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3. Metodologia

3.5 Técnicas e Instrumentos de Recolha de Dados

3.5.1 Entrevista de Focus Group

Tal como explicam Galego e Gomes (2005) a entrevista de focus group tem as suas raízes históricas em Robert King Merton, o qual, no início da década de 1941, desenvolveu um novo procedimento de recolha de informações que consistia em

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solicitar a uma audiência, constituída por um maior ou menor número de pessoas, que tinha agido anteriormente em reposta a questões colocadas por outros investigadores, que fizessem a descrição e justificação dessas suas respostas. Desta forma seria possível alargar e diversificar o leque de informações obtidas acerca da audiência em estudo, conduzindo a novas linhas de reflexão. Merton pretendia, assim, ultrapassar as limitações do recurso a questionários de questões fechadas que nem sempre proporcionavam respostas exatas, assim como dos casos de entrevistados limitados nas suas respostas. Só na década de 1980 é que esta proposta se desenvolveu como estratégia de investigação em ciências sociais; contudo, atualmente, tem vindo a ter uma utilização crescente em investigação científica, nomeadamente na investigação em educação (Vaughn, Shay & Sinagub, 1996).

O objetivo de uma entrevista de focus group é recolher dados de um grupo organizado de pessoas com interesses comuns, num contexto em que são debatidos temas previamente selecionados. Os dados recolhidos, em geral de natureza qualitativa, consistem fundamentalmente em perceções, atitudes, sentimentos e ideias dos participantes (Vaughn et al., 1996). De acordo com estes autores nestas entrevistas participam, usualmente, entre 5 a 10 indivíduos (podendo estes limites ser diferentes, em função dos objetivos do estudo), durante um período de uma a duas horas. Os elementos do focus group apresentam características particulares, relacionadas com as finalidades da investigação a realizar, o objetivo principal do grupo é debater tópicos ou assuntos do interesse do investigador.

Durante uma entrevista de focus group os membros do grupo vão respondendo a questões abertas, colocadas por um moderador, papel desempenhado, frequentemente, pelo investigador. As questões inicialmente colocadas pelo investigador/moderador são de âmbito mais geral e vão-se tornando cada vez mais específicas e focadas nos assuntos de interesse. Ao longo da entrevista são incentivadas as interações entre os elementos que constituem o grupo, num processo dinâmico e natural de troca de opiniões e argumentos, muito rico no que respeita a informação disponibilizada.

Vários autores (e.g. Breen, 2006; Krueger & Casey, 2009) têm vindo a identificar e analisar desvantagens apresentadas por esta modalidade de entrevista tais como: i) a tendência para os participantes intelectualizarem as suas ações ou comportamentos, dando-lhes um carácter racional e reflexivo, que nem sempre possuem, pois muitas das ações situam-se no domínio do inconsciente, no momento em que ocorrem; ii) os participantes podem inventar respostas sobre determinadas questões,

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por não quererem dar uma imagem negativa de si próprios perante os outros membros do grupo; iii) os dados recolhidos podem ser triviais, particularmente em grupos de grandes dimensões ou quando os assuntos a abordar são complexos; iv) há participantes que podem sobressair nos momentos de debate, por terem, por exemplo, uma personalidade mais expansiva, o que pode enviesar os dados recolhidos; v) os dados recolhidos são muito dependentes do contexto, pelo que os resultados do estudo não são generalizáveis, o que leva a que alguns investigadores continuem a questionar a validade na produção de conhecimento, ainda que a generalização não seja a intenção deste tipo de estudos.

Tais críticas são comuns a outros métodos de recolha de dados pelo que cabe ao investigador/moderador assumir um papel ativo na planificação e condução da entrevista no sentido de ultrapassar possíveis dificuldades e limitações.

Um dos aspetos a ter em consideração na planificação de uma entrevista de focus group consiste em assegurar o equilíbrio entre uniformidade e diversidade (Galego & Gomes, 2005) do grupo a ser entrevistado. Tal critério de equilíbrio foi observado no grupo constituído pelos participantes no presente estudo, uma vez que relativamente à uniformidade todos lecionavam física e química no ensino secundário e todos concretizavam trabalho laboratorial do tipo experimental com recurso aos SATD. No que respeita a diversidade, a localização distinta da escola sede de cada participante, em territórios diferentes com diferentes condições sociais e económicas, implicou que os participantes divergissem no contacto com realidades socioeconómicas, dos seus alunos, totalmente distintas, assim como possíveis diferenças no equipamento e no modo como o trabalho laboratorial do tipo experimental com recurso aos SATD era abordado e concretizado nas respetivas escolas.

O guião da entrevista focus group (Tabela 3.2) foi construído com base na primeira questão de investigação – Quais as ideias e as práticas de professores de física e química relativamente aos SATD? (subcapítulo 1.2.2.) – com a finalidade de caracterizar os professores no início da oficina de formação e poder comparar estes resultados com os observados ao longo e após a realização da oficina, conferindo, assim, elementos para a resposta à segunda questão de investigação – Que mudanças se observaram nas ideias e práticas dos professores participantes relativamente ao trabalho laboratorial do tipo experimental com SATD, decorrentes da sua participação na oficina?

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O guião foi estruturado segundo três categorias de análise definidas a priori: atividade experimental, sistemas de aquisição e tratamento de dados e instrumentos de registo. No guião constam várias questões alternativas sobre o mesmo tópico dentro de cada categoria de modo a facilitar o processo de interação entre a entrevistadora e os participantes, num ambiente descontraído e agradável.

