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5 MODELO MATEMÁTICO

5.2 ANÁLISE DA EQUAÇÃO DE PROPAGAÇÃO DA ONDA SONORA

5.2.2 Equação da onda acústica em meio homogêneo e barotrópico

A dedução da equação da onda acústica é baseada nas equações diferencias que modelam a dinâmica dos fluidos, Eq. (5.8), e nas equações constitutivas desenvolvidas na subseção anterior. No entanto, será feita a linearização destas

equações baseando-se na seguinte hipótese: a amplitude máxima de flutuação das variáveis que descrevem a onda acústica é muito pequena, assim o processo de propagação pode ser considerado linear na grande parte dos problemas práticos. Realizando a linearização da equação da continuidade, Eq. (5.1), e de Navier-Stokes, Eq. (5.2), e considerando o meio estagnado, obtém-se:

𝜕𝜌′ 𝜕𝑡 + 𝜌0∇⃗⃗ ∙ 𝑢⃗ ′= 0 (5.20) 𝜌0𝜕𝑢⃗ ′ 𝜕𝑡 + ∇⃗⃗ 𝑝 ′= 0. (5.21)

O resultado da linearização da equação de estado Eq. (5.16), utilizando a definição de velocidade do som Eq. (5.17) e considerando o meio homogêneo e barotrópico, é

𝑝′ = 𝑐

02𝜌′. (5.22)

Calculando a derivada temporal da equação da continuidade linearizada, Eq. (5.20), subtraindo do divergente da equação de Navier-Stokes linearizada, Eq. (5.21) e utilizando a Eq. (5.22) para eliminar 𝜌′ da equação resultante, obtém-se a equação homogênea da onda acústica linear em termos das flutuações de pressão:

𝜕2𝑝′ 𝜕𝑡2 − 𝑐0

22𝑝= 0. (5.23)

Em razão do conceito que define o som, é comum escrever a equação da onda sonora em termos das flutuações de pressão (𝑝′) como variável dependente, como foi feito. Porém, esta equação também pode ser expressa em função das flutuações de massa específica 𝜌′:

𝜕2𝜌′ 𝜕𝑡2 − 𝑐0

Para interpretar os termos da equação da onda acústica linear, inicialmente é necessário compreender o significado físico do operador Laplaciano. Para isso, considere uma variável bidimensional 𝜓(𝑥, 𝑦) e seu Laplaciano, dador por

∇2𝜓 = 𝜕 𝜕𝑥( 𝜕𝜓 𝜕𝑥) + 𝜕 𝜕𝑦( 𝜕𝜓 𝜕𝑦). (5.25)

Se a direção 𝑥 for discretizada em elementos ∆𝑥 de valor unitário, a primeira derivada é aproximada por diferenças finitas de primeira ordem por

𝜕𝜓 𝜕𝑥 ≈

𝜓𝑖+1− 𝜓𝑖

∆𝑥 = 𝜓𝑖+1− 𝜓𝑖. (5.26)

A segunda derivada é aproximada tomando este resultado e subtraindo da derivada do ponto anterior,

𝜕2𝜓 𝜕𝑥2 ≈ 𝜓𝑖+1− 𝜓𝑖 ∆𝑥 − 𝜓𝑖 − 𝜓𝑖−1 ∆𝑥 ∆𝑥 = 𝜓𝑖+1− 2𝜓𝑖 + 𝜓𝑖−1. (5.27)

Repetindo este mesmo procedimento para a direção 𝑦, resulta que o Laplaciano de 𝜓(𝑥, 𝑦) é aproximado por

∇2𝜓 ≈ 𝜓

𝑖+1,𝑗 + 𝜓𝑖−1,𝑗+ 𝜓𝑖,𝑗+1+ 𝜓𝑖,𝑗−1− 4𝜓𝑖,𝑗. (5.28) Dividindo ambos os lados dessa equação por quatro, resulta

∇2𝜓 4 ≈

𝜓𝑖+1,𝑗 + 𝜓𝑖−1,𝑗+ 𝜓𝑖,𝑗+1+ 𝜓𝑖,𝑗−1

4 − 𝜓𝑖,𝑗. (5.29)

Portanto, nesta última equação observa-se que o Laplaciano é proporcional à diferença entre o valor da variável 𝜓 na posição (𝑖, 𝑗) e a média dos valores vizinhos. O que leva a percepção de que este operador “mede” a concentração, ou o excesso, da variável contida na partícula de fluido com relação às partículas ao seu redor.

