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CAPÍTULO 2: UMA TRAJETÓRIA DO PROGRAMA DE MICROCRÉDITO

2.3 Discussões Breves acerca do Crediamigo

Diversos autores têm estudado os impactos do Crediamigo como política de geração de renda e emprego. Reportamo-nos a eles para, em seguida, focalizarmos o objetivo deste estudo.

Inicialmente, alguns autores apontam para o alcance do Crediamigo, como política de combate à pobreza. Souza (2008, 114) cita que “o Programa Crediamigo demonstrou ser uma política de crédito transformadora que procura trazer soluções a partir da potencialidade do cliente e o desenvolvimento dos negócios por meio do acesso ao crédito”.

Numa abordagem semelhante, Neri (2008, p. 21) apresenta:

Dadas as características de aval solidário, sustentabilidade, retorno privado, retorno social (leia-se emancipação da pobreza), foco e retorno das mulheres e o fato de ocupar mais de 60% do mercado brasileiro de microcrédito, o Crediamigo pode ser considerado o autêntico Grameen tupiniquim.

Monzoni (2008, p. 66-67)também destaca:

Não é possível abordar as microfinanças do Brasil sem falar do BNB. Mesmo não tendo sido um pioneiro no mercado, o Programa Crediamigo do BNB representa hoje mais de 60% do mercado nacional de microcrédito produtivo orientado em clientes atendidos e 46,5% em carteira ativa.

Farranha (2005) faz uma comparação entre o programa de microcrédito do município de Vitória (ES) e o Programa Crediamigo, ao relatar experiência de cliente daquele programa. Ressalta o aval solidário, como diferencial e também “aspectos relativos à construção de laços solidários, presentes em outros formatos de

programas de microcréditos – (o Crediamigo, por exemplo).” (FARRANHA, 2005, p.

225, grifo nosso).

Leandro (2009, p. 112-113) faz referência ao Programa Crediamigo Comunidade:

Enquanto não se viabiliza o emprego assalariado e o desenvolvimento das comunidades, aponta-se a possível adoção da experiência do Crediamigo Comunidade, como uma ação complementar aos programas de transferência de renda atualmente em evidência no Brasil, como o Bolsa Família, por exemplo, constituindo-se os bancos comunitários como uma porta de entrada ao sistema produtivo, para os beneficiários dessa política do governo federal.

Outros autores mostram-se mais cautelosos em relação aos impactos do Crediamigo.

Bandeira (2008), embora considerando que um período de dois anos é relativamente curto para uma efetiva mudança, afirma que “mesmo diferenciando-se com algumas características inovadoras e mais próximas de um paradigma emancipatório, o Crediamigo Comunidade faz parte de um todo que ainda não chegou aos mais pobres dos pobres”. (BANDEIRA, 2008, p. 94).

Gussi (2010), reportando-se às evidências empíricas sobre o Crediamigo, destaca que as experiências de microcrédito têm demonstrado alguns paradoxos que apontam para os seus limites e possibilidades em relação aos objetivos a que se

propõem, pois essas experiências têm se apresentado como alternativas de geração de emprego e renda para grupos sociais em situação de exclusão. Contudo, a efetividade dos programas de microcrédito deve ser contraposta à mediação das políticas de desenvolvimento que os circunscrevem.

No mesmo sentido dos paradoxos apontados por Gussi (2010), outros autores também alertam para a necessidade de uma visão mais sistêmica sobre a funcionalidade da política de microcrédito e seus efeitos. Lopes (2007, p. 120) faz referência às especificidades de grupos minoritários e que demandam crédito diferenciado, por isso afirma:

Essa forma de concessão de crédito à população das camadas populares (desprovidas de garantias exigidas pelo sistema de crédito tradicional) só poderá funcionar com coerência quando for associada às demais políticas de emprego.

Ainda,para Santos e Nitsch (2001, p. 182):

O microcrédito não é um instrumento adequado para suprir deficiências de política social e tampouco para substituir uma política econômica que esteja voltada para o emprego e a geração de renda [...] ele pode ser um instrumento, entre outros, de fomento ao desenvolvimento econômico e social.

Em sentido diverso, como uma forma de inclusão para o mercado, Parente (2003) alerta que “em nenhum momento se deve perder de vista a forte conotação social ou de política pública no caráter empresarial da atividade de microcrédito.” Ela comenta sobre sua experiência no campo das microfinanças e da gestão organizacional e mostra que:

Minha experiência no campo das microfinanças mostra que as instituições de microcrédito constituem um bom exemplo de organizações que aprendem, buscam novos espaços de mercado, inovam em tecnologias de produto, processo e gestão, visando atender de forma eficiente ao seu público-alvo, sob a égide da ética e dos princípios do desenvolvimento humano sustentável. (PARENTE, 2003, p. 11).

Parente (2001) enfatiza, ainda, que os programas de microcrédito devem atingir os mais pobres, sobretudo “os que estão em localidades onde a base econômica é frágil” e ressalta a importância do papel do Estado, enquanto “animador de processos que envolvam atores do mercado e da sociedade.” (PARENTE, 2001, p. 19).

Evidenciando alguns paradoxos que revelam limites quanto ao alcance do microcrédito, voltemo-nos a Gussi (2010). Ao analisar o microcrédito, o autor se pergunta se os programas de microcrédito não seriam um pressuposto para a construção de um novo paradigma de desenvolvimento orientado para uma sociedade inclusiva, considerando que esses programas se implementam nos contornos das sociedades capitalistas contemporâneas, estruturalmente excludentes?

Visando responder à pergunta investigativa de Gussi (2010), e contribuir com o debate, a perspectiva do presente trabalho é a de avaliar os impactos do Crediamigo nas condições de vida dos beneficiários do Programa, verificando sua relação com os processos de inclusão social e de cidadania.

Para tanto, realizamos a pesquisa sobre o Crediamigo do BNB, partindo das seguintes questões: (I) Houve mudança nas condições de vida dos clientes que ingressaram no Programa? (II) E se houve, em que medida essas mudanças têm relação direta com o Crediamigo?. A construção da metodologia dessa pesquisa, apresentamos no capítulo seguinte.