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Do concubinato à União estável: a garantia da igualdade de gênero

2 A SITUAÇÃO JURÍDICA DA MULHER – DO CONCUBINATO AO

2.3 Do concubinato à União estável: a garantia da igualdade de gênero

Como já estudado anteriormente, as uniões, surgidas sem o selo do matrimônio, eram identificadas com o nome de concubinato até a Constituição Federal de 1988. O conceito generalizado do concubinato, também denominado

união livre, tem sido invariavelmente, no entender de Washington de Barros Monteiro

(2007) o de vida prolongada em comum, sob o mesmo teto, com a aparência de casamento.

No entendimento de Maria Alice Zaratin Lotufo (2002), as uniões chamadas de concubinato, era uma expressão que poderia se referir tanto àquela união à margem do casamento, quanto à posse do estado de casado, isto é, no interesse numa comunhão de fato, instituição que recebeu inúmeras restrições pelo legislador do Código Civil de 1916, no qual não reconheciam as uniões extramatrimoniais como família, somente o casamento.

Para Edgar Moura Bittencourt (1969, p.23):

A expressão concubinato, que em linguagem corrente é sinônima de união livre, à margem da lei e da moral, tem no campo jurídico mais amplo conteúdo. Para os efeitos legais, não apenas são concubinos os que mantêm vida marital sem serem casados, senão também os que contraíram matrimônio não reconhecido legalmente, por mais re4speitável que seja perante a consciência, como sucede com o casamento religioso; os que celebram validamente no estrangeiro um matrimônio não reconhecido pelas leis pátrias; e ainda os que vivem sob o casamento posteriormente declarado nulo e que não reunia as condições para ser putativo. Os problemas do concubinato incidem, por conseguinte, em inúmeras situações, o que contribui para revesti- los da máxima importância.

Assim, a união livre difere do casamento pela liberdade de cumprir os deveres a este inerente. Por isso, a doutrina clássica esclarece que o estado de concubinato pode ser rompido a qualquer instante, qualquer que seja o tempo de sua duração, sem que ao concubinato abandonado assista direito a indenização pelo simples fato da ruptura.

Este termo concubinato foi substituído, na Constituição de 1988, pela expressão união estável, ocorrendo à equiparação das entidades familiares, sendo todas merecedoras de proteção. A Constituição acabou por reconhecer juridicidade ao afeto ao elevar as uniões constituídas pelo vínculo de afetividade à categoria de entidade familiar.

As mulheres foram conquistando condições de igualdade, depois de muito tempo, a sociedade tradicionalmente ser dominada pelos homens. Assim, mesmo depois dos inegáveis avanços da Constituição, as mulheres ainda se defrontam com o preconceito, sendo seu maior adversário os costumes.

O artigo 226 parágrafo 3º da CF/88 reconheceu, para efeito de proteção do Estado em caráter de entidade familiar a união estável. Tal artigo provocou mudanças estruturais no Direito de família, a saber:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

[...] § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

Então, pela primeira vez o legislador pátrio reconheceu a união estável enquanto entidade familiar, para efeito de proteção do Estado, surgindo inúmeros projetos de lei que tentaram estabelecer normas para essa nova entidade familiar.

Eduardo de Oliveira Leite, refere que a palavra “família” empregada no artigo 226, caput da CF, deve ser entendida num sentido amplo, abrangendo, não somente

a família fundada no casamento, mas ainda as novas formas de conjugabilidade como a união de fato.

Hoje a expressão “concubinato” é utilizada para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, que infringem o dever de fidelidade, também conhecido como adulterino. Configuram-se segundo o artigo 1.727 do Código Civil, quando ocorrem “relações não eventuais entre homem e a mulher, impedidos de casar”.

Da expressão utilizada, deve-se entender que nem todos os impedidos de casar são concubinos, por isso, o § 1º do artigo 1.723 do Código Civil, trata como união estável, a convivência pública e duradoura entre pessoas separadas de fato e quem mantêm o vínculo de casamento, não sendo separadas de direito.

A conceituação da união estável consta do artigo 1.723 do Código Civil de 2002, in verbis: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição familiar.”

A preocupação do legislador ao tutelar o instituto da união estável foi proteger a família. Apesar de não haver a efetivação dos atos solenes do casamento, ambos buscam constituir família, primeiramente superando a simples convivência para relação sexual e passando a prestar assistência mútua e contínua. Conforme se observa no dizer de Orlando Soares (2000, p. 41).

Nota-se, pois que no que tange a união estável entre homem e mulher, como entidade familiar, a convivência deve ser duradoura e contínua, possuindo como finalidade a constituição de família, ao contrário do que ocorre nas relações amorosas, passageira, fugaz, em caráter de aventura.

