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4. O CONFESSADO ATIVISMO DO SUPREMO TIRBUNAL FEDERAL EXISTE CONTROLE NO MODELO BRASILEIRO?

4.1 O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4277 / DF.

4.1.3 Dos Argumentos Invocados para votar favoravelmente.

Como já adiantado, o plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade de se efetivarem uniões homoafetivas de forma unânime, de modo que os ministros cujos votos foram acima analisados terminaram por votar pelo provimento das ações judiciais propostas.

Para que a pesquisa em questão se revista de completude, importa que sejam explicitadas as razões invocadas pelos julgadores para superar a literalidade da norma constitucional e decidir favoravelmente à matéria posta em julgamento.

O Ministro Gilmar Mendes pautou seu voto sobre a matéria na necessidade de proteção dos direitos das minorias, os quais estariam reprimidos a partir da adoção de norma prevista na Constituição Federal e no Código Civil que disciplinam o casamento entre homem e mulher.

Veja-se trecho do voto que bem esclarece o posicionamento adotado:

É que, como já mencionei aqui, entendo existirem fundamentos jurídicos suficientes e expressos que autorizam o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo, não com base no texto legal (art. 1723 do Código Civil), nem com base na norma constitucional (art. 226, §3º), mas, sim, como decorrência de direitos de minorias, de direitos fundamentais básicos em nossa Constituição, do direito fundamental à liberdade de livre desenvolvimento da personalidade do indivíduo e da garantia de não discriminação dessa liberdade de opção (art. 5º, XLI, CF) – dentre outros explicitados em minha fundamentação –, os quais exigem um correspondente dever de proteção, por meio de um modelo de proteção institucional que até hoje não foi regulamentado pelo Congresso.

Nesse sentido, diferentemente do que expôs o Ministro Relator Ayres Britto

– ao assentar que não haveria lacuna e que se trataria apenas de um tipo de interpretação que supera a literalidade do disposto no art. 226, § 3º, da Constituição e conclui pela paridade de situações jurídicas –, evidenciei o

problema da constatação de uma lacuna valorativa ou axiológica quanto a um sistema de proteção da união homoafetiva, que, de certa forma, demanda uma solução provisória desta Corte, a partir da aplicação, por exemplo, do dispositivo que trata da união estável entre homem e mulher, naquilo que for cabível, ou seja, em conformidade com a ideia da aplicação do pensamento do possível. (grifos conforme o original)

Gilmar Mendes entendeu existir uma lacuna legal que deveria ser preenchida pelo Poder Judiciário ainda que de forma provisória, aplicando-se analogicamente o que resta disciplinado no texto legal e constitucional em favor das uniões heteroafetivas.

O argumento é no entender desta pesquisa insustentável, considerando que o Texto Constitucional, que serviu de amparo ao legislador quando da edição do Código Civil, é claro ao afirmar que a união somente é possível entre “homem” e “mulher”, de modo que inexiste qualquer espécie de lacuna, mas posição firmada pelo legislador quanto à matéria posta em julgamento. Saliente-se, conforme já foi acima destacado que o tema da união homoafetiva foi analisado por ocasião da Assembleia Constituinte de 1988, tendo o Poder Legislativo decidido por manter as expressões “homem” e “mulher” que constavam no texto original da Constituição Federal.

No mais, o próprio ministro lançou inconteste argumento de que outra não poderia ser a interpretação que não a literal. Os termos não admitem interpretação divergente.

Na mesma linha de intelecção foi o voto do Ministro Ricardo Lewandowski sobre o tema, o qual igualmente reconheceu a existência de lacuna legal a ser suprida pelo Supremo Tribunal Federal, como forma de resguardar o direito que assiste às minorias, senão veja-se o trecho abaixo.

Cuida-se, enfim, a meu juízo, de uma entidade familiar que, embora não esteja expressamente prevista no art. 226, precisa ter a sua existência reconhecida pelo Direito, tendo em conta a ocorrência de uma lacuna legal que impede que o Estado, exercendo o indeclinável papel de protetor dos grupos minoritários, coloque sob seu amparo as relações afetivas públicas e duradouras que se formam entre pessoas do mesmo sexo.

Em suma, reconhecida a união homoafetiva como entidade familiar aplicam-se a ela as regras do instituto que lhe é mais próximo, qual seja, a união estável heterossexual, mas apenas nos aspectos em que são assemelhados, descartando-se aqueles que são próprios da relação entre pessoas de sexo distinto, segundo a vetusta máxima ubi eadem ratio ibi idem jus, que fundamenta o emprego da analogia no âmbito jurídico.

Por fim, o Min. Cezar Peluso adota o mesmo posicionamento, assentindo com os demais no sentido de que há lacuna legal a ser suprida pelo julgamento da matéria pelo Supremo Tribunal Federal, o que foi feito naquela oportunidade.

É importante registrar que ao final do voto do Min. Cezar Peluso, a partir de aparte levado a efeito pelo Min. Gilmar Mendes, assentaram o dois ministros que a decisão ali tomada pela corte impunha fim à discussão que revelaram existir sobre a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal julgar inconstitucional a regulamentação da união homoafetiva levada a efeito pelo legislador no plano infraconstitucional.

Assim, entenderam os Ministros Cezar Peluso e Gilmar Mendes que a prolação da decisão reconhecendo a união homoafetiva terminava por chancelar (do ponto de vista da constitucionalidade), a priori, eventual norma que viesse a regulamentar a matéria.

Laborou mal a Corte Constitucional, pois aferiu a constitucionalidade de dispositivo legal inexistente e que, até hoje, não chegou a ser votado pelo Congresso Nacional, seja como emenda constitucional, seja como lei ordinária para alterar o Código Civil.

O processo de aferição da adequação constitucional deve ser feito por meio da propositura de ações próprias a partir da existência da norma legal, mas não no plano hipotético, sem que sequer a vontade do legislador tenha se manifestado em tal sentido.

Esses elementos evidenciam o que aqui se defende, qual seja, o posicionamento confessadamente ativista da nossa Corte Constitucional, que invoca para si o papel de verdadeiro legislador, sob o frágil e inconsistente fundamento de proteger a efetivação de direitos fundamentais.

Se não bastasse o julgamento aqui analisado, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº. 175, de 14 de maio de 2013 (CNJ, 2013, online), por meio da qual restou vedado que as autoridades competentes restringissem a habilitação, o casamento ou a conversão da união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Mais grave, portanto, é que a lacuna legal existente, que deveria ser colmatada por edição, pelo Poder Legislativo, de emenda constitucional ou de lei ordinária, terminou por ser suprida a partir de texto normativo editado pelo Conselho Nacional de Justiça, que é órgão vinculado ao Poder Judiciário, nos termos do art. 92, I- A, da Constituição Federal.

A solução não se mostra ideal, considerando especialmente a violação ao sistema de competências firmado na Constituição Federal de 1988.

4.2 Caso do Estado de Coisas Inconstitucional. A má importação de instituto