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4 O CURRÍCULO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NOS PARADIGMAS

5.2 O PCC: o mosaico do Curso de Licenciatura em Educação do Campo

5.2.2 Educação

O documento analisado apresenta a temática Educação, sendo possível identificar suas Concepções, seus Princípios, suas Características e suas Funções/Objetivos,conforme veremos abaixo.

No que se refere à Concepção de Educação, percebemos no PCC a presença de duas: a primeira Concepção de Educação como Política Pública; e a segunda Concepção de

Educação Emancipatória.

Quanto à primeira Concepção de Educação apresentada, a Concepção de Educação

como Política Pública, encontramos escrito na apresentação do documento:

APRESENTAÇÃO

Dessa forma, insere-se num esforço de afirmação da Educação do Campo

como política pública, em um processo de construção de um sistema

público de educação para as escolas do campo (PCC, 2010, p. 2-3 – Grifo nosso).

Desta forma, a Educação é um direito que se materializa como política pública e não como favor. A presente concepção está fincada na legalidade do direito assegurado desde a Constituição Federal de 1988 que preconiza em seu artigo 205 o direito da educação a todos os cidadãos brasileiros. Isto implica dizer que os povos campesinos vêm lutando para garantir a efetivação desse direito rompendo com as imposições subalternizadoras da Colonialidade do Saber. Nessa direção, Caldart (2002,p. 18) afirma que a educação “é um direito universal, direito humano, e direito social. Por isso não pode ser tratada como serviço, política compensatória ou mercadoria”.

A luta é pertinente, porém a garantia legal por si só não assegura o trato educativo com os diferentes sujeitos campesinos. Conforme nos lembra Walsh (2010), a Interculturalidade Funcional pode atuar na legislação incluindo os diferentes, mas não modificando as estruturas sociais e educacionais. Nessa direção, Jesus (2006) vai falar da necessidade de assegurarmos o direito universal, mas, não aceitarmos o universalismo educacional que torna homogêneo s os diferentes lugares, tempos e sujeitos.

É relevante refletirmos sobre as posturas universalizantes e homogeneizadoras postas à Educação, pois elas têm gerado relações dicotômicas que influenciam diretamente na oferta e qualidade da mesma. Para os modelos educacionais fincados no padrão colonial de se conceber a educação, o que se tem efetivado é uma educação precária denunciada pelo próprio PCC. Encontramos no documento,

JUSTIFICATIVA

Pesquisas realizadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP mostram que a educação no Brasil enfrenta desafios

que precisam de intervenções urgentes e consistentes. Em se tratando da educação para as comunidades do campo, os dados são ainda mais alarmantes, pois apontam para uma realidade muito mais precária com

a presença de políticas públicas inadequadas ou a sua total ausência.

(PCC, 2010, p. 7 - Grifo nosso)

Se contrapondo à educação precária ofertada historicamente aos territórios campesinos o PCC anuncia sua segunda Concepção de Educação, a de Educação Emancipatória. Esta consiste em conceber a educação como meio de proporcionar o desenvolvimento dos sujeitos campesinos. Consta no documento:

JUSTIFICATIVA

Nesse sentido, considerando a relação estratégica da educação para o

desenvolvimento local, por meio da construção de conhecimentos que possam oportunizar a construção da identidade e do empoderamento dos sujeitos, da autoestima e do capital social, por meio da união de parceiros que discutam, aprofundem e promovam ações direcionadas as mudanças necessárias, acredita-se que é fundamental um trato educativo

específico no qual, ao mesmo tempo em que se resguardem os parâmetros de excelência relativos aos saberes escolares, também se preserve uma preocupação com as especificidades das comunidades envolvidas no processo, tendo em vista o desenvolvimento de uma educação cujo sentido supere o alheamento e promova um sentido de pertencimento para com a realidade vivenciada pelas pessoas que vivem no e do campo. Isto inclui as diversas dimensões da vida humana em sociedade: laboral, social, cultural, identitária, linguística, entre outras. (PCC, 2010, p. 8 - Grifo nosso).

