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Enoturismo no Vale dos Vinhedos: Contexto Histórico e Atratividades

1 TURISMO: TIPOLOGIAS, MOTIVAÇÕES E ATRATIVOS TURÍSTICOS

1.4 Enoturismo no Vale dos Vinhedos: Contexto Histórico e Atratividades

A religiosidade sempre esteve fortemente presente entre os imigrantes italianos. Em cada comunidade que se formava no Vale dos Vinhedos, a primeira construção era uma capela ou igreja. Ergueu-se a primeira capela do Vale em 1880, construída em pedra bruta e coberta por pequenos pedaços de tábua que foi mantida assim até 1928, quando foi substituída pela construção atual, denominada Capela das Almas.

Já no início do século XX foi construída a Capela Nossa Senhora das Neves. Sua construção aconteceu num período de intensa seca que durou cerca de dois anos. Segundo a história, os moradores decidiram utilizar o vinho estocado das safras anteriores na preparação da argamassa para a construção da Capela. Assim, no decorrer do tempo, outras capelas surgiram, iniciando um processo de colonização do vilarejo. O roteiro turístico Vale dos Vinhedos preserva, até hoje, vários capitéis que traduzem a religiosidade do povo que colonizou a região.

Com a criação, no ano de 1995, da Aprovale, atualmente a região preocupa-se em desenvolver estrategicamente as 24 vinícolas associadas e 23 associados não produtores de vinho, como hotéis, restaurantes, fabricantes de produtos artesanais, dentre outros. A Aprovale, inserida no Vale dos Vinhedos, visa o desenvolvimento e incentivo à pesquisa vitivinícola; o desenvolvimento de ações que promovam a organização do espaço físico do Vale dos Vinhedos, promovendo estudos e agindo junto às autoridades competentes para a elaboração de leis atentas ao atendimento deste objetivo; o estímulo e a promoção do potencial turístico da região, bem como o aprimoramento sócio-cultural dos associados, seus familiares e da comunidade; e preservação e proteção à Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos (IPVV).

Em 1997, a Aprovale, contando com a parceria da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Uva e Vinho e da Universidade de Caxias do Sul (UCS), iniciou o processo de obtenção da Indicação Geográfica, considerando a entrada em vigor da Lei de

Propriedade Industrial (LPI), nº 9.279/96, cujos artigos 176 a 182 tratam desta temática com profundidade. Esta lei regula direitos e obrigações relativos à Propriedade Industrial e nela as Indicações Geográficas no Brasil, as quais indicam aos consumidores que determinados produtos e/ou serviços possuem características especiais relacionadas com o local de procedência (PIMENTEL, 2005).

Com esses dispositivos legais, a região avançou no sentido de poder reconhecer e qualificar Indicações Geográficas próprias. Estabeleceram-se os limites do Vale, uma visão de sua topografia, de suas condições topoclimáticas e um levantamento semi-detalhado de seus solos11. Com isso, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), responsável pelos registros de marcas e das Indicações Geográficas no Brasil, autorizou, em 2001, o uso da IPVV pela Aprovale (Fig. 7).

Figura 7: Selo de Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, RS12. Fonte: Aprovale.

A Indicação de Procedência (IP) garante determinada qualidade, reputação, tradição ou outras características que podem ser atribuídas a essa origem geográfica e, no caso particular do Vale dos Vinhedos, vários critérios devem ser rigorosamente seguidos pelas vinícolas para poderem utilizar a IPVV nos seus vinhos ou espumantes. O regulamento da IPVV contempla critérios de produção, de elaboração, de rotulagem dos produtos, de competências do conselho regulador, direitos e obrigações dos inscritos na IPVV, como também as infrações, penalidades e procedimentos para tais.

Conforme informado no Anuário Brasileiro da Uva e do Vinho (Vencato et al., 2007, p. 31) a Indicação de Procedência é um instrumento de competitividade, no qual “considera-se Indicação de Procedência (IP) o nome geográfico – do país, da cidade, da região ou da localidade do seu território – que se tenha tornado conhecido como sendo centro de extração, produção ou fabricação de determinado produto ou de prestação de determinado serviço”.

A partir desta conquista, as vinícolas associadas à Aprovale passaram a encaminhar anualmente seus vinhos para que estes obtenham o Certificado de Indicação de Procedência e

11 Estudo elaborado por pesquisadores da Embrapa e da Universidade de Caxias do Sul, que resultou no livro Vale dos Vinhedos: Caracterização Geográfica da Região, 1999.

o Selo de Controle para os vinhos amparados pela IPVV, criando-se, assim, um diferencial nos vinhos fabricados na região. Além de ter sido pioneira na conquista de Indicações Geográficas (IG) no segmento de vinho e espumantes, a região do Vale dos Vinhedos teve, no ano de 2007, o reconhecimento pela União Européia, o que garante a facilidade em exportação dos produtos13 em longo prazo, como também incremento de vendas internas e o aumento do fluxo de visitantes na região.

