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Parte II – A reportagem multimédia e o jornalista multitasking nos espaços online dos meios de

2. Enquadramento teórico

2.3. Do jornalista online ao jornalista multimédia, o profissional “do futuro”

Quandt (2008) analisou a rotina dos jornalistas online de cinco meios de comunicação alemães e concluiu que estes profissionais trabalham em média 8 horas e 50 minutos e que a sua “frequência de atividades é muito alta” (p.86) – uma atividade demora, em média, 2 minutos e 40 segundos –, o que significa que o conteúdo é publicado de forma muito rápida para um trabalho que, segundo o investigador, deveria ser “microscópico”.

Importa aqui distinguir já jornalismo online e jornalismo multimédia. Para Deuze (2004), a capacidade de usar vários formatos de media pode ser vista como um potencial, mas não é um elemento fundamental na apresentação do jornalismo online. Por multimédia entende-se não só a convergência de diferentes formatos (texto, imagem, motion grafics, por exemplo), mas também a agregação dos media que a internet exigiu ao jornalismo criar, como o website e o contacto de e-mail. Porém, a definição mais usual deste conceito no campo do jornalismo, diz Salaverría (2014), traduz-se na utilização conjunta e simultânea de diversos elementos, normalmente texto, som e imagem estática ou animada, para transmitir informação, sendo que “para nos encontramos perante uma mensagem multimédia basta que coincidam dois desses elementos, independentemente de quais forem” (p.29). Portanto, nesta aceção, qualquer mensagem que não seja monomédia (se exprime apenas por um tipo de linguagem) é multimédia (combinação de dois ou mais tipos de linguagem).

Segundo Wyde (2015) e Van der Haak et al. (2012), os jornalistas podem, através da tecnologia e do espaço online, produzir artigos com maior e melhor qualidade e conceber um tipo de jornalismo

55 mais independente. Mas este sucesso do webjornalismo depende, segundo Canavilhas (2014a), do aproveitamento das características desse espaço e "da criação de rotinas de consumo que facilitem a tarefa dos leitores num meio onde a ansiada liberdade de leitura se pode facilmente transformar num labirinto” (pp.21-22). O autor faz referência a três potencialidades do jornalismo online que oferecem ao consumidor de notícias uma experiência muito diferente da praticada noutro tipo de jornalismo, como na imprensa escrita. São elas a multimedialidade, a interatividade e a hipertextualidade (Canavilhas, 2014b).

Finberg e Klinger (2014) estudaram esta nova necessidade dos jornalistas em adquirirem “competências especiais”, que são do interesse não só dos editores, mas também da democracia. Contudo, os investigadores lembram ainda que esta é, além do mais, uma questão económica que define a “viabilidade das organizações mediáticas” (p.2). Ainda assim, a investigação feita por Finberg e Klinger (2014) sobre a importância de determinadas técnicas multimédia para o jornalismo obteve resultados fora da perceção inicialmente estipulada pelos investigadores. Mais pormenorizadamente, o estudo obteve cerca de 2900 respostas de um universo composto por jornalistas profissionais, jornalistas independentes, estudantes e professores da área e concluiu que a comunidade académica reconhece maior importância à aquisição e execução de técnicas multimédia no jornalismo, ao contrário do que defende a maioria dos jornalistas profissionais. O estudo aponta para a existência de uma diferença bastante significativa quando medida a importância de gravar e editar vídeo: 46% dos jornalistas responderam que está aptidão é “importante” ou “muito importante” e 76% dos professores responderam o mesmo. A mesma situação se verifica para a captação e edição fotográfica (53% para os jornalistas e 79% para os professores) e para a captação e edição de áudio (38% para os jornalistas e 72% para os professores).

Ainda sobre as “competências especiais” necessárias aos jornalistas, Pelham (2009) descreve a introdução da vertente multimédia no jornalismo “em terreno” como uma forma de aproveitar ao máximo o potencial de cada profissional. Mas lembra também a grande barreira da produção multimédia no jornalismo: o tempo. O jornalista cita o seu colega David Shukman, editor de Ciência da BBC, para acrescentar que multimédia significa multi-skilling (Shukman, n.d., citado por Pelham, 2009). Ou seja, Shukman chama a atenção para o facto de, atualmente, os jornalistas terem que se adaptar às mais variadas vertentes do jornalismo, como ser capaz de gravar uma peça para televisão, escrever para a web ou voltar a escrever o mesmo texto, mas adaptado para

56 rádio. O jornalista deixa, portanto, de ser um profissional destacado apenas para um determinado tipo de media para se tornar um “jornalista multifunções” e multimédia. O editor de Ciência da BBC acredita ainda que, com os cortes financeiros aos meios de comunicação, esta extensão “desafiante” do jornalista, que se torna jornalista para a web, de rádio, de televisão, produtor de vídeo, fotógrafo e programador, é cada vez mais normal e exigida.

A mesma ideia de extensão “desafiante” foi analisada por Gradim (2003), que já nos primeiros anos do século XXI definia o “jornalista do futuro”. Este seria

“uma espécie de MacGyver. Homem dos mil e um recursos, trabalha sozinho, equipado com uma câmara de vídeo digital, telefone satélite, laptop com software de edição de vídeo e html, e ligação sem fios à internet. One man show, será capaz de produzir e editar notícias para vários media: a televisão, um jornal impresso, o site da empresa na internet, e ainda áudio para a estação de rádio do grupo.” (p.117)

Esta visão de um jornalista multimédia “em produção”, que “apaixona alguns, mas aterroriza muitos mais”, também defendida por Shukman (n.d., citado por Pelham, 2009), revolucionaria a produção e transmissão noticiosa (Gradim, 2003). Segundo a autora, esta é a visão dos entusiastas da convergência, à qual se junta Stevens (2002). A professora e jornalista norte- americana defende que o backpack journalist, aquele que usa uma câmara digital ao invés do bloco de notas, que usa, para além do texto, clips de vídeo, fotografia e informação gráfica dentro de uma webpage para contar uma estória, seria o modelo do profissional de informação do futuro. Kawamoto (2003), contrariamente, acredita que o jornalismo não caminha para uma era em que o jornalista tem necessariamente que fazer ou saber fazer de tudo. O autor defende que haverá sempre lugar para os especialistas que executam uma tarefa particularmente bem.

Mas, no campo de batalha pelo emprego, Bull (2010) e Pacheco (2014) chegam mesmo a afirmar que quanto mais técnicas multimédia um jornalista conseguir efetuar, maior será a probabilidade de ser escolhido.

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