Neste cenário, a Educação aparece como ferramenta fundamental para ratificar o modelo societal defendido no PCC, o Emancipatório. Isto implica dizer que bem mais do que a apreensão da decodificação da leitura e da codificação da escrita, aEducação Emancipatória é vista como possibilidade de desenvolvimento social, político, econômico, cultural e epistêmico.

De tal modo, quando adota a Concepção de Educação Emancipatória, o PCC aproxima-se de uma das bandeiras de luta dos Movimentos Sociais Campesinos, a educação pensada e construída a partir da mirada de uma transformação social. Nesta perspectiva,

Educação como emancipação humana, compreende que os sujeitos possuem história, participam de lutas sociais, sonham, tem nomes e rostos, gêneros, raças e etnias diferenciadas, e que ao lutar pelo direito à terra, à floresta, à água, à soberania alimentar, aos conhecimentos potencializadores de novas matrizes tecnológicas com princípios agroecológicos e estratégias solidárias, vão recriando suas pertenças, reconstruindo sua identidade na relação com a natureza, com o trabalho e a cultura (SILVA, 2009, p. 74-75).

Para concretizar a Educação Emancipatória o PCC vai apontar que é necessário adotar como Princípio que a mesma seja de Qualidade. Conforme expresse no documento “para dar

conta dessas demandas é urgente à oferta de educação de qualidade para as populações do campo” (PCC, 2010, p. 9 – Grifo nosso).

O Princípio da Qualidade assegura que a educação posta ao território campesino não pode ser ofertada de qualquer maneira, ou, como diz Arroyo (2010), ser uma educação meramente compensatória. O PCC sinaliza com este Princípio a necessidade de se pensar uma Educação que tenha relação direta com o território campesino atendido,ou seja, uma educação do povo feita pelo povo.

De tal modo, é possível compreender o Princípio da Qualidade por meio da

Característica da Educação ser Específica e Diferenciada. Isto significa a defesa por uma

educação condizente com a realidade do território campesino. No que concerne a este aspecto encontramos no documento,

Nesse sentido, considerando a relação estratégica da educação para o desenvolvimento local, por meio da construção de conhecimentos que possam oportunizar a construção da identidade e do empoderamento dos sujeitos, da autoestima e do capital social, por meio da união de parceiros que discutam, aprofundem e promovam ações direcionadas as mudanças necessárias, acredita-se que é fundamental um trato educativo específico

no qual, ao mesmo tempo em que se resguardem os parâmetros de excelência relativos aos saberes escolares, também se preserve uma preocupação com as especificidades das comunidades envolvidas no processo, tendo em vista o desenvolvimento de uma educação cujo sentido

supere o alheamento e promova um sentido de pertencimento para com a realidade vivenciada pelas pessoas que vivem no e do campo. Isto inclui as diversas dimensões da vida humana em sociedade: laboral, social, cultural, identitária, linguística, entre outras. (PCC, 2010, p. 8 – Grifo nosso)

Ao tomar como Característica da Educação ser Específica e Diferenciada o documento PCC da LEdC pesquisada direciona-se para a defesa da educação Do e No Campo. Desta forma, com tal Característica, o que se defende é o direito da educação ser ofertada No lugar de habitação, o Campo, bem como ser uma educação que diz respeito direto ao modo de vida dos sujeitos campesinos (CALDART, 2002). Nessa direção, o PCC toma amparo na LDB de 1996 e afirma,

Trata-se de uma educação capaz de dar forma a concepções sobre a dinâmica do mundo contemporâneo, em diferentes escalas, ou seja, abrangendo o global, o nacional, o regional e o local, e integrando as complexas questões socioeconômicas às questões ambientais. Ao mesmo tempo, há evidentemente, o desafio de integrar, com eficiência, o ensino às micro dimensões do cotidiano das comunidades envolvidas e das pessoas, em particular. Concepção esta expressa e já assegurada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) - Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 - quando reconhece as especificidades das populações campo e o

direito dessas populações a uma educação adequada a sua realidade. O

que sugere, evidentemente, a necessidade da formação docente coerente com essa visão (PCC, 2010, p. 9 – Grifo nosso).

