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Este trabalho teve por objetivo verificar os padrões comportamentais e detalhar o comportamento alimentar por diferentes categorias etárias de Sapajus flavius juvenis em vida livre.

Corroborando a hipótese 1 nossos dados mostram diferenças no comportamento de forrageio, manipulação e ingestão entre as idades. O surrupiar foi maior (mas não significativamente) em juvenis 1, a locomoção e a manipulação foi maior em juvenis 2, e a ingestão e locomoção-forrageio maior em juvenis 3. Esse resultado mostra um desenvolvimento no padrão de aquisição de alimentos, com juvenis 1 obtendo mais alimentos por “surrupio” e juvenis 3 já por manipulação e busca individual.

Esses resultados concordam com o estudo de Lima (2016), no qual foi proposto que os juvenis 1 passam um grande período de tempo próximo a seus coespecíficos, observando seus comportamentos, gerando uma aprendizagem comportamental, para que assim possam gerar uma maior eficiência nas suas habilidades de forrageio. Ainda corroborando com a primeira hipótese e predição, as análises mostraram que a observação de outros indivíduos foi alta em juvenis 1 indicando que esse indivíduos passaram mais tempo, na observação de seus coespecíficos, podendo gerar uma maior aprendizagem de habilidades manipulativas. Além disso, essa observação exibe uma relação com as interações sociais e de proximidade, no qual os imaturos exibem uma frequência maior em comparação com as outras categorias etárias.

Sabe-se que os juvenis 1 são os indivíduos (além dos infantes) mais tolerados pelos mais velhos dessas espécies, podendo estar associado com aumento comportamental do scrounge/surrupio. Sendo eles considerados o centro das atenções em comparação com outros juvenis 2 e 3, (Fragaszy et al., 2004). De acordo com trabalhos já descritos, como Resende et al., (2004) e Coelho et al., (2015), indivíduos juvenis passam a escolher indivíduos mais velhos, consequentemente mais experientes, para a observação e contato mais proximal, para que dessa forma possam vir a coletar restos de alimentos (scrounge). Silva (2008), em sua pesquisa com macacos-prego imaturos em condição de liberdade, verificou que os imaturos escolhem indivíduos dominantes para essa observação, devido ao fato de apresentarem um desempenho mais frequente e de modo mais eficiente. Além do mais, esse autor afirma que essa observação é alta, por ocorrer a presença do comportamento de “surrupiar” (scrounge), promovendo uma oportunidade ideal de aprendizagens comportamentais, o qual é possível graças a tolerância que os macacos adultos ou dominantes têm em relação as esses imaturos. Assim como encontrado por Silva (2008), outros estudos apresentaram dados semelhantes,

como Santos (2009) e Winandy (2012), que observaram uma sincronia forte de atividades entre macacos imaturos, quando o macho dominante do grupo se mantinha mais perto, verificando também que jovens e imaturos permaneciam próximos desse indivíduo mais experiente.

Para este estudo comportamental das categorias etárias, mesmo que não significativo, houve um declínio constante na mudança da frequência do comportamento de Scrounge ao longo das faixas etárias de juvenis, sugerindo que há uma mudança na aquisição e processamento de itens alimentares.

O alto nível de locomoção em juvenis 2 pode estar relacionado com a mudança de forma de aquisição de alimentos e ao tempo que é dedicado a procura de alimentos neste fragmento. Tal fato é corroborado pela alta manipulação de comida que esses indivíduos tiveram, que foi principalmente de frutos, sendo em um período que os recursos estavam distribuídos de forma dispersa, de modo que seria necessário deslocar-se pelo fragmento a procura de outro recurso ou fruteira. Sampaio (2004) em seu estudo com Cebus apella em vida livre, também observou em suas análises que os macacos pregos apresentaram grande parte do orçamento de atividades em deslocamento (cerca de 39%). E em outros trabalhos semelhantes foi observado um grande período de locomoção, como Cazzadore (2007) com cerca de 43% em seu estudo com Cebus apella no Parque estadual Matas do Segredo, Campo Grande - MS. Sobretudo, Sampaio (2004) ainda fala que o deslocamento, o forrageamento e a alimentação, formam o tripé dos principais comportamentos que constituem as atividades dos macacos-prego que vivem na natureza.

