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5.1) Obtenção dos peptídeos

Os peptídeos foram sintetizados via síntese química em fase sólida, pois a mesma possui a vantagem de ser mais prática e rápida que a síntese em solução. Dentre as estratégias de síntese em fase sólida optou-se pela t-Boc. Nesta estratégia utiliza-se o grupo t-butiloxicarbonila (t-Boc) para proteger o grupo α-amino dos aminoácidos doadores de acila, que têm as suas cadeias laterais reativas bloqueadas por grupos do tipo benzila, estáveis ao tratamento com ácido trifluoroácetico que é utilizado na remoção do grupo t- Boc67.

As escalas de síntese variaram de 0,4 a 1,0 mmols e foram utilizadas resinas de graus de substituição de 0,4; 0,6 e 0,8 mmol/g de resina de partida. A resina metilbenzidrilamino-resina (MBAR) foi a escolhida por apresentar partículas cujo tamanho e formato permitem um inchamento rápido e eficiente, são totalmente inertes aos reagentes e solventes utilizados. Outra vantagem da resina MBAR é a de que na etapa de desproteção do grupamento Boc do N-aminogrupo por TFA, praticamente não ocorre a indesejável clivagem de peptídeo da resina. Além disso, durante a clivagem final do peptídeo com HF anidro não apresenta problemas de desligamento dos peptídeos como observado com a benzidrilamino-resina (BAR), principalmente quando o primeiro resíduo de aminoácido e hidrofóbico68.

Nos acoplamentos usou-se um excesso de 2,5 vezes dos componentes carboxílico (Boc-AA) e dos agentes acopladores (TBTU/DIPEA) com o objetivo de deslocar o equilíbrio da reação no sentido da formação do produto. Nesta etapa, uma mistura de 20% DMSO em NMP foi usada como solvente, e em média, gastou-se de 45 a 70 minutos para o acoplamento de cada resíduo de aminoácido. Os acoplamentos e as desproteções em cada etapa foram monitorados pelo teste de Kaiser62. Como pode ser observado nas Tabelas VI e VII, onde estão listados os resultados obtidos nas sínteses dos peptídeos, para alguns resíduos houve a necessidade de reacoplamento (resíduos grafados em vermelho). Podemos observar que, alguns dos fragmentos apresentam regiões de maior dificuldade de síntese. Nestas regiões houve necessidade de fazer reacoplamentos o que contribuiu para o surgimento de um grande número de contaminantes, o que pode ter ocasionado uma diminuição no rendimento global da síntese.

A solubilidade de alguns fragmentos brutos foi um dos problemas encontrados na etapa de purificação. Este tema tem sido estudado particularmente para as seqüências

peptídicas protegidas69, mas muito pouco tem sido feito no sentido de solucionar tal dificuldade para os peptídeos desprotegidos. Na literatura está descrito que a melhora da solubilidade é obtida com a utilização de soluções acidificadas com TFA70, e que, para a dissolução total desta classe de peptídeos hidrofóbicos, é necessária a adição de ácidos concentrados ao sistema de solventes, tais como 90% AcOH em H2O ou 40% ácido fórmico em H2O/iPrOH. Os sistemas clássicos de solventes normalmente empregados nas purificações por HPLC, tais como TFA/ACN ou TEAP/ACN não solubilizaram adequadamente alguns dos peptídeos. Na tentativa de aumentar a solubilidade de peptídeos hidrofóbicos para a purificação no sistema de HPLC preparativo, geralmente utilizamos uma quantidade de AcOH para a solubilização dos fragmentos. Este procedimento se mostra eficiente, porém em alguns casos, uma quantidade elevada de AcOH faz com que o fragmento não fique retido na coluna C18 impossibilitando sua purificação.

O uso do HPLC de fase reversa mostrou-se satisfatório na purificação dos peptídeos brutos. A maior parte das purificações foi realizada em uma única condição experimental na presença de TFA como par iônico, exceto os fragmentos I e VI com os quais foram necessárias 2 etapas de purificação, e os fragmentos XI e XVII que foram purificados em três etapas, como consta nas Tabelas VIII e IX – pgs. 53 e 54. Os rendimentos das purificações variaram entre 2,0 e 13,0% e podem ser analisados nestas mesmas tabelas. Esse baixo rendimento estava dentro do previsto, pois o objetivo principal foi o de obter peptídeos com pureza acima de 97% e, assim sendo, não houve uma preocupação com o rendimento.

