a matéria orgânica (10%) associada à grande quantidade de óxidos de Fe (cerca de 26%) no Solo 2 pode explicar o incremento observado nas concentrações de Fe(II) das amostras aquecidas em atmosfera oxidante em 120 e 250 °C.

Os óxidos de Fe presentes no Solo 1 (5%) e seu teor de matéria orgânica (8%) são menores que do Solo 2, essas diferenças podem explicar a razão pela qual não se observou aumento na concentração de Fe(II) no Solo 1. Por outro lado, a transformação de magnetita em hematita com formação de espécies intermediárias contendo apenas Fe(III) também pode ocorrer em condições oxidantes, como demonstrou Pereira (2010). Quando magnetitas são aquecidas entre 200 e 300 °C, ocorre a preservação de um núcleo de magnetita recoberto por uma camada de hematita. Essas alterações podem justificar a redução das concentrações de Fe(II) a partir de 300 °C no Solo 2 em atmosfera Oxidante, inclusive a valores abaixo do controle não aquecido, como ocorreu, por exemplo, no aquecimento à 450 °C por 1h, como apresentado na Figura 37. Portanto, a presença de matéria orgânica além de minerais com Fe(III) no solo podem auxiliar na formação de compostos com Fe(II) durante o seu aquecimento, mesmo em ambiente oxidante.

De acordo com Clement et al. (2011) e Till et al. (2015) o aquecimento de oxi- hidroxidos de Fe na presença de matéria orgânica ou atmosfera redutora pode levar à formação de fases mais magnéticas, como a maghemita. A maghemita (γ-Fe2O3)foi detectada nas análises

de DRX das amostras aquecidas de Solo 2 a partir de 300 °C, tanto em atmosfera oxidante quanto em redutora. A presença desse mineral explicaria concentrações menores de Fe(II) a partir dessa temperatura, uma vez que a maghemita é um dos minerais intermediários formados a partir do aquecimento de goethitas, como já mencionado e apresenta deficiência em Fe(II) (FERGUSON e HASS, 1958; JORDANOVA et al., 2019; TILL et al. 2015).

Figura 37 –Concentração de Fe(II) em amostras de Solo 2 aquecidas a diferentes temperaturas durante 1h e 3h sob atmosfera redutora e oxidante.

Fonte: A autora.

Os parâmetros físico-químicos monitorados durante o teste de batelada indicaram que as condições do teste não foram as ideais para promover a degradação abiótica. Embora tenha ocorrido uma redução no valor do potencial de oxirredução para as amostras com PCE, de 480 mV para 439 mV para o Solo Controle e 488 mV para 436 mV para o Solo Aquecido, esses valores ainda correspondem a condições oxidantes, associadas à presença de oxigênio dissolvido na água, que representa o principal aceptor de elétrons do meio.

Os valores de pH também não apresentaram mudanças significativas ao longo do tempo nos reatores com solo e PCE (Figura 35). Porém, a maioria dos estudos (US EPA, 2009) apontam o mecanismo de eliminação redutiva (Equação 1) como a principal via de degradação dos etenos clorados, dessa forma, não são esperadas alterações significativas nos valores de pH, como ocorreria caso o mecanismo predominante fosse o da hidrogenólise (Equação 2), através da liberação de íons H+, ou de hidrólise (Equação 4), através da presença de grupos OH-.

Em um ambiente redutor ou que favoreça o processo de degradação abiótica as taxas de descloração redutiva ocorrem preferencialmente em pH alcalino, conforme foi observado nos estudos de Lee e Batchelor (2002, 2004). Esses autores verificaram que, conforme o pH da solução aumentava, ocorria um decréscimo das cargas superficiais dos minerais, que

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 120 250 300 450 550 C on ce ntr aç ão de F e(II) (mg/ kg ) Temperatura de Aquecimento (°C)

promoviam a formação de complexos superficiais desprotonados, que são mais reativos que os complexos protonados, observados em pH ácido. Portanto, o pH ácido do solo analisado não contribuiu para a degradação do PCE, mesmo na presença de Fe(II). No entanto, em estudos anteriores deste grupo de pesquisa, foram observadas dificuldades na elevação do pH do Latossolo, dessa forma, a alteração do pH do solo foi descartada.