Retornando à equação da onda acústica, Eq. (5.23), agora pode-se interpreta- la da seguinte forma: a taxa com que a taxa temporal da pressão na partícula

elementar de fluido 𝜕2𝑝/𝜕𝑡2, é justificada pela concentração de pressão nesta partícula 𝑐022𝜌, ou seja, é proporcional à diferença entre a pressão na partícula e a média das pressões nas partículas vizinhas, e a constante de proporcionalidade é 𝑐02. Assim, a Eq. (5.17) pode ser interpretada como uma medida da rapidez como a pressão é alterada com relação à variação da massa específica. Em suma, essa equação modela a propagação das flutuações de pressão ou massa específica em um fluido quiescente, sendo que este movimento é sustentado pelo meio de propagação somente se as escalas de espaço-tempo satisfizerem o balanço expresso na equação da onda acústica, Eq. (5.23). A transformada de Fourier desta equação pode ajudar a ilustrar este balanço das escalas no espaço-tempo:

𝜔2𝑝′= 𝑐02|𝑘⃗ |2𝑝′ 𝜔𝑝′= 𝑐02|𝑘⃗ |𝑝′,

(5.30)

onde 𝜔 é a frequência em radianos e 𝑘⃗ é o vetor número de onda.

A Eq. (5.30) é conhecida como relação de dispersão da onda e estabelece que para haver a propagação as escalas de flutuações temporais 𝜔 devem coincidir com as escalas espaciais multiplicadas pela velocidade do som no meio. Quando uma região do espaço é excitada por flutuações que não satisfazem este critério, a propagação não é suportada pelo meio e as oscilações decrescem exponencialmente. Neste ponto, define-se a velocidade de fase 𝑣𝑓, que relaciona a frequência e o número de onda da propagação da seguinte forma:

𝑣𝑓 = 𝜔

𝑘⃗ . (5.31)

Como 𝑘⃗ é um vetor, tem-se uma velocidade de fase para cada direção do espaço, assim, com o intuito de entender a origem desta equação, considere uma onda harmônica no espaço-tempo somente na direção 𝑥, dada por 𝑦(𝑥, 𝑡) = cos (𝑘𝑥𝑥 − 𝜔𝑡). Após um tempo 𝑡, a fonte gerou 𝜔𝑡/2𝜋 oscilações, neste mesmo tempo a frente de onda inicial propagou uma distância 𝑥 para longe da fonte. Para que o número de oscilações na distância 𝑥 coincida com as oscilações geradas pela fonte no tempo 𝑡, deve-se ter, 𝑘𝑥𝑥 = 𝜔𝑡. Caso esta seja uma propagação suportada pelo meio, a relação 𝑥/𝑡 é igual à velocidade do som, então:

𝜔 𝑘𝑥 =

𝑥

𝑡 = 𝑐0. (5.32)

Esses conceitos são essenciais para compreender os mecanismos pelos quais um escoamento gera flutuações de pressão (ou massa específica) que irradiam ondas sonoras, pois a condição para que isso ocorra é que a velocidade de fase da fonte de excitação deve ser maior que a velocidade do som no meio, em outras palavras, deve- se ter uma velocidade de fase supersônica (𝑣𝑓 > 𝑐0).

A Eq. (5.32) pode ser adimensionalizada utilizando o comprimento característico 𝐿 do escoamento e assim desenhar o gráfico 5.1, no qual observa-se a reta em azul que separa as regiões do espaço-tempo em que a fonte possui condições de irradiar, ou não, ondas sonoras. Para os pontos sobre a reta, correspondem à condição para propagação da onda no meio.

Gráfico 5.1 – Regiões de irradiação e não irradiação da fonte sonora.

Fonte: Autoria própria.

Uma outra forma de visualizar este mecanismo de irradiação é através do conceito de modulação espacial da onda sonora. Considere um escoamento que gere flutuações de pressão no espaço sob duas situações, como mostrado no desenho 5.2. Na situação (a) as flutuações produzidas, representadas pelos sinais positivos e negativos, são homogêneas ao longo da direção 𝑥, levando ao cancelamento mútuo no decorrer do espaço-tempo. Por outro lado, na situação (b), as amplitudes das

Não Irradia Irradia

flutuações de pressão são moduladas no espaço, consequentemente há o cancelamento incompleto das regiões de compressão e rarefação do meio, levando à produção líquida de energia, que irradia em forma de ondas sonoras caso a velocidade de fase dessa modulação seja supersônica.

Desenho 5.2 – Geração de som pela modulação da onda no espaço.

Fonte: Autoria própria.