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Enquadramento teórico: a Dermatite

PARTE II – PROJETOS DESENVOLVIDOS DURANTE O ESTÁGIO

2. A ÇÃO DE FORMAÇÃO INTERNA SOBRE D ERMATITE

2.1. Enquadramento teórico: a Dermatite

A dermatite é uma condição médica caraterizada pela ocorrência de inflamação cutânea, não grave e não contagiosa, que se manifesta de formas diferentes: dermatite atópica (DA) ou eczema atópico, dermatite de contacto (DC), dermatite seborreica, entre outras35,36. Em Portugal, as estimativas apontam para uma incidência de cerca de

10% em crianças até aos 12 anos de idade e entre 2 a 8% em adultos, apresentando- se com tendência para o aumento destes valores37,38. Muitas esta patologia encontra-

se associada a um historial pessoal ou familiar de doenças respiratórias como asma e rinite alérgica, para além do historial familiar de atopia que parece influenciar o aparecimento da mesma37.

A sintomatologia é marcante a nível físico, mas também tem impacto psicológico e socioeconómico. O incómodo causado por esta condição causa perturbações no sono destas pessoas, que por sua vez pode afetar o aproveitamento escolar ou a produtividade laboral39,40. Também não pode ser descartado o estigma social causado

por uma patologia cutânea crónica que pode levar a experiências sociais negativas que certamente afetam a saúde mental dos doentes39.

É importante para um farmacêutico perceber as várias formas em que a dermatite afeta a vida dos utentes e, para tal, é necessário perceber a fisiopatologia da doença e

34 as várias formas de tratamento, farmacológico e não farmacológico, para que se possa ajudar e aconselhar da melhor forma.

2.1.1. Fisiopatologia da Dermatite

A inflamação que define a dermatite pode evoluir de forma crónica ou aguda, com intensidade que também pode variar com o tempo. Na origem desta patologia podem estar envolvidos fatores endógenos ou agentes externos que podem ou não atuar simultaneamente e que determinam a intensidade do eczema37.

No geral, a sintomatologia carateriza-se pelo aparecimento de um eritema na pele acompanhado de ruborização, comichão e algum inchaço36. Dada a natureza

inflamatória pode existir a acumulação de líquido purulento que pode levar ao desenvolvimento de borbulhas que podem rebentar formando feridas que agravam a dermatite35,41. Estes processos fisiopatológicos fazem com que nestes casos, a pele

seja muito mais suscetível a infeções virais, bacterianas ou fúngicas35.

Os vários tipos de dermatite são a DA, a DC, a dermatite seborreica, a dermatite da fralda, dermatite de estase, dermatite perioral e neurodermatite36. Dado o

enquadramento prático deste projeto, apenas foi dado maior destaque aos tipos de dermatite abordados na ação de formação, sendo eles a DA e a DC.

2.1.2. Dermatite atópica

A DA, ou eczema atópico, é uma patologia de pele de evolução crónica caraterizada por períodos de crises com periodicidade variável. Estas crises são caraterizadas por secura extrema e irritação da pele e prurido intenso nas zonas afetadas35,37,38. A localização do eczema varia com a idade do doente: no adulto as

zonas do corpo mais afetadas são a face, o pescoço, as regiões flexoras dos joelhos e cotovelos e as extremidade superiores e inferiores; na criança entre os 3 meses e os 2 anos são a face, os membros superiores e inferiores de um modo mais geral, e o couro cabeludo as regiões em que o eczema mais incide, poupando no entanto a zona da fralda38.

Há maior tendência de aparecimento da DA em crianças e nestas, a patologia é mais complicada porque tendem a coçar mais as zonas afetadas, o que agrava a sintomatologia37. As causas não estão completamente definidas, mas sabe-se que há

uma predisposição genética que se manifesta na composição lipídica e proteica da barreira cutânea, para além de estar associada a um historial de atopia na família, asma ou alergias37,42. Pode também haver envolvimento do sistema imunitário no

desencadeamento da DA devido à exposição alergénios ou por processos autoimunes37.

35 Na DA verifica-se uma alteração estrutural ao nível da barreira cutânea, nomeadamente ao nível de lípidos, tais como as ceramidas, e de proteínas como a filagrina43. Devido a esta desorganização verifica-se maior perda de água

transepidérmica levando à desidratação da pele e despoletando uma crise de secura extrema e o processo inflamatório caraterizado pelo aparecimento de prurido, comichão e irritação que propagam e agravam o dano à pele44. Associado a este processo podem

estar agentes exógenos que podem permear a barreira cutânea e agravar a inflamação devido à incapacidade da pele em defender-se destes agentes e à ativação da resposta imunológica44. Alguns fatores que causam o desencadeamento ou agravamento de

uma crise de atopia podem ser alérgenos (pó, pólen, alergénios alimentares…), ar frio e seco, contacto com agentes irritantes (detergentes, produtos de cosmética, tecidos) e o stress35.

2.1.3. Dermatite de contacto

A DC manifesta-se de forma semelhante à DA em termos do mecanismo de inflamação e sintomatologia38. A diferença encontra-se na causa deste eczema, que

como o nome indica, é o contacto ou a exposição continuada a alguma substância que leva ao aparecimento da DC. Muitas vezes encontra-se esta condição associada à exposição ocupacional com diversos materiais que vão sensibilizando a pele até que sejam necessárias contactos cada vez menores para causar irritação45. A prevalência

é maior em adultos devido ao maior tempo de exposição aos agentes causadores, sendo que pode chegar a afetar cerca de 20% da população no total46.