Antonio Carlos Mathias Coltro (1995, p. 165) corrobora ainda que a união estável é:

A família à margem do casamento, merecedora de proteção ampla, de sorte a também cercá-las de garantias legais, desde que os

presentes elementos indicativos da estabilidade nas relações entre os conviventes, protegendo-se, com isso, não só o próprio respeito que relacionamentos de tal ordem possam merecer, quanto às pessoas daqueles que o integram, alcançados, aí obviamente os filhos.

Demorou para o Direito Civil Brasileiro se adaptar à realidade social, em que existia, enquanto relações familiares, o casamento e as uniões não reconhecidas, gerando problemas relacionados à filiação, aos alimentos, aos bens adquiridos durante a convivência.

Por fim, podemos ver que com esta evolução do concubinato para a união estável, o ordenamento jurídico passou a reconhecer a sociedade de fato, levando a Constituição a dar nova dimensão à concepção de família, havendo uma relação com um vínculo afetivo entre os companheiros.

CONCLUSÃO

Antigamente, no Direito Romano, a estrutura familiar fundava-se tipicamente no modelo patriarcal, tendo como figura principal da família romana o pater famílias

ou poder familiar, no qual o chefe de família possuía todas as responsabilidades e

direitos daquele grupo, nem sempre dirigida a laços afetivos, como vimos, pela característica do Direito de Família, mas sim a laços de autoridade, sendo uma unidade econômica, religiosa e política, organizada sob o principio da autoridade, onde o ascendente vivo mais velho era ao mesmo tempo, chefe político, que exercia sobre os filhos direito de vida e morte.

O direito de família teve uma evolução bem expansiva, haja vista que, antigamente a legitimidade da família esteve condicionada ao casamento, sendo ignoradas as demais uniões.

O Código Civil de 1916, não reconhece até hoje as uniões extramatrimoniais como família, somente como casamento.

No Direito Civil Brasileiro, o primeiro reconhecimento da união estável pelo Direito Civil Brasileiro foi em 1964, com a súmula nº 380 do STF (Supremo Tribunal Federal), sendo que comprovada à existência de sociedade de fato entre os concubinos seria cabível a sua dissolução judicial.

Diante da realidade do contexto brasileiro atual, o reconhecimento da união estável deu-se na Constituição Federal de 1988, no seu artigo 226, § 4º, onde reconhece que podem existir família, e entidade familiar, sendo que a família nascida fora do casamento passa a denominar-se como união estável. A intenção do

legislador foi proteger a vivência de homem e mulher, solteiros, separados (mesmo que de fato e não juridicamente), divorciados, viúvos, como companheiros, como aparência de casamento.

Pode-se afirmar que não existe mais determinação legal de que a união estável somente se configura após 05 anos de convivência ou quando o casal tiver filhos, como dizia a Lei 9.791/94. Pois a Lei 9.278/96 entendeu ser contrario os requisitos para caracterização da união estável, regulamentando o § 3º do artigo 226 da Constituição Federal, reconhecendo como entidade família, a união estável com os seguintes requisitos da convivência duradoura, pública e contínua, de uma mulher. Sendo que agora não precisa mais a comprovação do estado civil para os companheiros estarem abrangidos com a lei, não havendo mais prazo mínimo de convivência e não há mais exigência de prole.

Assim como o advento da Lei nº 9.278/96, o Código Civil de 2002 não estabeleceu um período mínimo de convivência para a configuração da união estável, não sendo o número de anos que deverá caracterizar uma relação como união estável, mas sim a presença dos requisitos previstos no seu artigo 1.723, compreendendo que as pessoas que mantiveram seu estado civil de casadas, mas estando separadas de fatos, poderão estar constituindo união estável.

A partir da realização desta pesquisa, percebe-se que antigamente, a ideia era de que a função principal da mulher na sociedade era ser mãe, esposa e educadora. A mulher, desde o seu nascimento, esteve submetida a um rigoroso treinamento para o desenvolvimento da missão relacionada ao trabalho doméstico, seja a responsabilidade com os filhos e/ou com o lar e o qual permaneceu por um longo tempo.

As conquistas femininas foram lentas, especialmente no que tange a igualdade em relação ao marido ou companheiro. Hoje, a mulher é equiparada ao homem, não só nos direitos, mas também nos deveres, ou seja, o cuidado e educação dos filhos é dever do casal.

Os direitos foram sendo conquistados e reconhecidos paulatinamente, saindo de uma relação de concubinato para o reconhecimento constitucional da união estável, garantindo o princípio da igualdade entre homem e mulher.

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