Para dar conta de uma Educação de Característica Específica e Diferenciada a Educação tem como Função/Objetivo ser Global e Local. Conforme expresso no documento,

Trata-se de uma educação capaz de dar forma a concepções sobre a

dinâmica do mundo contemporâneo, em diferentes escalas, ou seja, abrangendo o global, o nacional, o regional e o local, e integrando as complexas questões socioeconômicas às questões ambientais. Ao mesmo

tempo, há evidentemente, o desafio de integrar, com eficiência, o ensino às

micro dimensões do cotidiano das comunidades envolvidas e das pessoas, em particular. Concepção esta expressa e já assegurada na Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) - Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 - quando reconhece as especificidades das populações campo e o direito dessas populações a uma educação adequada a sua realidade. O que sugere, evidentemente, a necessidade da formação docente coerente com essa visão (PCC, 2010, p. 8 – Grifo nosso).

Ao dar conta dessa Função/Objetivo, o PCC se compromete a abordar na Educação o saber histórico acumulado e produzido no contexto global,bem como tratar do saber local, aquele que historicamente foi subalternizado pela Colonialidade do Saber, como sendo aquele não digno de ser ensinado e consequentemente não digno de ser apreendido (MIGNOLO, 2005a).

Nessa direção, evidencia-se outra Função/Objetivo da Educação presente no PCC, o de Proporcionar oPertencimento dos que são atendidos pela Educação. É posto que

Nesse sentido, considerando a relação estratégica da educação para o desenvolvimento local, por meio da construção de conhecimentos que possam oportunizar a construção da identidade e do empoderamento dos sujeitos, da autoestima e do capital social, por meio da união de parceiros que discutam, aprofundem e promovam ações direcionadas as mudanças necessárias, acredita-se que é fundamental um trato educativo específico no qual, ao mesmo tempo em que se resguardem os parâmetros de excelência relativos aos saberes escolares, também se preserve uma preocupação com as especificidades das comunidades envolvidas no processo, tendo em vista o desenvolvimento de uma educação cujo sentido supere o alheamento e

promova um sentido de pertencimento para com a realidade vivenciada pelas pessoas que vivem no e do campo. Isto inclui as diversas dimensões

da vida humana em sociedade: laboral, social, cultural, identitária, linguística, entre outras. (PCC, 2010, p. 8 – Grifo nosso)

Nesse cenário, a educação tem como Função/Objetivo proporcionar o pertencimentodos diferentes sujeitos que fazem parte do território campesino. Isto implica

dizer que mais do que estar/habitar um espaço geográfico, o pertencimento diz respeito a estar inserido/fazer parte de um território material e imaterial (FERNANDES; MOLINA, 2004). Mais do que um lugar geográfico, o território abrange os aspectos políticos, sociais, culturais e epistêmicos nos quais se dá a vida. Nessa via de pensamento se adota a nomenclatura de pertencer ao invés de habitar, pois a primeira implica “fazer parte de”, já a segunda implica apenas “estar em”.

Concebemos, assim, a partir das Concepções, Princípios, Característica e Funções/Objetivos, que no que se refere à temática Educação, que o documento analisado denota uma vinculação direta com o Paradigma da Educação do Campo Crítico. A vinculação é estabelecida à medida que a Educação é vista como território de luta, um latifúndio do saber a ser ocupado (ARROYO, 2012). Nessa direção, o PCC se aproxima tomando a Educação como um direito nacional assegurado por meio de Políticas Públicas,rejeitando de tal forma a educação precarizada ofertada historicamente no Paradigma Rural Hegemônico. Por isso, quando se pensa e fala na Educação sob o viés do Paradigma da Educação do Campo Crítico se toma como premissa os modos de vida dos povos campesinos, suas lutas, seus saberes, seus costumes entre outros aspectos. Trata-se de uma Educação no território campesino para e construída com os sujeitos campesinos.

Como dito, no viés do Paradigma da Educação do Campo Crítico a Educação é um território a ser ocupado. Nesse cenário, Arroyo (2010) vai apontar a necessidade de se ocupar o latifúndio do saber não só na Educação Básica, mas também no Ensino Superior. Estamos concebendo os Cursos de Licenciatura em Educação do Campo como um dos Lócus de acesso dos povos campesinos ao Ensino Superior na atualidade. Nesse cenário, nos importa discutir, na próxima subseção, a temática: Curso de Formação de Professores.