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O objetivo específico deste estudo foi investigar a influência individual dos jogadores nas redes de circulação da bola das suas equipas durante o jogo de futebol. Para o efeito, procedemos a uma análise dinâmica das ligações de passe entre os jogadores, obtendo o valor de duas medidas (betweenness e eigenvector), as quais traduzem a influência dos jogadores. Os resultados obtidos permitem-nos perceber que (1) os jogadores mais influentes foram também mais estáveis nessa mesma influência ao longo do jogo e que (2) a posição ocupada em campo pelos jogadores afeta o seu nível de influência na equipa.

A análise do coeficiente de correlação de Pearson revelou a existência de uma forte associação negativa entre os valores médios da influência individual dos jogadores e a correspondente variabilidade. Estes resultados significam que um aumento do grau de influência dos jogadores nas redes de circulação de bola foi acompanhado por uma diminuição da variabilidade dessa mesma influência ao longo do jogo. Seguindo esta linha de raciocínio, identificamos uma clara tendência para a estabilização da performance dos jogadores mais influentes em contraste com a maior variabilidade dos jogadores menos preponderantes no desenrolar do jogo.

Relativamente ao efeito da posição ocupada em campo, os resultados demonstraram um efeito significativo nos indicadores de influência individual dos jogadores. Os dados sugerem que a capacidade de intermediação (betweenness) e a qualidade das ligações de passe (eigenvector) dos jogadores na rede de circulação de bola das suas equipas foram influenciadas pela posição em campo. Neste sentido, estes resultados estão de acordo com a tendência geral identificada na literatura científica, nas quais se verificou que a performance individual tende a variar em função da posição que o jogador ocupa no campo (Sarmento et al., 2014). Deste modo, parece claro que o treinador deverá ter em atenção esta informação na preparação da sua equipa, designadamente, criando contextos de treino que promovam as adaptações específicas de cada posição. A este respeito, a literatura tem sugerido que uma abordagem sistémica do treino, na qual o todo vai para além das partes.

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A análise estatística revela que os jogadores que ocuparam a posição de Médio Centro exerceram uma influência superior aos restantes jogadores, na rede de circulação de bola, quer na capacidade de intermediação, quer na qualidade das ligações. Estes resultados vão ao encontro das investigações realizadas por Malta & Travassos (2014) e Cotta et al. (2013), nas quais os Médios Centro foram também os jogadores com os valores médios mais elevados de betweenness e eigenvector. Nesta perspetiva, a ocupação primordial do centro do campo parece ter sido utilizada pelos Médios Centro para interagirem mais com os seus companheiros de equipa, constituindo dessa maneira o principal elo de ligação no seio das equipas.

Não obstante esta comprovada supremacia dos Médios Centro, é importante notar que os seus valores médios de eigenvector, e que refletem a qualidade das interações, não se distinguiram significativamente dos valores apresentados pelos Defesas Laterais. Estes resultados vão ao encontro do estudo de Dellal et al. (2010), que identificaram exatamente a mesma percentagem de passes certos em Defesas Laterais e Médios Centro Defensivos (78%) da liga francesa. Neste sentido, os nossos resultados sugerem que os Médios Centro tiveram uma capacidade de intermediação na rede de circulação de bola da equipa com um número de colegas manifestamente superior aos Defesas Laterais. Por outro lado, os valores médios de eigenvector alcançados pelos Médios Centro e pelos Defesas Laterais apontam para a existência muitas das ligações na rede de passes das equipas entre os jogadores destas posições.

Quando comparamos os Defesas Laterais com os Defesas Centrais, identificamos apenas diferenças significativas nos valores médios da qualidade das ligações. Esta inexistência de diferenças significativas na capacidade de intermediação pode significar uma tendência para as equipas circularem a bola entre os seus defesas (quer centrais, quer laterais), aproveitando dessa maneira a ocupação de uma zona onde normalmente têm superioridade numérica para construir um jogo mais elaborado, tal como demonstrado por Vilar, Araújo, Davids e Bar-Yam (2013). Esta tendência evolutiva do jogo está retratada na literatura recente, precisamente no contexto da Premier League (Bush, Barnes, Archer, Hogg & Bradley, 2015).

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Os Defesas Laterais distinguem-se ainda significativamente dos Guarda-Redes, Médios Exteriores e Avançados em todos os indicadores de performance individual. Quer isto dizer que os Defesas Laterais mostraram uma capacidade de intermediação e qualidade de interação na rede de passe comparativamente superior aos jogadores das posições acima referidas. Desta maneira, como refere Castelo (1994), admitimos que o posicionamento dos Defesas Laterais sobre os corredores laterais do campo tenha constituído uma referência de partida para o seu envolvimento nas várias fases do processo ofensivo.

Por seu lado, os Médios Exteriores apresentam níveis de influência individual significativamente diferentes de todos os jogadores, exceto em relação aos Defesas Centrais, na qualidade das ligações. Os baixos valores dos Médios Exteriores sugerem que estes não foram particularmente ativos na intermediação na rede de passe, provavelmente, porque os comportamentos técnico-táticos destes jogadores envolvem normalmente situações de 1x1 ou de deslocamento sem bola (Castelo, 1994) que tendem a estar mais associados a finalização do processo ofensivo. Contudo, é importante notar que estas ações são importantíssimas no desfecho final do jogo, pois foi descoberto que as equipas que vencem mais duelos individuais nos corredores laterais tendem a vencer os jogos (Jacquet et al., 2000).