Todos os peptídeos utilizados neste trabalho foram caracterizados por HPLC, AAA e espectrometria de massas (Tabela X – pg. 55). A pureza dos peptídeos em HPLC foi sempre superior a 97%. Os cromatogramas de LC/ESI-MS mostraram perfis semelhantes e compatíveis entre si, e os resultados obtidos por espectrometria de massas e por análise de aminoácidos (Tabela XI – pg. 56) apresentaram-se coerentes com os valores teóricos esperados, confirmando assim, a identidade química dos peptídeos estudados.

5.2) Análise estrutural dos peptídeos - Dicroísmo circular (CD) 5.2.1) Estudos da variação das concentrações de SDS e TFE

Nos espectros de CD, em diferentes concentrações de SDS (1, 5, 10, 20, 40 e 50 mM) e TFE (10, 30, 50, 70 e 90%), que estão representados nas Figuras 28 a 44 observamos que os fragmentos de I a VI, VIII, IX e XI a XVI adotaram uma conformação

típica de α-hélice, uma banda positiva em ~190 nm e bandas negativas em 208 e 222 nm, tanto em SDS como em TFE (Vide Figuras 28 a 33, 35, 36 e 38 a 43). Esta tendência deveu-se provavelmente a estabilização das estruturas através das pontes de hidrogênio entre os resíduos da seqüência peptídica71,72. O fragmento VII apresenta uma banda negativa em 198 nm característico de uma conformação randômica (Vide Figura 34). Já os fragmentos X e XVII apresentaram espectros com uma banda negativa em 198 nm e um ombro bastante acentuado na região de 220 nm indicativo de uma mistura conformacional (Vide Figuras 37 e 44).

Com esses dados, podemos constatar que os fragmentos isolados, em solução aquosa, não assumem a mesma conformação observada quando estão inseridos na molécula da leptina. Esses resultados, de certa forma, eram esperados, pois, os resultados de estudos conformacionais utilizando fragmentos de proteína mostraram resultados semelhantes aos nossos73,74. Nesses trabalhos, Callihan e colaboradores investigaram a estrutura de sete fragmentos peptídicos da proteína FK506 (Tacormilus), utilizando CD e RMN; enquanto, Zhaowen e colaboradores, através de dicroísmo circular, estudaram a proteína Vpr (Proteína acessória do HIV-1) através de fragmentos peptídicos, os quais correspondiam às estruturas em α-hélice da molécula. Em ambas as pesquisas, determinaram-se que as regiões da proteína que apresentavam estruturas secundárias bem definidas mostraram-se totalmente randômicas ou apenas mantiveram, em alguns casos, apenas parte da estruturação original. Os fragmentos apresentaram uma mudança sensível em suas conformações quando não dispuseram das interações entre as cadeias proteícas. Com a utilização de diferentes porcentagens de TFE e SDS foi possível observar a estabilização das estruturas secundárias dos fragmentos estudados, os quais assumiram conformações em α-hélice e conformação randômica.

5.3) Ensaios biológicos

Samsons e colaboradores48 observaram uma redução na ingestão alimentar e no peso em ratos quando administraram intracerebroventricularmente (icv) 500 e 1000 ng diários de leptina, evidenciando que este tipo de ensaio é extremamente útil, já que confirma a importância da atuação da leptina no sistema endócrino de ratos. O mesmo comportamento também foi observado por Telles e colaboradores75 quando administraram, também icv, 5 e/ou 10 µg de leptina dissolvidos em 5 µL de CSF. Estes dois exemplos evidenciaram também o efeito da leptina e fragmentos em ratos normais, já que os efeitos em animais ob/ob foram exaustivamente estudados56,76,77.

A partir destes resultados decidimos utilizar este tipo de ensaio para testar comparativamente os nossos fragmentos peptídicos derivados da leptina. Cabe ressaltar que a idéia inicial era a de se empregar camundongos ob/ob e administrar os peptídeos subcutaneamente, entretanto, durante o tempo de desenvolvimento deste projeto, o número de animais disponíveis no CEDEME/UNIFESP foi insuficiente. Outro tipo de ensaio que estava programado, e infelizmente também não pode ser realizado, devido a problemas na aquisição das células HP-75 e também problemas com o próprio aparelho, foi o do emprego do Cytosensor para avaliar a interação dos peptídeos com o receptor da leptina presentes nestas linhagens de células, experimentos estes que foram realizados com sucesso anteriormente por Oliveira e colaboradores53. Este último experimento teria a grande vantagem de não necessitar do sacrifício de animais.

