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EDUCAÇÂO E ENSINO DA ARTE

Nós aprendemos com aqueles que aprendem conosco. Hans-Georg Gadamer

A educação, afirma Gadamer, está diretamente ligada a nossa capacidade linguística a qual exercemos quando aprendemos a falar. Educar é educar-se, assim como um pai e uma mãe participam da educação e formação de seu filho, um educador é um formador. Também forma-se ao participar direta e ativamente do processo de aprendizagem. (Gadamer, 2000, p.15).

A educação tem que levar em consideração a fecundidade da experiência do estranhamento, da ruptura do atual, do cômodo, do conhecido. Com isso, desestabiliza-se a regularidade metódica que norteia a ação educativa. A formação está centrada na própria experiência educativa, não é algo subjetivo e nem encontra sua produtividade somente nas redes metodológicas e técnicas, pois, a presença de algo não é captável pela lógica dos conceitos. Abrir o sentido da educação pela metáfora, portanto, é ampliar a capacidade compreensiva, deixando um espaço para a pluralidade contra o esmagamento produzido por um só modelo (Gadamer, 2007, p.87).

Gadamer entende que ensinar é exercitar no pensamento e na livre faculdade de julgar o aprendizado dos outros. É a própria capacidade de julgar que é enriquecida pelo contato com os outros. Aprender é como participar como uma “audiência” que temos que aprender a ouvir, sobre um caminho e outro, alegando que o todo tem que se arremeter sobre a parcialidade do eu, na qual a vontade própria e a compulsão à validade procuram capturar aquele impulso intelectual (Gadamer, 2007b, p.69).

62 O filósofo ressalta a totalidade de sentido da educação, que está na possibilidade de sempre novamente questionar, pois ao final de cada resposta não apenas se apresenta a impossibilidade de encerrar a educação num único conceito, mas também a produtividade que há em se expor ao outro e assumir uma postura reflexiva.

Só através do diálogo é possível aprender. Essa afirmação é um reencontro com a tradição educativa do mundo ocidental, inaugurada por Sócrates, que se mantém ainda viva pela fecundidade inabalável daquilo que foi anunciado: educar pressupõe abertura ao outro.

Mais de dois mil anos depois, essa tradição emerge, sob forma de narrativa literária, na conhecida obra Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, quando o sertanejo Riobaldo diz: "Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende...”, numa clara evidência de que os envolvidos no processo de educar devem permanecer abertos e dispostos a aprender um com o outro. A hermenêutica expôs essa abertura em toda a sua radicalidade, apontando a história e a linguagem como elementos estruturadores de nosso acesso ao mundo e de nosso aprendizado (Hermann, 2002, p. 10).

O diálogo pedagógico ocorre entre professor e aluno no processo de ensino. Na tradição, o diálogo sempre foi constitutivo da relação pedagógica, embora nem sempre os professores mantivessem essa capacidade dialógica. A incapacidade para o diálogo se deve ao fato de o professor posicionar-se como um transmissor autêntico da ciência. Nessa perspectiva, o aprisionamento da educação pelo modelo da cientificidade cria dificuldades para que, na ação educativa, cada um possa constituir-se a si mesmo: a educação é educar-se; a formação é formar-se (Gadamer, 2000, p. 11).

A formação tem a ver com nossa relação com os outros e com nossa capacidade de diálogo: só podemos aprender através da conversação (Gadamer, 2000, p.10). O aprender é um permitir vir à luz – um parir – de verdade, que só

63 nasce no duplo movimento de um dirigir-se a, solicitando, e de um receber de, que corresponde àquela solicitação.

Na experiência formativa é necessário levar em consideração que ela envolve a performance do educar, bem como aquilo que pode empobrecer a experiência educativa.

O olhar distante do teórico, não envolvido na dinâmica do processo vivido pelos atores, consegue registrar, explicar e ampliar o conhecimento dos fatos visíveis, submetendo-os à lógica das leis causais como base da reconstrução, ou melhor, da apropriação de um mundo externo, objetivo (Gadamer apud FLICKINGER, 1997, p.11).

