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MC - O Edifício I foi construído entre 1976 e 1978. Nessa altura utilizava-se muito, noutros países da Europa e nos EUA, o betão armado aparente bem como se mostrava a veracidade dos materiais nos edifícios. Qual a importância que os materiais assumiram na construção do Edifício I?

RHF - O primeiro edifício é interessante, não só porque foi o primeiro, mas também porque nós investimos as nossas ideias sobre como resolver a nossa proposta. Uma coisa engraçada é que quem trabalhou muito sobre esse edifício foi o engenheiro Teixeira Trigo, que foi angariado pelo construtor, mas depois, mais tarde acabou por ser angariado para diversas partes do edifício. É engraçado porque nós quisemos fazê-lo em betão e, de facto, o empreiteiro fez essa angariação do engenheiro Teixeira Trigo para resolver o problema. Eu não conhecia o engenheiro Teixeira Trigo e ele correspondeu àquilo que nós queríamos.

MC – Mas em relação ao betão armado aparente, qual foi a sua importância e porque é que se optou por essa solução construtiva?

RHF – Nós fomos para o betão aparente, não só porque nos parecia o mais adequado, mas também porque correspondia àquilo que nós próprios pensávamos em relação às características do edifício. Digamos que foi logo uma decisão nossa, antes mesmo de ser uma decisão do engenheiro Teixeira Trigo.

MC – Pretendiam transmitir alguma coisa através dos materiais?

RHF – O que eu na altura pensava era que o betão aparente ia ser um material muito adequado para aquilo que nós pretendíamos para a expressão do edifício. Foi logo escolhido para o exterior. Havia dois corpos, ainda antes de se fechar o quadrado, e eram dois corpos que estavam nos extremos. Obviamente que para nós não era indiferente a experiência que tínhamos e para nós era importante o que nós tínhamos feito na Escandinávia, o que nós tínhamos visto nos Estados Unidos e portanto todos esses elementos foram escolhidos por nós e acabaram por se repercutir na estrutura e na expressão do edifício. Portanto, não foi indiferente de maneira nenhum, mas foi a primeira vez que nós o fizemos em Portugal.

MC – O que acabou de dizer vem de encontro à pergunta seguinte. Uma vez que teve uma experiência tão vasta no estrangeiro, e uma vez que nesta altura em que foi contruído o primeiro edifício do ISCTE não era frequente a utilização do betão aparente em Portugal, tentou de alguma forma que a arquitetura portuguesa acompanhasse a arquitetura do estrangeiro?

RHF – Não. A arquitetura brutalista é uma arquitetura que efetivamente se repercutiu aqui em diversos aspetos da arquitetura, mas eu nunca me senti influenciado por essa arquitetura dita brutalista. Agora, o que eu pensava era que com essa relação dessa arquitetura que nós escolhemos para o ISCTE tinha certas vantagens do ponto de vista económico, do ponto de vista da estrutura do edifício. Mas não face àquilo que nós achávamos que era a arquitetura brutalista, digamos assim. Não foi algo que nos orientou. O que nós pensámos foi que a arquitetura feita em betão, com certas características, é uma arquitetura simples que nos permitia não só no caso do ISCTE, mas de outros também, saber como é que íamos trabalhar com essa base e como é que nos ia ser permitido ter uma arquitetura lógica, simples e ao mesmo tempo que correspondesse àquilo que nós queríamos ter como expressão no edifício. De maneira que eu tenho a impressão que, talvez, esse seja o lado mais importante. Nós depois fizemos o edifício da Escola Secundária de Benfica (Escola José Gomes Ferreira) e nós também nos baseamos muito nisso. Aqui utilizámos outra vez o betão branco no sentido de podermos corresponder àquilo que nós queríamos como edifício e ao mesmo tempo que seja uma arquitetura simples.

MC – Na sua arquitetura alguma vez teve por base os ideais da arquitetura brutalista de evidenciar a estrutura e a veracidade dos materiais?

RHF – Não, isso tenho a certeza que não.

MC – Não se considera, então, um arquiteto brutalista? Quando vemos os seus edifícios com os materiais aparentes, considera-se um arquiteto brutalista?