Os resultados para o orçamento de atividades, com relação ao comportamento de forrageio, foi compatível com os resultados apresentados por Lima (2016). Assim como essa autora, que estudou um grupo de Sapajus sp. no Parque Ecológico do Tietê (PET), nosso estudo com Sapajus flavius mostrou que os juvenis 3 foram os indivíduos que o obtiveram o maior tempo médio desse comportamento quando comparado com os juvenis 2, o que pode estar relacionada com a capacidade de forrageio mais independente e maior necessidade alimentar de juvenis 3 devido ao maior tamanho corpóreo.

A avaliação do comportamento de ingestão dos itens alimentares pela dieta geral, mostra que houve uma variação ao longo do desenvolvimento de juvenis no fragmento. Indicou que os juvenis 1 apresentaram uma proporção de ingestão baixa (em relação aos juvenis 3), o qual pode estar relacionado com a evitação de alimentos difíceis de processar. As análises indicaram ainda que o consumo dos alimentos foi menor em juvenis 2, seguido de

juvenil 1 e maior em juvenis 3. Ou seja, enquanto juvenis 2 locomovem mais, juvenis 3 forrageiam e ingerem mais.

A brincadeira é uma característica marcante entre os primatas juvenis, iniciando com as brincadeiras sociais a partir de 12 semanas de vida (Fragaszy et al., 1989). De foma geral, o índice de brincadeira observado foi baixo, indicando que estes imaturos necessitam se deslocar bastante a procura de alimentos, o que restringe o tempo para brincadeiras. Apesar disso, os resultados mostram que os juvenis 1 se engajaram mais no comportamento de brincadeira social, envolvendo pelo menos dois sujeitos, sem haver agressões durante essa interação. Apesar de não haver um consenso a respeito da função desse comportamento em muitos estudos (Walters, 1987; Burghart, 1998), é sugerido que a brincadeira é importante no desenvolvimento social e de vínculos afiliativos nesses indivíduos (Poirier & Smith, 1974; Walters, 1987; Fairbanks, 1993; Resende et al., 2004), e no treinamento motor, para que possam refinar as suas habilidades motoras ou manipulativas (Byers & Walker, 1995). Durante a juventude, alguns autores supõem que o desempenho motor pode proporcionar um desenvolvimento muscular, ósseo, do tecido conjuntivo, além do sistema nervoso central e periférico (Brownlee, 1954; Smith, 1983; Martin & Caro, 1985; Caro, 1988; Beckoff & Byers, 1998; Biben, 1998). Contudo, alguns estudos, citados anteriormente, apenas supuseram que o comportamento de brincar serviria como uma forma de exercícios, como Fagen (1981) propôs que tal comportamento seria uma condição de “treino físico”, enquanto Smith (1983) fala que serviria como uma “Prática”, para o desenvolvimento de habilidades físicas.

Nossa segunda hipótese previu que os padrões alimentares e de ingestão dos imaturos são determinados por fatores físicos como a dureza do alimento. De acordo com os resultados obtidos neste estudo, os juvenis consomem itens de dureza mais baixa e media, e evitam o de dureza alta. No entanto, não houve diferença significativa entre as idades. Contudo, os indivíduos passam a exibir comportamentos manipulativos mais diversificados. Tal aspecto concorda com os argumentos de Fragaszy e colaboradores (2004) de que os juvenis mais novos apresentam limitações físicas, quando comparado aos mais experientes, podendo evitar até certos alimentos de difícil acesso e manipulação em relação aos adultos. Outros trabalhos também mostram que existe diferença na dieta entre imaturos (Santos, 2009; Winandy 2012; Cutrim, 2013), de modo que a aprendizagem e a força possam ser fatores determinantes na técnica alimentar desses imaturos. De forma semelhante, Gunst e colaboradores (2008) em seu trabalho com forrageamento de larvas em talos de bambu, afirmaram que quando a aprendizagem se torna um fator importante ou essencial, o período para desenvolver o comportamento de forrageio de forma madura e eficiente deve-se ao fato do tempo de

crescimento e desenvolvimento físico. Ou seja, algumas habilidades de manipulação e forrageamento extrativo requerem uma evolução de técnicas manipulativas, e apenas irá atingir uma capacidade mais eficiente e madura depois do completo desenvolvimento corporal.

