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Os presidentes brasileiros contam com um toolbox, isto é, uma caixa com ferramentas como poder de agenda, prerrogativas orçamentárias, poderes partidários, poderes de nomeação e instituições informais (CHAISTY, CHEESEMAN, POWER, 2012). Essas ferramentas lhes permitem coordenar suas ações com as dos ministros e garantir a manutenção da coalizão de governo (RAILE, PEREIRA, POWER, 2010).

Dentre tais ferramentas, a politização e as substituições ministeriais, em especial, têm potencial de auxiliar os presidentes a reduzir as dificuldades de acesso e controle da informação decorrentes dos fatores políticos e contextuais descritos acima.

Contudo, a adoção dessas ferramentas no contexto brasileiro implica altos custos e, diante deles, é esperado que os presidentes recorram a uma estratégia mais pontual, porém mais complexa, para obter o acesso e controle da informação relativa às policies e a política, qual seja, a centralização de estruturas formais de assessoramento.

Nas duas subseções a seguir, procuro mostrar brevemente como (1) a politização e as substituições ministeriais têm potencial para auxiliar os presidentes a mitigar os problemas informacionais; e (2) como, devido aos altos custos que implicam, podem acabar dando lugar à centralização de estruturas formais de assessoramento.

A politização

A politização é uma estratégia que permite aos presidentes diminuir a assimetria informacional em relação a seus agentes e alcançar maior controle das informações pertinentes às

policies. Essa estratégia consiste na nomeação de pessoas leais e ideologicamente alinhadas ao

presidente para posições cruciais nas agências, departamentos e ministérios (MOE, 1985). A ideia central da politização é “garantir que importantes decisões burocráticas sejam colocadas nas mãos de agentes presidenciais, ou que pelo menos sejam diretamente supervisionadas e monitoradas por eles” (MOE, 1993, p. 370 tradução minha).

Moe (1993) defende que essa é uma estratégia imperialista - “extending the turf of the presidential team by infiltrating alien territory” (MOE, 1993, p. 370) – adotada pelos presidentes para lidar com os obstáculos que a separação de poderes coloca ao exercício da liderança presidencial.

Uma faceta da politização, explorada em governos parlamentaristas de coalizão, é a nomeação de ministros juniores, também conhecidos como watchdogs (THEIS, 2001). Trata-se de agentes intermediários entre os ministros e a burocracia, com preferências divergentes dos ministros correspondentes, cuja função é monitorar qualquer comportamento dentro dos ministérios que destoe das preferências do chefe do Executivo.

Nos sistemas presidencialistas, a nomeação de secretários executivos (SEs) equivale aos

watchdogs. Os SEs ocupam a segunda posição na hierarquia de comando das pastas ministeriais e,

por esse motivo, podem monitorar e até influenciar as decisões do ministro (PEREIRA et al., 2015). Dessa forma, como os ministros gozam de assimetria informacional a seu favor no que tange a sua pasta, a nomeação de SEs leais que monitorem as atividades da pasta é uma forma pela qual os presidentes podem reduzir essa assimetria (PEREIRA et al., 2015).

No entanto, a politização envolve custos. Lewis e Gallo (2011) examinam, por exemplo, a relação entre politização e desempenho de programas federais nos Estados Unidos a partir dos dados do Program Assessment Rating Tool (PART) de 1.016 programas federais. Os achados dos autores sugerem que a politização, embora seja uma importante fonte de capital político para o presidente, tem impacto negativo sobre o desempenho da administração federal. Portanto, o primeiro custo da politização é a seleção de nomeados leais, porém incapazes de exercer com primazia a função que lhes foi designada.

O segundo custo da politização está relacionado ao controle presidencial sobre tais nomeados: os nomeados podem ser cooptados e passam a perseguir os objetivos dos ministros e/ou da burocracia e não os objetivos do presidente; ou então, podem procurar estabelecer uma base de poder independente e usar essa autonomia para promover seus próprios objetivos em detrimento do presidente. Em cada caso, o resultado é uma erosão da confiança entre o presidente e o agente (LINK, 2002).

