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Economia e administração: o papel do Iluminismo na formação estatal da segunda metado

De tal forma, quando o Iluminismo chegou, por volta da metade do século XVIII, em lugares como a península itálica, a Prússia, a Áustria, a Rússia, Portugal e Espanha, haveria já os pressupostos e, em alguns casos (como no da Lombardia de Muratori), os precursores da realização de uma aliança, ainda que tácita, entre os príncipes e os setores sociais ascendentes que se interessavam por uma modernização funcional na estrutura jurídica e, evidentemente, na estrutura burocrática em geral. A instalação da filosofia das Luzes em todos esses lugares ofereceu os instrumentos intelectuais em que essa aliança seria pensada. Na medida em que, como já dissemos, o processo de centralização jurídica e administrativa implicaria em uma melhoria das condições de investimento para os setores interessados em desenvolver atividades econômicas; na medida em que essa centralização atendia, por si só, aos interesses autocráticos dos príncipes; na medida em que o incremento da atividade econômica, propiciado por esse processo de centralização absolutista, renderia conseqüências positivas para a própria política de fortalecimento do soberano, tanto em relação ao plano interno quanto em relação

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“Le accuse sempre più pressanti che vengono indirizzate alla scienza giuridica, spesso provenienti dal suo interno, trovano una prima efficace sintesi nell´opera del Muratori: nonostante non rappresenti um attacco all´intero sistema del diritto comune, ma solo ai suoi aspetti più incerti ed arbitrari, e nonostante proponga più una correzione del sistema che um suo radicale rovesciamento, Dei difetti della giurisprudenza suscita al suo apparire immediate reazioni in difesa della scienza giuridica qui posta sotto accusa, reazioni che ben documentano della difficoltà di scalfire il potere e il prestigio del sistema di diritto vigente, senza intaccare al tempo stesso quella strutura sociale complessa ed articolata che ne costituiva la base d´appoggio.” (FRIGO, Daniela. Principe, Giudici, Giustizia: Mutamenti Dottrinali e Vicende Istituzionali fra Sei e Settecento. In COLAO, F. e BERLINGER, L. (org.). Iluminismo e Dottrine Penali. Milano: Giuffrè, 1990, p. 27.).

ao plano externo; na medida em que o desenvolvimento de uma burocracia principesca centralizada demandaria um quadro funcional novo, recrutado entre o patriciado urbano e as camadas burguesas desses Estados; na medida em que, em sua empreitada pelo fortalecimento político, o príncipe precisaria contar com o apoio daqueles grupos sociais interessados na sua proposta e precisaria formar um quadro administrativo (que seria retirado desses grupos) para formar sua burocracia,40 teríamos as bases para a realização de uma coalizão social em torno da proposta absolutista. O desenvolvimento de uma economia capitalista altamente fortalecida ao longo dos séculos precedentes, que culminaria, no século XVIII, em uma enorme expansão de mercados e nos primeiros passos da revolução industrial e a evidente conexão entre a pujança econômica e o poderio político-militar de um Estado no instável e belicoso cenário internacional europeu de então são os fatores centrais na determinação dos rumos das mudanças institucionais nos territórios mencionados. A percepção, por parte dos soberanos, de que seus desígnios autocráticos dependeriam do fortalecimento econômico interno e a percepção, por parte daqueles súditos interessados no desenvolvimento das atividades econômicas, que qualquer salto econômico mais ousado não poderia dispensar a ajuda de um poder político suficientemente forte, como seria o de um monarca absoluto, puderam encaixar-se um no outro e, assim, forneceram a base política sobre a qual se desenvolveria o fortalecimento absolutista dos príncipes e o programa modernizador que o acompanhava.

