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Eixo II Ações compatíveis com a Escola inclusiva

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.4 Eixo II Ações compatíveis com a Escola inclusiva

Falar sobre inclusão e acolher os alunos provenientes de famílias concebidas como incluídas no padrão cultural, é natural para a escola. No outro extremo, a exclusão de crianças e jovens é ratificada por não se identificarem com a cultura escolar, ou simplesmente, por não terem “conhecimentos prévios” é a fala mais usual. Esse é o caso da violência simbólica da qual fala Bourdieu (2013) que, além de privilegiar os já privilegiados, convence os demais de sua própria culpa diante dos fracassos e exclusões.

A inclusão perpassa pelas várias dimensões humanas, sociais e políticas, e vem gradualmente se expandindo na sociedade contemporânea, de forma a auxiliar no desenvolvimento das pessoas em geral de maneira a contribuir para a reestruturação de práticas e ações cada vez mais positivas: inclusivas, sem preconceitos e discriminação.

Primeiro a gente tem que ter uma consciência de que ela [a escola] é de todos independente da maneira que o outro seja. Então, ela é uma escola de todos e uma escola para todos. A gente tem que ter essa consciência; segundo trabalhando que embora tenhamos características diferentes nós somos iguais enquanto raça humana, enquanto seres humanos e o respeito que é devido a um é também devido ao outro (Willian).

O dia-a-dia de uma escola pode ser o meio de dissipação ou dispersão de atitudes preconceituosas. Ressaltamos que a escola deva ser para todos e todas, mas não igual para todos. Assumir a situação, concebendo que a desigualdade existe é a base para uma mudança de atitude e equiparação dos direitos visando à igualdade de condições. Pois historicamente reconhece-se a existência do preconceito, mas em outros contextos temporais. Ele é visto sempre no passado. Como afirma Schwarcz (2012, p. 30): Todo brasileiro parece se sentir, como uma ilha de democracia racial, cercado de racistas por todos os lados.

A educação inclusiva propõe compreender e aceitar o outro na sua singularidade. Implica mudança de perspectiva educacional e abre horizontes para o desenvolvimento de sociedades mais justas. Dessa forma, pode–se dizer que a educação inclusiva é aceita quando se abandona a ideia de que as crianças devem se tornar “iguais” para contribuir para o mundo. Isso requer a superação da tradicional concepção antropológica de seres humanos ideais, pois como afirma Candau (2003) apresentam-se diversos estilos, crenças, costumes, cores, etnias.

Apontamos que a escola inclusiva não deveria fazer a distinção entre os seres humanos. No entanto, vivemos num mundo de padronizações e estereótipos.

O desenvolvimento de novas relações sociais permitirá, como afirma Cunha Junior (1998), perceber que o racismo, o preconceito e a discriminação são os malefícios que existem tanto na escola como na sociedade em geral, muitas vezes, mascarados e naturalizados e, outras vezes, assumidos explicitamente nas atitudes, nos valores e nas normas vigentes, presentes em nosso cotidiano. Essas manifestações são parte de um processo cruel de dominação, que oprime a cultura dos grupos sociais considerados dominados entre nós, como os negros e os indígenas (entre outros). Nestes termos, cabe a equipe escolar como um todo exercitar os preceitos da Lei 10.639/2003, que assegura que nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira (Art. 26-A, §1º).

O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinente a História do Brasil (BRASIL, 2003).

Nesse sentido, é necessário um trabalho pedagógico voltado para a eliminação do preconceito, o fortalecimento e o resgate da cultura negra para que as escolas brasileiras se tornem um espaço público onde haja igualdade de tratamento e oportunidades. Pensamos que desta forma, é que poderá ocorrer de fato a inclusão do negro nos diversos ambientes que lhe pertencem tanto quanto aos demais, independente da etnia, religião e cultura.

Discutir a igualdade e a diferença e reconhecê-las exigem também refletir e entender a intolerância. A intolerância se manifesta contra aqueles concebidos como os de fora, os inadaptáveis, os incontroláveis, aqueles que são denominados como excluídos. Para a construção de uma escola inclusiva é preciso alguns ingredientes: uma gestão voltada para que as ações realmente aconteçam, perseverança, fé, entusiasmo, superação. Não pode haver

nenhum tipo de discriminação ou preconceito por parte dos que se propõe a eliminá-los. A colaboradora Rosa resume da seguinte forma: “é preciso ter vontade, querer e acreditar que pode dar certo. E o mais importante: ter consciência de que muito já se fez e está sendo feito mais ainda é pouco. A escola precisa se adaptar ao novo contexto”.