Devido a estes problemas, os ensaios in vivo foram realizados com ratos machos, da linhagem Wistar, onde foram avaliados os efeitos dos compostos na variação dos pesos corporais e no consumo alimentar através de injeções icv diárias (Vide Figuras 50 e 51, pgs. 79 e 80, respectivamente) dos fragmentos I a VII e o X (Vide Tabela V – pg. 24). As respectivas porcentagens de variação de peso corporal e do consumo alimentar entre o primeiro e o último dia de injeção estão listadas na Figura 52 (pg. 81). Os demais peptídeos (VIII, IX e XI a XVII - Tabela V – pg. 24) não foram testados até o momento.

Como pode ser observado na Figuras 50 e 52 (pgs. 79 e 81, respectivamente), ao longo dos quatro dias de testes, com o controle, CSF, houve um aumento de cerca de 5% na variação dos pesos corporais dos ratos testados. Com a leptina houve uma diminuição desta variação de cerca de 6,3%, resultado semelhante, ou seja redução de 6%, foi observado com o [D-Leu4]-hOB3, fragmento desenvolvido por Grasso e cols46,51,55e que foi usado como controle em nossos experimentos. Dentre todos os nossos novos fragmentos testados, observamos que o Ac-hLEP-110-119-NH2 (VI) mostrou-se ativo, e

também ocasionou uma diminuição do peso corporal (4,2%). Quanto ao consumo alimentar observamos: diminuições significativas de 50, 31 e 36%, com a [D-Leu4]-hOB3, Ac-hLEP-110-119-NH2 (VI) e com a leptina, respectivamente, enquanto que com o controle,

CSF, houve um aumento do consumo de cerca de 1,3%. Os resultados obtidos com os demais fragmentos não foram significativamente distintos e as porcentagens de variação de peso corporal ficaram entre 0,8 a 3,7% e os de consumo alimentar entre 1,3 e 24,5%.

Estas observações evidenciaram a concordância entre os resultados descritos na literatura49,51,53,56 com os obtidos neste projeto em termos da região da leptina, entre os resíduos 110 e 122, que deve conter o epitopo funcional da molécula (Vide Figura 11, pg. 21).

Ao compararmos os fragmentos, SCSD-LPQT-NH2 {[D-Leu4]-hOB3} e Ac-V-L-A-F- S-K-S-C-H-L-NH2 {Ac-hLEP110-119-NH2 (VI)}, desenvolvidos por Grasso e colaboradores e

por nos, respectivamente, observamos que os mesmos apresentam comportamentos conformacionais semelhantes, ou seja, de α-hélice, tanto em meios com diferentes composições de SDS como de TFE (Vide Figura 45, pg 74). Em ambos os peptídeos também, há a presença de um único resíduo de cisteína, que como observado nas Figuras 46 a 49, (pgs. 75 a 78) acarreta a formação de dímeros quando dissolvidos em CSF. Desta forma as atividades biológicas dos fragmentos podem ter sido devidas às moléculas de monômeros ou dos dímeros. Cabe lembrar que a existência das pontes de dissulfeto não havia sido observada nas etapas de purificação e caracterização, pois nestas etapas o pH do meio, em que os peptídeos estavam dissolvidos, sempre foi ácido o que desfavorece a formação das pontes.

Quando o resíduo de cisteína foi substituído por serina, vide fragmentos, Ac-F-S-K- S-C-H-L-P-W-A-NH2 {Ac-hLEP113-122-NH2 (VII)} e Ac-F-S-K-S-S-H-L-P-W-A-NH2 {Ac- [Ser117]-hLEP113-122-NH2 (X)}, os resultados não foram conclusivos, já que com ambos os

peptídeos as porcentagens de variação de peso corporal de 1,5 e 1,9%, respectivamente, foram praticamente idênticas, embora as porcentagens de consumo alimentar tenham sido significativamente distintas (24,5 e 1,6%, respectivamente). Os espectros de dicroísmo circular destes dois fragmentos em TFE, também foram divergentes uma vez que Ac-hLEP113-122-NH2 (VII) apresentou um perfil típico de α–hélice, enquanto que para o

fragmento Ac-[Ser117]-hLEP113-122-NH2 (X) foi o de uma estrutura randômica.

Os resultados obtidos com o fragmento Ac-hLEP-110-119-NH2 (VI) são muito

promissores, já que foram similares com os observados com [D-Leu4]-hOB3, que até então era o fragmento mais ativo descrito na literatura e foram melhores que os descritos para a seqüência SCSLPQT-NH2 denominada de OB3 (Vide Tabela II, pg. 15). Este ultimo, uma vez otimizado (troca da L-Leu por D-Leu) deu origem ao [D-Leu4]-hOB3, ou seja, se o mesmo racional for aplicado ao nosso fragmento VI, um melhora de sua atividade pode ser conseguida.

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