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CAPITULO IV MÉTODOS DE EDUCAÇÃO DE ADULTOS

1. Educação Popular de Paulo Freire

Este capítulo aborda duas das experências de alfabetização e educação de adultos propostas, respetivamente, por Paulo Freire e João de Deus, bem como da pedagogia social como ciência da educação pela comunidade e para a comunidade.

Segundo Finger e Asún (2003) entre os teóricos da educação de adultos há um consenso alargado de que Paulo Freire é o pai intelectual de qualquer espécie da educação de adultos emancipatória. Freire ocupa essa posição pelo fato de, por um lado, ser um dos importantes escritores que dedicou a sua própria vida à causa dos deserdados e, por outro, por deixar um importante legado de trabalhos onde sublinha a ideia iluminista da compreensão racional que leva à emancipação, a ideia humanista de respeito pelo educando e pela sua cultura e a ideia pragmatista de abordar os problemas de forma coletiva, prática e isentas de qualquer forma de alienação. (Finger e Asún, 2003, p. 74).

O pensamento de Freire está estreitamente ligado ao contexto sociopolítico em que viveu, por isso que Osorio (2005) salienta que “a sua obra não pode ser entendida sem que se parta do seu „contexto‟ concreto: o processo de desenvolvimento económico e social brasileiro e a sua superação da cultura colonial” (p. 152).

Entre as décadas de 1960 e 1970 do século passado, a América Latina foi marcada historicamente por diversas situações, nomeadamente: a revolução social cubana, a emergência de partidos e sindicatos socialistas populares, as reformas agrárias, industrialização e penetração de corporações multinacionais resultantes das políticas económicas e desenvolvimentistas. Por perceber a situação que considera de desumana, Freire sujeita o seu trabalho à causa da libertação popular da opressão, da alienação dissimulada precisamente pelo analfabetismo.

Foi neste momento que Freire lançou um dos seus importantes trabalhos designado “A Pedagogia do Oprimido” em 1962, como forma de crítica social e de consolidar a sua

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luta de resgate da humanização, num contexto caraterizado por uma forte estratificação social e desumanização das massas populares.( Freire,s/d, p.10)

Nas obras de Paulo Freire sobre a educação e a AEA, é notória a sua oposição às pedagogias mecanicistas e teleológicas quando afirma “se admitíssemos que adesumanização é vocação histórica dos homens, nada mais teríamos que fazer, a não ser adotarmos uma atitude cínica ou de total desespero” (Freire, 2003, p. 30).

A este respeito Paulo Freire aconselha que os oprimidos não podem limitar os seus esforços à súplica da falsa oferta dos poderosos. A grande oferta está em lutar para que, cada vez mais, estas mãos, sejam de homens ou de povos, se estendam menos, em gesto da súplica e se façam mãos humanas que trabalhem e transformem o mundo, pois a luta pela sua humanização é única forma de resgatar a verdadeira generosidade (Freire, 2003, p. 31).

Através destas afirmações podemos perceber que a ideia de Freire contraria a compreensão mecanicamente quantitativa do conhecimento. A sua proposta sobre alfabetização e educação de adultos é virada para as camadas populares, está inspirada numa pedagogia e numa epistemologia da curiosidade que se funda em perguntas. O método da alfabetizaçãoe educação de adultos proposto por Freire constitui o processo de tomada de consciência sobre o diálogo, que deve fluir em todo o processo da alfabetização numa relação horizontal de educandos para educadores e vice-versa. Em termos de procedimentos o processo decorre em cinco fases nomeadamente: a primeira, em que se faz o levantamento do universo vocabular dos grupos com quem se trabalhará, consistindo em conversas informais com moradores da área abrangida e são recolhidos os vocábulos mais carregados de sentido e típicos da região.

Na segunda fase, através do universo vocabular das palavras recolhidas na primeira, faz-se a seleção das mesmas para o processo da aprendizagem mediante os critérios da riqueza dos fonemas que constituem as palavras, dificuldade fonética e teor pragmático (maior pluralidade de engajamentoda palavra numa dada realidade social, cultural, política).

Na fase seguinte, a terceira, criam-se situações existenciais típicas do grupo com quem se vai trabalhar, representadas em cartazes, desenhos, teatros ou outras atividades.

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Estas representações constituem os chamados temas gerativos que serão descodificados pelos grupos, com a colaboração do coordenador.

A quarta fase consiste na elaboração de fichas-roteiro, uma espécie de planos de trabalho que auxiliam os educadores ao longo do debate, mas que não devem ser encarados de forma rígida, mas sim apenas um instrumento que contém elementos essenciais ao debate.

Na última fase, são feitas fichas de leitura contendo as famílias dos fonemas das palavras geradoras extraídas das situações concretas apresentadas na terceira fase. Completadas essas fases, que funcionam dependentemente das situações e dos contextos em que se aplica o método, considera-se que a partir do momento em que o educando consiga combinar os diversos fonemas formando sílabas e palavras que tenham significado, começa o seu processo da alfabetização.

Para Freire, além da consciência crítica, há uma outra designada por consciência mágica. Assim, o modelo pedagógico que ele propõe constitui um percurso que, como enfatizam Finger e Asún (2003) leva as pessoas da consciência em que não são capazes de analisar a sua situação (consciência mágica) à uma outra intermediária em que reconhecem os seus opressores, mas ainda não são capazes de agir o que poderão fazer depois de alcançarem o estágio da consciência crítica que os permitirá vislumbrar a possibilidade de agir sobre as causas dos fatos que outrora eram considerados autênticos, sem se questionar a sua lógica. Por isso, Paulo Freire opta por um método que valoriza o saber do aluno, promove o diálogo, a valorização da cultura local, a problematização e a participação integral do aluno.