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Disrupções sobre o meio físico em decorrência da implantação da soja

CAPÍTULO III O AVANÇO DO CAPITAL EM CAMPOS LINDOS E SUAS

3.2 Disrupções sobre o meio físico em decorrência da implantação da soja

A magnitude da intensa intervenção no meio natural para a implantação da monocultura da soja em Campos Lindos foi mensurada para esta tese com a utilização de técnicas de sensoreamento remoto e de processamento de imagens de satélite.

Apartir de mapeamentos realizados pela Seplan para subsidiar o Zoneamento Ecológico Econômico do estado do Tocantins. Para este trabalho de tese foi feito um recorte espacial, correspondente à área territorial do município de Campos Lindos, nas imagens de satélite, para os anos de 1990, 2000, 2005 e 2007, pois esse é o último ano para o qual a Seplan dispõe dessas imagens.

O propósito do trabalho de análise foi mensurar e comparar, ao longo do tempo, a extensão e as classes das formações florestais da cobertura vegetal e as mudanças no uso da terra, antes e depois da implantação das plantações de soja. Foram feitos 4 (quatro) recortes temporais, correspondendo o primeiro ao ano de 1990, sete anos antes da implantação das lavouras de soja, e três recortes temporais nos anos 2000, 2005 e 2007, que cobrem a primeira década após a implantação da soja. A análise não pode ser realizada para anos posteriores a 2007 porque não há disponibilidade das imagens de satélite para este período. Porém, considerando que a intervenção antrópica para a implantação da soja foi mais intensa no período de 1997 até o ano de 2005, quando o desmatamento atingiu seu auge, depois do ano 2005 o processo de desmatamento

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continuou, porém em menor intensidade, pois os grandes plantios já estavam consolidados. Isto significa que no período estudado se conseguiu captar a parcela mais importante do processo indiscriminado de desmatamento para abertura de áreas para o plantio da gramínea.

Para a visualização gráfica dos resultados, na primeira parte são apresentados quatro mapas que correspondem às imagens de satélite já processadas e recortadas espacialmente para coincidir com os limites político-administrativos do município de Campos Lindos. Os mapas estão apresentados na sequência: 1990, 2000, 2005 e 2007. Depois da sequência dos quatro mapas é apresentada uma tabela com as convenções de cores utilizadas nos mapas para representar as diversas formações florestais. Grosso modo, a cor verde corresponde às formações vegetais mais densas, que no caso de Campos Lindos coincidem com as matas ciliares, ou matas de galeria, que acompanham os cursos d’água; a cor rosa que cobre a maior parte do mapa corresponde às formações florestais da cobertura vegetal das feições típicas do Cerrado, as cores da gama do amarelo, no mapa de 1990 mais concentradas na porção Oeste do município, correspondem às plantações com lavouras permanentes e temporárias e a cor café corresponde às áreas com uso agropecuário.

Para construir uma ideia da intensidade das transformações acontecidas na cobertura vegetal e na utilização das terras, ao longo dos anos 1990, 2000, 2005 e 2007, o leitor deve centrar sua atenção na sequência dos quatro mapas, ou imagens de satélite já trabalhadas. Atenção especial deve ser dada à observação da metade a Leste do município no qual o desmatamento foi mais intenso e as mudanças no uso da terra também foram mais drásticas, pois ali nessa região se dá a maior concentração de lavouras de soja.

A primeira constatação visual é a diminuição continua, nos quatro mapas, da cor rosa que representa as formações florestais do cerrado, e o aumento da cor amarela a qual representa as áreas plantadas com soja. Essa diminuição continua da cor rosa está indicando o desmatamento e a substituição de áreas cobertas de vegetação nativa por lavouras de soja.

Centrando a atenção nos detalhes da distribuição da cor verde se percebe que essa cor também diminui se fazendo mais estreita e desaparecendo nas pontas mais finas. Essa alteração esta indicando a derrubada de vegetação natural ao longo dos cursos d’água, o qual configura um grave crime ambiental, pois as matas de galeria ou

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matas ciliares são áreas de preservação permanente e a lei não permite sua derrubada. A desaparição da cor verde nas pontas que, correspondem às nascentes de rios e ribeirões, está indicando que nesses lugares até as nascentes d’água foram aterradas e transformadas em áreas para plantio.

Continuando com a atenção na metade a Oeste, de relevo mais acidentado e com a predominância de solos de menor aptidão agrícola, se percebe um aumento continuo de pequenas áreas na cor marrão, o qual está indicando também a conversão de terras antes cobertas de vegetação nativa em áreas para atividades agrícola e pecuária, em pequenos e médios estabelecimentos em geral de agricultura familiar.

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Mapa 3.2 Campos Lindos, cobertura e uso da terra em 2000

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Quadro 3.1- Convenções usadas nos mapas de cobertura e uso da terra

A mensuração das variações dos diversos tipos de formações florestais, na sequência dos quatro anos considerados, e usando uma escala de medição em quilômetros quadrados (1 km2 é um quadrado com 1.000 metros de lado, o um quadrado com 100 hectares de área), está apresentada de forma resumida no Quadro 4.2.

