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2 – Entrevistas: enfoque biográfico privilegiado

A matriz da nossa investigação está orientada e centralizada para que seja possível deslocar para o ecrã o filme das narrativas das vidas dos nossos entrevistados, o que obriga a existência de um «contrato implícito» entre o investigador e o entrevistado (Marques, 2009: 63). Sob este aspecto, também ficou implícita a convicção de que «não há regras definidas quanto à forma de optimizar as condições de uma entrevista, excepto quanto ao respeito pela privacidade, aos silêncios e à liberdade de não resposta dos entrevistados» (ibidem). Só através de uma empatia entre o investigador e o entrevistado e o compromisso protocolado, conseguimos encontrar as condições necessárias e favoráveis para que os entrevistados pudessem explanar os seus pontos de vista e as suas interpretações, bem como as suas experiências e convicções. É pela «palavra» que o entrevistado percorre o que viveu ou o que vive, expondo a sua história, procurando convencer o entrevistador de que a sua narração é a que ele acredita ou quer acreditar. É nessa fonte de compreensão que o investigador terá de agir, pois o que se está a catar não é a veracidade daquilo que nos é relatado, mas restituir a memória e as respectivas significações subjectivas atribuídas pelos próprios (ibidem).

Todavia, todos sabemos o quanto a tarefa de interpretação das palavras se torna complexa, pois estamos perante testemunhos, definições de situações e memórias. Estes testemunhos nasceram de construções que tiveram implicações a vários níveis. É por isso que o sociólogo trabalha sobre os elementos recolhidos durante as entrevistas no sentido de dar forma aos mesmos e concomitantemente tenta identificar os processos que estruturaram as narrativas do indivíduo (Marques, 2009).

De forma concreta, a realização das entrevistas biográficas assentaram num guião semiestruturado e em torno de cinco eixos essenciais:

I. Contextos e origem social; II. Percurso escolar e formativo; III. Entrada na “vida adulta”; IV. A experiência do desemprego;

V. “Gerir” a vida após o desemprego.

Tendo como base de partida os eixos acima descritos, pretendemos, através deste guião, ter a possibilidade de: 1) identificar as situações de desemprego e o perfil socioprofissional dos entrevistados; 2) caracterizar as transformações originadas nas relações informais e no contexto familiar proveniente da vivência do desemprego; 3) perceber quais as representações sociais principais que se forjam em torno do emprego/desemprego. É desta forma que procuramos encontrar um sentido justificativo/explicativo do conhecimento daquilo que obstaculiza à não-inserção no mercado de trabalho e das estratégias de superação que possam contribuir para o desenvolvimento de políticas adequadas de emprego, formação e cidadania (Marques, 2009: 64).

Importa aqui que centremos o nosso objectivo de análise na tarefa de podermos conceder sentido às informações recolhidas «sem reduzir a riqueza das significações» Poirier (in Marques, 2009: 64). Além da biografia que está implícita, os actores sociais não estão fora do âmbito institucional e normativo, pois seja qual for o seu contexto onde se sustenta a análise – família, escola, círculo de amigos, trabalho – é de admitir que entre eles existam regularidades de partilha de percursos escolares idênticos e determinadas condições sociais (Marques, 2009).

As entrevistas foram realizadas durante os meses de Fevereiro e Março de 2012 em locais indicados pelos entrevistados, tendo o investigador se deslocado aos sítios escolhidos. Quatro entrevistas foram realizadas nas instalações da Universidade do Minho, Braga, dentro de uma sala de aula; outra entrevista foi realizada num espaço público, praticamente sem privacidade, no bragaparque; outra entrevista foi feita em casa do entrevistado. As entrevistas foram gravadas, com conhecimento e consentimento do entrevistado.

Para proceder à análise de conteúdo da entrevista definimos cinco dimensões de análise. Na primeira, a que chamamos “Contextos e origem social”, definimos como categorias a idade, o sexo, o estado civil, o tipo de residência, filhos, local de nascimento e vivências da infância. Na segunda dimensão, “Percurso escolar e formativo”, definimos como categorias as habilitações literárias, formações e percurso profissional. Na terceira, parte que consideramos a “Entrada na “vida adulta””, utilizamos como categorias as vivências da adolescência, experiências profissionais, última profissão, situação na profissão, duração e remuneração e ainda a ida para o desemprego. Na quarta, dimensão onde exploramos “A experiência do desemprego”, tivemos as variáveis de tempo de desemprego, as consequências que essa situação trouxe para a sua vida, a alteração do dia-a-dia resultante do desemprego, como é um dia normal do desempregado e o que passa pela cabeça quando é atingido pelo desemprego. A quinta, dimensão que escolhemos de “Gerir a vida após o desemprego”, procuramos explorar as variáveis respeitantes à reacção da família à situação de desemprego, que medidas encetou enquanto desempregado para a procura de emprego, o que está a impedir o regresso ao trabalho, que projectos e sonhos ficam por realizar, que riscos está disposto a correr para reingressar no mercado de trabalho, que visão tem sobre as instituições públicas que estão relacionadas com o desemprego, que medidas podem ser tomadas pelas várias instituições para combater o desemprego e o que pensa, dada a sua experiência, sobre o facto de estar no desemprego.

