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CAPÍTULO 2 O TRABALHO INFANTIL NO BRASIL

2.3 O ENFRENTAMENTO DO TRABALHO INFANTIL NO BRASIL: ações dos

Segundo Costa (1994), a sociedade e o Estado brasileiro conviveram com a problemática da exploração da mão-de-obra infantil, antes dos anos oitenta, pacificamente. O Ministério do Trabalho era inexpressivo diante da problemática. Coloca o autor:

A fiscalização do Ministério do Trabalho teve uma atitude tímida e inexpressiva diante do problema. Os sindicatos eram totalmente absorvidos pelas lutas corporativas [...]. As ONG´s voltadas para o atendimento da população infanto-juvenil, por seu lado, preocupavam-se apenas com ações típicas de atendimento direto, evitando enveredar-se pela discussão de questões políticas e sociais de maior envergadura.” (COSTA, 1994, p. 47).

A questão do trabalho infantil não foi, de fato, na década de 1980 uma prioridade na agenda dos movimentos sociais nem na do governo, de modo que se conservou na Carta Constitucional de 1988 e no ECA, a proibição do trabalho para menores de 14 anos, idade estabelecida pela CLT de 1934.

Contudo, em 1990, “contra [...] o aumento abusivo dos problemas relacionados ao trabalho infantil e, na impossibilidade de encaminhar medidas para minorar o problema em nível nacional”, a Associação Gaúcha dos Inspetores do

trabalho (AGITRA)56, denuncia aos organismo internacionais, incluse a OIT, a omissão do governo brasileiro em relação à questão:

Na 77ª Reunião da Conferência Internacional do Trabalho da OIT, a AGITRA apresentou dados que denunciaram a presença indiscriminada de crianças trabalhadoras na condição de escravas, tanto como a negligência dos organismos governamentais do país. (OIT, 2003, p. 36).

No mesmo período outras denúncias semelhantes apontaram a presença de crianças, inclusive de 4 anos, ajudando na extração de matérias primas, como consta na publicação do Jornal Zero Hora do dia 25 de outubro de 1990:

Cerca de 200 famílias estão trabalhando em regime de escravidão na localidade de Paquete, interior de Capela de Santana (RS), com crianças de até 4 anos ajudando na extração de acácia, mulheres e homens sem carteira assinada, inexistência de água encanada, luz, banheiros, esgotos, assistência médica, escolas ou qualquer estrutura mínima para subsistência. (Jornal Zero Hora, 25/10/90, apud OIT, 2003, p. 36).

Em nível internacional, um ano antes da denúncia da AGITRAA, em 1989, o Jornal norte-americano Footwear News denuncia ao mundo que no Brasil, mais especificamente no Vale dos Sinos, Rio Grande do Sul, “20% da mão de obra utilizada na indústria de calçados é constituída por menores que trabalham em condições que comprometem a saúde pelo contato direito com a cola usada na confecção de sapatos.” (Revista Cep, 1991, p. 27 apud CARVALHO, 2000, p. 24).

Em resposta a essas denúncias e ao aumento das taxas de trabalho infantil que passou de 6.9 milhões, em 1980, para 8.8 milhões, em 1992, conforme dados do Pnad57, a OIT, em 1992, implanta o Programa de Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC) no Brasil, marco de referência no combate ao trabalho da criança no país, após a assinatura do Memorando de Entendimento entre o governo brasileiro e a OIT.