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Quadro 3.2 - Campos Lindos: Cobertura e uso da terra - 1990, 2000, 2005, 2007

AGRUPAMENTO Classes de Cobertura e Uso - 1:100.000 Área (km²) 1990 % 2000 % 2005 % 2007 % Floresta Estacional Semidecidual Aluvial 80,97 2,50 78,29 2,42 77,67 2,40 78,42 2,42 Sub total - Floresta Estacional 80,97 2,50 78,29 2,42 77,67 2,40 78,42 2,42 Formações Savânicas Formações Florestais de Cerrado Mata de Galeria/Mata Ciliar 590,26 18,22 572,93 17,68 549,67 16,96 539,25 16,64 Cerradão 31,35 0,97 28,02 0,86 26,97 0,83 25,90 0,80 Sub total - Formações Florestais de Cerrado 621,61 19,18 600,94 18,55 576,64 17,80 565,15 17,44 Cerrado Sentido Restrito Cerrado Sentido Restrito 1.716,8 52,99 1.376,3 42,48 1.185,4 36,59 1.157,7 35,73 Vereda 1,96 0,06 1,96 0,06 1,96 0,06 1,96 0,06 Sub total - Cerrado Sentido Restrito 1.718,8 53,05 1.378,3 42,54 1.187,4 36,65 1.159,6 35,79 Formações Campestres Campo 525,98 16,23 650,74 20,08 569,88 17,59 530,87 16,38 Campo Rupestre 97,86 3,02 97,86 3,02 97,75 3,02 97,38 3,01 Sub total - Formações Campestres 623,84 19,25 748,61 23,10 667,63 20,60 628,25 19,39 ÁREAS ANTRÓPICAS Uso da Terra Áreas Antrópicas não Agrícolas Área Urbanizada - - 0,83 0,03 2,46 0,08 2,46 0,08 Capoeira 10,65 0,33 10,56 0,33 10,34 0,32 9,94 0,31 Sub total - Áreas Antrópicas não Agrícolas 10,65 0,33 11,39 0,35 12,80 0,39 12,40 0,38 Cultura Temporária 21,80 0,67 93,77 2,89 491,86 15,18 495,44 15,29 Agropecuária 162,47 5,01 328,80 10,15 226,16 6,98 300,83 9,28 Sub total - Áreas Antrópicas Agrícolas 184,27 5,69 422,57 13,04 718,02 22,16 796,27 24,58 TOTAL 3.240,16 100,00 3.240,16 100,00 3.240,16 100,00 3.240,16 100,00 Notas:

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Do conjunto de resultados quantificados se destacam os mais relevantes:

1. Da floresta estacional semidecidual aluvial, encontrada originalmente às margens do rio Manuel Alves Grande, limite interestadual entre os estados do Tocantins e o Maranhão, entre 1990 e 2000 foram derrubados 2,55 km2, equivalentes a 255 há.

2. Da mata ciliar, ou mata de galeria, a qual constitui a proteção natural contra o assoreamento das águas superficiais, foram derrubados 51,01 km2 ou 5.101 ha entre os anos de 1990 e 2007, o qual constitui um gravíssimo problema ambiental; diversos córregos e nascentes d’água desapareceram por assoreamento, esse tipo de vegetação é considerado legalmente de preservação permanente.

3. Do Cerradão e do Cerrado, no sentido restrito, a perda foi significativa: entre 1990 e 2007: foram derrubados 564,55 Km2, equivalentes a 56.455 há, ou na linguagem popular o equivalente a 56.455 campos de futebol.

4. Entre 1990 e 2007 da área total antes coberta pelas formações florestais derrubadas, foram incorporadas 61.811 hectares à produção de soja. Vale anotar que, em 1990, Campos Lindos tinha uma área antropizada com atividades agrícola e pecuária, equivalente a 18.847 hectares. Este dado, desde outro ângulo reafirma o que já tinha sido constatado: antes da emergência da soja a região já tinha uma atividade agrícola e pecuária importante, rebatendo o argumento de improdutividade usado pelos agentes que planejaram a grande expropriação das terras consideradas entre as mais férteis do Cerrado brasileiro.

Além dos problemas ambientais de desmatamento ilegal, inclusive de áreas de preservação permanente, do assoreamento de rios e mananciais, constatadas nas imagens acima, outros problemas foram relatados e constatados73. Destacam-se alguns deles: contaminação de rios e ribeirões, pelo lançamento de agrotóxicos e o descarte das embalagens dos mesmos nas proximidades de rios e ribeirões e até mesmo nas próprias águas.

Os problemas decorrentes do uso intensivo de agrotóxicos nas lavouras já avançaram além das plantações de soja e tem atingido as populações indígenas na

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reserva indígena dos Krahô, no município vizinho de Goiatins74. Posseiros que ainda resistem o embate dos sojeiros nas áreas próximas aos cultivos e aqueles cujas posses foram convertidas em reserva ambiental convivem com a proximidade dos agrotóxicos. Diversos relatos apontam a morte de crianças pela contaminação no ar ‘pelo veneno jogado nas plantações75’. A combinação de, desmatamento e agrotóxicos, eliminou grande parte da biodiversidade antes existente na região hoje convertida num extenso deserto verde.

Até aqui o trabalho de pesquisa permitiu comprovar que um “projeto”76 de 105.690,50 hectares para a produção da monocultura, planejado e executado com a participação direta da alta cúpula da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária– CNA, na pessoa de sua presidente, foi implantado, afrontando a legislação ambiental do país: a proteção dos governos do estado do Tocantins fez possível que até hoje (2013), depois de quase quinze anos de produção, nenhum dos sojeiros tenha cumprido sequer as obrigações mínimas para obter a licença de instalação para a atividade de produção de soja. Um projeto dessa magnitude, no qual foi comprovada uma larga sequência de gravíssimos crimes ambientais, sempre contou com a atitude dilatória, ou até a omissão do órgão ambiental do Estado do Tocantins77.

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