A cultura iluminista começa a se desenvolver, na França, na primeira metade do século XVIII e, durante a década de cinqüenta desse século, já tem formadas e

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A vinculação do quadro administrativo aos interesses do poder dominante, tão essencial à sua manutenção, conforme ressaltou Weber em suas teorias sobre os tipos ideais de dominação legítima, é atestada para a época do absolutismo esclarecido em Portugal, por Hespanha: “Este progressivo engrossamento do aparelho político-administrativo central faz aumentar os quadros do funcionalismo estadual. Sejam quais forem as origens sociais deste funcionalismo e sejam quais forem as ligações que ele continua a manter com os mecanismos clássicos de apropriação da renda feudal (estes são os pontos tradicionais de abordagem da questão da burocracia, mas não os mais fecundos), o que é certo é que a sua existência e alargamento faz crescer o número daqueles cuja fonte de subsistência económica principal é este Estado em gestação. E que, se se coloca a questão do fortalecimento (ou mais dramaticamente da solvência) financeiro do aparelho a que pertencem não deixarão de sacrificar os interesses gerais do bloco feudal aos interesses particulares e autónomos do Estado. É desta massa que se fazem homens como Tomé Pinheiro da Veiga, Francisco de Lucena, o Conde de Castelo Melhor, o Marquês de Pombal e D. Rodrigo de Sousa Coutinho; mas também, em ponto menor, centenas e centenas de burocratas e letrados.” (HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional..., p. 55-6.).

definidas as suas principais bases. A partir de então, ela começa a se disseminar para outras partes da Europa e do ocidente. Falamos em cultura iluminista porque em sua origem o Iluminismo propunha-se a ser, e efetivamente foi, muito mais do que uma corrente ou escola filosófica no sentido tradicional (e porque não dizer, no sentido que voltou a ter hoje?). A penetração social e a amplitude que o Iluminismo ganhou na França do século XVIII faziam dele um movimento cultural sem paralelos na história da filosofia.41 Na

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Essa amplitude social do Iluminismo respeitaria, evidentemente os limites impostos pelo analfabetismo e estaria mais ou menos restrita à população urbana num contexto em que a maioria das pessoas ainda vivia no campo. Um dos elementos mais importantes dessa difusão da cultura iluminista para o tecido social foi emergência daquilo que Robert Darnton chama de público leitor: “No século XVIII emergiu, na França, o que se poderia chamar de público leitor; a opinião pública ganhou força; e o descontentamento ideológico jorrou, juntamente com outras correntes, para produzir a primeira grande revolução dos tempos modernos.” (DARNTON, Robert. Boemia literária e revolução: o submundo das letras no antigo regime. Tradução de Luís Carlos Borges. São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p. 11.). Essa propensão a se espalhar por todo o conjunto social deve ser bem compreendida. Não significa, de forma alguma, que todos os homens se tornariam intelectuais como um Voltaire, um Holbach, mas que o clima de crítica se disseminaria pelo tecido social (urbano, evidentemente). Segundo Darnton, depois da geração dos grandes iluministas como Voltaire e D’Alembert uma onda de jovens escritores desejosos de entrar nos altos círculos literários e, assim, fazer fama e fortuna, assolou Paris. Destes, poucos conseguiriam entrar no seleto grupo daqueles que se favoreceriam do sistema de relações pessoais que compunha o mundo das letras do antigo regime, mundo esse que, como quase tudo naquela época, era organizado sob a base do sistema de privilégios. Assim quando o Iluminismo finalmente se estabelecia entre a elite parisiense, graças ao trabalho da geração anterior, uma horda de literatos excluídos dos altos círculos iluministas (esses já mais ou menos cooptados pelo antigo regime) se dedicaria, para viver, a uma subliteratura popularesca altamente agressiva aos poderes constituídos e de nível muitas vezes até pornográfico, através da qual eles dariam vazão ao rancor que tinham pelo mundo das altas elites que os havia renegado e que os abandonava às situações sociais mais humilhantes. Essa literatura, que se propagava sob a forma de libelos, foi um importantíssimo elemento na formação cultural das classes mais baixas, e cumpriu a tarefa de predispô-las para participar dos eventos revolucionários que colocariam fim ao antigo regime. “Para além da corte, e abaixo dos pináculos da sociedade do salon, o ‘público geral’ vivia de rumores; o ‘leitor comum’ via a política como um esporte seleto e fechado, disputado por vilões e heróis mas desprovido de temas – exceto talvez o de uma tosca luta entre o bem e o mal, ou entre a França e a Áustria. Provavelmente lia os libelles como seu equivalente moderno vê televisão ou lê histórias em quadrinhos ou revistas de fofocas, só que o francês do século XVIII não os punha de lado depois de dar boas risadas; os vilões e heróis eram reais para ele. Lutavam pelo controle da França. A política era folclore vivo. Assim, após se deleitar com os excitantes relatos de La gazette noire de doenças venéreas, sodomia, adultério, ilegitimidade e impotência nas camadas superiores da sociedade francesa, podia ficar ultrajado com a descrição de Mme. Du Barry, ‘passando direto do bordel para o trono’. Propaganda desse tipo era mais perigosa que o Contrait social – rompia o senso de decência que unia o público a seus governantes. Seu dissimulado caráter moralizante opunha a ética do povo miúdo à de les grands: nesse sentido, apesar de suas obscenidades, os libelles eram intensamente moralistas. Talvez até houvessem propagado a moral burguesa que veio a se impor durante a Revolução. ‘Bourgeois’ pode não ser o termo apropriado, mas os petits que se insurgiram contra os gros no ano II correspondiam a uma espécie de puritanismo gálico que se desenvolvera