Eu acho que todos têm direito a educação. O sol nasce todos os dias pra todo mundo; não nasce só pra mim, só pra você. Eu acho que eles têm direito de estar, sim. Eu acho que o que precisa talvez seja o envolvimento maior das pessoas. As pessoas estão acostumadas a ter tudo muito pronto. E eu costumo dizer que a educação... Ela assim como a educação de filhos ela não tem receita pronta. Só que pra você colocar isso na cabeça dos profissionais hoje é muito difícil. Nós temos um grupo de professores aqui que querem e eles buscam, eles perguntam, eles perseguem e já tem aquele grupo que quer tudo pronto, entendeu, porque já vieram de uma trajetória que se dava tudo mastigado e hoje não é assim. Então, eu acho que a escola ela pode ser inclusiva, ela deve ser inclusiva e a melhor forma dela ser inclusiva é... [através da Lei]. Eu acho que infelizmente, as pessoas só vão entender quando vier assim cumpra-se, entendeu? (Ângela)

Em sua fala, Ângela pondera a importância da lei e a resistência dos profissionais da educação em acatá-la. Por vezes a falta de repertório e de conhecimento é articulador de preconceitos e reproduções de estereótipos. Por isso a fala de Ângela a respeito do envolvimento dos professores e da inexistência de receitas prontas é tão importante. Talvez seja importante aqui também refletir sobre a colocação de Ângela, sobre o “cumpra-se”. Mesmo existindo a lei, parece que alguns professores ainda não entenderam que a lei é para ser cumprida. Neste sentido, pode-se refletir sobre uma questão dos costumes brasileiros, em que as leis são desconhecidas, ou não cumpridas. A Ângela complementa e questiona:

Como eu posso garantir que uma lei seja cumprida ou não? Existe uma fiscalização pra saber se ela está sendo cumprida ou não? Não. Então fica tudo muito no ar, fica tudo muito solto. Vai à cima do bom senso mesmo. De quem está orientando, de quem está na direção da escola. Se acredita, se investe. Então a meu ver ela [a lei] não garante, não. A gente faz por nossa conta porque nós acreditamos.

Por outro lado, o “cumpra-se” remete a uma necessidade de um ato autoritário, vindo de cima para baixo. No entanto, esse não é o caminho esperado para uma educação democrática e cidadã.

Sobre o aspecto da eficácia da legislação, o Leo assegura que a existência da legislação não garante a sua aplicação nas práticas pedagógicas:

A lei, ela dá um bom embasamento, mas só a lei não [garante]. Não basta criar uma lei para falar como deve ser a educação, qual o caminho a se fazer. Acredito que o melhor caminho para ser cumprido é através de informação, conscientização. Você [se refere ao orientador pedagógico] mostrar para os profissionais [que] eles fazem parte, ver que aquilo realmente é importante. Se os professores não virem

significado na lei e porque fazer essa ação, ele não vai fazer. E se for uma coisa muito automática os próprios alunos não vão ter essa consciência. Eu acho que o melhor caminho é a conscientização, é a educação para se reconhecer a importância desse ensino.

A educação inclusiva assinala para a transformação da sociedade. É um processo que se amplia com a participação dos estudantes nesse processo. Trata-se de uma reestruturação da cultura, da prática e das políticas vivenciadas nas escolas de modo que estas respondam à diversidade dos alunos e dos sujeitos que fazem parte de seu cotidiano. Existe grande distância entre o real e o ideal. É imperativo que se perceba que se irá errar muitas vezes e fracassar, mas é necessário ter coragem para reconhecer que errou e seguir em frente. Pois segundo Freire (1989, p. 39) “Todos nós sabemos alguma coisa, todos nós ignoramos alguma coisa, por isso aprendemos sempre. Todos possuem limitações, ninguém é perfeito”.

[...] Desde que as pessoas que nela [escola] trabalham entendam que cada ser humano é único que você não pode padronizar, criar estereótipos para com teu aluno. A partir do momento que a escola entende que a escola existe por causa do aluno e que não existe escola sem o aprendizado e inclusão do aluno, tudo é possível. Eu acho assim... A escola tem que se adequar. Ficar culpando o governo, colocando a culpa no outro, não vai resolver o problema da inclusão. A inclusão existe e os professores têm que fazer a diferença (Léo).

Desejar a inclusão escolar, objetivando também uma sociedade inclusiva, exige a mudança do olhar o ser humano de um modo distinto e pensar com uma lógica diversa da atual, do contrário o projeto de inclusão proposto pela legislação e referendado pelos movimentos de negros pode não acontecer na pratica ou ser realizado pela metade. Sacavino (2012) problematiza sobre “até que ponto estamos socializado não só para tolerar, mas também para aceitar como normais e mesmo endossar as formas existentes de desigualdade racial, o preconceito racial dissimulado e a discriminação velada?” (CANDAU, 2012, p. 17). Quando as lideranças no ambiente escolar não atuam de modo a atacar o preconceito e as discriminações tornam-se coniventes com tal situação.