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O DUPLO GRAU E O DEVIDO PROCESSO LEGAL

No documento O DUPLO GRAU E OS RECURSOS (páginas 158-162)

4. O DUPLO GRAU E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

4.1. O DUPLO GRAU E O DEVIDO PROCESSO LEGAL

O devido processo legal, previsto no inciso LIV do art. 5º da Constituição Federal de 1988, é princípio basilar do direito processual sobre o qual todos os outros deitam suas raízes. É, também, regra inerente à noção de Estado Democrático de Direito.

Oportuna, nesse passo, a lição de Nelson Nery Junior “(...) bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio do due process of law para que daí decorressem todas as conseqüências processuais que garantiriam aos litigantes o direito a um processo e uma sentença justa. É por assim dizer gênero do qual todos os demais princípios constitucionais do

processo são espécies.”236

Como decorrência do devido processo legal surgem outros princípios: a) da publicidade dos atos processuais; b) da proibição do uso de provas ilícitas; c) da garantia do juiz natural; d) do contraditório; e) do procedimento regular; f) da razoável duração do processo.

Aliás, é apenas num Estado Democrático de Direito, lugar onde a participação popular é garantida por meio de mecanismos democráticos

236 Nelson Nery Junior, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 5ª ed., São Paulo, RT, 1999, p.

(voto, referendo e plebiscito), que o devido processo legal encontra solo fértil para sua aplicação.

Por outro vértice, não há que se falar na utilização do devido processo legal - instrumento garantidor da tutela da vida, liberdade e propriedade, num Estado totalitário, lugar em que a participação da população não encontra ressonância na condução dos desígnios do país.

O devido processo legal teve sua origem na Inglaterra em 1215, na Magna Charta de João Sem Terra, tendo o seu art. 39 feito menção à

law of land. Nesse período não era utilizada a denominação “devido processo

legal”.

O princípio do due process of law relaciona-se de forma estrutural como bens relacionados à vida, à liberdade e à propriedade, apresentando acepção ampla de modo a garantir sobre todos esses bens sua defesa. É nesse contexto em que se insere a cláusula do due process clause.

A par disso, afirma Sampaio Dória “(...) a busca de preceito constitucional explícito, para servir de veículo de atuação de todo um indefinido e indefinível corpo de ‘leis naturais’, não tardou em deparar com o único dispositivo da constituição, que se prestava idoneamente a essa finalidade: a cláusula due process of law. Conveniente vaga em sua expressão literal (embora, conforme vimos, com nítido sentido processual em sua tradição histórica), proibindo a infringência a direitos relativos à vida, liberdade e propriedade, a cláusula em apreço vinha a talhe de foice para se constituir em

instrumento hábil a amparar a expansão das limitações constitucionais ao

exercício do poder legislativo federal e estadual.”237

Em sentido processual, a expressão apresenta um significado mais restrito, a saber: “(...) a) direito à citação e ao conhecimento do teor da acusação; b) direito a um rápido e público julgamento; c) direito ao arrolamento de testemunhas e à notificação das mesmas para comparecimento perante os tribunais; d) direito ao procedimento contraditório; e) direito de não ser processado, julgado ou condenado por violação de leis ex post facto; f) direito à plena igualdade entre a acusação e defesa; g) direito contra medidas ilegais de busca e apreensão; h) direito de não ser acusado nem condenado com base em provas ilegalmente obtidas; i) direito à assistência judiciária,

inclusive gratuita; j) privilégio contra auto-incriminação.”238

A existência apenas do princípio do devido processo legal na Constituição Federal torna desnecessária a presença do caput e demais incisos do art. 5º, pois a “(...) explicitação das garantias fundamentais derivadas do devido processo legal, como preceitos desdobrados nos incisos do art. 5º, CF, é uma forma de enfatizar a importância dessas garantias, norteando a administração pública, o legislativo e o judiciário para que possam aplicar a

cláusula sem maiores indagações.”239

237 Direito Constitucional Tributário e Due Process of Law, 2ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1986, p. 30.

238 Nesse sentido: Nelson Nery Junior, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 5ª ed., São Paulo,

RT, 1999, p. 39.

Há quem afirme que a relação estabelecida entre o duplo grau de jurisdição e o devido processo legal baseia-se mais numa opção política

do que jurídica.240

De certo modo, isso ocorre no campo do sistema processual civil, sistema em que o legislador infraconstitucional estabelece critérios para restringir o cabimento dos recursos e as hipóteses de incidência.

O mesmo acontece quando a lei processual cria ou extingue recursos, salvo o recurso extraordinário e o especial que estão previstos na

Constituição Federal.241

Exemplo de extinção de recursos ocorre na Lei de Execuções Fiscais, em que não se admite apelação contra sentença em execuções de valor igual ou inferior a 50 Obrigações do Tesouro Nacional – (OTN), permitindo-se apenas embargos infringentes e de declaração dirigidos ao próprio juiz, nos termos do art. 34 da Lei 6.830/80.

240 Oreste Nestor de Souza. Laspro, Duplo Grau..., p. 93.

241 Como ressalta Alcides de Mendonça Lima ao comentar a Constituição Federal de 1967: “(...) do ponto de

vista constitucional, poderia o legislador federal extinguir todos os recursos previstos no Código de Processo Civil (ou em diplomas similares de qualquer ramo, de modo que os Tribunais de Justiça (não os de Alçada), por for força da Constituição Federal, somente teriam garantida a atividade prescrita no referida no referido art. 144, § 3º: competência originária. O Tribunal Federal de Recursos, porém, ante o teor do citado art. 122 n. II, teria sempre assegurada sua função de juízo ad quem, ao menos sob a égide da praxe ou de disposições regimentais, se lei não houvesse a respeito do assunto. Na esfera estadual, portanto, qualquer que fosse a natureza ou o valor da causa, não haveria mais recurso para o mesmo juízo ou para os órgãos normais de segundo grau. Entretanto, nem por isso, a instituição estaria banida de nosso ordenamento processual, embora a restrição chegasse aos limites da própria extinção. Do juízo originário de primeiro grau estadual, a causa poderia ascender diretamente ao Supremo Tribunal Federal, desde que ocorresse, no mínimo, um dos motivos do art. 119, n. III, da Constituição Federal, apesar das limitações nele contidas. Mas, de qualquer modo, as partes teriam recurso a seu alcance, ainda que de âmbito limitado. As causas da Justiça Federal comum, porém, contariam normalmente com recurso para o Tribunal Federal de Recursos, ex vi do mencionado art. 122, n. II da Constituição Federal. O princípio, pois, do duplo grau, mesmo fracionado, estaria resguardado e incólume em sua pureza!.” Introdução

4.2.

A LIMITAÇÃO DO DUPLO GRAU À LUZ DA

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