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A tentativa de compreender a energia presente na natureza se confunde com a história da ciência. O estudo do movimento dos objetos e os conceitos relacionados, tais como força e energia, formam o campo da física conhecido como mecânica. A força exerce um papel fundamental na descrição do deslocamento e também pode ser descrita em função de outra grandeza, a energia, que é uma grandeza conservativa. A lei de conservação de energia é especialmente valiosa quando se trata de sistemas com muitas variáveis, nos quais o entendimento detalhado do sistema de forças é um problema de difícil solução, como o encontrado na escavação de uma estaca (Silva & Camapum de Carvalho, 2010).

Outro conceito que está diretamente relacionado à energia é o trabalho realizado. Energia e trabalho são duas grandezas escalares e, portanto, sem direção associada. A universalidade do conceito de energia torna possível, por exemplo, entender como a energia mecânica produzida por um motor é transformada em energia cinética e potencial, que, por sua vez, é dissipada por atrito (calor) ou som, ou seja, garante que, mesmo que haja mudanças de forma, a energia total é uma constante. Fisicamente o trabalho descreve o que é realizado pela ação de uma força, sendo definido como sendo o produto da intensidade do deslocamento multiplicada pela força

paralela ao deslocamento. Para Young & Freedman (2008), outra forma de energia associada a um objeto é a energia potencial, que depende basicamente da posição e configuração do sistema. Se a energia se conserva, pode-se dizer que esta energia ficou acumulada em termos de energia potencial gravitacional, que depende apenas da posição do objeto relativo ao centro da Terra. Neste contexto, define-se potência como a razão temporal em que o trabalho foi realizado, por exemplo, a potência mecânica de uma máquina hélice contínua traduz a sua capacidade de escavação por unidade de tempo.

Outro importante princípio é o de Hamilton, que parte do conceito da energia conservativa, em que a energia não pode ser criada ou destruída, apenas transformada. O princípio de Hamilton pode ser aplicado ao caso de carregamento de qualquer sistema, em equilíbrio estático ou dinâmico e, particularmente ao sistema estaca–solo. Lembra-se, ainda, da primeira lei da termodinâmica, segundo a qual, em qualquer transformação de energia seu valor absoluto se conserva, ou seja, a energia não pode ser criada ou destruída, mas apenas transformada.

Baseado no princípio de Hamilton, Aoki (1997) definiu o conceito de energia complementar a partir de análises da curva carga versus recalque obtida durante uma prova de carga estática (Figura 2.5a). A energia complementar (Vc) tende para um valor constante quando a energia de deformação total (V) e o recalque (S) tendem para o infinito, ou seja, a análise da variação da energia de deformação complementar com o carregamento permite saber quão próximo se encontra a ruptura, uma vez que a taxa de variação deste parâmetro tende a zero quando a capacidade de reação do sistema ensaiado se extingue. Ainda, segundo Aoki (1997), após a descarga em prova de carga estática, a região representada na Figura 2.5a por Wq é o trabalho realizado para a deformação permanente Sp, e a região representada por Ve é a correspondente à energia de deformação elástica que, na prática, não é significativa para pontas de estacas assentes em solos homogêneos.

Aoki (1997; 2000) apresentou formulação revisada para determinar os valores de energia potencial (Vs), energia complementar (Vc), energia de deformação elástica (Ve) e o trabalho realizado (W) pela parcela estática das forças, durante uma prova de carga dinâmica. Segundo o autor, foi possível calcular valores mais condizentes com a curva Resistência estática mobilizada (R) versus Deslocamento máximo (D), representados na Figura 2.5b.

Para o carregamento estático cíclico, Aoki (1997) apresentou a Figura 2.6 e verificou que as formas das curvas são parecidas. Isso porque se assumiu que não há mudança nas condições

iniciais de cada ciclo do ensaio e, no caso, a curva carga versus recalque do ciclo de maior carregamento é a envoltória das curvas carga versus recalque dos ciclos de carga de menor carga.

(a) (b)

Figura 2.5 – a) Curva carga versus recalque no ensaio de carregamento estático, Aoki ( 1997); b) Diferença entre o modelo ideal e o modelo “real” ( Aoki, 2000).

Figura 2.6 - Prova de carga cíclica crescente (Aoki, 1997).

Na prova de carga estática em que se medem apenas a carga (Q) e o recalque (s), a energia de deformação imposta ao sistema é uma terceira variável de grande valia na definição da carga de ruptura do sistema composto pela a estaca e o solo. No ensaio de carregamento estático, atinge-se o valor da carga Q em estágios de carga crescentes (ΔQ) a partir de um estágio de carregamento inicial Qi que provoca acúmulo de energia de deformação no sistema (ΔVD),

resultando no deslocamento crescente do ponto de aplicação da carga. Estes deslocamentos são referidos ao topo da estaca que se mantém continuamente pressionado contra o sistema de reação da prova de carga. Deste ensaio, resulta a curva carga versus recalque da prova de carga. A reação ou resistência do solo é numericamente igual à carga aplicada, enquanto a área sob a curva carga versus recalque é numericamente igual à energia de deformação acumulada

pelo sistema estaca-maciço de solo. Considera-se que a energia de deformação complementar é o terceiro parâmetro que pode caracterizar a carga última. A análise de sua variação com o carregamento permite saber quão próximo se encontra a ruptura, uma vez que a taxa de variação deste parâmetro se anula quando a capacidade de reação ou resistência do sistema atinge um valor extremo (Aoki, 1997). Esta vantagem torna-se patente no caso do ensaio de carregamento dinâmico de energia cinética crescente, em que a medida desta energia faz parte da rotina do ensaio.

Reese (1972), apud Aoki (1997), propôs o abandono do conceito de carga última de ruptura e a adoção da forma da curva carga versus recalque como melhor parâmetro de medida do comportamento de uma estaca.

A partir do princípio de Hamilton, Odebrecht (2003) demonstrou que, após o golpe do martelo, no momento em que todas as energias cinéticas e elásticas já foram absorvidas, a variação da energia potencial do sistema martelo-haste é igual à variação do trabalho efetuado por forças não conservativas, ou seja, o trabalho efetivamente realizado pode ser calculado através da penetração do amostrador no solo, consequentemente pode-se calcular o valor da força dinâmica média, que atua no momento da cravação do amostrador. Conhecendo esta força, Lobo et al. (2009) apresentaram um novo método de previsão de capacidade de carga de estacas, desenvolvido com base na interpretação de resultados de ensaios SPT. Ao contrário de outras metodologias consagradas na prática de engenharia, de natureza essencialmente empírica, a nova abordagem foi baseada em conceitos da dinâmica e faz uso dos princípios de conservação de energia envolvidos na cravação do amostrador SPT. A energia absorvida pelo solo foi calculada a partir do número de golpes NSPT (ou diretamente da medida

correspondente à penetração do amostrador) e convertida analiticamente em uma força dinâmica de reação à penetração. Esta força permitiu determinar as resistências unitárias mobilizadas no amostrador SPT e estimar as resistências unitárias mobilizadas na estaca. Segundo Lobo et al. (2009), a metodologia é simples e apresenta vantagens em relação a métodos empíricos, pois o uso de diferentes equipamentos e procedimentos utilizados, resultantes de fatores locais e grau de desenvolvimento tecnológico regional, não interfere no método, se a eficiência de cada sistema de SPT for devidamente aferida, pois a energia transmitida pelo sistema martelo-haste-amostrador é função do tipo de solo e, portanto, o método captura a influência do solo na previsão da capacidade de carga da estaca.