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Capítulo III – Os instrumentos avaliativos como estratégia de reorganização do trabalho docente.

SITUAÇÃO DA APRENDIZAGEM

3.5 Eixo Escrita

Ao pensarmos nas atividades avaliativas que nos levassem a uma melhor compreensão do processo de aquisição da escrita, esperávamos não fazer delas instrumentos que verificassem apenas seus aspectos mecânicos (segmentação, tipo de letra...) ou apenas aspectos normativos da língua. Para tanto, o grupo concluiu que o instrumento deveria criar condições para que as crianças demonstrassem seus conhecimentos sobre a língua, pensando em atividades cujo foco fosse na máxima aprendizagem a ser desenvolvida naquele ano escolar. Abaixo um trecho das discussões com o grupo de professoras:

Lucia – Mas assim, a gente quer ver se a criança está escrevendo com BR, LH, NH...? Só escrevendo não está bom no primeiro ano?

Ângela – Como assim?

Lucia – Tem que ser com ortografia dessas palavras?

Cássia – Não, por que mesmo que nós escolhemos essas palavras? Foi pensando... Alessandra – Pensando nas crianças alfabéticas, alfabetizadas se elas já conseguem...

Cássia – Em um nível mais avançado.

Ângela – Seria o nível já de aprendizagem máxima. Cássia – É, porque se pensou no máximo, por isso. Lucia – Entendi.

Alessandra – Como na avaliação a gente vai fazer com os alfabéticos e também vai fazer com os não alfabéticos, então a gente pensou em algumas palavras que tem o máximo para a gente identificar.

Lucia – Não, é que como eu vi aqui essa preocupação com ortografia, pareceu técnico igual a leitura estava, entendeu? Parece que era uma escrita certinha consolidada no primeiro ano, entendeu?

Ângela – Então, mas aí eu acho que vai entrar na mesma discussão. Eu acho que quando faz lá a relação som-grafia, utiliza empregos de diferentes estruturas silábicas, é tudo técnico.

Alessandra: Isso é tudo técnico.

Ângela – Mas é uma coisa que a gente precisava discutir, não é Charlene? Coesão, coerência e os gêneros também. Eu acho que esses quatro descritores estão de acordo com a segmentação da escrita e com as palavras de diferentes estruturas silábicas, aí eu acho que agora falta descritor para coesão e coerência e para os gêneros textuais. (Trecho da discussão com o grupo de professoras)

Vemos que a preocupação das docentes não era apenas ver se as crianças registrariam as palavras ortograficamente corretas, embora quisessem que aquele instrumento representasse o nível máximo de aprendizagem possível àqueles alunos. Desse modo, para além do registro de palavras com BR, LH, NH, pensávamos também em contemplar aspectos de coesão, coerência14 e gênero textual.

Para compreender a aprendizagem dos alunos quanto aos fatores de coesão e coerência textual, propusemos a escrita de um texto narrativo cujas características se aproximavam do gênero textual “contos de fadas”. Para Kaufman (1995), o conto consta de três momentos diferenciados: começa apresentando um estado inicial de equilíbrio; segue com a intervenção de uma força, com a aparição de um conflito, que dá lugar a uma série de episódios; encerra com a resolução desse conflito que permite, no estágio final, a recuperação do equilíbrio perdido. Todo conto tem ações centrais que estabelecem entre si uma relação causal. Entre essas ações, aparecem elementos secundários, cuja função é manter o suspense. Tanto as ações centrais como as secundárias colocam em cena personagens que as cumprem em um determinado lugar e tempo. Para a apresentação das características destes personagens, assim como para as indicações de lugar e de tempo, apela-se para recursos descritivos.

Levando em consideração tais características do gênero contos, a história proposta para os alunos se centraria em uma bruxa, em um castelo e em uma fada. De acordo com a estrutura do gênero escolhido, bem como a idade e o desenvolvimento cognitivo de

      

14

 Para compreender a definição dos conceitos coesão e coerência, utilizamos os trabalhos realizados por Kock e Travaglia (2005).  

crianças com seis anos de idade, esperávamos que o texto desses alunos deveria conter: um título; a apresentação dos personagens da história (nome, papel desempenhado e características); a apresentação de alguma situação problema e a resolução do problema vivido pelos personagens.