medida em que, para os autores iluministas, a filosofia, identificada com a própria idéia de

razão, tinha por principal função iluminar as trevas em se encontrava o homem emerso da

Idade Média, dissipando assim todos os grilhões da ignorância e do preconceito, ela deveria sair dos altos círculos intelectuais em que era cultivada com exclusividade e, assim, ganhar as massas. Todavia, na importação do pensamento iluminista para outras partes da Europa esse caráter de movimento cultural com propensão a se disseminar para todo o conjunto social acaba sendo fortemente abalada. Na Itália, na Prússia, em Portugal o Iluminismo será patrimônio de uma elite cultural materializada em acadêmicos, literatos, funcionários da administração real, sobretudo aqueles dos altos escalões, e alguns burgueses ilustrados. A razão disso está em que, na França, o Iluminismo, embora não possa ser reduzido a uma mera expressão ideológica da burguesia, acabou tendo uma afinidade com essa classe a ponto de ter se tornado, sob certo aspecto, uma bandeira ideológica para ela nos conflitos contra os estamentos privilegiados. Esse processo, que se aprofundaria gradativamente ao longo do século XVIII até chegar ao seu auge na revolução de 1789, radicar-se-ia nas circunstâncias particulares da classe burguesa francesa, cada vez mais autônoma e cada vez identificando-se menos com a situação política de sua nação. Assim a extrema importância assumida pela burguesia na França do século XVIII deu ao Iluminismo um amplo espaço social para se desenvolver. Ao contrário, naqueles Estados que não contavam com uma classe burguesa com a mesma força e autonomia em relação ao conjunto da sociedade não haveria o mesmo espaço social para que o Iluminismo se difundisse.

Na França, a existência de poderes intermediários nobiliárquicos que incomodavam tanto a coroa quanto a burguesia colocou-os lado a lado na polêmica antinobiliárquica setecentista. Alguns intelectuais iluministas franceses, como Voltaire e Helvétius, se posicionariam a favor do fortalecimento do poder monárquico com a esperança de que ele exercesse um papel modernizador, solapando os estamentos privilegiados. A insensibilidade da coroa francesa para se posicionar a favor das reformas, conciliando-as com seus desígnios absolutistas, motivada talvez por uma situação relativamente cômoda experimentada nos anos precedentes (quando o Estado francês, ao lado da Inglaterra, sustentava o status de principal potência européia) que aparentemente

bem antes de 1789. Crédulos acerca das tramas e dos expurgos do Terror, também haviam candidamente assimilado as lendas dos antigos libelles.” (DARNTON, Robert. op. cit., p. 203-4.).

