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2.2 DIMENSÃO PRAXIOLÓGICA

2.2.4 Distinção social

Este conceito, exposto por Bourdieu (2007), traduz as correlações da cultura erudita, fomentada por competências oriundas de famílias nobres, com a posse de títulos acadêmicos. A origem social de cada sujeito é determinante na legitimação do seu capital cultural e os bens culturais assumem um viés econômico:

A lógica do funcionamento dos campos de produção de bens culturais e as estratégias de distinção que se encontram na origem de sua dinâmica fazem com que os produtos de seu funcionamento [...] estão predispostos a funcionar diferencialmente, como instrumentos de distinção, em primeiro lugar, entre as frações e, em seguida, entre as classes (BOURDIEU, 2007, p. 218).

Segundo Bourdieu (2007), a escola produz as demandas culturais de um determinado grupo social, ao estabelecer as práticas e atividades. Nesse sentido, as preferências culturais individuais são correlacionadas, em um primeiro momento, ao nível de formação e, depois, na origem social familiar. Então, surge “como objeto o gosto, ou seja, uma prerrogativa do indivíduo [...] para mostrar que as preferências ou julgamentos [...] decorrem da posição do indivíduo no espaço social” (LOYOLA, 2002, p. 73).

A noção de gosto, exposta por Bourdieu (2007), retoma uma classificação, em que cada indivíduo faz distinção entre o bonito e o feio, a partir do seu capital cultural. Assim, o consumo cultural revela-se como uma transgressão do estético. Ou seja, a legitimação das escolhas passa a ser, a priori, incomensurável, uma percepção extremamente subjetiva. Essa concepção também retoma a luta de classes:

As estratégias de distinção dependem da posição do indivíduo no grupo, mas também da posição do próprio grupo na estrutura social: assim, por exemplo, a pequena burguesia ascendente se define por sua boa vontade cultural, mas a investe nas formas menores das práticas legítimas [...] A pequena burguesia em declínio (pequenos comerciantes e trabalhadores independentes) rejeita os componentes mais característicos do gosto operário, distinguindo-se por um gosto formado em torno de valores do trabalho, da ordem, do rigor, da estética do cuidado, que se distingue da estética do sóbrio da burguesia e, sobretudo, da estética fantasista das classes populares (LOYOLA, 2002, p. 74-75).

Dessa forma, ao expor como as características culturais de um determinado grupo social podem ser fomentadas pelos bens consumidos, de acordo com as categorias de cada indivíduo, Bourdieu (2007) revela uma aproximação entre a prática cultural e o capital escolar. Em suma, o autor traz indícios para refletir que o consumo cultural está atrelado a uma vivência anterior, e esta, por sua vez, se torna uma forma de distinção entre as diversas classes da sociedade.

O autor ainda contempla a estética como senso de distinção – isto é, o espaço social distingue o que é belo e feio, pois, ao estudar a disposição estética da pequena burguesia francesa, Bourdieu aponta o seguinte:

De fato, as escolhas estéticas explícitas constituem-se, muitas vezes, por oposição às escolhas dos grupos mais próximos no espaço social, com quem a concorrência é mais direta e imediata e, sem dúvida, de modo mais preciso, em relação àquelas, entre tais escolhas, em que se torna mais evidente a intenção, percebida como pretensão, de marcar a distinção em relação aos grupos inferiores (BOURDIEU, 2007, p. 60).

A estética torna-se um aspecto significativo no poder distintivo dos consumos culturais, pois o gosto une e separa as predisposições de uma determinada classe. Ela se torna o símbolo e reflete uma posição privilegiada na sociedade, cujo capital cultural é determinante para a legitimação dessa distinção. Assim, há um destaque dos aspectos da sociologia de Bourdieu que foram delimitados para esta pesquisa, conforme a figura a seguir:

Figura 1 – Aspectos da Sociologia de Bourdieu

Entende-se, a partir da figura 1, que a distinção se caracteriza por uma consequência do estudo do termo capital cultural. Segundo Bourdieu (2007), as práticas no campo social são referendadas pela noção de habitus e campo, em que há um sentido sincrônico em ambos os termos, ou seja, um necessita do outro para sua constituição. Por fim, há a constituição da diferenciação perante um determinado grupo social, o que se conceitua, de acordo com o autor, como distinção. Ancoram-se todos esses conceitos com o conhecimento praxiológico, pois a dialética dos indivíduos, em uma determinada sociedade, motiva as práticas daquele determinado contexto.