Para Gadamer, uma educação pela arte torna-se uma educação para a arte (2007, p.132). A partir disso, podemos pensar sobre a interpretação/experiência da obra de arte no ensino da mesma, vinculando-a ao fenômeno da compreensão. Em geral, as práticas pedagógicas de ensino da arte se detêm nos aspectos que dizem respeito à construção da obra, em seu aspecto formal, condizente com objetivos pré- estabelecidos ao ensino formal da arte. Para Gadamer, se o conceito de uma coisa fosse apresentado visando somente ao seu aspecto de beleza, isso não passaria de uma questão de representação acadêmica (Gadamer, 2006, p.95).

Para pensarmos no ensino da arte importa, pois, considerar as experiências mesmas de “interpretação e de experiência da obra”, as quais, de longe, ultrapassam as questões meramente metodológicas. Isso implica que os educadores, marcados pelas concepções cientificistas, se previnam contra a ilusão segundo a qual a “experiência” da obra está além da tradição e da linguagem nas quais se situam e se comunicam obras e intérpretes.

A linguagem da obra de arte demanda que nos apropriemos dela, como se fosse nossa própria (Gadamer 2000, p. 10). Precisamos aprender o alfabeto e a linguagem daquilo que ela nos diz, pois, em cada caso, há uma realização conjunta: a realização de uma coletividade em potencial (Gadamer, 1985, p.60).

64 A identidade da obra existe mediante uma experiência real, para aquele que “joga junto”, ou seja, que participa e que se entrega. Uma “obra” tem identidade, a qual consiste justamente em algo que deve “ser compreendido”, no que ela quer ser entendida, no que ela “quer dizer” ou “diz” (Gadamer, 1985, p.42).

A obra nos faz uma exigência a de ser resgatada. Ela exige uma resposta que só pode ser dada por aquele que acatou a exigência e se entregou à experiência do jogo (Gadamer, 1985, p. 42).

A hermenêutica tem que desconstruir uma racionalidade que reduz a experiência da verdade a uma aplicação metódica. A hermenêutica reivindica dizer ao mundo a partir da sua finitude e historicidade, de onde emerge seu caráter interpretativo. Ela tem como preocupação central o pensar e o conhecer para a vida prática, interrogando as experiências.

Começa-se a “decifrar” um quadro como um texto com várias facetas de uma mesma coisa, de modo que, no final, o que foi representado apareça na tela com múltiplas faces. Com um novo colorido e com uma nova plástica. De modo que, no final, a significação evocada torne presente uma significação universal: “cujo sol nunca se põe” (Gadamer,1985, p.44).

Compreender e interpretar sempre demanda uma reflexão e uma elaboração mental. O jogo reflexivo é uma exigência da obra como tal (Gadamer, 1985, p.45). Por isso o interesse maior sobre a obra de arte não recai sobre os modos que um pintor ou escultor trabalha. O que mais importa é se encontramos em sua obra a energia de uma ordem espiritual, ou se os conteúdos nos recordam nossa formação ou este ou outro artista.

A tarefa hermenêutica não se conforma em querer aprender somente o que se diz ou o que está dado, mas instiga nosso interesse em perguntar. Porém, aceita o caráter aventureiro da compreensão precisamente porque oferece oportunidades

65 especiais, podendo contribuir para ampliar de maneira especial nossa experiência humana, nosso conhecimento e nosso horizonte do mundo (Hermann, 2002, p.30).

Para o ensino da arte isso é fundamental, pois é na interrogação que o novo pode emergir, afastando-se da familiaridade e contribuindo para a ampliação do conhecimento, pois é no jogo de horizontes que a aprendizagem emerge.

É importante aprender a ler as obras da arte clássica carregadas de significações que nos vinculam com a tradição. Ler, porém, não é só soletrar e pronunciar uma palavra após a outra, mas, principalmente, realizar o movimento hermenêutico constante, comandado pela expectativa de sentido do todo o qual é preenchido a partir de cada parte individual as quais permitem a elaboração significativa do todo (Gadamer,1985, p.45).

Gadamer reconhece a arte como algo que não é fechado, mas sempre aberto a possibilidades; por isso, em suas descrições, pouco faz referência ao ensino da arte em si, mas muito contempla a arte e a filosofia, na possibilidade de, a partir delas, repensar os limites das ciências.

