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Parte II – PROJETOS DESENVOLVIDOS

2. Ostomia

2.1. Enquadramento

Ostomia corresponde à técnica cirúrgica em que se cria, intencionalmente, uma abertura designada estoma, que permite a comunicação de um órgão (geralmente traqueia, estômago, intestino ou bexiga) com o exterior ou com outro órgão [71]. Os estomas são criados fundamentalmente com o objetivo de drenar excreções, que diferem consoante o tipo de ostomia, sendo que também podem ter a finalidade de permitir a alimentação do doente quando a via oral se encontra impedida [72]. Diversas patologias podem conduzir à necessidade de realização de uma ostomia, sendo as mais referidas o cancro colorretal, doença diverticular e distúrbios inflamatórios do trato gastrointestinal, tal como a doença de Crohn e colite ulcerosa [71, 72]. O estoma é, regra geral, construído na parede abdominal, havendo comunicação com o intestino delgado, cólon ou ureteres. Este pode ainda estar localizado na traqueia, adquirindo a designação de traqueostomia. No entanto, os tipos de ostomia mais comuns são as digestivas e as urinárias. No que concerne às ostomias digestivas, estas adquirem uma designação diferente conforme o segmento envolvido, como descrito na Tabela 8.

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Tabela 8: Tipos de ostomias digestivas. Retirado de [72].

Colostomia

Jejunostomia

A colostomia e a ileostomia têm como objetivo a drenagem do conteúdo fecal enquanto que, por outro lado, a jejunostomia e a gastrostomia apresentam como finalidade a alimentação e nutrição do doente [72].

Diferentes tipos de ostomias conduzem a diferentes tipos de efluentes, que variam de acordo com a etapa em que o processo de digestão foi interrompido. Desta forma, na colostomia o efluente é sólido ou semissólido, dependendo da capacidade de absorção de água ainda existente. Por sua vez, na ileostomia o efluente é líquido, contínuo e altamente corrosivo devido à elevada concentração de enzimas envolvidas na digestão. Na urostomia, o efluente é igualmente líquido e altamente irritante para a pele. Desta forma, são indicados diferentes dispositivos ou conjuntos de dispositivos médicos para cada situação [73]. Outra condicionante para a seleção adequada do material de ostomia a utilizar é o tipo de estoma. Idealmente, este será saliente, sobressaindo na parede abdominal. Neste caso, o doente deve ter apenas o cuidado de adaptar adequadamente o penso protetor cutâneo ao estoma, prevenindo fugas de efluente. No entanto, existem estomas que exigem maior cuidado, nomeadamente os planos e retraídos. Os primeiros são nivelados com a superfície do abdómen, podendo resultar da retração de um estoma saliente ou da própria técnica cirúrgica selecionada pelo médico. Já os estomas retraídos, como o próprio nome indica, encontram-se abaixo do nível da superfície da pele, sendo que a retração pode ocorrer devido a um processo de cicatrização interna, oscilações de peso pós-cirurgia, entre outros. Em ambos (estomas planos e retraídos), o objetivo é preencher e nivelar as pregas e proeminências da superfície abdominal e usar uma placa convexa que exerce uma leve pressão em redor do estoma, aumentando a sua protusão. Assim, através da criação de uma superfície plana e da utilização de um penso protetor cutâneo convexo pretende-se melhorar a aderência do dispositivo, diminuindo a probabilidade de ocorrência de fugas de efluente [74].

Sintetizando, é necessário ter os seguintes aspetos em consideração aquando da seleção do material de ostomia: natureza dos efluentes, tipo de estoma, grau de sensibilidade da pele periestomal, conforto do doente e a sua atividade profissional. Os sistemas coletores podem ser constituídos por uma única peça, em que o penso protetor cutâneo e o saco coletor estão associados ou, por outro lado, estes podem estar separados tratando-se de sistemas de duas peças. Os primeiros são recomendados em doentes com a pele periestomal em boas condições e quando se realizam até três substituições do dispositivo por dia. Já os sistemas de duas peças são aconselhados em doentes com a pele sensível e quando os efluentes são muito irritantes (ileostomias e urostomias), já que permitem a troca do saco coletor sem remoção do penso cutâneo. Por outro lado, estes sistemas são desaconselhados em doentes com dificuldades de manuseamento, uma vez que o penso cutâneo e o saco coletor estão ligados por um sistema de aros de conexão, cuja montagem pode constituir um obstáculo. No que concerne especificamente aos sacos coletores, estes podem ser fechados, indicados para casos em que o efluente é sólido ou semissólido (colostomias), ou abertos / drenáveis com ou sem torneira incorporada. Os sacos drenáveis sem torneira são indicados em casos de ileostomias ou de fezes líquidas (diarreia) e os que possuem torneira estão reservados para

Íleo Ileostomia

Segmento envolvido Designação

Estômago Gastrostomia

Jejuno Cólon

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urostomias. Estes sacos, uma vez drenados, permitem a reutilização, representando menores custos para o doente (Anexo 21) [75]. Com o objetivo de evitar a acumulação de gases no saco, este pode também estar equipado com um filtro com carvão ativado, permitindo a saída dos gases e a eliminação dos maus odores através da adsorção das partículas odoríferas por parte do carvão. Esta particularidade é especialmente relevante em caso de colostomia [75].

2.1.1. Situação em Portugal

Segundo a Associação Portuguesa de Ostomizados, estima-se que em Portugal existam cerca de 20 mil ostomizados [76]. Em 2017, assistiu-se a uma importante alteração no panorama nacional no que concerne ao universo dos ostomizados, com a aprovação da Portaria nº 284/2016. Esta estabelece o regime de comparticipação dos dispositivos médicos e material de apoio aos doentes ostomizados visando, assim, um acesso facilitado aos mesmos, contribuindo para o aumento da qualidade de vida e reinserção social destes doentes. Na portaria referida consta uma lista dos dispositivos comparticipáveis, bem como das condições de comparticipação [77]. Inicialmente, como descrito no artigo 3.° da portaria, o valor de comparticipação por parte do Estado era de 90 % do PVP máximo fixado, no entanto, este valor passou a 100 % após aprovação da Portaria n.º 92-F/2017 [78]. Foi também definido pelo diploma legal que a prescrição destes produtos é realizada exclusivamente por via eletrónica, salvo as exceções previstas, e que a sua dispensa é efetuada nas farmácias comunitárias. A aprovação e entrada em vigor desta portaria foi um marco nacional, impactando positivamente a vida de todos os doentes ostomizados que, até então, usufruíam de uma comparticipação pelo Serviço Nacional de Saúde de 90 % até ao limite de 400 escudos (que corresponde a 2 €) nas bolsas de colostomia e ileostomia. A comparticipação, prevista no Despacho n.º 25/95, do Ministério da Saúde, publicado no D.R. II Série, n.º 213, de 14-09-1995, era francamente insuficiente face aos preços de mercado das bolsas e acessórios. Os doentes ostomizados deparavam-se, então, com duas opções: ou se deslocavam aos centros de saúde onde tinham acesso a dispositivos médicos e acessórios mais económicos, mas que nem sempre eram os mais adequados à sua condição, ou recorriam às farmácias onde eram cobrados os preços de mercado. Neste último caso, os doentes tinham ainda de requerer o reembolso da comparticipação no centro de saúde. O processo de reembolso era, por vezes, moroso e irregular, representando uma situação incomportável para muitas famílias [79].

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