RHF – Não. Quero dizer, se pensarmos no ISCTE, em que efetivamente nós queríamos uma arquitetura muito simples e com uma expressão plástica em que o lado da arquitetura e o lado do que nós queríamos como estrutura tinham muito a ver um com o outro e, portanto, nós não podíamos abdicar do que cada um deles exprimia. Independentemente de ser uma arquitetura brutalista ou não brutalista. Francamente, isso não era uma coisa muito importante para nós. O que era importante era saber que a expressão arquitetónica teria uma certa lógica na sua

escolha e havia uma lógica na harmonia entre o que era arquitetura e o que era, de facto, estrutura. E para mim isso foi muito bom e tivemos sorte por ter aparecido o engenheiro Teixeira Trigo, que veio a soldo do empreiteiro. O empreiteiro é que o escolheu, eu nem o conhecia, mas depois apercebemo-nos que na intervenção dele havia uma certa lógica no sentido de servir o que a arquitetura e a estrutura poderiam representar para as pessoas daquele edifício.

MC – O Edifício I foi alvo de diversas alterações. Para si, o Edifício I que foi construído com estes materiais e com esta expressão deveria manter-se fidedigno à construção original, ou para si isso não é de facto importante? Ou seja, gostaria que me falasse um pouco sobre a relação entre o material, a estrutura e a sua expressão.

RHF – As alterações que foram feitas ao edifício sem o meu conhecimento, contra a minha opinião, obviamente que não subscrevo. É com pena que isso terá ocorrido. Da minha perspetiva e dos meus colaboradores, foi sempre muito triste observar essas alterações. Quer dizer, obviamente que o edifício foi construído desde o início com uma expressão e nunca pensei que fosse ser alterada. Era uma expressão especial do edifício e absolutamente de acordo com a expressão que queríamos que o edifício tivesse, não só nos seus andares, na sua expressão exterior, etc… Portanto, todas alterações que se fizeram lá sem o meu conhecimento, eu não subscrevi de maneira nenhuma.

Acho que a relação que a estrutura, a expressão e o material é fundamental. Eu posso escolher um edifício de betão, de tijolo, ou de outros materiais e sempre que escolho esses materiais é tendo em atenção a natureza do edifício que nós vamos criar. Qualquer edifício que eu pense, em relação aos materiais, é sempre com o objetivo de servir o edifício. É sempre com esse objetivo.

Há uma coisa que talvez possa dizer… Todos os edifícios, tendo em conta o seu caráter e a sua estrutura, são harmoniosos. Portanto, há uma ideia de harmonia entre aquilo que foi pensado e aquilo que foi executado, sem dúvida nenhuma. Quer seja tijolo, quer seja betão… Há sempre uma necessidade nossa de harmonizar o que nós pensámos e o que nós executámos. E quando nós executámos. E os engenheiros também têm a noção daquilo que nós pretendemos com essa estrutura. Ainda agora há um edifício que nós fizemos e que o engenheiro é uma pessoa praticamente da minha idade e ele teve uma grande capacidade de entender aquilo que nós quisemos para o edifício. O carácter do edifício acaba por beneficiar não só das nossas ideias base, dos nossos esquiços,

digamos assim, mas também do que o engenheiro acresce a essa nossa proposta. E o mesmo aconteceria no ISCTE se eles não tivessem alterado algumas coisas que nós não gostaríamos que tivessem sido alteradas.

MC – Se o Arquiteto tivesse sido o responsável pelas alterações ao edifício, de maneira a adaptá-lo às necessidades que foram surgindo, não teria optado por algumas das opções que foram tomadas… Teria mantido a mesma expressão passados quarenta anos da sua construção?

RHF – Há uma coisa que é triste no ISCTE, que é de facto um edifício que eu prezo bastante. A maneira como cuidaram de conservar o edifício, de o manter, é muito triste. Para mim é uma forma de agredir o edifício, quando ele foi concebido com uma determinada ideia. Embora nós também tivéssemos alterado algumas coisas, mas sempre com a mesma ideia de que é um edifício que tem um caráter que é de preservar.

MC – E que caráter é que o arquiteto vê no edifício do ISCTE?

RHF – O caráter é muito variado, não só porque teve muitas fases ao longo dos anos e também porque uma pessoa não é cega àquilo que nos rodeia e está sempre de acordo com as alterações que se processam no edifício e na nossa cabeça. Nós estaríamos sempre atentos aquilo que era fundamental no edifício, mas sem, de forma alguma, deformar o edifício em que aquele cariz é essencial.