56 Posteriormente denominada Sindicato Nacional dos Agentes da Inspeção do Trabalho (SINAIT). 57 Dados contestados pela OIT conforme citação: “Essas quantidades seriam maiores se fossem incluídas as crianças entre 5 e 9 anos de idade, que em 1981 somavam 14.8 milhões de pessoas e em 1992 chegavam a 16.8 milhões [...]. Considerando-se esses fatores, é possível estimar uma diferença constante e positiva no número de crianças e adolescentes trabalhadores da ordem de aproximadamente 3 milhões de crianças, elevando a população infantil trabalhadora de 6.9 milhões para 9.9 milhões, em 1980, e de 8.8 milhões para 11.8 milhões de trabalhadores infantis em 1992

Criado em 1991 pela OIT, com o apoio do governo alemão, o IPEC, fundamento nas convenções concernentes ao trabalho infantil, tem como objetivo "apoiar os países a restringir progressivamente o trabalho infantil e a regulamentá-lo com vista a sua eliminação definitiva.” (OIT/IPEC, 1992-1996, p. 6).

No Brasil, de acordo com a OIT (2003, p. 1), as diretrizes estratégicas adotadas pelo IPEC seriam marcadas pelo “caráter interinstitucional do programa, incluindo entidades do Governo Nacional, Estadual e Municipal, a participação direta de entidades sindicais (CUT, CGT e Força Sindical), empresariais (CNI, CNT)58 e organizações não-governamentais”.

A partir dessas representações, em 1992, o IPEC cria o Comitê Nacional de Direção – embrião do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI) – dando início, através dele, às ações de combate ao trabalho infantil no Brasil, as quais podem ser resumidas em quatro eixos temáticos: mobilização e sensibilização social; capacitação de lideranças e agentes dos governos, sindicatos e ONGs; implementação de projetos de prevenção e eliminação do trabalho infantil; investigação sobre o trabalho infantil e “consolidação de espaço/canal de fluição de propostas de decisões políticas co-participantes entre governo, empregadores, trabalhadores em ONGs.” (CARVALHO, 2000, p. 32).

Todavia, embora o governo federal tenha aderido ao IPEC e se feito presente no Encontro Mundial de Cúpula pela Criança, em 1990, nos Estados Unidos, ocasião em que assinou a Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, Proteção e Desenvolvimento da Criança, no que trata da erradicação do trabalho infantil até 1996 a sua postura foi apenas de “um participante-espectador”. É tanto que “foram as centrais sindicais, parte do empresariado e as ONGs que assumiram as ações fomentadas pelo IPEC, em seu primeiro momento.” (CARVALHO, 2000, p. 36).

Quanto às centrais sindicais, de acordo com Carvalho (2000), são os sindicatos que introduziram em primeira instância a questão do trabalho infantil na pauta de luta do movimento social em defesa dos direitos da criança. Dessa feita, é válido ressaltar a citação:

Por isso a CUT [...] em se tratando da criança e do adolescente cabe a nós articularmos os sindicatos para esta discussão, a fim de que o tema também seja pauta nas negociações dos contratos coletivos, já que o numero de meninos e meninas empregados ou

subempregados em empresa é muito grande. Além disso, meninos e meninas de rua são filhos e filhas da classe operária. Atualmente, após duras lições apresentadas pela história, estamos cientes de que numa sociedade tão complexa como a nossa, na qual um dos sustentáculos principais é a ideologia, não basta a leitura dos fatos. É preciso a formulação de propostas concretas sobre o meio ambiente, o negro, a educação, a mulher, o menor e outros temas anteriormente secundarizados pelo sindicalismo (ANDRADE; MOTTA, 1991).

Sob esse olhar, provavelmente embasadas no pensamento de Marx (1868) de que os direitos das crianças teriam que ser defendidos pela sociedade, uma vez que elas não podiam fazê-lo, as Centrais Sindicais, sobretudo a CUT, Contag, CCT e a Força Sindical, iniciam, a partir de 1992, uma pesquisa de “rastreamento dos focos de trabalho infantil, assim como, de conscientização dos trabalhadores sobre as implicações do trabalho precoce como produtor de sequelas bio-psicossociais e, de negação à criança do direito à educação”. (CARVALHO, 2000, p. 24).