A DC pode atuar através de dois mecanismos distintos que levam às mesmas consequências. Deste modo temos a DC irritativa e a DC alérgica.

Pelo mecanismo de irritação, a pele tem de estar em contacto com um agente irritante por um dado período de tempo, como por exemplo látex ou borracha de luvas, produtos de limpeza, materiais de peças de bijuteria, componentes de algum produto de cosmética ou fármaco, entre outros38.

No mecanismo alérgico também se verifica contacto com substâncias como as supracitadas, no entanto, basta um contacto muito mais reduzido para que se despolete uma reação alérgica que leve ao aparecimento da inflamação46. Neste caso, pode-se

determinar um diagnóstico através da realização de testes em que se expõe a pele a diferentes alergénios45.

2.1.4. Tratamento e medidas não farmacológicas

O tratamento para a dermatite no geral, baseia-se no controlo sintomático e na prevenção do aparecimento ou agravamento do eczema, visto que não existe de

36 momento uma cura definitiva para esta patologia35,47,48. Os objetivos deste tratamento

devem focar-se na diminuição da intensidade das crises de secura extrema, e no maior espaçamento temporal das mesmas, através de cuidados dermatológicos48,49.

A hidratação da pele é de grande importância no tratamento, devendo ser utilizados cremes emolientes uma a duas vezes por dia, de preferência nos momentos após o banho, que não deve ser muito quente nem muito demorado, de modo a reter alguma humidade47,48,50. Para estes cuidados, devem ser utilizados produtos contendo

excipientes que não sejam agressivos, privilegiando formulações isentas de detergentes, álcool ou fragrâncias na sua composição 35,48. Produtos que contenham

aveia coloidal são também uma opção devido às suas propriedades hidratantes e protetoras51. Existem formulações que incluem componentes lipídicos da barreira

epidérmica na sua forma natural de modo a auxiliar a reposição dos mesmos na pele lesada, promover a sua rápida regeneração reestabelecer a função barreira da pele44.

Em termos de terapia farmacológica, devemos tentar alcançar um alívio com medicação que não seja muito agressiva para a pele. Na primeira linha do tratamento encontram-se os corticosteroides tópicos e os inibidores da calcineurina, como o tacrolimus, e o pimecrolimus46–48. Deve-se dar continuidade à gestão do eczema com produtos hidratantes e emolientes e evitar coçar as zonas inflamadas, de forma a que não haja libertação de prurido que cause um ciclo vicioso de irritação e ter cuidados reforçados de limpeza de pele de modo a eliminar contaminantes que possam afetar a pele neste estado mais fragilizado49.

Os corticosteroides tópicos devem ter potência suficiente para que se verifique efeito terapêutico mediante aplicados no mínimo tempo possível49. Podem verificar-se

efeitos secundários tais como atrofia cutânea, agravamento do eritema, estrias, aumento de suscetibilidade a infeções, entre outros, sendo que o risco do seu aparecimento aumenta com a potência da substância ativa, maior tempo de utilização e maior área de aplicação48,49. É necessário reforçar a ideia entre os utentes que este

tipo de formulações só devem ser aplicadas em último recurso, e que o uso prolongado acarreta maior risco de efeitos adversos, mas ao mesmo tempo, reassegurar que a boa utilização das mesmas tem efeito benéfico, de modo a mitigar a “fobia a corticoides” que prevalece em alguns utentes52. Os corticosteroides tópicos são MSRM, excetuando

a hidrocortisona a 1% que é um MNSRM-EF.

Os inibidores da calcineurina são usados em segunda linha quando os corticosteroides tópicos são ineficazes, conseguindo atingir o mesmo efeito anti- inflamatório local sem que ocorram os efeitos secundários típicos dos corticoides48. As

formulações disponíveis são capazes de aliviar a crise nos primeiros dias desde a sua aplicação48. Alguns efeitos adversos são prurido e rubor no local de aplicação, porém,

37 o facto de não causarem atrofia cutânea favorece a sua utilização em zonas mais delicadas da pele49.

Na DC, para além das formas de gestão do eczema e de alívio de crise supracitadas, devemos também atuar conforme a causa dos sintomas, procurando sempre identificar e evitar o contacto com o agente etiológico46.

Em todos os casos deve ser evitado o contacto com agentes irritantes, como roupas de lã, dermocosméticos, sabões, detergentes ou outros tipos de produtos com ingredientes mais agressivos. Caso seja impossível evitar o contacto, deve utilizar-se um creme barreira que consiga proteger a pele50,53. Devido à comichão causada pelo

eczema, deve haver cuidado em manter as unhas cortadas, especialmente em crianças onde podemos ter o cuidado de calçar luvas para evitar coçar durante a noite35.

Relativamente à utilização de máscara e outros tipos de equipamentos de proteção individual, estes podem ser um fator agravante ou até desencadeante de eczema, mas que muitas vezes não podem ser evitados dada a obrigatoriedade da sua utilização. Por isso são necessários alguns cuidados de modo a que a sua utilização seja mais confortável para estes doentes. A utilização de cremes barreira enquanto se utilizam EPI’s não deve ser recomendada devido à falta de estudos que comprovem que não afeta a capacidade destes últimos; no entanto pode-se recomendar a utilização de uma compressa entre a face e a máscara de forma a proteger a pele e a continuidade dos cuidados habituais de hidratação cutânea42,54.

A máscara deve ser trocada sempre que estiver húmida de modo a evitar o contacto com o suor que possa ser irritante e desencadeante de crise de atopia49. No

caso das máscaras comunitárias, estas devem ser compostas por tecidos mais suaves para a pele, mas que não comprometam a capacidade de filtração55.

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