Para o ano de 2008, a Aprovale busca uma Indicação Geográfica do tipo Denominação de Origem (DO) para os vinhos e espumantes produzidos na região. A Denominação de Origem irá garantir que a qualidade ou as características dos produtos e/ou serviços se devem essencial ou exclusivamente a um meio geográfico específico, incluindo os fatores naturais e humanos. Portanto, esta Denominação de Origem irá proteger o terroir14 do meio geográfico. Para sua obtenção é necessária a descrição dos processos ou métodos de obtenção, devendo ser locais, leais e constantes. Com mais este diferencial, podem ser citados alguns benefícios, tais como: preservação da identidade regional do produto ou serviço, diferenciação dos demais produtos e de similares, facilita a identificação do consumidor e permite a fidelização, facilita a negociação junto ao mercado vitivinícola, agrega valor ao produto ou serviço protegido e estimula o desenvolvimento econômico local.

No Quadro1 podem-se visualizar as fases de desenvolvimento da vitivinicultura e do enoturismo na região da Serra Gaúcha, utilizando como base os estudos de Tonietto (2003).

1° Fase 2° Fase 3° Fase 4° Fase

Período

1870 a 1920 1930 a 1960 1970 a 1990 2000 em diante

Geração de

vinhos 1ª geração 2ª geração 3ª geração 4ª geração

Estágio da Diversificação Incremento da qualidade Identidade para o

vitivinicultura Implantação de produtos e especialização vinho brasileiro

Visitar vinhedos Exposições Visita a vinícolas Associações e roteiro

Características e cantinas agroindustriais em áreas urbanas integrado do vinho

do familiares na Festas Degustação Visita a vinícolas comerciais

enoturismo época da enogastronômicas de vinhos Hospedagem e gastronomia

vindima no meio rural

Quadro 1: Fases da vitivinicultura e do enoturismo na Serra Gaúcha. Fonte: Base de estudo de Tonietto (2003).

13 Segundo dados obtidos em Vencato (et al., 2007, p. 46) os países que mais importam os produtos brasileiros são: República Tcheca, França e Itália.

14 O “terroir” de uma região é a junção harmoniosa entre solo, clima, topografia e o conhecimento humano (SANTOS, 2006).

Através desta análise percebe-se com clareza que, a partir da terceira fase de desenvolvimento da vitivinicultura e do enoturismo, ocorreram significativas mudanças no Vale dos Vinhedos no que se referem às propriedades agrícolas da região. Houve um afastamento dos jovens em busca de novas oportunidades de trabalho nas cidades vizinhas e, em contrapartida, um incremento de novos empreendedores administrando negócios familiares, como também novos empreendimentos voltados à vitivinicultura e ao turismo. Citamos, como exemplo, a Vinícola Miolo e o Hotel Villa Michelon.

Smith (1995) identifica diversos critérios que caracterizam uma região turística: a) a região deve possuir características culturais, físicas e sociais que criam uma sensação de identidade regional; b) a região deve dispor de infra-estrutura turística adequada para garantir o desenvolvimento do setor; c) a região deve ser maior do que a comunidade e possuir mais de uma atração ou ter potencial para o desenvolvimento de novas atrações para oferecer ao turista; d) a região deve ter um órgão de planejamento turístico e iniciativas de marketing para coordenar seu desenvolvimento; e) a região deve ser acessível para um deslocamento por terra, mar ou pelo ar.

Sendo assim, cada destino turístico tem um ou mais produtos para oferecer aos turistas (RUSCHAMNN, 1990). Cabe aos destinos turísticos definirem quais são os atrativos que realmente podem competir nos mercados regionais, nacionais e até mesmo nos internacionais.

Atualmente a Rota Enoturística Vale dos Vinhedos oferece ao visitante diversas atratividades, onde o visitante tem a liberdade de elaborar seu próprio roteiro para a visita, escolhendo o percurso que deseja fazer e os atrativos que deseja visitar, conforme pode ser visualizado através da Figura 8:

Figura 8: Rota Enoturística Vale dos Vinhedos, RS. Fonte: Folder do Vale dos Vinhedos.

ƒ Vinícolas: atratividade potencial do roteiro por ser em maior número, aproximadamente 32 vinícolas. Oferecem ao turista visitação guiada no interior da vinícola, degustação de vinhos, espumantes e suco de uva e ainda a visitação aos parreirais. Existem vinícolas familiares e comerciais, como também de pequeno, médio e grande porte, devido sua infra-estrutura e quantidade de produção de vinhos.

ƒ Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos (IPVV): diferencial que a região possui para proteger a reputação dos produtos certificados, neste caso os vinhos e espumantes da região.

ƒ Paisagem: é típica de uma região vitivinícola, podendo ser encontrados, além dos parreirais, outros elementos marcantes como os plátanos, as araucárias e a vegetação nativa.