Convém, também mencionar que em 1992 foi expedida a primeira ação cível movida por um Promotor de Justiça do Estado de São Paulo, proibindo o trabalho infantil na zona canavieira de Sertãozinho, município de São Paulo. Esse acontecimento, segundo Carvalho (2000), mobilizou usineiros famílias e trabalhadores contrários à ação cível, de tal modo que produziu “uma primeira e duradoura sinergia” no combate ao trabalho infantil entre o Fórum DCA, sindicatos, universidades, empresários, em particular a Fundação Abrinq, a mídia impressa e televisiva, entre outros organismos.

No que diz respeito ao Fórum DCA, Segundo Carvalho (2000), somente no final de 1992, com incentivo do IPEC é que o Fórum introduz na sua pauta de ações o combate ao trabalho infantil, destacando-se, nesse sentido, a busca de aprovação da Emenda Constitucional (aprovada em 16 de dezembro de 1998) que proibia o trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos.

Dada a ausência de uma instância que possibilitasse a articulação dos diferentes setores da sociedade e evitasse a duplicação de esforços na busca da solução do problema do trabalho infantil, em 1994 é criado o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI) com o apoio da OIT e da UNICEF, tendo como objetivo “propiciar uma instância aglutinadora e articuladora de agentes sociais institucionais, envolvidos com políticas e programas de promoção de

medidas destinadas a prevenir e erradicar o trabalho infantil no Brasil” (OIT, 2003. p 36).

De acordo com Carvalho (2000), o FNPETI imprime aos programas de prevenção e erradicação do trabalho infantil, até então existentes, um caráter inovador e eficaz, uma vez que:

• Introduz uma parceria permanente entre governo e sociedade civil nas decisões e na própria implementação e avaliação das ações;

• Introduz a complementaridade de esforço entre as três esferas do governo: federal, estadual e municipal;

• Introduz o caráter multissetorial ou transetorial aos programas (trabalho, educação, assistência social, saúde...). (CARVALHO, 2000, p. 35)

Ainda, de acordo com a citada autora, o FNPETI se destaca por envolver na luta pela prevenção e erradicação do trabalho infantil toda cadeia produtiva implicada nas atividades econômicas de produção, principalmente do carvão, sisal e cana-de-açúcar.

Para Marin (2010, p. 8), o motivo que levou o setor agroindustrial a se incorporar à luta de prevenção e erradicação do trabalho infantil foi a crescente pressão internacional, exposta “nas contínuas ameaças e boicotes às mercadorias produzidas com o aviltamento do valor da força de trabalho” das crianças; e o interesse das empresas em vincular a sua imagem a uma visão mais humanitária de desenvolvimento, em favor dos direitos sociais dos excluídos.

Nesse sentido, com o objetivo de estimular o compromisso das empresas para a não utilização do trabalho infantil e contribuir para a formação das crianças e capacitação profissional dos adolescentes a Fundação Abrinq59, maior representante do empresariado, em 1995 cria o Programa Empresa Amiga da Criança60.

59 A Fundação Abrinq foi criada em fevereiro de 1990 pela Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedo. Ela se define como uma instituição de direito privado, sem fins lucrativos, com a finalidade principal de “defender os direitos da criança em conformidade com as normas nacionais e internacionais”.

60 Para a Fundação Abrinq, a Empresa Amiga da Criança é aquela que não explora economicamente a força de trabalho infantil e desenvolve ações ou projetos de apoio à formação das crianças e à capacitação de adolescentes (ABRINQ, 2006).

Para concretizar tais objetivos a Fundação Abrinq, segundo Marin (2010), estabelece três estratégias fundamentais, a saber:

• Cria o selo “Empresa Amiga da Criança”;

• Realiza campanha pela inclusão de pactos e de cláusulas sociais nos contratos públicos e privados, de compra e venda de bens e serviços, para impedir a circulação de produtos e serviços com uso do trabalho infantil; • Fortalece a capacidade normativa e fiscalizadora das instituições do Estado e

da sociedade civil por meio de mobilizações sociais.