continuava a exercer seus efeitos sobre a mente do rei e de seus principais conselheiros mesmo depois de ser abalada pela derrota na guerra dos sete anos e pelas crises das finanças públicas dos anos do governo de Luis XVI, faria com a burguesia francesa (de longe a mais forte e autônoma do continente Europeu) abandonasse as esperanças outrora depositadas no absolutismo e resolvesse fazer ela própria as mudanças desejadas.42 O Iluminismo, evidentemente, acompanharia esse movimento e converter-se-ia na filosofia que prepararia a revolução. Nos outros Estados do continente europeu, ao contrário, a situação de atraso econômico, que poderia comprometer seriamente os projetos de fortalecimento político das dinastias, faria com que elas se posicionassem mais decididamente a favor das reformas.43

Essa situação de atraso econômico ainda possui um outro aspecto relevante. Enquanto na França, do ponto de vista econômico, as reformas reivindicadas tinham por finalidade apenas abrir o caminho para o desenvolvimento de forças econômicas já existentes, naqueles outros países, ao contrário, seria necessário que o Estado criasse, a partir de cima, as forças econômicas. Em outras palavras, o próprio Estado deveria agir sobre a sociedade civil, intervindo nela, regulando-a e impondo, do alto, o dinamismo econômico necessário para a produção de riquezas. Assim, diferentemente do que aconteceu na França, nesse contexto o fortalecimento do poder monárquico e a sua participação no processo de desenvolvimento econômico eram indispensáveis. Qualquer programa de eficiência econômica implica em um programa de racionalização

instrumental, entendendo por razão instrumental aquela que articula meios segundo fins. O

desenvolvimento do capitalismo impunha por si só, através da coação exercida pela competição no mercado, uma racionalização de tal tipo, na medida em que tornava necessário produzir com menor custo (o que implica em maior eficiência) para, assim,

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O grau de vinculação da coroa francesa à nobreza e o fato de que essa nobreza ainda detinha enorme poder político e social, o que faria com a coroa enfrentasse duras batalhas caso viesse a deflagrar um enfretamento mais radical contra ela, são certamente a causa dessa mencionada insensibilidade.

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VALSECCHI, F. L’assolutismo illuminato in Europa... ; KLINGENSTEIN, Grete. Riforma e crisi: la monarchia austriaca sotto Maria Teresa e Giuseppe II fra XVII e XVIII secolo. In SCHIERA, Pierangelo. La dinâmica statale austríaca nel XVIII e XIX secolo. Bologna: Società editrice il Mulino, 1981.

poder oferecer produtos a um preço menor.44 Na França do século XVIII uma economia capitalista cada vez mais desenvolvida tentava impor à estrutura do Estado, especialmente no que dizia respeito à sua administração financeira, um grau de racionalização que correspondesse à suas necessidades. É evidente que a situação seria diferente em lugares que não haviam alcançado o mesmo nível de desenvolvimento econômico. Assim enquanto na França temos uma economia racionalizada que tenta impor uma racionalização à burocracia estatal, na Prússia, na Áustria, em Portugal temos uma burocracia que se racionaliza para impor à economia um grau de racionalização necessário para garantir a eficiência na produção de riquezas. De tal forma, a política de desenvolvimento econômico que deveria necessariamente acompanhar o desejado fortalecimento institucional no âmbito dos projetos absolutistas da segunda metade do século XVIII obrigava a uma racionalização que partia do alto, do Estado e de sua burocracia, e atingisse a sociedade.45 Podemos dizer,

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Max Weber ressaltava o poderoso efeito racionalizador que o mercado exercia sobre o desenvolvimento social.

