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3.2. Reforma do Estado Brasileiro e Reforma Administrativa da Saúde 39 

3.2.1. Eficiência e Eficácia como diretrizes da Nova Administração Pública 43

A Emenda Constitucional n.º 19/2000 introduziu no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da eficiência ao alterar a redação do artigo 37 da Carta Política.

Mas por que o Estado assumiu o dever constitucional de ser eficiente? Respondendo a esta indagação, Bresser-Pereira (2008, p. 391) disse que o desenvolvimento econômico é possível somente quando o Estado-nação pode contar com um Estado eficaz.

O desenvolvimento econômico deve trazer benefícios à qualidade de vida das pessoas, representada pelo estado de saúde e de educação, estado este passível de ser descrito por múltiplos atributos interdependentes e medidos por indicadores sociais. O Estado pode ser visto como uma unidade produtiva que utiliza uma tecnologia a qual associa os gastos a uma fronteira de possibilidade de produção onde são produzidos serviços que venham a resultar na variação desses estados de qualidade de vida. A distância de cada ente público (União, Estado, Distrito Federal e Municípios) até essa fronteira é a medida da ineficiência (MOTAet al., 2007).

Todavia, a conjuntura mundial formada a partir da década de 1990, com fatores que envolviam os resquícios da crise de 1980, o empobrecimento da população, a globalização, a decadência do modelo intervencionista, dentre outros, impôs ao Estado uma nova ordem de gestão pública.

O Estado percebeu que não necessitava apenas de um tipo weberiano de burocracia, constituída de profissionais bem selecionados e bem treinados, agindo sem autonomia no cumprimento da lei, e de uma organização hierárquica e centralizada com linhas definidas de autoridade (BRESSER-PEREIRA, 2008). Necessitava, ao contrário, ser eficiente; precisava fazer mais e melhor, gastando menos.

De acordo com o diagnóstico contido no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado

44 O modelo burocrático relaciona-se com o controle rígido dos processos (...). Os instrumentos de supervisão e acompanhamento são pouco criativos, sendo deste modo insuficientes para caminhar passo a passo com a mudança tecnológica e atender à necessidade de repensar e propor novos objetivos e métodos de forma ágil, em menor tempo, e a um custo mais baixo. Além disso, o sistema carece de mecanismos auto-reguladores e é refratário às inovações. Sua capacidade de resposta aos novos e constantes estímulos é limitada, fato que o torna arcaico e ineficiente (MARE, 1995).

Em linhas gerais, o princípio da eficiência deve ser considerado sob dois aspectos: o modo de atuação do agente público, buscando o melhor desempenho possível de suas funções, com vistas aos melhores resultados; e o modo de organizar, estruturar e disciplinar a Administração Pública, criando uma máquina eficiente para prestação do serviço público (DI PIETRO, 2008).

No campo da Administração Pública, o conceito de eficiência não deve ser empregado no mesmo sentido econômico.

Na economia, eficiência tem por objeto a alocação de recursos, de modo a aumentar o bem-estar do indivíduo ou de um grupo determinado de consumidores, sem diminuir, concomitantemente, a disponibilidade de recursos dos demais consumidores.

Já na Administração Pública, o Estado é obrigado a prover a coletividade e, por isto, a eficiência administrativa se obtém pelo melhor emprego dos recursos e meios (humanos, materiais e institucionais) para melhor satisfazer as necessidades coletivas, num regime de igualdade dos usuários (SILVA, 2005, p. 329).

Logo, o princípio da eficiência administrativa consiste na organização racional do aparelho do Estado, a fim de garantir a satisfação dos cidadãos em coletividade.

Confirmando o interesse coletivo neste princípio, o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (MARE, 1995) conceituou que eficiência é atender milhões de cidadãos com boa qualidade a um custo baixo. Prosseguindo, o Plano estabelece que eficiência é “a busca de uma relação ótima entre qualidade e custo dos serviços colocados à disposição do público”.

45 Convém notar que de todos os princípios constitucionais da Administração Pública, eficiência é o único que traduz uma ideia de dinâmica. Os demais princípios – legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade – não implicam, necessariamente, ações que afetam a vida da sociedade.

Corolário lógico é que a eficiência é, dentre os princípios constitucionais, o que mais se aproxima da vida dos cidadãos, pois, por meio dela, poder-se-á avaliar a qualidade da execução das políticas públicas.

Por esta razão,

Esse princípio consubstancia a exigência de que os gestores da coisa pública não economizem esforços no desempenho dos seus encargos, de modo a otimizar o emprego dos recursos que a sociedade destina para a satisfação das suas múltiplas necessidades; numa palavra, que pratiquem a ‘boa administração’, de que falam os publicistas italianos (MENDES et al.., 2008).

Objetivo do Estado-nação contemporâneo é satisfazer determinadas necessidades sociais, e estar vinculado ao atendimento eficiente dos fins sociais e fáticos aos quais se destina, compreendendo-se que

eficiência não pode ser entendida apenas como maximização do lucro, mas sim como melhor exercício das missões de interesse coletivo que incumbe ao Estado, que deve obter a maior realização prática possível das finalidades do ordenamento jurídico, com os menores ônus possíveis, tanto para o próprio Estado, especialmente de índole financeira, como para as liberdades dos cidadãos (ARAGÃO, 2005, p. 5).

Todavia, a inoperância e a falta de eficiência na qual se afundou o Estado brasileiro decorrente da crise da década de 1980 chegaram a abalar a sua própria legitimidade, conforme lembra Comparato (1997), observando que “em radical oposição a essa monocracia estática, a legitimidade do Estado contemporâneo passou a ser a capacidade de realizar (...) certos objetivos predeterminados”.

O mesmo autor cita que

A legitimidade do Estado passa a fundar não na expressão legislativa da soberania popular, mas na realização de finalidades coletivas, a serem realizadas programadamente. (p. 18).

46 Em resposta a esta crise de credibilidade, a Reforma do Estado também é colocada como um resgate da coisa pública, como se pudesse produzir uma elevação do controle social da Administração Pública quando descentraliza e busca maior participação da sociedade. A descentralização ou aumento do poder local leva a um aumento do processo democrático que está em curso (BRESSER-PEREIRA, 1998).

Além do mais, a Reforma procura desenvolver a governança no Estado, tornando o Estado o articulador de recursos de diversas instituições públicas e privadas visando ao desenvolvimento de atividades públicas. Com isso, a sociedade civil passa a ser envolvida em maior grau nas decisões do governo e, consequentemente, legitima as ações do Estado.

Deve-se, contudo, considerar que o princípio da eficiência encontra-se no mesmo patamar de ordem dos demais princípios da Administração Pública (legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade). Não pode, por isso, o princípio da eficiência sub-rogar a vigência dos demais, sob pena da inadmissível situação de “os fins justificam os meios”. Di Pietro (2008) esclarece que o princípio da eficiência soma-se aos demais, não podendo sobrepor-se a nenhum deles, especialmente ao da legalidade, sob pena de sérios riscos à segurança jurídica e ao próprio Estado de Direito.

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