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CAPÍTULO II- OS CAMINHOS PERCORRIDOS SOBRE O FEMINISMO NO BRASIL E

2.2 A EDUCAÇÃO PARA A MULHER

No final do século XIX, no Brasil e alguns outros países, as mulheres começavam a se organizar em grupos femininos, reivindicando educação para a mulher. Nessa luta, ultrapassaram várias barreiras, enfrentando as discriminações da sociedade da época. Conforme aponta Céli Pinto (2003), uma das maiores batalhadoras pela educação feminina brasileira. Foi Nísia Floresta Brasileira Augusta10.

10Educadora, escritora e poetisa, nascida em 12 de outubro de 1810, em Papari, Rio Grande do Norte, filha do português Dionísio Gonçalves Pinto com uma brasileira, Antônia Clara Freire, foi batizada como Dionísia Gonçalves Pinto, mas ficou conhecida pelo pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta. Nísia é o final de seu nome de batismo. Floresta, o nome do sítio onde nasceu. Brasileira é o símbolo de seu ufanismo, uma necessidade de afirmativa para quem viveu quase três décadas na Europa. Augusta é uma recordação de seu segundo marido, Manuel Augusto de Faria Rocha, com quem se casou em 1828, pai de sua filha Lívia Augusta. Céli Pinto a caracteriza como sendo abolicionista, republicana e feminista, defensora da educação feminina.

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Ela é considerada a primeira mulher a atravessar os limites entre os espaços considerados públicos e privados para as mulheres. Em uma época em que a imprensa nacional ainda estava começando, abria-se espaço para artigos direcionados ao universo feminino, como assuntos de moda, beleza, culinária e cuidados domésticos. Essas publicações eram feitas por homens ou por mulheres que usaram de pseudônimo para conseguir espaço na mídia. Uma dessas mulheres, mais uma vez, foi Nízia Floresta, que fez uso de nome falso para escrever no jornal.

Essa escrita, entretanto, fugia àquilo que era determinado, dentro do chamado “universo feminino”. Nízia Floresta aproveitava o espaço do jornal e denunciava a situação de ignorância em que a mulher se encontrava. Para ela, a falta de uma “educação para a mulher era responsável pelas dificuldades que encontrava na vida e que só a educação era capaz de mudar as consciências e a vida material dessas mulheres”.

Segundo Céli Pinto, esse tipo de manifestação das mulheres na mídia aponta para a “existência de um incipiente movimento de construção de espaços públicos na sociedade brasileira e, no caso, por parte de pessoas que estavam completamente excluídas do campo da política e das atividades públicas.” (PINTO, 2003, p. 33).

A partir da virada do século, foram abrindo escolas nas capitais estaduais do Brasil e, com isso, começa a surgir o ensino específico para a mulher, especialmente para as filhas dos grupos sociais protegidos. Vale ressaltar que esse ensino feminino surge sobre a ótica cristã, especificamente católica. O ensino para as moças era diferenciado do ensino dos meninos. A elas, competia ser capaz de ler, de escrever e de deter os conhecimentos principais de matemática, além de aulas de piano e francês, aulas que eram ministradas em suas casas, quando estas eram adequadas para tal ou em instituições religiosas11.

Nas aulas, as moças recebiam incentivos para desenvolverem habilidades domésticas, como: domínio com a agulha, culinária, bordados, rendas, comando das criadas, ou seja, o domínio da casa, em geral. Para alguns grupos dessa sociedade, a educação para as mulheres deveria se restringir a essas questões acerca do lar, pois

11Sobre essa discussão consultamos o site:

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consideravam importante garantir que a mulher soubesse assumir adequadamente o lugar que cabia a ela. Assim, não havia necessidade de se preocupar com questões ligadas à intelectualidade, ou seja, a mulher não precisava acumular conhecimentos científicos. Cabia a elas o exercício digno de esposa, mãe – do lar.

Nesse contexto, deparamo-nos, inevitavelmente, com a representação dual da mulher, na sociedade moderna: ora é Maria – pura, casta, digna de ser mãe, sem a mancha do contato carnal; ora é Eva – pecadora, desafiadora, desobediente. Conforme expõe Frade (2008, p. 5), a própria palavra Eva ajusta-se a uma leitura muito distinta, quando é lida de trás para frente: Ave – o que nos remete à saudação do anjo Gabriel a Maria. Assim sendo, “A mulher é a pecadora (Eva), que leva simultaneamente à magnífica Virgem Mãe Maria (Ave) e à desgraça (Vae). A mulher conduz à vida e à morte”. (FRADE, 2008, p.5).

Chartier (1990) utiliza o julgamento de representação e realidade, como sendo aquilo que é constituído a partir das interpretações que, por sua vez, arquitetam os significados que vão sendo socialmente construídos.

Desta forma, pode pensar-se uma história cultural do social que tome por objeto a compreensão das formas e dos motivos – ou, por outras palavras, das representações do mundo social – que, à revelia dos atores sociais, traduzem as suas posições e interesses objetivamente confrontados e que, paralelamente, descrevem a sociedade tal como pensam que ela é, ou como gostariam que fosse. (CHARTIER, 1990, p. 19).

Entendemos, a partir desses posicionamentos, que as representações são, na verdade, as atitudes e os interesses com os quais se compreende o mundo real, seguindo arquétipos discursivos e determinações intelectivas, feitas por meio de comportamentos sociais alocadas pela esfera do poder.

A sociedade brasileira, por sua vez, procurou instituir e lançar os modelos idealizados de família, numa tentativa de se adequar às diversas transformações advindas do chamado “progresso”. Segundo Claudia Maia, muitos pensadores e políticos brasileiros viam a superioridade moral e, de certa forma, material do Brasil na estabilidade da família brasileira: por isso, em seus discursos ela era apresentada como a célula mater da sociedade, responsável pelo desenvolvimento, fortalecimento e progresso do Estado; “é preciso manter o lar para salvaguarda da collectividade”. Sobre a instituição família, Maia cita Arlette Farge e Michel Foucault: “a família é o

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lugar privilegiado onde a tranquilidade privada fabrica certa forma de ordem pública.” (Maia, 2011, p. 93).

No entanto, a família brasileira patriarcal mantinha uma forte resistência em relação às novas convicções e padrões, especialmente ao que se referia à emancipação feminina em diferentes ângulos. No início de século XX, conforme já pontuamos, a mulher foi qualificada como mãe devotada, que se dedica por completo à família, sem liberdade para expor o que o que pensa sobre a política, ou sobre quaisquer outros aspectos da vida em sociedade. (RAGO, 1997).

Na sociedade machista e preconceituosa desse período, circulava, no meio social e religioso, a proposição de que o sexo feminino em si não deve ser nada, ou melhor, não deve ter espaços e direitos iguais ao homem na sociedade, limitando o espaço feminino ao âmbito familiar, aceitando o lugar do homem como chefe da família, cabendo à mulher e aos filhos o respeito e a obediência, visto que são desqualificados para tomarem decisões, dentro ou fora do lar.

2.3 A MODERNIDADE TROUXE MUITA AGITAÇÃO PARA AS