A primeira categoria – atividade experimental – refere-se ao modo como os professores afirmam planificar as atividades experimentais, que elementos consideram como fundamentais, como as implementam em sala de aula (laboratório). As questões que figuram nesta categoria servem para orientar a entrevista no sentido de clarificar se a atividade é realizada em grupo ou individualmente, se o professor adota o papel de observador ou se toma parte ativa na realização da atividade e de que forma os professores conciliam a atividade experimental com a resolução de problemas, nomeadamente a questão problema inerente a cada atividade experimental.

A segunda categoria – sistemas de aquisição de dados – refere-se à forma como os professores afirmam utilizar os SATD nas atividades experimentais e quais os elementos que consideram como fundamentais na utilização destes equipamentos. Como, nestas aulas, os alunos trabalham, se o fazem em grupo ou individualmente, se ocorre alguma discussão do tema da atividade, antes da sua implementação prática, se o professor fornece algum tipo de ficha com questões ou se apenas é seguido o protocolo do manual. O segundo objetivo nesta categoria refere-se às ideias que os professores têm relativamente a estes equipamentos, nomeadamente, se os consideram uma vantagem ou desvantagem, se têm dificuldades na sua utilização ou se notam dificuldades por parte dos seus alunos, na utilização dos sensores, quais as reações dos alunos quando trabalham com estes equipamentos, e que avaliação fazem os professores, da utilização dos SATD, nas aprendizagens dos alunos, nomeadamente se consideram que ocorrem aprendizagens mais profundas e profícuas, ou se pelo contrário consideram que a introdução destes equipamentos nas atividades não afetam as aprendizagens dos alunos.

A terceira categoria – instrumentos de registo – refere-se aos instrumentos que os professores afirmam recomendar aos alunos para proceder ao registo dos procedimentos seguidos na atividade, como o registo dados, respetivo tratamento e discussão.

70 Tabela 3.2

Guião da entrevista de focus group

Categorias Objetivos Questões

Atividade Experimental  Verificar como planificam, os professores, as atividades experimentais.  Analisar a implementação das atividades experimentais.

– Como é que normalmente planificam as atividades experimentais? Que elementos considera ao planificar atividades experimentais no quadro das disciplinas que leciona? (ex.: competências, objetivos, estratégias)

– Como implementa essas atividades experimentais? (Alunos trabalham em grupo ou individualmente? Qual o tempo dado para discussão? Quais os tópicos de discussão e indicações dadas?) – Qual o papel do professor durante a atividade

experimental? (Como intervém? Observa os alunos; realiza a atividade; questiona os alunos; que tipo de questões? Que autonomia concede aos alunos?)

– Qual o papel dos alunos? (colocam questões, discutem os resultados da atividade?) – Como integra a atividade experimental na

resolução de problemas? (Parte de uma questão- problema? Estabelece relações entre as atividades experimentais e a resolução de problemas?)

SATD

 Verificar de que forma os SATD são utilizados nas atividades experimentais.  Analisar as perceções dos professores, relativamente a estes equipamentos.

 Que elementos considera ao planificar atividades experimentais com SATD no quadro das disciplinas que leciona? (ex.: competências, objetivos, estratégias).

 Antes da atividade os alunos têm alguma preparação no funcionamento e na montagem do equipamento?

 Como implementa essas atividades experimentais? (Em grupo, individualmente; tempo dado para discussão, tópicos de discussão; indicações dadas – ficha?).

 Que diferenças perceciona relativamente ao papel do professor e ao papel do aluno quando as atividades experimentais são realizadas com SATD?

 Quais as dificuldades que tem sentido ao utilizar estes equipamentos nas atividades experimentais?  Quais as reações (positivas e negativas) dos seus

alunos quando utilizam estes instrumentos?  Qual a vossa opinião acerca dos SATD? Que

avaliação faz do impacte dos SATD, nas aprendizagens dos alunos?

Instrumentos de registo  Verificar que instrumentos de registo, os professores utilizam, nas suas aulas de

atividades experimentais.

 Que instrumentos de registo utiliza?

 Já utilizou “Vês” de Gowin e/ou mapas de conceitos, como instrumento de orientação, nas atividades experimentais?

 Que avaliação faz destas ferramentas ou de outras que utiliza para os mesmos fins?

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Se preferem que os alunos utilizem o modelo de relatório convencional ou que construam um modelo para ser utilizado pelos elementos do grupo disciplinar; se orientam os alunos nas respostas às questões pré e pós laboratoriais; se utilizam o V de Gowin.

As questões que figuram nesta categoria servem para orientar a entrevista no sentido de clarificar, também, como os professores avaliam os instrumentos de registo utilizados pelos seus alunos, mais propriamente se consideram que a utilização de um dado instrumento de registo contribui para a realização de aprendizagens mais profícuas, por parte dos seus alunos.

Desta forma, toda a entrevista foi direcionada no sentido de auscultar as ideias dos professores em relação às categorias selecionadas anteriormente. Esta entrevista decorreu na primeira sessão da ação de formação e foi inteiramente áudio-gravada. Esta gravação foi transcrita para um documento Word, cujo texto foi submetido a análise de conteúdo categorial segundo Bardin (2009). Esta transcrição está disponibilizada no Apêndice VI (disponível no CD que acompanha esta tese).