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Em que consiste a estratégia presidencial de centralização de estruturas formais de

O que é esse movimento estratégico de centralização de estruturas formais de assessoramento empreendido pelos presidentes para contornar problemas informacionais? Os desenvolvimentos da teoria da agência, dos estudos sobre tomada de decisão e dos estudos sobre a presidência institucional oferecem indicativos sobre o que é essa estratégia e como ela opera para mitigar problemas informacionais.

Os diversos estudos desenvolvidos nessas áreas convergem no entendimento de que os problemas informacionais, provocados pelos fatores políticos e contextuais abordados nas seções anteriores, incentivam os presidentes a adotarem estratégia administrativa com o objetivo de manter o comando político do Executivo em suas mãos.

A teoria da agência considera que “é racional para o mandante mitigar esses problemas por meio de controles hierárquicos e monitoramento” (MOE, 1984, p. 761). Sob essa perspectiva, o mandante investirá em mecanismos de controle hierárquicos, em especial em sistemas de informação (como conselhos de administração, por exemplo), a fim de controlar os agentes e contornar os problemas informacionais (EISENHARDT, 2015).

Esses mecanismos de controle hierárquicos estão em sintonia com o contexto organizacional em que os gestores públicos estão inseridos (MOE, 1984). No caso brasileiro, o

contexto organizacional coloca à disposição dos presidentes poderes administrativos que permitem criar, redesenhar e extinguir unilateralmente estruturas como agências, ministérios, conselhos, etc., atribuindo padrões organizacionais com tamanho, duração, composição e localização que atendam aos seus interesses e lhes permitam o controle dos seus agentes (art. 61 CF88).

Os estudos sobre tomada de decisão apontam que para solucionar problemas informacionais, os presidentes costumam recorrer a estratégia de criação de estruturas formais e informais de assessoramento (THOMAS, 1970), cuja finalidade é prover conselhos e informações ao presidente, garantindo-lhe o controle sobre a tomada de decisão do governo.

Essas estruturas se diferenciam em alguns aspectos. As estruturas formais dizem respeito à criação de estruturas formalizadas de assessoramento, com funções pré-estabelecidas, e que podem assumir diferentes formatos institucionais: conselhos, grupos de trabalhos, forças-tarefas, comitês, comissões etc. (THOMAS, 1970).

Outras estruturas consistem na criação de grupos informais ad hoc. Estes grupos também são conhecidos pela literatura como kitchen cabinets (BAKVIS, 1997; ARAYA, 2012), círculos

de hierro (SIAVELIS, 2014), invisible presidency e inner circle (THOMAS, 1970). Segundo

Thomas (1970), no caso norte-americano, estes grupos “tendem a ser compostos por alguns membros-chave da equipe da Casa Branca, um ou dois membros do gabinete que gozam da confiança especial do Presidente e, ocasionalmente, alguns amigos pessoais do Presidente” (THOMAS, 1970, p. 560 tradução minha).

Na América Latina, os presidentes também recorrem a estruturas informais. O trecho abaixo, extraído de uma entrevista do ex-presidente da Nicarágua, Enrique Bolaños, demonstra como essas estruturas operam.

Yo tenía tres grupos de consejeros. En uno estaban los miembros de mi gabinete, un grupo multisectorial donde llevé gente que representaba todos los puntos de vista y servía de colador de opiniones. Tenía otro grupo de opinión que yo convocaba, de amigos selectos que me daban opiniones con patriotismo. Tengo todas las minutas con las cosas que me recomendaban. El tercer grupo era un ‘kitchen cabinet’, con el que nos reuníamos tres veces al mes, y ahí veíamos el panorama total, me orientaban en política y estrategia, entonces salían tópicos de todo. Yo me apoyaba mucho en mis asesores (BOLAÑOS, 2011 apud ARAYA, 2012, p. 41).

Por seu turno, os estudos sobre a presidência institucional, recentes na América Latina, mas já bastante desenvolvidos nos Estados Unidos, ocupam-se das condições organizacionais das quais

os presidentes dependem para exercer suas prerrogativas institucionais (INÁCIO, LLANOS, 2016).

