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Capítulo 4. Metodologia

4.1 Abordagem qualitativa

4.1.1 Entrevistas em profundidade

O principal método de recolha de dados neste estudo foi feito através de entrevistas em profundidade a residentes e a interlocutores relevantes, realizadas entre setembro e dezembro de 2016. Com o consentimento verbal dos participantes e o compromisso de anonimato, gravámos e transcrevemos entrevistas de cerca de uma hora a 15 residentes no bairro de Alfama, e a 5 interlocutores relevantes: um agente imobiliário, a presidente da Associação do Património e População de Alfama (APPA), uma proprietária e gestora de apartamentos turísticos e dois comerciantes de longa data em Alfama, conhecedores da vida no bairro.

As entrevistas em profundidade consistem em conversas mais ou menos formais com sujeitos teoricamente relevantes para a investigação, em que o investigador faz perguntas abertas com o intuito de deixar o entrevistado falar livremente sobre o tópico da pesquisa (Lalanda, 1998). Durante as entrevistas, tivemos o cuidado de não influenciar as respostas, procurando, sempre que possível, fazer perguntas abertas e dar continuidade a ideias já referidas pelos participantes. Também procurámos ser empáticos para que os entrevistados se sentissem à vontade para falar sem constrangimentos e, assim, obtermos o máximo de informação possível. As entrevistas em profundidade não foram entrevistas estruturadas com perguntas pré-feitas, sendo que o seu objetivo era deixar o entrevistado falar sem restrições e sem ser influenciado. No entanto, conduzimos as entrevistas de modo a que estas pudessem oferecer informações acerca do tema em estudo.

Segundo Piedade Lalanda (1998), as entrevistas em profundidade podem assumir a forma de história de vida, de narrativa ou de testemunho. Neste caso, o que se pretendia era uma narrativa, que é parte da história de vida, subordinada a um tempo e a um lugar específico. O tempo é o “agora” e o lugar é Alfama, num possível processo de gentrificação turística.

Assim, para que as entrevistas em profundidade nos pudessem oferecer um panorama consistente da experiência dos moradores em relação aos alugueres de curta duração, e ao mesmo tempo nos ajudassem a construir um panorama das transformações socio- espaciais que têm vindo a ocorrer no bairro, estabelecemos alguns tópicos relevantes de conversação. Esses tópicos, bem como outras informações que pedimos a cada entrevistado, podem ser consultados no Anexo 1, e envolvem: relação com o proprietário

45 do edifício onde moram; reabilitação do edificado; apartamentos turísticos na área; relações de vizinhança; novos/antigos residentes no bairro; e segurança/ruído/higiene. Antes da entrevista, todos os participantes foram informados acerca do tema em estudo, de uma forma simplificada, mas abrangente, de modo a não influenciar positiva ou negativamente as suas respostas. Assim, todos os participantes foram informados que este estudo tinha como tema o turismo e o bairro de Alfama, sem que se estabelecesse à partida qualquer relação entre os dois temas. Esta forma de apresentar o estudo revelou ser muito útil, na medida em que cada entrevistado teve oportunidade para falar livremente sobre aquilo que lhe pareceu mais relevante, permitindo-nos recolher as mais variadas informações/visões acerca da vida atual no bairro.

Quanto à seleção dos 15 residentes participantes, esta foi sendo feita com base na sua heterogeneidade: género; idade; nível de escolaridade; arrendatário/proprietário; ou tempo de residência no bairro. Ao mesmo tempo, todos os residentes entrevistados tiveram, necessariamente, de verificar uma condição: residir em Alfama há, pelo menos, cinco anos, de modo a poderem oferecer-nos informações relevantes acerca das transformações pelas quais o bairro tem passado desde que o fenómeno dos alojamentos turísticos informais se começou a alastrar, ou seja, sensivelmente a partir de 2012 (ver Figura 1)

As informações referentes a cada residente entrevistado podem ser consultadas na Tabela 4, abaixo. Nesta tabela estão também especificadas informações prévias que nos levaram a escolher determinados participantes, que entendemos serem importantes para a investigação. Estes motivos relacionam-se com o tema em estudo e vão de encontro ao que Mario Luis Small (2009) explica ser fulcral na escolha de participantes: segundo o autor, num estudo de natureza qualitativa, o investigador deve procurar ir entrevistando participantes que acrescentem novos dados à investigação, de modo a que se possa construir um panorama abrangente daquilo que se pretende analisar e descobrir.