O selo Empresa Amiga da Criança é um diferencial concedido para as empresas que não exploram a mão de obra infantil nem são clientes de instituições que exploram; já as cláusulas sociais nos contratos de comércio e de trabalho são compromissos assumidos pela empresa, no sentido de combater a exploração do trabalho infantil na cadeia produtiva em que atuam, não adquirindo bens e/ou serviços de outras empresas que por ventura tenham utilizado o trabalho de crianças ou de adolescentes. (MARIN, 2010).

Contudo, a política de ação do setor agroindustrial não apontou nenhum programa alternativo que pudesse compensar a renda perdida pelas crianças ao serem retiradas do trabalho. “Nenhuma ação foi encaminhada para favorecer a permanência das crianças nas escolas, para desenvolver programas de capacitação e aprendizagem profissional para os jovens, para apoiar programas de renda mínima familiar.” (MARIN, 2010, p. 13).

Compondo ainda o conjunto de denúncia nesse período, em 1995 a matéria publicada na revista Veja, de 30 de agosto de 1995, intitulada "O Suor dos Pequenos", denuncia a exploração de mão de obra nas redes de fast food, nas indústrias de calçado, na colheita, no transporte manual de feixes e na moenda de sisal (em jornadas de até 12 horas diárias) entre outras atividades. (FRANÇA; CARVALHO, 1995).

Com a finalidade de apurar a denúncia feita pela Revista Veja, em 1994 é instalada a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Congresso Nacional. A CPMI efetuou 29 reuniões, colheu 51 depoimentos, realizou audiências públicas e diligências nos Estados do Rio Grande do Sul, Ceará, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul, além de inspeções acerca da execução do Programa Criança

Cidadã, da Secretaria de Assistência Social do Ministério da Previdência e Assistência Social, nos Estados de Pernambuco e Mato Grosso do Sul. (Relatório Final da CPMI, 1998).

Ao término das investigações, comprovadas as denúncias a CPMI conclui o Relatório com a seguinte afirmativa:

A maior causa do trabalho infantil, no Brasil, procede da excessiva pobreza da população. Grande parte das famílias nordestinas vive na condição de indigência, cuja marca registrada é a subalimentação existente em toda a região e, em especial, na Zona rural localizada no Polígono da Seca. Segundo a DRT/RN, do total das famílias do Estado, 46% são consideradas indigentes. A complementação da renda familiar representa, seguramente, o principal fator responsável pelo encaminhamento das crianças e dos adolescentes ao trabalho. A renda gerada pelo trabalho dessa mão-de-obra é significativa, quando não essencial, para a subsistência da família. (BRASIL. RELATÓRIO FINAL DA CPMI, 1998, p. 143).

Vale destacar que a pobreza que acometia as famílias, sobretudo as nordestinas, na década de 1990 é acentuada pelo efeito da “década perdida” - e pelos primeiros sinais do ajuste econômico introduzido no país pelo governo Fernando Collor.

Outras organizações que assumiram a luta pela erradicação do trabalho infantil, nessa época, foi o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR), a Agência de Noticias de Direito da Criança (ANDI) e o Projeto Axé, em Salvador e a CONANDA. Essa última realizou, em 1997, a II Conferência Nacional dos Direitos da Criança, tendo entre seus eixos temáticos a exploração da mão de obra infantil.

Ainda, contra a exploração da mão de obra infantil pode-se destacar o Tribunal Nacional Contra o Trabalho Infantil, realizado em 1995, em Brasília, e o Tribunal Internacional Contra o Trabalho Infantil (Segunda Sessão), realizado em 1999, em São Paulo61.

O Tribunal Nacional Contra o Trabalho Infantil (1995) veio responder ao apelo da Conferência de Dacar Contra o Trabalho Forçado e Infantil, realizada em janeiro de 1995, em Bangladesch, uma vez que para a Conferência “quanto maiores as

61 O Brasil também se fez presente no Tribunal Internacional Independente contra o Trabalho Infantil, ocorrido em 1996, no México.

conquistas dos trabalhadores, quanto mais o movimento operário se desenvolve, menor é a extensão da exploração do trabalho infantil”.