As mudanças de competência manipulativa de bater e morder na dieta de imaturos de Sapajus flavius tanto relacionadas principalmente com a “amorosa”, como também por outros itens alimentares, são bem diversificadas em juvenis 2 e 3, mas não em juvenis 1 (não houve a manipulação e processamento da amorosa). Isso sugere que ocorrem mudanças entre essas categorias etárias para obtenção e consumo, sendo perceptível apenas por observações e não de valores significativos, que se trata de um fruto de difícil manipulação e consumo necessitando assim de comportamentos mais intensos, como morder e bater. Tais comportamentos foram observadas em grande frequência por juvenis 2, podendo-se supor, que é necessário o indivíduo ter força física para consumir o fruto e ter ganho energético, fato que não é observável nas características físicas dessa faixa etária. Sabendo que eles não obtêm alimento via “surrupio” tais juvenis 2 poderiam estar passando por uma fase para testar as suas habilidades manipulativas por tentativa e erro. Desse modo, durante a fase de desenvolvimento dos primatas, os autores Jason & Van Schaik (1993), relacionaram que as mudanças do tamanho dos macacos, se devem a modificações elevadas de experiência, e pelo processo de tentativa, erro e prática.

De forma geral a maior frequência do comportamento de morder ocorreu nos juvenis intermediários (juvenil 2). Esses resultados se alinham a já conhecida característica exploratória manipulativa desses indivíduos imaturos, que sugere que, juvenis sofrem limitações físicas e sociais, evitando certos alimentos de difícil acesso e manipulação e, portanto, explorando (manipulando ou mordendo ou cheirando, por exemplo) uma variedade de alimentos não consumidos por indivíduos mais velhos, em uma maior frequência, para superar sua menor eficiência em termos de taxa de sucesso por tempo de forrageio (Fragaszy et al., 2004).

Um dos itens alimentares de mais difícil acesso e consumo neste estudo é a fruta/coco dendê (Elaeis guineensis). Por meio das análises verificou-se que os juvenis 1 esfregaram mais esse tipo de item alimentar do que os outros indivíduos imaturos, mostrando que eles apresentam limitações físicas para bater (Fragaszy et al., 2004). Também se pode supor que eles apresentam limitações dentárias (para morder), uma vez que de acordo com Galliari (1985), a germinação de dentes decíduos e permanentes em macacos-prego ocorrem com 2 anos e 6 meses de idade (idade referente à juvenis 2).

Outro item alimentar obtido durante as observações e análises foi a embiriba (Eschweilera ovata), fruto que apresentou manipulação elevada pelos juvenis 1 nos comportamentos de esparramar e cheirar/lamber. Se tratando de um fruto de classificação observacional de dureza média (tabela 2), tornando fácil o processamento e obtenção desse alimento.

Winandy (2012), por exemplo, em seu estudo com uma população diversificada de macacos-prego no Parque Ecológico do Tietê verificou que após a infância, os juvenis forrageiam por alimentos de mais fácil obtenção, e os alimentos mais difíceis de obter ou processar aumentaram ao longo do desenvolvimento da juventude. Em um trabalho de Gunst e colaboradores (2008) foi observado que os jovens dedicam uma grande proporção de seu tempo no forrageamento de alimentos fáceis de obter e serem consumidos, sendo as larvas de talos de bambu um tipo de alimento de fácil manipulação, muito embora que durante a extração das mesmas eram de rara obtenção. Além disso, em outro trabalho, Gunst e colaboradores (2010a) comentam que muito embora os comportamentos usados na extração de larvas, como quebrar e cheirar, façam parte do repertório comportamental desde o indivíduo infante, a escolha de determinados locais adequados para direcionar os comportamentos depende da idade, e vai aumentando de acordo com o seu crescimento de categoria etária e experiência. Observando que a competência máxima foi atingida no período adulto, aos 6 anos de idade, apontando a importância da prática da manipulação, mesmo com as capacidades físicas e corpóreas completamente desenvolvidas.

Finalmente, Santos (2009) mostra em seu trabalho com Sapajus nigritus, que a dieta e os extratos de forrageio variam conforme a idade, como também pelo sexo dos indivíduos. De acordo com Janson & Van Schaik (1993), jovens imaturos se baseiam na necessidade de busca e obtenção de alimentos fáceis, por serem menos experientes e menos habilidosos que indivíduos mais velhos para localizar o alimento, ou seja, o tamanho e força corporal reduz o acesso a determinados itens alimentares. O fato de não termos encontrado diferença significativa entre as idades requer mais atenção, é possível que nosso sistema de classificação de dureza não esteja perfeito, ou que em ambientes fragmentados, devido à redução de riqueza das espécies vegetais, essa diferença de idade não seja apresentada.

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