Inicialmente, começámos por pedir a cada entrevistado que nos indicasse outros residentes que pudessem estar interessados em participar no estudo para, assim, estabelecermos novos contactos. No entanto, esta técnica, que Small (2009) explica ser comum para angariar novos participantes, revelou-se desnecessária e por vezes pouco prática, pelo que acabámos por não a utilizar. A maioria dos participantes foram abordados em espaços de convívio como cafés, mercearias e nas ruas.

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Tabela 4 – Informações dos residentes entrevistados

Nomes (fictícios) / Dados Ida de Anos em Alfa ma Nível de estudos Profissão A / P* Rend a Mens al Rendimentos (anual em milhares de euros) Info. Extra

Catarina 60 60 4ª classe Doméstica A 350€ 5 – 7,5

Saiu de Alfama em março de 2016 Pedro 41 5 Licenciat ura Músico A 450€ 10 – 15 n. a.

Melo 70 23 4ª classe Reformado A 277,5

6€ 5 – 7,5 O edifício onde mora mudou de proprietário José 27 5 Licenciat ura Gerente de bar A 300€ 15 – 20 n. a.

Mário 65 40 4ª classe Reformado P n. a. 7,5 – 10 n. a.

Júlio 40 40 4ª classe Segurança n.

a. n. a. 7,5 – 10 n. a. Carla e Fernando 76 83 76 83 4ª classe Reformados A 150€ 10 – 15 n. a. Maria José 46 8 9º ano Empregada de restaurante A 350€ 10 – 15 Mudou de casa

Filipe 30 6 12º ano Estudante A 330€ 10 – 15

Subarrenda um apart. para turismo Sílvia e Diana 36/ 31 4/7 12º ano Empregadas de restaurante A n. s. s. 10 – 15 n. a.

Taborda 72 50 3ª classe Reformado A 70€ > 5 n. a.

Eurico 34 10 12º ano Empregado

de bar A 320€ 5 – 7,5 n. a. Margarida 42 5 Licenciat ura Gestora de apartamentos turísticos A 500€ 15 – 20 Proprietária de um apartamento turístico

Maria 54 43 4ª classe Merceeira A 350€ 10 – 15 n. a.

Clara 43 12 Doutora

mento Investigadora A 425€ 15 – 20 n. a.

Fonte: Participantes no estudo *A - Arrendatário; P – Proprietário Nota: a tabela está organizada por ordem de participação no estudo

47 No entanto, estabelecemos contactos importantes durante as entrevistas, que nos ofereceram, em entrevistas informais posteriores, alguns dados bastante relevantes para a investigação. Estes dados, bem como os relatos destes participantes informais, são apresentados juntamente com a entrevista que os refere, em nota informativa.

Em relação ao número de entrevistas, Mario Luis Small (2009) explica que se devem fazer tantas até o assunto estar esgotado, que é o mesmo que dizer até ao ponto em que os entrevistados começam a repetir ideias e já não oferecem novos dados fulcrais para a investigação. Nesta investigação considerámos o assunto esgotado à vigésima entrevista. Fizemos 20 entrevistas em profundidade: 15 a residentes e 5 a interlocutores relevantes. Todas as entrevistas foram transcritas, impressas e entregues a cada entrevistado para que estes tivessem a oportunidade de retificar o que haviam dito, clarificar ou acrescentar algumas informações. Nos casos em que os entrevistados acrescentaram informação, esta aparece formulada no fim da entrevista.

Para analisarmos as entrevistas usámos o software Nvivo, que é um programa que permite codificar dados qualitativos. Depois de transcrevermos e lermos as entrevistas, identificámos alguns temas comuns que usámos como códigos agrupadores de informação, permitindo-nos, de seguida, analisar e escrever sobre o tema em estudo.