Pensar no conceito de jogo é fundamental para elucidar pontos sobre o ensino da arte, o conceito de jogo, de acordo com Gadamer, requer levar em conta o que é jogo o que, para ele, é uma função elementar da vida do homem, de tal sorte que a cultura humana, sem um elemento de jogo, é impensável. É interessante aqui o dado elementar do jogo humano em suas estruturas, a fim de que o elemento lúdico da arte torne-se visível não apenas de modo negativo, como libertação de objetivos obrigatórios, mas como impulso livre. Quando falamos de jogo, está implícita a ação de ir e vir de um movimento que se repete constantemente. Pensemos em certos ditos, como “o jogo de luz”, ou “o jogar das ondas”, em que há um constante ir e vir, ou seja, um movimento que está ligado a uma finalidade última. Isso é notadamente o que caracteriza o ir e vir de que, nem um nem outro extremo, é o alvo do movimento, o ponto no qual ele descansa. Além disso, é claro que a tal movimento condiz um espaço de jogo (Gadamer, 1985, p.37).

O jogo mostra que todos os que jogam são parceiros. Em relação à experiência da obra de arte não existe algo que permanece imóvel no passado nem algo fixo no

66 presente. Não há separação entre o todo da obra e aquilo que torna possível que a mesma seja vivenciada (Gadamer, 1985, p.45).

Em relação ao jogo, interessa a Gadamer o aspecto do jogo como o movimento de “estar vivo”. E o que está vivo tem o impulso do movimento em si mesmo. Concebido nesses termos, o jogo caracteriza-se por um movimento que não pretende fins nem objetivos.

O movimento do jogo exige, sempre, daquele que vai jogar, entrega. Mesmo ao espectador que olha, é necessária a participação interior nesse movimento que se repete. Por exemplo, basta alguém observar, na televisão, o público num torneio de tênis: “é um verdadeiro exercício de pescoço”. Ninguém pode deixar de jogar junto. Parece-nos, portanto, outro aspecto importante que o jogo seja, nesse sentido, um fazer comunicativo, que ele desconheça propriamente a distância entre aquele que joga e aquele que se vê colocado frente ao jogo.

Segundo Gadamer, o espectador é notadamente mais que um mero observador que vê o que se passa diante de si; ele é como alguém que “participa” do jogo, uma parte dele. Naturalmente que nessas formas simples de jogo ainda não estamos no jogo da arte. O autor destaca que quase não há mais nem um passo que leve da dança do culto à celebração do culto, tomada como representação. E que quase não há um passo que leve daí à representação em si, por exemplo, ao teatro, que surgiu desse contexto de culto como sua representação. Ou às artes plásticas, cuja função decorativa e expressiva procede, no todo, de um contexto vital religioso. Um vai dar no outro. Mas o fato de que um dê no outro confirma algo comum no que falamos do jogo, ou seja, que aí algo quer dizer algo, mesmo quando não trata de algo conceitual, significativo, com objetivo, mas de uma mera lei do movimento ditada por si mesma (Gadamer, 1985, p.39-40).

Podemos nos questionar, então, se a arte, como linguagem do compreender e interpretar, pode estar diretamente ligada à questão do ensinar e aprender em um sentido mais amplo, pois sabemos que ensinar não é transmitir conhecimentos fragmentados e isolados, mas sim um instigar a pensar, a um diálogo.

67 Assim, a perspectiva de retomada do fundamento do jogo e da concepção do círculo hermenêutico, de ser sempre aberto e de novo reinterpretado, pode auxiliar no ensino da arte na perspectiva dos horizontes distintos do aluno e do educador.