ƒ Capelas e capitéis: são cinco as capelas encontradas no roteiro, além de vários capitéis que podem ser visualizados ao longo do percurso no Vale dos Vinhedos. ƒ Gastronomia: são encontrados restaurantes, queijarias, cafeteria e a Casa de Madeira

onde o turista pode adquirir suco de uva, geléias e outros produtos artesanais. ƒ Artesanato: a região possui dois ateliers com a venda de artesanato local.

ƒ Trilha ecológica: para quem quiser fazer uma atividade de ecoturismo no meio aos parreirais.

ƒ Hospedagem: hotel, pousada e um Spa do Vinho (bandeira Accor) são atrações completas, pois possuem, além da hospedagem, restaurantes, atividades de lazer e saúde e um Memorial do Vinho com painéis temáticos, fotos, textos e mapas, contando a história do vinho no Rio Grande do Sul, no Brasil e no mundo.

ƒ Eventos: Festa da Vindima em janeiro, fevereiro e março; Festival do Quentão, em junho; 1º Maratona do Vinho15, que ocorreu na segunda quinzena de janeiro de 2007, período que antecedeu a abertura da Fenavinho 2007.

Porém, para que os produtos de uma região se sustentem, é preciso que se construa uma imagem do local, que pode ser definida por Kotler (1994, p. 151) “como a soma das crenças, das idéias e impressões que as pessoas têm dele”. Deste modo, a imagem de uma cidade ou destinação turística pode ser projetada para que seja percebida pelos consumidores, tornando-

15 A Maratona do Vinho foi planejada utilizando como exemplo a maratona do vinho da região do Médoc, na França, que é uma região produtora de vinhos e a corrida é realizada nas estradas em meio aos vinhedos.

se uma imagem de marca. Isto vem sendo explorado no Vale dos Vinhedos através da propaganda em mídias como revistas especializadas sobre viagens, turismo e vinho, em jornais da região, na televisão através de matérias relacionadas e novelas de épocas.

Petrocchi (1998) defende a importância de um planejamento turístico e afirma que, no caso de um produto turístico, o planejamento deve ter como objetivo despertar desejos de compra e/ou de conhecer a região; assim, essa atratividade viria a assegurar receitas e, por meio delas, a sobrevivência do sistema turístico local ou da região.

Além do aumento do número de visitantes na região a cada ano, em 2006 a área de vinhedos plantados no Vale dos Vinhedos chegou a 87.792 hectares, com incremento de 16,99% em relação a 2005.

A Tabela 1 permite visualizar o aumento significativo quanto ao número de visitantes entre os anos de 2001 e 2007. Esses dados permitem identificar que o Vale dos Vinhedos é um destino enoturístico relevante para o desenvolvimento da região como um todo.

Tabela 1: Fluxo turístico do Vale dos Vinhedos, RS.

Fluxo Turístico Vale dos Vinhedos

Ano Numero visitantes

2001 45.000 2002 60.000 2003 82.000 2004 102.000 2005 115.737 2006 105.617 2007 120.962

Fonte: Dados estatísticos disponibilizados pela Aprovale

Atualmente, o Rio Grande do Sul é o maior produtor de uvas do País, com 54,2% do total, sendo que 90% da uva é transformada em vinhos, sucos e derivados. Isto mostra um aumento de área de cultivo em relação a 2006 em 12,09%, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)16.

É pertinente que a região turística possua um Plano Diretor, a fim de regulamentar e planejar a área rural e urbana do município, promover suas potencialidades num âmbito econômico, político e sócio-cultural e incentivar e ampliar roteiros turísticos sustentáveis17 e

16 Informação obtida em Vencato (et al., 2007, p. 9).

17 Entende-se como turismo sustentável a definição de Swarbrooke (2000, p. 19) de “formas de turismo que satisfaçam hoje as necessidades dos turistas, da indústria do turismo e das comunidades locais, sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazerem suas próprias necessidades. [...] Significa turismo que é

de forma responsável18, tanto para a comunidade local, para o meio ambiente e para as gerações futuras.

O Plano Diretor de Bento Gonçalves está em processo de construção e verificação e, conforme o Estatuto das Cidades, (Lei Federal 10.257/01) deve abranger todo o território do município, incluindo a área urbana e rural; englobando, portanto, a região em estudo, o Vale dos Vinhedos. Este Plano Diretor deverá ser um caminho em prol da preservação da paisagem local, contendo diretrizes que limite a construção e a urbanização desordenada e insustentável na região.

Para que este planejamento efetivamente aconteça é fundamental a participação da comunidade19 em conjunto com os órgãos competentes e os empreendedores locais, a fim de estudarem políticas adequadas e eficazes a serem tomadas.

Dentro desta conjuntura, conhecer o consumidor é fundamental para um planejamento estratégico e para a segmentação de mercado (SWARBROOKE & HORNER, 2002). O comportamento do consumidor é a chave de sustentação para que se possa desenvolver, promover e vender um produto turístico, por isso à importância em identificar qual (is) atrativo (s) desperta (m) atenção deste consumidor20.