Quanto às concentrações de Cl- também não se observou nenhuma correlação com as

concentrações obtidas de PCE. A concentração de íons Cl- na água destilada utilizada no estudo foi de 0,32 mg L-1, indicando que, provavelmente, os íons detectados estão associados ao solo

ou ao contaminante. Para verificar essa interferência, a determinação de íons cloreto na solução de PCE utilizada nos testes de batelada também deveria ser realizada. Como mencionado anteriormente, as amostras de solo apresentaram capacidade de adsorção física, ou fisissorção, que é um processo reversível que ocorre na superfície das moléculas (DABROWSKI, 2001 e IUPAC, 2015). Dessa forma, uma possível adsorção das moléculas de cloro do contaminante e sua posterior liberação podem ter afetado as medições de íons Cl- ao longo do tempo. Outro fator que pode ter ocasionado as flutuações nos resultados são os interferentes do próprio solo na análise através de eletrodos seletivos de íons (ISE), sendo eles os hidróxidos e haletos (THERMOSCIENTIFIC, 2008).

Portanto, não foi possível observar indícios de degradação abiótica a partir dos resultados obtidos nos testes de batelada. Acredita-se que alguns fatores externos também possam ter afetado os resultados dos testes, como o ambiente do interior dos frascos que, desde o início, esteve oxidante. Essa condição poderia ter sido corrigida pela injeção de N2 na

atmosfera dos frascos e a utilização de água desoxigenada nos reatores, preparada também a partir de injeção de N2.

Outro aspecto que pode ter interferido nos resultados dos testes foi o solvente utilizado. Embora o acetato de etila tenha se apresentado como melhor solvente nos ensaios de recuperação de PCE, o mesmo pode não ter sido eficiente na manutenção do contaminante na fase dissolvida durante o período em que os frascos ficaram armazenados. Nesse caso, pode ter ocorrido volatilização (perdas para a atmosfera do frasco) de parte do PCE e que não foi quantificada nas análises de GC/MS.

Vale ressaltar também que as amostras foram enviadas para análise todas em conjunto ao final do T14. Portanto, as amostras do T0 deveriam apresentar os maiores valores de concentração de PCE, o que não foi observado, confirmando a hipótese de que, provavelmente,

o PCE foi perdido por volatilização durante o tempo de espera, enquanto já estava extraído em Acetato de Etila. Essa perda poderia ter sido evitada caso as amostras tivessem sido analisadas logo após terem sido extraídas dos reatores.

Outro ponto a ser destacado é que a coluna utilizada para a detecção de PCE no presente estudo (RESTEK RTX-5ms, 30 m x 0,25 mm x 0,25 μm) não é a mais indicada para Solventes Orgânicos Voláteis, sendo colunas com maior diâmetro de filme mais indicadas (em geral, de 1,0 a 1,8 µm). Dessa forma, podem ter ocorrido variações entre as amostras, afetando os valores de concentração de PCE obtidos. Além disso, por se tratar de um laboratório multiusuário da Universidade Federal de São Paulo, amostras de outros usuários podem ter contaminado a coluna e, por consequência, interferido nos resultados obtidos nesta pesquisa.

A degradação do PCE também poderia ser avaliada através da análise de isótopos, como foi realizado por Badin et al. (2016) para caracterizar a degradação do PCE e de seus subprodutos em água subterrânea. De acordo com Elsner et al. (2005), o mecanismo de degradação de solventes clorados pode ser inferido através dos valores de εbulk, que representa

relação entra as massas dos isótopos e dos valores de AKIE - Apparent Kinetic Isotope Effects, entre os isótopos de Carbono e Cloro (C – Cl).

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