Além disso, a nomeação de leais representa um risco para a institucionalização da desconfiança (RUDALEVIGE, 2009), isto é, para a garantia de que informações suficientes e oriundas de múltiplas fontes cheguem ao presidente permitindo-o avaliar informações conflitantes e preservar seu direito de escolha sobre decisões importantes. Em outras palavras, a seleção de nomeados leais aumenta o que o auxiliar de Lyndon Johnson, Harry McPherson (1988 apud RUDALEVIGE, 2009, p. 178 tradução minha) chamou de "o perigo da parcialidade ou omissão que resulta da dependência da informação recebida através do filtro das convicções de outros homens".

No Brasil, os custos da politização para os presidentes estão além daqueles apontados pela literatura internacional. Isso porque, no Brasil, as nomeações presidenciais são também consideradas bens de troca, sujeitos a diversos critérios de divisão, com a finalidade de ajustar

barganhas menores dentro da coalizão de governo (RAILE, PEREIRA, MULLER, 2010; PRAÇA, FREITAS, HOEPERS, 2011; LOPEZ, PRAÇA, 2015; BORGES, COÊLHO, 2015).

Diante disso, no Brasil, a politização perde parte de seu potencial como auxílio para contornar os problemas informacionais provocados pela composição multipartidária do gabinete. Por isso, espera-se que, de forma alternativa à politização, os presidentes recorram a centralização de estruturas formais de assessoramento, uma estratégia pontual voltada, exclusivamente, para a coleta, sistematização e fornecimento de informações com vistas a obter o acesso e controle da informação relativa às policies.

As substituições ministeriais

As substituições ministeriais, por seu turno, são apontadas como estratégias centrais dos presidentes latino-americanos para lidar com os choques externos, funcionando como “válvulas de segurança” (safety valve) utilizadas pelo governo para se ajustar às mudanças nas circunstâncias políticas e econômicas (MARTÍNEZ-GALLARDO, 2014).

Segundo Martínez-Gallardo (2014), as substituições ministeriais, amparadas pelos poderes de nomeação presidencial, permitem que os presidentes mudem as políticas, mudando os indivíduos encarregados de formulá-las, além de ajudá-los a ajustar sua coalizão de apoio, dando- lhes um recurso que pode ser usado em suas negociações com outros atores. A autora demonstra que há forte associação entre a presença de choques externos e a mudança e a duração de gabinetes em governos multipartidários (MARTÍNEZ-GALLARDO, 2014).

Contudo, o uso dessa ferramenta envolve custos como, por exemplo, a seleção de nomeados qualificados, respeitados em suas áreas e que tenham apoiadores da oposição. O caso argentino representa um bom exemplo desses custos.

No ano de 2001, a economia argentina, que já estava em recessão havia dois anos, entrou ainda mais em crise. O mercado de ações despencou e o presidente Fernando de la Rúa reagiu substituindo o ministro da Economia, José Luis Machinea, por Ricardo López Murphy, considerado o economista mais ortodoxo próximo a De la Rúa. Apesar de sua qualificação, o novo ministro não logrou apoio político para seu plano de reforma e foi logo substituído por Domingo Cavallo (que por cinco anos foi ministro da Economia no governo de Carlos Menem). Domingo Cavallo possuía não só o conhecimento necessário, como também tinha poderosos apoiadores na

oposição, feita pelo Partido Justicialista, cujos votos no Congresso eram essenciais (MARTÍNEZ- GALLARDO, 2014).

No Brasil, além desses custos, as substituições ministeriais também estão sujeitas à dinâmica da coalizão, o que fragiliza sua potencial contribuição para mitigar os problemas informacionais provocados por choques externos. É esperado, portanto, que para lidar com os problemas informacionais provocados por esses fatores, os presidentes brasileiros recorram também à estratégia alternativa de assessoramento.

A estratégia de centralização de estruturas formais de assessoramento equivale, então, a um caminho mais complexo e excepcional daquele da politização e das substituições ministeriais. Caminho pouco explorado na América Latina, através do qual os presidentes podem lidar pontualmente com os problemas informacionais advindos dos fatores políticos e contextuais discutidos aqui.

2.6 Em que consiste a estratégia presidencial de centralização de estruturas formais de