Os resultados alcançados pelos Guarda-Redes diferenciam-se significativamente de todos os outros pares de posições, por atingirem os mais baixos valores médios de influência individual, quer para a betweenness, quer para o

eigenvector. Estes resultados confirmam a forte natureza defensiva deste posto

específico, indo ao encontro do estudo de Duch et al. (2010), em que os Guarda-Redes foram os jogadores com valores mais baixos de precisão de passe na rede de circulação de bola das suas equipas. Apesar disso, os Guarda-redes são jogadores incontornáveis no decurso do jogo, mas com um estatuto diferenciado e explícito nas próprias leis do jogo. Este fato tem levado vários autores a excluírem os Guarda-Redes das suas análises (e.g. Di Salvo et al., 2007). Contudo, a crescente tendência no número de passes efetuados durante o jogo (Barnes, Archer, Hogg, Bush & Bradley,

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2014) deverá ter implicações numa intervenção superior do Guarda-Redes na rede de circulação da bola da equipa. Neste sentido, esta hipótese carece de confirmação futura.

Tal como sucedeu com os Guarda-redes, a influência individual dos Avançados distinguiu-se significativamente dos jogadores de todas as outras posições. Quer isto dizer que o grau de intermediação e qualidade das interações dos Avançados na rede de circulação da bola foi mais baixa do que a dos restantes jogadores, exceto os Guarda-Redes. Este resultado parece mostrar uma tendência para um papel menos interventivo dos Avançados na rede de passes das equipas, hipoteticamente por ocuparem uma zona do campo onde existe mais pressão defensiva do adversário, por estarem muitas vezes em inferioridade numérica (Vilar et al., 2013) e recebem a bola de costas para a baliza (Dellal et al., 2010). Para além disso, os Avançados têm como principal missão a finalização do processo ofensivo das suas equipas (Castelo, 1994), o que justifica os seus baixos valores de intermediação das jogadas.

Adicionalmente, analisámos os rankings alusivos à influência individual na rede de circulação de bola das equipas, independentemente da posição em campo. Encontramos nos primeiros lugares do ranking geral uma clara predominância de jogadores que habitualmente ocupam a posição de Médio Centro, quer na capacidade de intermediação, quer na qualidade de ligação com os seus companheiros de equipa. Como referimos anteriormente, esta parece também ser a tendência geral identificada em investigações anteriores (Cotta et al., 2013; Duch et al., 2010; Malta & Travassos, 2014).

Por outro lado, a associação entre os indicadores de influência individual e a quantidade de jogos realizados pelos jogadores revelou-se pouco significativa. Os resultados mostram uma baixa relação quer entre o aumento da influência individual (betweenness e eigenvector) e o número de jogos efetuados, quer entre a diminuição da variabilidade da sua influência (coeficiente de variação de betweenness e

eigenvector) e o número de jogos. Inicialmente, seria expectável uma relação mais

forte entre estas variáveis, pois era de prever que os jogadores que jogam com mais frequência registassem um desempenho mais elevado e estável. Porém, raramente isso sucedeu. Outros jogadores, apesar de jogarem pouco, causaram um forte impacto

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na equipa. Estas evidências sugerem que esta metodologia de análise poderá abrir novas perspetivas no apoio as decisões dos treinadores acerca da continuidade da utilização ou rotatividade dos jogadores na equipa. Esta informação objetiva pode ser de extrema importância, uma vez que Duch et al. (2010) identificaram uma associação entre a influência individual dos jogadores e a performance das equipas, essencialmente dos jogadores mais preponderantes nas seleções nacionais participantes no Euro 2008.

Encontramos, por fim, um baixo valor de covariação entre os valores médios da capacidade de intermediação e a qualidade das ligações. Este dado originou a análise de clusters integrando ambas as métricas, no qual distinguimos grupos de jogadores com semelhantes influência individual nas suas respetivas equipas. A tendência geral aponta no sentido de encontrarmos cada vez menos jogadores nos clusters com maior valor de influência individual na rede de passes da equipa. Mais de um terço dos jogadores (35,1%) enquadram-se num padrão de performance individual no qual foram registados baixos valores médios de intermediação e qualidade da ligação. Por outro lado, o agrupamento com os elementos com mais elevados valores de

betweenness e eigenvector foi bastante mais reduzido (2,1%). Estes resultados

sugerem que a influência individual dos jogadores nas equipas foi desproporcional e fortemente impulsionado por um pequeno número de jogadores.

Nesta perspetiva, encontramos diferenças na influência dos jogadores no desempenho da equipa, quer entre diferentes jogadores, quer para os mesmos jogadores ao longo do jogo. A posição específica ocupada em campo parece constituir um fator relevante no padrão de influência dos jogadores, favorecendo os jogadores do centro do campo. Porém, será um erro menosprezar o papel desempenhado pelos restantes jogadores. Na realidade, o futebol é uma atividade de equipa em que a divisão das tarefas é diferenciada, sendo provável que enquanto alguns jogadores mostram a sua influência na rede de passe outros companheiros de equipa estejam complementarmente ocupados em tarefas igualmente relevantes para as suas equipas (Eccles, 2010; Duarte, Araujo, Correia & Davids, 2012). A coordenação do conjunto das tarefas desenvolvidas pelos jogadores é um aspeto fundamental na performance final da equipa.

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Este trabalho pode ter eventuais implicações na evolução do conhecimento sobre o desempenho individual dos jogadores de futebol. Por um lado, fornecendo um contributo para o desenvolvimento e afirmação da análise de redes de circulação de bola no jogo de futebol. Por outro lado, proporcionando aos treinadores e administrações dos clubes um conjunto de informações objetivas que dê suporte às suas tomadas de decisão, no âmbito dos processos de scouting e recrutamento de jogadores.

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