Tal reflexão, segundo Gadamer, deve preparar-nos para entendermos que não é uma mera abertura de sentido realizada através da arte. Seria antes importante dizer que é o acúmulo do sentido em algo fixo, de modo a que ele não escape ou peneire-se, mas seja fixado e protegido na estrutura do produto criado. O autor comenta sobre a excelente contribuição de Heidegger quanto à possibilidade de enunciar o conceito de sentido idealista e, por assim dizer, percebermos a plenitude do ser ou a verdade que nos toca vinda da arte, na expressão dupla de desvelar, descobrir, abrir, dar proteção e ser protegido. Segundo ele, Heidegger mostrou que o desvelar é apenas um lado da experiência fundamental do homem no mundo, isso porque o velar e o encobrir também fazem parte da finitude do homem. Tal concepção se contrapõe à pretensão de uma representação controle, de modo absoluto, o sentido, ou seja, indica que, na obra de arte existe algo mais; que é a existência de algo peculiar que perfaz este mais; que essa existência é uma resistência insuperável entre toda expectativa de sentido que se crê superior (Gadamer, 1985, p.53).

O quadro que é pendurado no saguão da prefeitura ou no palácio episcopal ou onde quer que seja deve ser uma parte de sua presença. (...) o próprio quadro é representativo. Naturalmente isso não significa uma veneração a quadros ou a imagens, mas sim que, quando temos uma obra de arte, não se trata de um mero signo recordativo, de um “remeter a” e um “substituir por” da existência (Gadamer,1985, p.54).

A hermenêutica, na medida em que reconhece uma dimensão criadora da compreensão, amplia o sentido da educação para além das práticas normativas técnico-científicas, cuja racionalidade se encontra no modelo instrumental (Hermann 2002, p.83).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A leitura dos textos de Gadamer nos jogou em um horizonte de reflexão no qual os temas da linguagem, da compreensão, da interpretação, da finitude, da experiência, da tradição e, sobretudo, do ensino da arte são pensados para além de seus aspectos metodológicos.

Estamos na linguagem, destaca Gadamer e dela não podemos sair; por ela somos constantemente (re)construídos, inseridos ou excluídos. A linguagem tanto precede cada ser humano que chega ao mundo, quanto é condição para que possa se expressar, criar e se comunicar com seus semelhantes.

Gadamer ressalva: o aspecto essencial da compreensão decorre do fato de que ela não é tanto uma ação da subjetividade, mas um tributo à tradição, uma mediação entre presente e passado, que desde já estabelece os vínculos do intérprete com o mundo.

Na obra de arte, é essencial o caráter de ser da presença sensível, já que não existe arte fora do meio da sensibilidade. E somente sob a condição da experiência da obra singular que se torna presente um universal, teoricamente não pré- determinado, que legitima seu caráter autêntico, diferenciando a arte de outros objetos. O movimento de ir ao encontro de alguém, inerente à obra de arte, não é, de antemão, calculável pela reflexão, mas é dela que emerge o impulso ontológico que precede a reflexão. Ou seja, da experiência da obra de arte emerge a consciência reflexiva à medida que essa reconhece a dinâmica própria da experiência.

A experiência possibilita uma abertura para o conhecimento, porque coloca em xeque o que nos é familiar. A experiência do desconhecido e do estranho instiga à

69 reflexão; ela nos inquieta pelo fato de ser o outro que não nós mesmos. Por isso nos percebemos sujeitos singulares quando nos deparamos com os outros.

Na arte, há um mundo que se abre; apenas um horizonte de interrogação que transcende a pretensão de controle técnico metodológico da obra permite ter acesso ao como e ao que, à temporalidade e ao lugar, da obra de arte no mundo. Quando deparamos com a arte, alargam-se os horizontes do nosso próprio mundo e passamos a ver o próprio mundo como se fosse pela primeira vez. Mesmo os objetos comuns e habituais, surgem a uma nova luz quando iluminados pela arte.

No encontro com obra de arte, nos fazemos presentes porque não penetramos num universo estranho, não saímos do tempo e da história nem nos separamos de nós mesmos. Nesse encontro, nossa compreensão é avaliada e posta em causa. Não somos nós que a interrogamos; é ela que nos coloca uma questão: o que provocou o seu ser. A experiência de uma obra de arte emerge na unidade e na continuidade do nosso próprio autoconhecimento.