A Presidência Institucional refere-se ao grupo de agências que apoiam diretamente o chefe do executivo (MOE, 1993; MOE, WILSON, 1994). Essas agências são parte da burocracia do Poder Executivo e podem ser criadas pelos presidentes, ou transferidas para dentro da Presidência, por um movimento conhecido como centralização (MOE, 1985; 1993; 2000). A característica definidora delas é que operam sob a autoridade direta do presidente e são responsáveis por apoiar a liderança presidencial (DICKINSON, 2005).

Essas agências podem ser classificadas em core, advisory e policy, isto é, centro presidencial, assessoramento presidencial e unidades políticas, respectivamente (INÁCIO, 2012). Para cada uma delas cabe o apoio aos presidentes. Em especial, o assessoramento presidencial, também conhecido como advisory network (BONVECCHI; SCARTASCINI, 2011), é responsável pelo assessoramento no processo de tomada de decisão e por fornecer subsídios para áreas consideradas como prioritárias.

Os estudos sobre a Presidência na América Latina indicam que o tipo de governo cria incentivos para a ampliação da presidência institucional. Explorando as condições sob as quais as presidências institucionais em seis países latino-americanos (dentre eles o Brasil) evoluíram ao longo das últimas décadas de governo democrático, Inácio e Llanos (2015) identificam que o número de agências na Presidência cresce quando aumenta o número de partidos no gabinete. O que “demonstra que os presidentes precisam ampliar sua base de apoio organizacional quando a equipe governamental está internamente fragmentada” (INÁCIO, LLANOS, 2015, p. 542 tradução

minha).

As autoras não analisam quais são as agências que mais crescem dentre os três tipos (core, advisory, policy) que constituem a presidência institucional. Contudo, o estudo oferece indicativos de que os presidentes têm incentivos para centralizarem na Presidência, sob sua autoridade direta, estruturas formais de assessoramento com a finalidade de contornar os problemas informacionais decorrentes da composição multipartidária do governo (INÁCIO, LLANOS, 2016). Assim,

Apesar dos presidentes serem os atores políticos mais poderosos nas democracias latino- americanas, eles necessitam do apoio político e da assistência técnica de confiança de assessores, pessoal técnico e agências governamentais para exercerem suas funções (INÁCIO; LLANOS, 2016, p. 40 tradução minha).

Dessa forma, a expansão da presidência institucional é entendida hoje como ferramenta integrante da toolbox presidencial, responsável pelo suporte organizacional e informacional dos presidentes (INÁCIO, LLANOS, 2016).

As evidências sobre a presidência institucional na América Latina convergem com os achados sobre a Presidência norte-americana. Rudalevige (2002) aponta que quando os custos de transação envolvidos na produção das políticas pela burocracia e/ou pelo poder legislativo são altos, os presidentes norte-americanos têm incentivos para centralizar, fortalecendo a Presidência como estrutura que garante suporte informacional e administrativo à definição das políticas presidenciais. Dickison (2005) corrobora esses achados argumentando que o crescimento da presidência institucional nos Estados Unidos está, em parte, associado à busca dos presidentes por fontes de informação para reduzir a incerteza de barganha.

Assim, as três perspectivas - teoria da agência, estudos sobre tomada de decisão presidencial e presidência institucional - convergem em que, para lidar com os problemas informacionais que surgem na condução do governo, os presidentes tendem a adotar como estratégia de assessoramento (1) a criação de estruturas formais assessoramento e/ou (2) a centralização dessas estruturas Presidência.

Para identificar, portanto, as estruturas formais de assessoramento centralizadas pelos presidentes brasileiros, a análise desenvolvida aqui se volta para as EFAPs (Estruturas Formais de Assessoramento Presidencial) que os presidentes criam ou transferem para a Presidência da República. Essas EFAPs, que compreendem todas aquelas estruturas subordinadas diretamente à Presidência da República e criadas por dispositivos legais, cuja finalidade é fornecer informações e conselhos aos presidentes, minimizando os problemas informacionais enfrentados por eles e auxiliando-os na tomada de decisão, constituem-se no referente empírico da análise aqui desenvolvida.

Vale esclarecer que olhar para as estruturas formais não significa ignorar a possibilidade de que os presidentes brasileiros também recorram a estruturas informais de assessoramento. Estudá- las, no entanto, exige um modelo analítico diferente daquele utilizado para a compreensão das estruturas formais.