Assim, visando a ascensão da classe trabalhadora e a consequente erradicação do trabalho infantil, o Tribunal Nacional Contra o Trabalho Infantil (1995) declara: “nossas crianças precisam de escolas para aprender. Escola e não fábricas, não lanchonetes, não supermercados, não trabalho no campo, não os bancos, não às guarda-mirins, onde as crianças são exploradas a pretexto de tirá-las da ociosidade das ruas”. Ao final, decide o Tribunal:

• Condenar como crime de lesa-humanidade a exploração do trabalho infantil. • Condenar e denunciar a toda sociedade brasileira os beneficiários deste

crime – o grande capital nacional, como o setor sucro-alcoleiro, e internacional, como o japonês, francês, alemão e italiano nas siderúrgicas de Minas Gerais. Todos que auferem lucros na cadeia produtiva, empregando direta ou indiretamente a mão de obra infantil. Todos os que se beneficiam do rebaixamento do custo do trabalho.

• Condenar e denunciar os responsáveis por toda esta situação, pela manutenção e expansão da exploração do trabalho infantil. O Executivo, que com sua política, amplia a situação de miséria do povo. O Legislativo, que aprova leis que permitem que se amplie o emprego de crianças, como o retrocesso em relação ao limite máximo de admissão ao emprego, aprovado em 1988. A Justiça, que se omite em aplicar leis protecionistas, como ocorre freqüentemente no Brasil, no sentido de coibir a exploração de crianças. • Condena os que, pela conivência com esta praga que se alastra em todos os

estados da federação, em todos os ramos da economia concorrem para a exploração das nossas crianças e adolescentes (Tribunal Nacional Contra o Trabalho Infantil, 1995, p. 222-223).

Na mesma linha de pensamento, o Tribunal Internacional Independente Contra o Trabalho Infantil (Segunda Sessão), realizada em São Paulo, nos dias 21, 22 e 23 de maio de 1999, considerando que a exploração da mão de obra infantil se constitui uma progressão desejada, planificada e organizada, consideram:

• São culpadas as multinacionais que estendem o trabalho terceirizado no labirinto do setor informal, na agricultura, nas “zonas francas”, nas “maquiladoras”, nas oficinas que escapam a qualquer regulamentação do trabalho. Nós acusamos as multinacionais que, no quadro de negociações internacionais, tais como o MAI (Tratado Multilateral sobre Investimentos) e

outras, procuram se dotar de plenos poderes para aniquilar todas as regulamentações nacionais ou internacionais do trabalho.

• É culpado o FMI que, em acordo com os governos, impõe em todos os países, planos sobre planos de ajuste estrutural, a destruição dos serviços públicos, em primeiro lugar da escola, da educação, da saúde.

• É culpado o Banco Mundial que através da concessão de empréstimos, exige a implantação de reformas educacionais que retiram dos estados a condição de formuladores de políticas educacionais, transformando a escola em campo de ação do capital privado.

• São culpados a OMC (Organização Mundial do Comércio), a OUA (Organização da Unidade Africana) a ONU e as Cúpulas ditas “sociais”, tal como aquela de Copenhague, cuja orientação permanente confessa é a demolição das Convenções da OIT (Organização Internacional do Trabalho). • São culpados os tratados de livre comércio, tais como o NAFTA (Tratado de

Livre Comércio da América do Norte), a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), o Mercosul (Mercado Comum da América do Sul), o CARICOM (Caribe) e APEC (Comunidade Econômica da Ásia-Pacífico), que organizam em escala regional, e de continentes inteiros a destruição de milhões de empregos, a desregulamentação do trabalho, a destruição da previdência social.