Estas dimensões foram elaboradas de forma a facilitar o processo de análise de conteúdo à entrevista por esta ser tão rica e ao mesmo tempo um pouco extensa.

2. 1 – O perfil dos nossos actores sociais

Relativamente ao perfil dos nossos entrevistados, o mesmo abrange o leque das idades escolhidas para a nossa investigação, excepto uma das entrevistadas que tem 48 anos, mas que entendemos incluir na nossa investigação por nos apresentar um perfil relevante para o nosso estudo, quer na idade em que se iniciou no mundo do trabalho, quer na entrada no ensino superior, aliado ao facto de na procura de trabalho ter sentido o factor da idade como um dos entraves no regresso ao mercado de trabalho. Os nossos entrevistados concluíram curso superior e estudos pós- graduados, sendo excepção um dos elementos que actualmente frequenta um curso superior.

A população alvo da nossa investigação distribui-se pelos distritos de Braga, três entrevistados; Porto, dois entrevistados; e Viana do Castelo, um entrevistado. No que concerne à distribuição por género, temos cinco mulheres e um homem.

A duração do desemprego dos entrevistados não é superior a três anos, e os que estão a trabalhar, depois de um período de desemprego, não estiveram desempregados mais de dois anos.

Em comum em todos os nossos entrevistados temos o facto de terem regressado à universidade ou de se terem inscrito na universidade quando se aperceberam que poderiam ficar desempregados ou quando foram mesmo para o desemprego, a fim de melhorarem as suas competências. Já no que diz respeito à frequência de cursos de formação, os nossos entrevistados referiram os seguintes: Certificado de Aptidão Pedagógica (CAP) (sempre à sua custa); cursos de formação impostos pelo Centro de Emprego (como recebia subsídio de desemprego), mas que não tiveram qualquer valor prático, excepto alguma cultura geral, segundo confessou uma das entrevistadas.

O quadro abaixo apresenta o perfil socioprofissional dos nossos entrevistados (conf. Quadro 4).

Quadro 4- Perfil socioprofissional dos entrevistados

34- Certificado de aptidão pedagógica. 35- Actividades Extra Curriculares.

36-Reconhecimento Validação e Certificação de Competências.

N.º Entrevista Sexo Idade Estado civil Agregadofamiliar escolaridadeNível de trabalhoAnos de

Profissão

(último emprego/ou actual)

Duração do desemprego

Formação profissional (enquanto desempregado)

Local residência

1 F 36 solteira Vive só em casaprópria c/crédito

Licenciatura em Administração

Pública 20 Empregada comércio 2 anos

CAP34; gestão e motivação de tempo;

espanhol; socorrismo e na área da

administração pública. Braga

2 F 42 casada 2 filhos c/ 9 e 6anos vive c/os filhos e o marido Licenciatura Sociologia; mestrado em políticas comunitárias

16 Técnica de instituição 1 ano Frequenta o doutoramento emSociologia Porto

3 M 44 solteiro Vive só

12.º ano – frequenta a licenciatura de

Markting

24 Informático Encontra-se atrabalhar CAP e sistemas solares térmicos Braga

4 F 48 casada 2 filhas maioresvive c/marido e as filhas

Licenciatura em

Educação 34 Administrativa

Encontra-se a trabalhar a dar aulas nas AEC’s35

CAP; Expressão Plástica; expressão

musical; Música, RVCC36; Markting Braga

5 F 45 solteira vive com a mãe

Licenciatura em Eng. Têxtil mestrado em

engenharia gestão industrial

20 Manutenção/gestão dequalidade 3 anos

Uma formação “obrigada” pelo centro de emprego do tipo empreendedorismo; recursos humanos; responsabilidade social.

Viana do Castelo

6 F 39 solteira vive com ospais

Licenciatura em Relações Internacionais,

mestrado em Markting