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DOMICÍLIOS PARTICULARES PERMANENTES OCUPADOS

01.09.1940 01.07.1950 01.09.1960 01.09.1970 01.09.1980 01.09.1991 01.08.2000 Brasil 7 897 769 10 046 199 13 497 823 17 628 699 25 210 639 34 734 715 45 021 478 Domicílios urbanos 2 509 639 3 730 368 6 350 126 10 276 340 17 770 981 27 157 268 37 454 740 Percentual 31,8 37,1 47,0 58,3 70,5 78,2 83,2 Domicílios rurais 5 388 130 6 315 831 7 147 697 7 352 359 7 439 658 7 577 447 7 566 738 Percentual 68,2 62,9 53 41,7 29,5 21,8 16,7

Esse crescimento populacional, mostrado na tabela acima, é marcado pela grande concentração nas áreas metropolitanas. Os números são eloqüentes. Um estudo elaborado pela FJP em 2005 mostra que, no ano 2000, dos 5.507 municípios brasileiros, 73% tinham menos de 20 mil habitantes, enquanto as nove maiores regiões metropolitanas (RM) do país abrigavam 30% do total da população21. O intenso processo de urbanização, entretanto, não teve paralelo na geração de empregos suficientes, nem na oferta de moradias, infra-estrutura, serviços e equipamentos urbanos, resultando na ocupação desordenada do solo e na expansão contínua das periferias.

Para uma melhor compreensão do problema da carência habitacional, faz-se importante uma análise do próprio conceito de déficit, sobre o qual não há consenso22. O termo “déficit habitacional” pode sugerir a idéia de um parâmetro único, o que não corresponde à realidade das necessidades habitacionais, que diferem em função dos diversos segmentos sociais envolvidos, bem como variam e transformam-se com a dinâmica da sociedade. Cumpre registrar, a propósito, que a falta da casa própria não deve ser confundida com a definição de déficit habitacional. Mesmo considerando a importância da propriedade da moradia para o cidadão, como fator de extrema segurança econômica, a redução do conceito de déficit habitacional a “ser ou não proprietário” reveste-se de um caráter de precariedade, porque a propriedade do imóvel não garante a qualidade do mesmo, tampouco a provisão da infra-estrutura adequada. Ressaltando-se desta forma a prevalência do direito ao domicílio digno sobre o direito a propriedade23.

O Centro das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (UNHABITAT), adota a seguinte definição para moradia adequada: (MORAIS, 2002, p.112)

21 Moura et ali (2003).

22 Pesquisadores da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE e do Núcleo de Estudos da População da

Unicamp, entre outros, entendem que o método da Fundação João Pinheiro superestima os números do déficit habitacional.

23 Silva (informação verbal) durante a seção pública de defesa desta dissertação, observou a importância de se

esclarecer que a política habitacional pode também ser baseada na provisão de moradia adequada sem necessariamente vincular a esta o direito à propriedade.

Moradia adequada é mais do que um teto sobre a cabeça. Também significa privacidade adequada; espaço adequado; acessibilidade física; segurança adequada; segurança da posse; estabilidade estrutural e durabilidade; iluminação, aquecimento e ventilação adequados; infra-estrutura básica adequada, como equipamentos de água, esgoto e coleta de lixo; qualidade ambiental e fatores relacionados à saúde apropriados; bem como localização adequada e acessibilidade ao trabalho e outros equipamentos básicos: tudo isso deve estar disponível a custos acessíveis. A adequação deve ser determinada conjuntamente com a população em questão, tendo em mente a perspectiva para o desenvolvimento gradual (AGENDA HABITAT, PARAGRAFO 60).

Prado e Pelin (1993) propõem como definição de déficit o que seria um padrão mínimo de habitação e, para tal descrição, utilizam a noção inversa de uma moradia adequada, ou seja, o que uma moradia não deve ser. Sendo assim uma moradia adequada não deve ser desprovida de redes de água e esgoto; não deve ser uma moradia improvisada, tais como meras salas, prédios em construção, viadutos e pontes; não deve ser uma moradia precária como casas de taipa não revestida ou de madeira aproveitada, casas cobertas de palha ou sapé, meros quartos ou cômodos; finalmente uma moradia adequada não deve ser ocupada por mais de uma família.

