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4. METODOLOGIA

4.2 Entrando em contato com o campo-tema

Na introdução deste trabalho afirmei que minha imersão no referido tema de estudo se deu antes mesmo de ser admitida como aluna do mestrado. Contudo, a aproximação com o que acredito ser o meu campo-tema de estudo aconteceu de forma muito mais intensa durante a produção de minha dissertação.

Antes de explicitar meus caminhos na construção da referida pesquisa gostaria de enfatizar que quando discutimos a questão do campo de pesquisa estamos aqui nos referindo a uma visão mais ampliada de campo tal como discutido por Peter Spink (2003) em que o autor vem afirmar que o campo não pode ser visto como uma instância estática, que se encontra lá esperando para ser pesquisado, ao pensar sobre o tema, escolher os textos, lê-los e discutir com nossos pares também estamos construindo parte do campo. Nesse sentido, campo é compreendido como:

(...) o argumento no qual estamos inseridos; argumento este que tem múltiplas faces e materialidades, que acontecem em muitos lugares diferentes (SPINK, p. 28, 2003).

Nesse sentido, desde o momento que nos dispomos a pesquisar um tema, no nosso caso o trabalho de equipes no contexto da Reforma Psiquiátrica, já temos como iniciada nossa imersão no campo. Entretanto, ao passo que desenvolvemos nossos estudos nos damos conta de que nem todos os lugares são igualmente fecundos para buscarmos as informações que precisamos, lugares diferentes com contextos diferençados iram nos proporcionar experiências diversas em nosso campo (SPINK, 2003).

À medida que nos aproximávamos e também nos apropriávamos do nosso campo, o tema de pesquisa foi aos poucos sendo lapidado, a partir das leituras. Foram fundamentais também as reuniões de orientação e as contribuições dos membros da banca de qualificação. O contato inicial com os trabalhadores militantes também foi importante para tal compreensão.

Os referidos contatos ocorreram fora do espaço dos CAPS, se deram nos encontros do movimento de trabalhadores em saúde mental – Núcleo de Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades. As reuniões do núcleo são abertas ao público e ocorrem duas vezes ao mês, as segundas feiras na sede do Conselho

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Regional de Psicologia CRP -02. Minha inserção no espaço ocorreu entre os meses de fevereiro e maio de 2009. Segue uma descrição do núcleo, retirada de um documento de apresentação do grupo:

O Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial Libertando Subjetividades de PE, está vinculado à RENILA (Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial) e vem participando de forma ativa na defesa da Reforma Psiquiátrica e no acompanhamento e apuração de denúncias de violação de Direitos Humanos que afetam os portadores de sofrimento mental. O núcleo pernambucano cobra aos gestores municipais e estaduais posicionamentos e medidas concretas para reverter à situação de barbárie em que ainda se encontram milhares de cidadãos pernambucanos internados nos hospitais psiquiátricos públicos e privados, sofrendo maus tratos, negligências, preconceitos, chegando inclusive, a óbitos. Sendo uma dessas medidas, a urgência na ampliação da rede substitutiva. (NÚCLEO LIBERTANDO SUBJETIVIDADES, 2009)

O núcleo é composto por usuários, familiares e trabalhadores em saúde mental. Funciona em um espaço cedido pelo conselho de psicologia. É interessante ressaltar que grande parte dos profissionais que atuam no núcleo são psicólogos, raramente, durante meu período de participação, observou-se profissionais de outras especialidades.

Participar do núcleo não exigiu tramites burocráticos. Fui a uma reunião, expliquei que era aluna do mestrado e gostaria de participar das reuniões como forma de compreender melhor o movimento de Luta no Recife. Não houve objeções apenas afirmativas no sentido de que minha participação no processo ocorresse de forma ativa e não como simples observação.

Acredito que minha participação no núcleo durante esse processo aproximou- se bastante daquilo que conhecemos como observação participante. Nesse contexto, a observação participante aparece como um princípio compreendido sob dois aspectos. O pesquisador ganha acesso através da participação ao campo e as pessoas estudadas e a observação é realizada de forma gradual para que se torne mais concreta e concentrada nos aspectos essenciais das questões de pesquisa (FLICK, 2004).

Segundo Flick (2004) o processo de observação participante possui três fases distintas: Observação descritiva; Observação Focal e Observação Seletiva.

A observação descritiva possui como função descrever detalhadamente o campo a ser pesquisado, orientando o pesquisador para o estudo do mesmo. Esse é um momento ideal para a formulação de novas questões de pesquisa, assim como para linhas de visão mais concretas.

Durante a observação focal o pesquisador irá restringir progressivamente os processos e problemas que serão considerados fundamentais para a compreensão da questão pesquisada.

A observação seletiva deverá ser realizada em um período próximo ao fim da coleta de dados, servindo como um momento em que o pesquisador deverá concentrar-se em buscar mais exemplos para os tipos de práticas e processo descobertos na segunda etapa.

Em meio a esse contexto a observação participante aparece como uma forma de entrar em contato com os atores sociais envolvidos do campo pesquisado. Não se buscará realizar comparações entre os dados de observação e os dados de entrevista no sentido de comparações valorativas de verdade. Se assim o fizéssemos estaríamos indo de encontro aos princípios teóricos desenvolvidos pelo construcionismo. Buscaremos com a utilização dos dois métodos de investigação ampliar nosso olhar sobre o objeto estudado.

Como será possível observar nos capítulos analíticos não foram realizadas muitas referências diretas as observações realizadas no núcleo, pois acredito que as experiências ocorridas durante esse período foram bastante importantes para que pudéssemos lapidar nosso objeto de estudo, conhecer as políticas municipais de saúde mental e compreender minimamente o funcionamento das relações entre o movimento, os trabalhadores e os usuários militantes ou não militantes.

4.2.1 Sobre os consentimentos formalizados

Além dos consentimentos concedidos a mim pelos membros do núcleo da Luta, também foram necessários consentimentos formalizados para que eu pudesse adentrar o espaço dos CAPS. Tal processo mostrou-se extremamente burocrático e terminou por retardar muito o início das entrevistas.

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O primeiro passo foi decidir quais serviços seriam focados, uma vez que, devido ao tempo pertinente a uma dissertação de mestrado, visitar todos os CAPS da cidade do Recife seria impraticável. Decidirmos focar dois CAPS, localizados nos distritos sanitários III e IV.

A primeira solicitação foi realizada a Prefeitura Municipal e levou três meses para ser concedida. A segunda solicitação foi realizada ao comitê de ética da UFPE, tal procedimento necessitava do consentimento prévio dos locais onde a pesquisa iria acontecer, e levou cerca de dois meses para ser concedido. O processo de autorização para minha entrada nos serviços levou aproximadamente cinco meses para ser concluído.