O recorte do arcabouço vai subsidiar a análise empírica futura, conectando as práticas (habitus) dentro dos cenários de atuação do profissional da área (campo). Toda a bagagem cultural será alicerçada com a experiência e as competências adquiridas em sua formação (capital cultural), em prol de uma posição que os favoreça perante os demais (distinção), e assim, aprimora-se o principio dialético que estimula a crítica e o julgamento social (conhecimento praxiológico). Forma-se, então, a síntese dos conceitos eleitos, exposta no quadro abaixo:

Quadro 3 – Conceitos da Sociologia de Bourdieu

Conceito Aspectos do Termo

Conhecimento Praxiológico

Entende-se que é o conhecimento dialético, em que o indivíduo estrutura não somente o contexto ao seu redor, mas os aspectos que o formam, e, assim, constrói um novo movimento na sua reprodução. Há uma concepção influenciada pelo teor crítico de cada sujeito, com um viés de questionamento ao conhecimento objetivista e fenomenológico.

Habitus Compreende-se como um conjunto de dispositivos, cognitivos e sociais, que estimulam o indivíduo a formular suas práticas no cenário social em que está inserido. Trata-se de uma possível influência do que está ao redor de cada sujeito, mas que pode estruturar a sua ação.

Campo Firma-se a concepção de que o campo é um espaço de interação dos sujeitos, que propicia divergências a partir de diferentes habitus estabelecidos por cada indivíduo. Há disputas simbólicas a partir das relações estabelecidas e isso forma as autoridades de cada campo.

Capital Cultural Entende-se que é o acúmulo de toda a bagagem cultural, de valores, costumes e crenças que possam pressupor uma capacidade especial ao sujeito. Adquirido por toda a sua existência, ele influencia no habitus de cada indivíduo e também se caracteriza pela constante evolução, desde que se pese a influência da trajetória anterior, que estimula o aprimoramento.

Distinção Compreende-se pelo modo de estruturação da sociedade, em que o indivíduo assume sua distinção por diferentes estratégias de colocação em determinado grupo social. Dessa forma, os sujeitos interagem, em um campo social específico, a fim de se legitimarem e efetivarem sua distinção.

O quadro acima reflete, então, uma perspectiva sociológica que subsidia a compreensão da pesquisa no campo empírico. Os conceitos da Sociologia de Bourdieu pressupõem um entendimento estruturado da sociedade, mas o autor transcende o pensamento estruturalista e é considerado, por alguns de seus seguidores, como pós-estruturalista. Os conceitos apresentados são fruto de uma produção acadêmica com viés crítico do contexto social, o que permite tratar esse recorte referencial como um esteio para as estratégias metodológicas. Além disso, permitem que emerjam novas reflexões sobre as possibilidades do campo da educação, dentro do campo acadêmico e profissional de Relações Públicas.

A partir dos fragmentos teóricos da dimensão praxiológica apresentados pela Sociologia de Bourdieu, são incorporadas, na matriz teórica desta pesquisa, como contexto social, as concepções de habitus, campo, capital cultural e distinção social. O conceito de habitus serve para a análise das práxis de Relações Públicas e em uma relação direta com o aspecto do campo, que vem a ser o espaço de interação social do profissional. O conceito de capital cultural é atribuído, na matriz, para compor toda a construção simbólica e bagagem cultural da atividade para o sujeito egresso dos cursos de graduação. A noção da distinção social é relevante para refletir sobre como os indivíduos que participam do campo da atividade de Relações Públicas atuam para se distinguirem e legitimarem perante os demais membros da sociedade.

As questões integram o contexto teórico para embasar a análise da sociedade. A práxis de Relações Públicas ocorre em determinado cenário e, por isso, incorpora-se o conceito de campo. A partir das tensões e disputas do campo, há o habitus, que pode ser entendido, nesta apropriação, como a prática da área. A noção de capital cultural entrelaça-se com os demais conceitos, pois fundamenta e dá subsídios para essa interação. O foco dos indivíduos está representado, nesse diagrama, pelo termo da distinção social, que pode se configurar como o reconhecimento dos hábitos no circuito. Trata-se de uma representação dos conceitos discutidos e que são incorporados a outras percepções, na análise.

3 EDUCAÇÃO HUMANISTA: CONVERGÊNCIAS COM A COMUNICAÇÃO

O presente capítulo reflete sobre as possibilidades da educação, na sociedade, para uma futura contextualização com a atividade de Relações Públicas. Parte-se da premissa de que as convergências entre os campos da Comunicação e da Educação são intersecções pertinentes para o referencial teórico desta pesquisa. Ao evoluir da perspectiva sociológica, com o olhar ampliado, apresenta-se uma delimitação do escopo, entendendo a educação como campo de atuação e de estudo acadêmico, na esfera social.

Ao discutir essas reflexões, Martín-Barbero (2014, p. 10) pontua que os campos científicos da comunicação e da educação possuem muitas similaridades e que “a educação já não é pensável a partir de um modelo escolar que se encontra ultrapassado tanto espacial como temporalmente”. Desta forma, uma reflexão da educação e sua práxis pode ser considerada como fruto de um processo de interação social, e não necessariamente de uma formação do sujeito no modelo escolar pré-estabelecido e concebido na sociedade. A discussão da educação, as suas influências e possibilidades, no campo social, podem reconhecer – ou identificar – as suas práticas em contextos externos aos ambientes escolares.

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