Essa gama de possibilidades usadas para definir o déficit se deve em parte à ausência de parâmetros claros e até certo ponto constantes, fazendo com que os dados a respeito do déficit habitacional brasileiro durante muito tempo não fossem utilizados pelo poder público como forma de aferir os resultados das políticas habitacionais implementadas. Pode-se considerar também que muitas vezes os números a serem apresentados não correspondiam à expectativa gerada, o que acabou incorrendo na falta de interesse em desenvolver uma metodologia única, ao menos na sua base, a fim de criar um histórico com os números do déficit habitacional.

As fortes transformações ocorridas na composição demográfica da sociedade brasileira no século passado, assim como nas condições ambientais e sociais das cidades, e do impacto

destas na infra-estrutura dos serviços públicos e nas condições de moradia, passaram a ser registradas no Anuário Estatístico do Brasil (AEB), publicado a partir de 1938, no entanto, as condições habitacionais só tiveram um tratamento sistemático a partir de 1963.

Para Lima (2003), a importância da habitação como tema da agenda política não se refletiu na seleção de informações estatísticas reunidas nos anuários. As políticas habitacionais tiveram uma divulgação bastante limitada, considerando ser este um dos temas de maior visibilidade política no Brasil do século XX. Em decorrência, os AEB pouco informaram sobre indicadores de políticas habitacionais, em nítido contraste com a divulgação de dados estatísticos referentes a outras políticas sociais como saúde, previdência e trabalho, aparecendo apenas o registro de informações sobre programas implementados pelo Banco Nacional de Habitação durante o período de 1965 a 1978, e conclui:

Este fato não deixa de guardar correspondência com os resultados insignificantes das políticas habitacionais adotadas ao longo do Século XX, no provimento de moradias populares, se comparado ao peso da construção. Se for considerado o período de 1964 a 1977, constata-se que dos 26 milhões de moradias construídas nas áreas urbanas, apenas 23% resultaram de recursos do Sistema Financeiro de Habitação. (LIMA, 2003, apud CUTOLO, 1999).

Segundo o IBGE (2003), em 1963 passou a ser publicado regularmente o dado censitário sobre a habitação, informando a respeito dos domicílios ocupados nas datas dos recenseamentos24, segundo as regiões físico-geográficas e as Unidades da Federação. Em 1966 é publicado o mesmo quadro acrescido de um outro informando a situação dos domicílios (urbano e suburbano / rural); a condição de ocupação (próprio / alugado e outros); e as instalações existentes (água encanada; iluminação elétrica; e instalação sanitária).

24 1940, 1950 e 1960

No AEB de 1968 aparecem pela primeira vez dados sobre política habitacional. Em três quadros são apresentadas as seguintes informações: evolução dos resultados previstos nos convênios e contratos; número de unidades financiadas, valor dos empréstimos e investimentos por programas implementados pelo BNH (1965-1967).

No AEB de 1969 é publicado quadro em que consta a evolução dos programas habitacionais; de abastecimento de água, e de materiais de construção por Unidade da Federação, com a evolução dos empréstimos e investimentos.

Em 1971 são publicados dados relativos às condições habitacionais, com base nos Censos de 1960 e 1970. Referem-se à condição de ocupação (próprios, alugados e outra condição); abastecimento d’água; instalação sanitária e tipo de fogão. São apresentados por situação de domicílio urbano e rural, em números absolutos e relativos.

Tal inconstância nos parâmetros a serem levantados gerou uma profusão de estimativas a respeito dos números relacionados à necessidade de construção de novas moradias, não sendo possível identificar até 1995 números oficiais a respeito do déficit habitacional ou a inadequação de moradias.