Os descritores elencados para esta atividade avaliativa foram:

Fez relação som-grafia: A criança compreende que as letras do alfabeto representam determinados sons da fala;

Empregou diferentes estruturas silábicas: A criança compreende que o registro do segmento escrito representa o som da fala e que nem sempre ele é composto por uma vogal e uma consoante, mas sim por diferentes junções silábicas: consoante+consoante+vogal; consoante+vogal+vogal;

Fez segmentação correta das palavras: A criança compreende que o registro se diferencia da fala pela necessidade de separar as palavras ao escrevê-las; Fez relação de seu texto com a proposta de escrita: A criança usa o fator de coerência “Intencionalidade” em seu texto;

Registrou suas ideias de forma compreensiva: A criança produz um texto coeso;

Descreveu as características dos personagens da história: A criança conhece a estrutura do gênero contos, que prevê a caracterização dos personagens, e o fator de coerência “Contextualização”;

Apresentou sequência dos fatos (início, meio e fim): A criança conhece a estrutura do gênero contos.

Recorreu a conhecimentos prévios para produzir o texto: A criança usa o fator de coerência “Conhecimento de mundo” (Kock e Travaglia, 2005) em seu texto.

Utilizou parágrafo e ponto final: A criança compreende que o ponto final e o parágrafo são uma representação gráfica.

Com base no entendimento das professoras sobre os descritores apresentarei algumas avaliações que elucidarão a forma como as professoras atribuíram os níveis de aprendizagem a seus alunos no eixo Escrita.

Professora Tereza

Giovana, 6 anos APRENDIZAGEM SITUAÇÃO DA Fez relação som-grafia Consolidada

Empregou diferentes

estruturas silábicas Consolidada Fez segmentação

correta das palavras Consolidada Fez relação de seu texto

com a proposta de

escrita Consolidada

Registrou suas ideias de

forma compreensiva Consolidada Descreveu as

características dos personagens da história

Consolidada Apresentou sequência

dos fatos (início, meio e

fim) Consolidada

Recorreu a conhecimentos prévios para produzir seu texto

Consolidada Utilizou o parágrafo e o

ponto final Em desenvolvimento Quadro 17: Correção da Professora Tereza Eixo Escrita

Figura 5: Texto da aluna Giovana, 6 anos, professora Tereza

ERA UMA VEZ UMA BRUXA UMA FADA. NO CASTELO DO REI COM ELE MORAVA UMA FADA E NO REINO MORAVA UMA BRUXA MAL QUE ELA QUERIA MORAR NO CASTELO DO REI E ELA FASIA DE TUDO PARA O REI E A FADA MORRECE PARA MORAR NO CSTELO E PARA FICAR COM TUDO DO REI. MAS A FADA NÃO DEIXAVA. E A FADA VOAVA PARA VER ONDE A BRUXA IA E O REI ERA MUITO PONZINHO. E AÍ A BRUXA FICOU DOENTE E A FADA SE VITIU DE MEDICO E DEU UM REMEDIO E ELA MOREU! FIM DA HISTÓRIA

O texto da aluna Giovana demonstrou, para sua professora, que ela se encontra em um nível consolidado dos descritores selecionados para esta avaliação. Ela empregou várias vezes em seu texto sinais de pontuação, inclusive o sinal de exclamação. No entanto, a professora considerou como aprendizagem em desenvolvimento, uma vez que ela não utilizou a representação gráfica do parágrafo, conforme previa o descritor.

Enquanto o texto da Giovana apresentou como consolidados quase todos os descritores. Veremos a seguir um texto no qual o aluno se encontrava em nível de desenvolvimento na maioria dos aspectos da escrita avaliados neste instrumento.

Professora Cássia

Guilherme, 6 anos APRENDIZAGEM SITUAÇÃO DA Fez relação som-grafia Consolidada Empregou diferentes estruturas

silábicas Consolidada

Fez segmentação correta das

palavras Não Desenvolvido

Fez relação de seu texto com a

proposta de escrita desenvolvimento Em Registrou suas ideias de forma

compreensiva desenvolvimento Em Descreveu as características dos

personagens da história Desenvolvimento Em Apresentou sequência dos fatos

(início, meio e fim)

Em desenvolvimento Recorreu a conhecimentos prévios

para produzir seu texto Consolidada Utilizou o parágrafo e o ponto final Não Desenvolvido Quadro 18: Correção da Professora Cássia Eixo Escrita