• É culpada a União Européia, cuja diretiva de 22 de junho de 1994, por exemplo, elaborada contra a opinião dos especialistas da OIT, autoriza explicitamente o trabalho infantil de 13 a 14 anos, especialmente através dos estágios e outras formas de “escola-empresa”, e até trabalhos perigosos ou noturnos a partir dos 15 anos.

• São culpados os governos que, ao longo dos últimos três anos, planificaram e organizaram o aumento do trabalho infantil.

Ainda, se pronuncia o Tribunal pela defesa da Convenção 138 da OIT que dispõe sobre a idade mínima para admissão ao emprego, e pela sua ratificação por todos os Estados que ainda não o fizeram, e pela sua aplicação efetiva por todos os estados que a ratificaram. Nessa perspectiva cobra dos governos ações que assegurem a efetiva erradicação do trabalho infantil e o cumprimento do Art. 2 da referida convenção que estabelece a idade mínima de 15 anos para o ingresso no mercado de trabalho.

No Brasil, “é somente em 1995”, ano da realização do Tribunal Nacional Contra o Trabalho Infantil, “e mais particularmente em 1996”, que o governo brasileiro “assume a postura de participante ativo e protagonista” no combate ao

trabalho infantil ao criar as Comissões Estaduais de Combate ao Trabalho Infantil (1995) e o Programa de Ações Integradas – PAI (1996), posteriormente transformado no Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI (1996). (CARVALHO, 2000, p. 36)

Criada em 1995, no âmbito das Delegacias Regionais do Ministério do Trabalho, as Comissões Estaduais de Combate ao Trabalho Infantil, inicialmente realizaram um Diagnóstico Preliminar dos Focos do Trabalho Infantil “com base nesse Diagnóstico, as equipes de fiscalizações selecionaram focos em que o trabalho infantil apresentava-se de forma mais crítica, para que, em seguida, fossem reforçadas as ações de combate àquele trabalho”. (BRASIL. TRABALHO INFANTIL: questões e políticas, 1998, p. 31).

Neste sentido, vislumbra-se na agenda do governo brasileiro o compromisso com a erradicação do trabalho infantil:

O combate ao trabalho infantil é, para o Governo brasileiro, uma questão de direitos humanos. O tema está na agenda da política social do país, constituindo um desafio tanto para o governo quanto para a sociedade. No entanto, a responsabilidade principal da política, legislação, estratégias e ações orientadas a eliminar o trabalho infantil é missão governamental62. (BRASIL. Trabalho Infantil

no Brasil: questões e políticas, 1998, p. 9).

Assim, contando com o apoio do governo federal, de posse de um vasto acervo sobre a exploração do trabalho infantil no país, em 1996 o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), entendendo “que seria necessário atuar simultaneamente em vários campos: saúde, educação, promoção social, meio ambiente e geração de trabalho e renda”, sob a coordenação do Ministério do Trabalho, implementa o Programa de Ações Integradas (PAI) nas carvoarias do Estado Mato Grosso do Sul. (FNPETI, 2003, p. 14), “onde a serpente botou o seu derradeiro ovo”.63

O PAI tinha por objetivo retirar as crianças do trabalho, sobretudo das atividades mais degradantes, e inseri-la na escola. Para isso contou com a

62

Discurso do Ministro do Trabalho, Dr. Paulo Paiva; perante a Conferência Internacional sobre o Trabalho Infantil realizada em Oslo, Noruega, entre 27 e 30 de outubro de 1997.

63 Expressão da presidente do sindicato dos trabalhadores rurais de Ribas do Rio Pardo (Mato Grosso do Sul), Iracema Ramalho do Vale, se referindo ao inferno ao qual eram submetidas as crianças trabalhadoras das carvoeiras do Mato Grosso do Sul.

concessão de um auxílio financeiro às famílias denominado Bolsa Criança Cidadã, também conhecido por Vale Cidadania, no valor de R$ 50,00; em contrapartida as