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Referindo-se ao absolutismo português, António Manuel Hespanha põe em relevo a sua “política de estímulo económico interno” e a conseqüente racionalização tanto da “actividade social” quanto do “aparelho de poder”. Vejamos a suas palavras: “Depois, a sua política de estímulo económico interno (sobretudo quando os reditos da expansão declinavam) – correntemente invocada sob a designação de ‘mercantilismo’; com efeito, tal política não era, como muitos parece suportem, uma política desenvolvimentista no sentido contemporâneo – ou seja, uma política em que a riqueza dos súbditos fosse um objectivo em si – mas uma política dirigida ao objectivo fiscal e político do aumento da base tributária. Claro que esta política também tinha consequências contraditórias com o sistema social feudal: muitos dos incentivos económicos consistiam em isenções ou privilégios que rompiam, quer as malhas dos mecanismos de cobrança periférica da renda, quer as hierarquias da pirâmide social feudal e da ideologia correspondente; e, num período final, não se hesitou mesmo em sacrificar aos objectivos fiscais financeiros da corôa elementos centrais dos mecanismos de cobrança da renda feudal – v.g., as propostas do Antigo Regime setecentistas e oitocentistas no sentido do alívio ou mesmo extinção dos forais. São ainda sobretudo objectivos desta natureza que comandam os esforços de racionalização da actividade social e de racionalização do próprio aparelho de poder que ocorrem durante os sécs. XVII e XVIII, segundo ciclos mais ou menos decalcados nos ciclos de expansão ou de contração das receitas públicas.” (HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional..., p. 54.). Nessa passagem Hespanha ressalta que a política de fomento ao desenvolvimento econômico não tinha no aumento da riqueza dos súditos um objetivo em si. Isso está perfeitamente correto quando partimos, evidentemente, do ponto de vista da própria coroa e de seus funcionários. Entretanto, se pensarmos do ponto de vista dos próprios súditos interessados no desenvolvimento de atividades econômicas a coisa se inverte, pois para eles o fortalecimento da coroa é que não era um objetivo em si, mas apenas um meio necessário para que fossem criadas as condições imprescindíveis para a expansão econômica que possibilitaria o aumento da riqueza pessoal de cada um deles. Temos então uma coalizão de interesses em que o monarca implementa políticas que favorecem o desenvolvimento econômico de certas parcelas de seus súditos para poder aumentar a arrecadação e financiar seus projetos de fortalecimento institucional e em que os súditos favorecidos apóiam esses projetos de

portanto, que esse processo de racionalização que era imposto a partir do governo central é uma característica inerente às condições históricas em que se desenvolveu o absolutismo nesses países que, na segunda metade do século XVIII, disputavam espaços entre si e com as potências mais avançadas da Europa.

O fato de o projeto absolutista nesses países conter esse programa de agressiva racionalização social deu oportunidade para que o Iluminismo, com seu ideal de racionalidade, se identificasse com ele. Além disso, a constatação de que, na ausência de uma burguesia forte e autônoma como a francesa, a coroa era a única força realmente capaz de implementar reformas que propiciassem algum progresso social acabava não deixando alternativas a qualquer um que se identificasse com os ideais iluministas. O fato de, dadas as condições sócio-econômicas, muitos dos intelectuais iluministas desses Estados serem membros de um patriciado ilustrado de onde se recrutariam os membros para compor o quadro administrativo que funcionaria em dependência direta da coroa, em substituição à antiga administração estamental, era evidentemente um outro fator de identificação desses intelectuais com o projeto absolutista. Assim os iluministas desses países colocarão seus serviços à disposição da elaboração do projeto absolutista, seja na condição de puros intelectuais seja na condição de funcionários do quadro administrativo régio. Por outro lado, a implementação desse ousado projeto político de modernização autocrática demandava, necessariamente, a colaboração de pessoas com qualificação suficiente para pensar suas estratégias e para compor o quadro administrativo de uma burocracia que funcionasse com a eficiência desejada. De tal forma, a colaboração dessas camadas intelectuais no projeto absolutista era, para os monarcas, indispensável. Assim na implementação desse projeto político, podemos dizer que temos uma espécie de coalizão entre os setores intelectuais, dentre os quais se destacam aqueles que se inspiravam na filosofia das Luzes, e os monarcas. É isso que nos permite falar em um absolutismo

esclarecido.

fortalecimento institucional na medida em que estão sendo favorecidos pelas políticas econômicas nos quais ele se baseia. O fato de essas políticas econômicas acabarem prejudicando certos setores sociais, como parte da nobreza (como mostra Hespanha), não impediu que, no plano teórico, esse processo fosse apresentado como uma coalizão dos interesses da coroa não apenas com os interesses de certos setores da sociedade (ainda que majoritários), mas com os interesses do próprio conjunto da sociedade. Assim na literatura política da época a promoção da felicidade pública e do bem-estar dos súditos começam a ser apresentados como funções do soberano, como tarefas que