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2.4. Procedimentos de coleta e de análise de dados

2.4.2. Do instrumento ao objeto intermediário

A elaboração dos instrumentos utilizados no GIP representou o elemento diferencial, considerando a necessidade de haver registro escrito dos conteúdos que transitavam verbalmente nos encontros e representar o aquecimento e ponto de partida das experiências compartilhadas no grupo. Tivemos também como objetivo, ao utilizar os instrumentos como registro, auxiliar na sistematização posterior de informações verbalizadas e compartilhadas no grupo.

Verificamos que tanto o GIP como os instrumentos utilizados exerciam uma função importante neste contexto e assumiram um lugar privilegiado passível de diversas análises pela riqueza dos registros possíveis. Avaliamos que o GIP e os instrumentos compuseram atribuição de intermediar tanto a relação dos participantes com eles mesmos, com as drogas, como a relação entre eles e a Justiça pelo cumprimento judicial.

Definimos, assim, que o instrumento representou a função de um objeto intermediário entre os participantes e o grupo. E o GIP representou assim a função de um espaço intermediário entre os participantes e a Justiça. Recorremos conceito de objeto transicional de Winnicott (2001) para nomear a função diferencial nesta intervenção tanto dos instrumentos utilizados como do GIP.

Como último ponto dos procedimentos de análise da fonte de dados, consideramos necessário destacar o objeto intermediário como importante vetor e

131 instrumento analítico tanto da revelação dos níveis interacionais entre os participantes, eles mesmos e o grupo, como dos níveis relacionais com os contextos sociofamiliar e institucional da Justiça. Além disso, utilizamos como elemento diferencial da possibilidade de analisar o processo grupal intermediado pelos objetos no grupo e pelo espaço reflexivo do grupo. No Capítulo 3 retrataremos mais detalhadamente estas funções do espaço e objeto intermediário ao apresentarmos o GIP como proposta metodológica construída e campo desta pesquisa, além de ser o primeiro eixo de resultado e do momento do processo de intervenção à pesquisa.

Recorremos às expressões dos participantes advindas da sistematização de todos os dados enquanto conteúdos empíricos, bem como às duas explicações dos registros, com o propósito de compreender, exemplificar e ilustrar a composição e função do GIP como espaço reflexivo no envolvimento dos sujeitos com a Justiça por uso de drogas. Apresentaremos assim, o segundo eixo de resultados que compreendeu a interpretação dos momentos do processo de intervenção à pesquisa deste estudo.

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3 – Metodologia do Grupo de Intervenção Psicossocial – O GIP como proposta construída

Apresentamos, neste capítulo e nos próximos (capítulos 4, 5 e 6), os resultados deste estudo, a partir do caráter construtivo, teórico-metodológico e interpretativo, do olhar hermenêutico e clínico psicanalítico, com o propósito de contribuir com as intervenções psicossociais no contexto da Justiça. A partir do trabalho de campo, relatamos os resultados pelo processo de intervenção à pesquisa, que abrangeu toda trajetória teórica e o recorte empírico, ou melhor, da proposta metodológica do GIP à análise do processo grupal que (re)significou o envolvimento com a Justiça por uso de drogas.

Consideramos que o processo de intervenção à pesquisa se inicia quando a Justiça instaura o processo legal de sujeitos apreendidos por uso e ou porte de drogas, realiza audiência coletiva e os encaminha ao SERUQ, que realiza a triagem e os encaminha a um dos serviços da rede de atenção ao usuário de drogas para cumprirem a medida alternativa37 imposta. Esse processo de intervenção à pesquisa operou-se em quatro momentos distintos, quais sejam, 1) participação no Grupo de Intervenção Psicossocial, que acolhe os envolvidos com a Justiça por uso de drogas, de acordo com a proposta metodológica, a ser apresentada neste capítulo; 2) possibilidade de os participantes refletirem acerca da relação que estabelecem com as drogas e com eles mesmos, diante dos níveis interacionais estabelecidos nos contextos sociofamiliar e institucional da Justiça; 3) composição funcional mental do GIP, ao longo dos encontros, como dispositivo reflexivo e clínico que promoveu processos reflexivos, com vistas ao desenvolvimento de uma postura reflexiva, para além da obrigação judicial, no intervalo entre a obrigação e a demanda; 4) o GIP como metabolizador de experiências capaz de deslocar o uso da função do uso de drogas no circuito pulsional, (re)significar a intervenção psicossocial no contexto da Justiça e revelar o encontro inexorável entre o sujeito e ele mesmo, para além da relação com as drogas e com a Justiça.

Ressaltamos que os referidos momentos 2, 3 e 4 do processo de intervenção à pesquisa serão retratados nos próximos capítulos, respectivamente.

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“Comparecimento a grupo educativo”, inciso III do artigo 28 da Lei nº 11.343/2006 – circunscrição do campo de pesquisa deste estudo e Lei nº 9.099/95, Lei dos Juizados Especiais Criminais, que oferta medida alternativa como cumprimento de pena para crimes de menor potencial ofensivo.

133 Neste capítulo, portanto, relataremos a proposta metodológica do GIP construída como primeiro eixo de resultado deste estudo e primeiro momento do processo de intervenção à pesquisa, que consiste na sistematização da experiência de intervenção grupal revelada pela pesquisa durante a condução dos grupos.

Através da experiência de realização dos grupos utilizando essa sistematização, verificamos que se tratava da análise não apenas dos conteúdos emergentes do campo de pesquisa, mas também do próprio contexto interventivo que promoveu o alcance da proposta do GIP. Destacamos um elemento diferencial acionado e utilizado nos encontros que integrou os registros escritos às expressões verbais nos grupos de envolvidos com as drogas, no contexto psicossocial da Justiça.

Avaliamos que esse elemento diferencial – considerado inicialmente como instrumento para reunir informações e servir como aquecimento dos encontros – representou para os participantes do GIP, no decorrer dos grupos, a condição essencial para realizarem contato com eles mesmos antes de compartilharem suas experiências para o grupo. Funcionou como um objeto intermediário entre os participantes e o grupo, responsável tanto por aplacar expectativas e angústias iniciais, como para facilitar a expressão e o compartilhamento de experiências no grupo. E o GIP, portanto, representou o espaço intermediário entre os participantes e a Justiça, enquanto contexto de intervenção e campo originário da presente pesquisa.

Com o objetivo de facilitar tanto a transmissão da proposta construída como a compreensão do leitor, elaboramos um roteiro de retratação e aplicabilidade do GIP, que abrangeu três etapas: 1) a caracterização do setting grupal, 2) o relato da função da pesquisadora na intervenção e na pesquisa pelo espaço intermediário do GIP ao objeto intermediário e, por fim, 3) o relato do que propomos para cada um dos cinco encontros do GIP e como foram utilizados os objetos intermediários nos dois grandes momentos, comum a todos os grupos, com registro escrito e registro verbal compartilhados.