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Para a ditadura, com seu modelo agressivo e repressivo, as diversidades regionais constituem as bases de nosso desenvolvimento, desigual e combinado Ou

No documento O TEMPO QUE NOS RESTA (páginas 67-69)

seja, o desenvolvimento de nosso capitalismo colonial está assentado na articulação

de fluxos de capital e força de trabalho de nossas desigualdades regionais.

Trabalhadores rurais de diversas regiões do Brasil, sem condições pela falta de terra, pela falta de emprego, mudam-se para regiões de terras virgens. Vão procurar uma nova terra, uma nova residência. Levam a família, muita coragem e, sobretudo, muita esperança.

A caminhada é longa e sofrida. Há informações de terra boa e barata, mas não se tem certeza. Pode ser até má intenção daqueles que querem ter

                                                                                                                         

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IANNI, Octavio. Estado e Capitalismo, p. 171.

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mão-de-obra abundante e barata. Tem que se ir procurando, fazendo paradas, até longas, trabalhando como assalariado ou parceiro, para, no final, se estabelecer numa área que dizem ser do Governo do Estado ou do governo Federal.

Nessa caminhada a família pode diminuir; perde-se um filho por falta de assistência e por desnutrição.

Na nova terra, o posseiro se anima, abre picadas na floresta virgem, desmata, ergue sua casa, constrói estradas, faz roça, estabelece benfeitorias.

O futuro parece sorrir para ele, apesar de tudo. A expectativa parece compensar os sacrifícios da família, da caminhada e do próprio local.

Em muitos lugares eles construíram povoados e fundaram cidades. Sempre se preocuparam em estabelecer sua família e levar o progresso para a região. O que ganharam com a produção (apesar dos intermediários) gastaram e aplicaram ali mesmo. Assim, os posseiros deram sua contribuição para o desenvolvimento da região. Seguros de sua contribuição para a Nação visam a permanecer na terra e produzir, e não se preocupam com a legalização das terras.

Isso tem acontecido de há muitos anos e continua a ocorrer nas áreas de ocupação.

Mas acontece que ultimamente tem havido abertura de grandes estradas na Amazônia; as terras têm-se valorizado bastante e, ainda mais, o Governo concede incentivos fiscais para os grandes capitais se instalarem na região. Então, esses grandes investidores ocupam, requerem ou compram milhares de hectares de terras do Estado ou da União, a preço baixo, e lá encontram os posseiros.

O drama se inicia. Os posseiros ali residem e produzem há muito tempo, mas não têm título da terra. Começam os despejos ou ameaças de despejos. As grandes firmas ou empresas agropecuárias querem o terreno livre de ocupantes.

Chegam a usar violência: contratam capangas, queimam casa, destroem construções com trator, quebram cercas, botam fogo na roça dos posseiros, ameaçam ou chegam mesmo a prender os posseiros que procuram defender a sua posse.

Algumas firmas entram com ação na Justiça contra os posseiros e têm, a seu dispor, advogados, transportes rápidos (aviões), recursos financeiros e influência. Enquanto que os posseiros são intimados para saírem das terras por uma pequena promessa de indenização, que nunca se realiza, até que os posseiros deixam a terra, amedrontados.

Cria-se, então, uma tensa situação social: os posseiros sabem que sem a terra perderão a fonte de renda familiar e se tornarão desempregados. Se procurarem outras áreas sem o título legal, correm o mesmo risco de despejo.

De um lado a justa expectativa dos posseiros de possuírem a área desbravada ou de receberem a indenização devida pelas benfeitorias e, de outro lado, o avanço dos agropecuários, com atitudes, frequentemente, ilegais, geram conflitos que exigem a efetivação da Justiça Social.

Áreas de Tensão – A Amazônia legal, com os investimentos oficiais de infra-

têm atraído grupos econômicos, nacionais e estrangeiros, tendo estes como motivação também a explosão de um rico patrimônio em madeiras e perspectiva segura de especulação de grandes áreas de terra, ocupadas simplesmente ou adquiridas a um preço quase simbólico.

As esferas de decisão estadual, mais sensíveis ao envolvimento político e com pouco planejamento na ocupação das terras do estado, não têm sido bastante eficientes para evitar conflitos entre posseiros que cultivam a terra de longa data e os grandes beneficiários dos incentivos fiscais.

O Governo Federal, com sábia visão social para evitar a indiscriminada de vastos latifúndios privados em terras públicas e, para que se realizasse uma colonização de cunho social, através do Decreto-lei 1.164/71, declarou indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais terras devolutas situadas na faixa de cem quilômetros de largura em cada lado do eixo das rodovias na Amazônia Legal.

Entretanto, ao arrepio da lei e das diretrizes oficiais, grupos econômicos têm-se apossado, sem licença de ocupação, de grandes áreas de terra, tanto na área do Decreto-Lei 1.164/71, quanto na área da faixa de fronteira. Tais atitudes chocam-se contra o artigo 171 da Constituição Federal e da Lei 2.597/55 que respectivamente exigem que a alienação ou concessão de terras públicas com área superior a três mil hectares seja feita com a aprovação do Senado Federal e que na faixa de fronteiras não exceda a de dois mil hectares. A sensibilidade social do Governo Federal, diante dos conflitos e despejos dos posseiros, declarou que estes não poderão ser desalojados das terras que cultivam, em áreas pioneiras ou de incentivos fiscais, sem a prévia consulta do Ministério da Agricultura, conforme Decreto de número 70.430/72.

Entretanto, essas determinações não têm sido observadas pelos grandes empresários, e eventualmente, por autoridades do Poder Judiciário.

As áreas de maior tensão são principalmente ao longo das rodovias, construídas ou em construção, nos vales úmidos, em áreas férteis ou de florestas ricas em madeira de lei.

As principais áreas são:

Complexo Xingu-Araguaia, situado no Nordeste de mato Grosso e Sul do Pará, onde grandes projetos pecuários se desenvolvem, sob influência das BRs 242, 158 e 080. Abrange as regiões de São Felix do Araguaia, Suiá- Missú e Conceição do Araguaia.114

Vejamos, no quadro seguinte, os conflitos de terra ocorridos no ano de 1976.

No documento O TEMPO QUE NOS RESTA (páginas 67-69)

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