A partir de 1995 a Fundação João Pinheiro (FJP) elaborou um estudo para a Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano (SEDU), atual Ministério das Cidades, por meio de contrato com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e dentro do âmbito do Projeto Habitar-Brasil do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que tentou caracterizar a situação habitacional no Brasil. Essa metodologia, que serve de base para o cálculo do déficit habitacional e da inadequação de moradias, foi desenvolvida com o intuito de colocar ao alcance da sociedade parâmetros e informações que retratem mais fielmente a realidade da questão habitacional no Brasil. Nesse documento procurou-se também uniformizar as informações veiculadas, pois eram muitos e díspares os números que

circulavam a respeito do problema. A metodologia teve ampla divulgação e aceitação por estudiosos da questão25.

Segundo a FJP (2005) o documento Déficit Habitacional no Brasil, de 1995, traçava o panorama dos problemas habitacionais, em 1991, nas unidades da Federação e nas regiões metropolitanas contempladas na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 1990, do IBGE. Os pressupostos metodológicos que subsidiaram a construção da metodologia continuaram válidos por ocasião de sua revisão, efetuada no estudo Déficit Habitacional no Brasil 2000, divulgado em 2001. Nesse documento, que teve como base a PNAD de 1999 para o cálculo do déficit habitacional e da inadequação de moradias em 2000, procurou-se aprimorar a metodologia adotada anteriormente, sem distanciar-se de suas premissas básicas.

No entanto, os parâmetros requeridos para o cálculo do déficit habitacional e das inadequações de domicílios exigiam um nível de detalhamento de dados secundários que, para o caso de municípios, só seria possível com a divulgação e a liberação pelo IBGE dos dados da amostra e dos “micro-dados” do Censo Demográfico 2000, o que ocorreu no final do ano de 2002. Esse fato levou o Ministério das Cidades, em convênio com o PNUD e o BID, a contratar novo estudo ao Centro de Estatística e Informações – CEI da Fundação João Pinheiro.

Na metodologia desenvolvida pela Fundação João Pinheiro são considerados dois diferentes segmentos: o déficit habitacional quantitativo – tratado simplesmente como déficit habitacional – e o déficit habitacional qualitativo – identificado como inadequação de moradias. Estabeleceu-se dessa forma uma situação na qual devem ser construídas novas

25 No entanto, um estudo feito por pesquisadores da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE e do

Núcleo de Estudos da População da Unicamp questiona tal metodologia, argumentando que poderia estar havendo um exagero ao incluir no cálculo do déficit todos os domicílios em que convivem mais de uma família, tendo em vista que uma análise mais detalhada do perfil dessas famílias indicaria que nem sempre é a pobreza ou a falta de moradia que leva as pessoas a tomarem essa decisão. No entanto a FJP se baseia numa premissa cultural de que: “quem casa quer casa”, e que se tal evento não ocorre, este se deriva da dificuldade de aquisição de uma nova moradia.

habitações e uma outra situação que reflete os problemas na qualidade de vida dos moradores e que não se relaciona ao dimensionamento do estoque de moradias, e sim a especificidades internas desse estoque.

Portanto, o conceito de déficit habitacional se relaciona diretamente às deficiências do estoque de moradias, englobando as residências sem condições de habitação devido à precariedade das construções ou em virtude de terem sofrido desgaste da estrutura física e que devem ser repostas, assim como à necessidade de incremento de estoque, decorrente da coabitação familiar ou da moradia em locais destinados a fins não residenciais.

Desta forma entende-se que o déficit habitacional é composto pelo “déficit por reposição de estoque” somado ao “déficit por incremento de estoque”.

O “déficit por reposição de estoque” refere-se aos domicílios rústicos, acrescidos de uma parcela devida à depreciação dos domicílios existentes. Domicílios rústicos não apresentam paredes de alvenaria ou madeira aparelhada, o que resulta em desconforto para seus moradores e risco de contaminação por doenças e devem, portanto, ser repostos. A depreciação de domicílios está relacionada ao pressuposto de que há um limite para a vida útil de um imóvel.

