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A Economia Solidária como Proposta Alternativa de Organização do Trabalho para os

1. ECONOMIA SOLIDÁRIA: PERTINÊNCIA, SIGNIFICADO E ABRANGÊNCIA

1.2 Significado da Economia Solidária

1.2.1 A Economia Solidária como Proposta Alternativa de Organização do Trabalho para os

Os autores referendados nesta abordagem, citados acima, não defendem uma proposta de auxílio aos mais pobres, mais uma busca da ampliação do movimento de economia solidária, de forma sustentável, para transposição dos limites de mera subsistência dos excluídos do mercado de trabalho formal.

Neste sentido, a primeira conceituação utilizada, dentro dos preceitos dessa abordagem, foi a de Razeto (1999), sob a nomenclatura de economia de solidariedade:

Concebemos a economia de solidariedade como uma formulação teórica de nível científico, elaborada a partir e para dar conta de conjuntos significativos de experiências econômicas – no campo da produção de comércio, financiamento de serviços, etc. – que compartilham alguns traços constitutivos e essenciais de solidariedade, mutualismo, cooperação e autogestão comunitária, que definem uma racionalidade especial, diferente de outras racionalidades econômicas. Trata-se de um modo de fazer economia que implica comportamentos sociais e pessoais novos, tanto no plano da organização da produção e das empresas, como nos sistemas de destinação de recursos e distribuição dos bens e serviços, e nos procedimentos e mecanismo de consumo e acumulação (RAZETO, 1999, p. 40).

Este mesmo autor situa a origem do fenômeno na crise da civilização moderna. Para ele, a economia solidária apresenta-se como uma busca por uma nova estrutura de sociedade, que possa construir com uma, também nova relação estrutural entre economia, política e cultura, em que a solidariedade, compreendida como democratização das três esferas da vida social – seja o elemento ético fundador e preponderante. “São iniciativas nas quais se pretende ser diferente e alternativo com respeito ao sistema imperante, e chegar assim, ainda que seja em pequeníssima escala, a uma mudança social, na esperança de uma sociedade melhor e mais justa” (RAZETO, 1999, p.48).

Outros autores também reconhecem o surgimento do fenômeno da economia solidária, na crise da sociedade capitalista, em relação ao mercado de trabalho, ocorrida nas últimas décadas, como Lisboa (1999) e Kraychete (2000). Para estes autores, a crise obriga que grande parte dos trabalhadores, excluídos do mercado de trabalho, busque alternativas de

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sobrevivência, no que se refere à geração de trabalho e renda, por meio de organizações associativas, seja por meio do incentivo da sociedade civil (LISBOA, 1999) ou pela “simples” necessidade de reprodução da vida (KRAYCHETE, 2000).

Apesar de a economia solidária surgir como uma alternativa aos setores populares, tanto Lisboa quanto Kraychete concordam que a sua proposta, enquanto fenômeno vai muito além. Lisboa (1999) afirma que a economia solidária possui a solidariedade em seu âmago, e apesar de diferir da economia informal, representa uma “outra economia” existente junto aos pobres e que não é motivada pela acumulação de riquezas. O que significa dizer que, a economia solidária manifesta uma racionalidade substantiva, ao contrário da economia capitalista, onde se manifesta a racionalidade instrumental.

Há também, conforme destacado por Kraychete (2000), a perspectiva de uma outra lógica, inversa à do capital: “Ao contrário das empresas que – na busca do lucro, da competitividade e da produtividade – dispensam mão-de-obra, os empreendimentos populares não podem dispensar os filhos e cônjuges que gravitam em seu entorno” (KRAYCHETE, 2000, p.36). Assim, convém:

Designar por economia dos setores populares as atividades que, diferentemente da empresa capitalista, possuem uma racionalidade econômica ancorada na geração de recursos (monetários ou não) destinados a prover e repor os meios de vida, e na utilização de recursos próprios, agregando, portanto, unidade de trabalho e não de inversão de capital (KRAYCHETE, 2000, p. 15)

A economia solidária, para Coraggio (2000, 2003), relaciona-se com a proposta de economia alternativa baseada no trabalho. Esta Economia do Trabalho viria complementar a economia pública e a mercantil, dominantes na sociedade contemporânea. A base dessa proposta seria a Economia Popular, mas deve-se ir além da simples reprodução da vida biológica, seria “estrutural ou conscientemente responsável pela reprodução ampliada da vida de todos os membros” (CORAGGIO, 2003, p.48).

Para isso, o autor propõe a formulação de uma nova proposta que leve em consideração dois elementos-chave. O primeiro, é que se tome em conta o desaparecimento da forma de Estado Nacional – de rígidas fronteiras e de governos soberanos – que preponderou do período que se estendeu desde a revolução industrial até a crise do Estado de Bem Estar Social. O segundo

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elemento-chave refere-se à necessidade de se partir das relações sócio-econômicas realmente existentes e da possibilidade de que essas relações produzam movimentos contra hegemônicos com alguma possibilidade de êxito (CORAGGIO, 2003).

Para Coraggio (2003) a Economia Popular representaria as “diversas formas de sobreviver ao neoliberalismo”, porém tais experiências seriam “fragmentadas, heterogêneas, cabendo tanto a competição como a solidariedade (...) suas células básicas seriam as unidades domésticas na lógica de reprodução da vida biológica e social” (p.35).

Assim, ele defende uma proposta de desenvolvimento evolutiva, com foco no “local”, que se apresente como um conjunto amplo de iniciativas, relações e redes, formado por empreendimentos de diversos tipos: informais, familiares, cooperativos, autogestionários, clubes de troca, etc., definidos a partir de uma predominância do fator trabalho como elemento de reprodução.

Nesse contexto, questões relacionadas à escala, sinergia e plano de ação da proposta são fundamentais, para superação das dificuldades existentes no mercado. No caso da América Latina, Coraggio (2003) salienta que ocasionada pela falta de competitividade das organizações solidárias frente a empresas capitalistas, muitas delas dependem do subsídio de doações e do voluntariado para se manterem. Por essa razão, evidencia-se a necessidade da união de forças com a luta sindical, com a luta da qualidade de serviços, a luta do meio ambiente, enfim, todos que estão de alguma forma tentando impor limites ao capitalismo.

Assim, em comparação aos modelos tradicionais vigentes, é importante que o fenômeno da economia solidária possa “ser alternativo nas pequenas coisas e avançar rumo à transformação do que é grande, em termos de expansão de microalternativas no não-estabelecido” (RAZETO, 1999, p. 53).

Pode-se observar, que esta abordagem, da economia solidária como uma alternativa para os setores populares, destaca que a economia solidária deve ser compreendida como um fenômeno que vai além de questões meramente econômicas, levando-se em consideração também novas formas de comportamentos sociais e pessoais, pautados na cooperação, na solidariedade, no mutualismo e na autogestão.

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1.2.2 A Economia Solidária como Proposta de Alternativa ao Modo de