Gadamer reaviva uma tradição que enfatiza os processos de instauração de sentido através da linguagem, da interpretação e do diálogo vivo. A compreensão da arte não advém de a cortarmos e dividirmos metodicamente como se fosse um objeto dotado de uma forma e de um conteúdo; advém de uma abertura ao ser, do ouvir da questão que a obra nos coloca. Em contato com ela, sentimo-nos “em casa” e dizemos: é na verdade assim! O artista disse aquilo que é. O essencial da obra não diz respeito ao fato de produzir um prazer estético, mas sim ao fato de revelar o ser.

O ato de educar pensado na perspectiva da hermenêutica filosófica, por um lado, reconhece seus vínculos com a tradição e, por outro, questiona os excessos do anseio de cientificidade pedagógica. Por isso, Gadamer insiste, a hermenêutica é a arte de compreender, derivada de nosso modo de estar no mundo. Compreender, não é um mero estar de acordo com o que ou quem se compreende; mas significa que cada um pode pensar e ponderar sobre o que o outro pensa. Compreender não é controlar o que nos está à frente, o outro, o mundo objetivo. A compreensão é um aspecto do comportamento humano, não passível de ser disciplinado pelo método científico, pois ela se estabelece como o próprio movimento da existência humana.

70 Não há um único caminho de acesso à verdade, há, para além do método científico, formas válidas e eficientes de se conhecer a realidade.

O diálogo é condição da atividade pedagógica, porque tudo o que pode ser entendido é linguagem. O ensino da arte demanda da experiência e do diálogo que permitem o acontecimento da obra. E porque o ser da obra nunca se desvela totalmente, a interrogação nunca deve cessar.

É na fusão de horizontes que a aprendizagem acontece. Para a formação é necessário a entrega, ou seja, entrar no jogo e se deixar interpelar pelas coisas, numa relação que se dá na ordem da objetivação da experiência. Para tanto, a arte é essencial, pois não bastam somente conceitos formais, metafísicos e da ordem de uma razão pura; segundo Gadamer, em seus estudos, essa perspectiva pode causar um estreitamento da maestria do ensinar.

Educar é educar-se. A educação demanda a entrega, tanto de quem ensina, quanto de quem aprende. É difícil, observa Gadamer, aos mestres se desvencilharem de suas amarras, de suas preferências estéticas e metodológicas e se aproximarem de um jogo livre, no qual os não ditos e as entrelinhas possuem um significado maior. Ir para além do método, requer a sensibilidade de se jogar com o próprio saber de nossa condição finita. Ou seja, de nossa capacidade parcial de reconhecer e compreender as coisas. Estamos sempre na tentativa de buscar o todo, porém nossa compreensão é sempre parcial, sempre intencional, dado que, quando desvelamos, ao mesmo tempo, velamos. Por exemplo: num cubo, quando chegamos a um ponto que elegemos analisar em um lado, o outro fica velado, e essa é a grandiosidade de sempre estarmos em um diálogo constante e autêntico com as coisas.

A ação educativa genuína lança nossas concepções prévias em jogo; desafia para além do saber familiar; ou seja: ser médium da aprendizagem no ensino da arte demanda reconhecer a intencionalidade no que se faz, escolhe e se interpreta. Essa intencionalidade está diretamente ligada à nossa condição finita e sempre historicamente situada na tradição, em nossas experiências com as coisas e com o

71 mundo. Ser no mundo é estar vivo, abrir-se às experiências, aos horizontes e a questões que podem emergir.

No confronto com o mestre, o interlocutor percebe e aceita, a diferença que é também abertura, ao que ele mesmo não é. É na aceitação da diferença e da distância em relação ao outro, que se configura sentido enquanto resultado do diálogo. Tal é o significado do que Gadamer designa como ‘’viver na linguagem’’ ou, mais precisamente, da afirmação de que ‘’todo compreender é linguagem (ROHDEN, 2000, p. 10).

O modo de ser do jogo enfatiza Gadamer, comporta uma inteligibilidade prática da relação ontológica que decorre da sua experiência. No jogar, o homem transcende-se a si mesmo, ultrapassa sua pré-compreensão; não permanece nele mesmo em sua interioridade.

O jogo não pode ser explicado nem compreendido instrumentalmente: nunca sabemos o que emerge dele; porém, sabemos que dele sempre saímos modificados. Todo jogar é um ser jogado, e o atrativo do jogo, a fascinação que ele exerce, reside

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