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CAPÍTULO 3 – O CONCEITO DE CONSUMO SUSTENTÁVEL

3.4 ELEMENTOS DO CONCEITO DE CONSUMO SUSTENTÁVEL

Retomando as lições de Fátima Portilho (2005, p. 138) sobre a existência de grandes dificuldades teóricas em se estabelecer uma relação entre consumo e sustentabilidade e sobre a pouca utilidade para as políticas públicas de conceitos muito amplos ou excessivamente especializados, bem como partindo da percepção do pouco interesse doutrinário pelo estudo do conceito de consumo sustentável, procurou-se extrair os elementos principais das fontes mencionadas, com o intuito de compor uma caracterização básica, ao invés de se propor uma demarcação rígida de limites.

Desta forma, o consumo sustentável:

a. implica justiça no acesso aos recursos naturais, econômicos e sociais para as gerações presentes e futuras;

b. requer formulação e implantação de políticas públicas específicas que envolvam ações coletivas, mudanças políticas, econômicas e institucionais;

c. é conduta ativa no que tange à aquisição de bens e contratação de serviços pouco agressivos ao meio ambiente, seja nos processos de produção, distribuição ou de descarte;

d. é conduta omissiva, no que diz respeito à abstenção da aquisição de bens e contratação serviços agressivos ao meio ambiente, seja nos processos de produção, distribuição ou de descarte;

e. é conduta de consumo que considera o respeito à dignidade da pessoa humana na produção, distribuição ou descarte de produtos e serviços;

adquiridos, de acordo com as instruções previstas nas respectivas bulas, no prazo de até um ano, contado da data de compra, ou prazo superior, se autorizado pelo órgão registrante, podendo a devolução ser intermediada por postos ou centros de recolhimento, desde que autorizados e fiscalizados pelo órgão competente.”

f. demanda a alteração de padrões de consumo sob os aspectos quantitativo e qualitativo, por meio de redução na aquisição de produtos e contratação de serviços, da reutilização e da reciclagem, sempre com atenção à qualidade de vida humana;

g. exige a compreensão de que qualidade de vida não é exclusivamente sinônimo de consumo material;

h. é um dever fundamental de todos, como se verá a seguir.

Sob o risco da redundância, dizer que o consumo sustentável (a) implica justiça no acesso aos recursos naturais, econômicos e sociais para as gerações presentes e futuras remete à constatação de que a busca do equilíbrio na utilização dos recursos demanda não apenas a modificação nos padrões quali e quantitativos, mas também na implantação de modelos de distribuição mais justos, uma vez que superconsumo e subconsumo são causas de degradação ambiental (BIERWAGEN, 2009, p. 189; INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Consumo

sustentável: manual de educação, 2005, p. 20).

Esses modelos (b) requerem a formulação e a implantação de políticas públicas específicas que envolvam ações coletivas, mudanças políticas, econômicas e institucionais, pois a busca pela sustentabilidade é um problema global cuja solução exige muito mais do que meras ações individuais desconectadas (PORTILHO, 2005, p. 133; BIERWAGEN, 2009, p. 189; INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Consumo sustentável: manual de educação, 2005, p. 19).

Além disso, o consumo sustentável (c) é conduta ativa no que tange à aquisição de bens e contratação de serviços pouco agressivos ao meio ambiente, seja nos processos de produção, distribuição ou descarte, porque o consumidor age dinamicamente na compra de produtos ou na contratação de serviços após obter informações ambientalmente favoráveis sobre todos os processos a eles relacionados.

No outro extremo, (d) é conduta omissiva no que diz respeito à abstenção da aquisição de bens e contratação serviços agressivos ao meio ambiente, seja nos processos de produção, distribuição ou descarte, porque o consumidor se mostra

indiferente a tais produtos e serviços no que diz respeito à aquisição ou à contratação.

Adicionalmente, (e) é conduta de consumo que considera o respeito à dignidade da pessoa humana na produção, distribuição ou descarte de produtos e serviços, uma vez que a sustentabilidade pretendida por todos somente pode ser alcançada mediante o cuidado e a atenção com o aspecto social das relações de produção e consumo.

Por fim, o consumo sustentável (f) demanda a alteração de padrões de consumo por meio de redução na aquisição de produtos e contratação de serviços, da reutilização e da reciclagem, sempre com atenção à qualidade de vida humana, visto que ambiciona resolver a questão da escassez e destruição dos recursos naturais.

Consequentemente, (g) exige a compreensão de que qualidade de vida não é exclusivamente sinônimo de consumo material. Como explica André van Hoorn (2007), o bem-estar subjetivo (em inglês, “subjective well-being” – SWB) não se confunde com felicidade, apesar de frequentemente os termos serem utilizados como sinônimos. Em português, fala-se em índice de felicidade interna, mas o SWB, como é internacionalmente conhecido, é formado por dois componentes, a saber: um afetivo e um cognitivo. O primeiro, como o próprio nome indica, constitui uma avaliação guiada pelas emoções e sentimentos, o segundo representa uma apreciação baseada em dados concretos e sua correspondência a um modelo hipoteticamente de ideal de vida:

Especificamente, o SWB é formado por dois componentes distintos (Cf. Diener, 1994: p. 106): uma parte afetiva, que se refere tanto à presença de afeto positivo (AP) quanto à ausência de afeto negativo (NA), e uma parte cognitiva. A parte afetiva é uma avaliação hedônica guiada por emoções e sentimentos, enquanto a cognitiva consiste na apreciação de vida de um indivíduo em comparação à sua correspondência com as expectativas e as semelhanças do que se considera uma vida ideal [Tradução nossa].67

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No original: “Specifically, reported SWB consists of two distinctive components (cf. Diener, 1994: p. 106): an affective part, which refers to both the presence of positive affect (PA) and the absence of negative affect (NA), and a cognitive part. The affective part is a hedonic evaluation guided by emotions and feelings, while the cognitive part is an information-based appraisal of one‟s life for which people judge the extent to which their life so far measures up to their expectations and resembles their envisioned „ideal‟ life.”

O campo de estudo do SWB surgiu há aproximadamente cinco décadas, ao longo das quais foram desenvolvidos inúmeros métodos e escalas com auxílio de profissionais de diversas áreas, principalmente da Psicologia, porém, seus atuais modelos avaliativos se estruturam sobre os pilares do desenvolvimento sustentável (ambiental, econômico e social), os quais vão muito além do consumo material para a plena qualidade de vida. Como exemplo, Van Hoorn (2007) cita o modelo de 2005 do Bureau Federal de Planejamento da Bélgica (“Belgian Federal Planning Bureau”) que distingue: (i) o capital humano (saúde mental e física, conhecimento e habilidades e bem-estar material); (ii) o capital ambiental, que compreende o acesso aos recursos naturais e à biosfera com toda a sua diversidade biológica e; (iii) o capital econômico, subdividido em físico (equipamentos, edifícios e infraestrutura) e tecnológico (ativos intangíveis, como software e tecnologia).

Quanto ao último elemento do conceito, José Geraldo de Brito Filomento (2009, p. 268) já adiantou que o consumo sustentável constitui um dever do Estado, dos fabricantes e inclusive dos consumidores, mas como se verá a seguir, trata-se de um tipo especial de dever, (h) um dever fundamental de todos.

CAPÍTULO 4 – O DEVER DE CONSUMIR DE MODO SUSTENTÁVEL E O