O “déficit por incremento de estoque” contempla os domicílios improvisados, a coabitação familiar e o ônus excessivo com aluguel. O conceito de domicílios improvisados engloba todos os locais destinados a fins não residenciais que sirvam de moradia, o que indica claramente a carência de novas unidades domiciliares, e o conceito de ônus excessivo com aluguel se aplica às famílias urbanas, com renda de até três salários mínimos, que moram em domicílios urbanos duráveis e que despendem mais de 30% de sua renda com aluguel.

Uma vez esclarecidos os parâmetros para a definição do déficit habitacional, se faz necessário esclarecer os parâmetros utilizados para definir a inadequação de moradias.

As habitações inadequadas são aquelas localizadas em áreas urbanas26 e que não proporcionam a seus moradores condições desejáveis de moradia, não implicando, no entanto, na construção de novas unidades. Porém, são excluídos do estoque analisado os domicílios inseridos em alguma das categorias do déficit habitacional.

Para que um domicílio seja classificado como inadequado, é preciso que apresente problemas de natureza fundiária, adensamento excessivo de moradores, alto grau de depreciação, falta de unidade sanitária domiciliar exclusiva ou alguma carência de infra- estrutura.

São considerados domicílios carentes de infra-estrutura todos aqueles que não dispõem de ao menos um dos seguintes serviços básicos: iluminação elétrica, rede geral de abastecimento de água com canalização interna, rede geral de esgotamento sanitário ou fossa séptica e coleta de lixo.

O adensamento excessivo ocorre quando o domicílio apresenta um número médio de moradores superior a três por cômodo, não sendo consideradas as partes da casa utilizadas para fins não residenciais, como garagens, depósitos, varandas abertas etc.

A Tabela 2 relaciona os diferentes critérios usados pela FJP para determinar o que seja uma moradia inadequada. Estes critérios são apresentados nas Grandes Regiões Brasileiras (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste), e também separados por Regiões Metropolitanas, Municípios com mais de vinte mil habitantes e Municípios restantes.

Deve-se esclarecer que os critérios de inadequação não podem ser somados, tendo em vista que uma mesma residência poderá apresentar mais de um critério de inadequação. Assim sendo, a avaliação do número total de domicílios inadequados é fortemente estimativa.

26 As áreas rurais muitas vezes apresentam formas diferenciadas de adequação, como por exemplo: a forma de

Pode-se notar na tabela 2 que o principal componente da inadequação de moradias se constitui na falta de um ou mais serviços de infra-estrutura, tais como: iluminação elétrica, rede geral de abastecimento de água, rede geral de esgotamento sanitário ou fossa séptica e coleta de lixo. Este critério, conjuntamente com o de inadequação fundiária, depende inexoravelmente da ação do poder público, evidenciando a falta de ação ou de alcance das políticas públicas.

Contrapondo-se ao déficit de moradias, existe um grande contingente de imóveis vazios, decorrente de um processo de ocupação do solo urbano que levou ao paulatino esvaziamento dos centros tradicionais, e que, dessa forma, foram perdendo população e atividades. Este dado nos oferece um primeiro paradoxo: segundo o Ministério das Cidades o estoque de domicílios vagos corresponde a aproximadamente 60% do déficit habitacional quantitativo brasileiro. Em 2000 havia 4,6 milhões de domicílios urbanos vagos, dos quais dois milhões e 250 mil situados em aglomerados metropolitanos especialmente nas áreas centrais, e 1,5 milhões na zona rural. Nas regiões Metropolitanas do Sudeste os imóveis vagos são em números superiores às necessidades habitacionais, no entanto, como veremos mais adiante, estes dados devem ser analisados cuidadosamente.

Assim, a partir de uma visão mais ampla da habitação, a qual engloba não apenas um mero abrigo, mas todos os componentes necessários para o morar digno, sendo estes: TABELA 2 – CRITÉRIOS DE INADEQUAÇÃO DOS DOMICÍLIOS PARTICULARES PERMANENTES

URBANOS (1), GRANDES REGIÔES E BRASIL - 2000

CARÊNCIA DE INFRA-ESTRUTURA