Defini¸c˜ao 3.1
Equa¸c˜ao diferencial ordin´aria (EDO) ´e toda a equa¸c˜ao da forma
Fx, y, y′, y′′, . . . , y(n)= 0 , n ∈ N , (3.1)
que descreve a rela¸c˜ao entre uma fun¸c˜ao desconhecida, indicada por y, definida e com derivadas cont´ınuas at´e `a ordem n num intervalo D ⊂ R, suas derivadas y′, . . . , y(n), e a
Na equa¸c˜ao (3.1), a express˜ao
Fx, y, y′, y′′, . . . , y(n)
representa qualquer express˜ao alg´ebrica que envolve (de uma forma que por vezes pode ser impl´ıcita) a vari´avel x, a fun¸c˜ao y e as suas derivadas at´e `a ordem n.
Quando na presen¸ca de uma equa¸c˜ao diferencial ordin´aria, ´e claramente importante observar qual a vari´avel independente e qual a vari´avel dependente. Na equa¸c˜ao (3.1) tem-se evidentemente x como vari´avel independente e y como vari´avel dependente.
A express˜ao “ordin´aria”adv´em do facto de se considerarem apenas fun¸c˜oes reais de uma vari´avel real, isto ´e, de considerar apenas uma vari´avel independente. Na sequˆencia, e dado que n˜ao h´a motivo para confus˜ao, omitimos sempre a palavra ordin´aria. Vejamos alguns exemplos.
Exemplos:
(a) Considere a equa¸c˜ao diferencial
y′= y . Esta pode escrever-se da seguinte forma
y′− y = 0 . Basta apenas identificar y′− y por
F (x, y, y′)
para observar que a equa¸c˜ao diferencial se encontra na forma (3.1). (b) No caso da equa¸c˜ao diferencial
t y′′+ (2t + 1) e−y= 0 , tem-se evidentemente
F (t, y, y′, y′′) = t y′′+ (2t + 1) e−y. A vari´avel independente ´e agora t e y ´e a vari´avel dependente. (c) Por ´ultimo, a equa¸c˜ao diferencial
x(4)+ t2x′′= 0 cujo o primeiro membro pode representar-se por
F (t, x, x′, x′′, x′′′, x(4))
Defini¸c˜ao 3.2
Ordem de uma equa¸c˜ao diferencial ordin´aria ´e a ordem da derivada de maior ordem da fun¸c˜ao y, presente na equa¸c˜ao (3.1).
A equa¸c˜ao y′′′ = sin x ´e uma equa¸c˜ao diferencial de ordem trˆes ao passo que a equa¸c˜ao (y′)2+ 2 x y = 0 ´e uma equa¸c˜ao diferencial de primeira ordem.
Defini¸c˜ao 3.3
Uma equa¸c˜ao diferencial ordin´aria de ordem n diz-se na forma normal se se pode escrever do seguinte modo
y(n)= fx, y, y′, y′′, . . . , y(n−1),
onde f representa qualquer express˜ao alg´ebrica que envolve (de uma forma que pode ser impl´ıcita) a vari´avel x, a fun¸c˜ao y e as suas derivadas at´e `a ordem n − 1.
A equa¸c˜ao diferencial de segunda ordem y′′= −(2x + 1) e−y
x
| {z }
, (x 6= 0) , f (x, y, y′)
encontra-se na forma normal. Mas nem sempre ´e poss´ıvel escrever uma equa¸c˜ao diferen- cial na forma normal. Considere a t´ıtulo de exemplo a seguinte equa¸c˜ao diferencial de primeira ordem y′= 2x(y′)2.
Defini¸c˜ao 3.4
Uma fun¸c˜ao real ϕ, definida num intervalo D ⊂ R, com as n derivadas ϕ′, ϕ′′, . . . , ϕ(n)
cont´ınuas no intervalo D, ´e uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial de ordem n
Fx, y, y′, y′′, . . . , y(n)= 0 , (3.2)
se a substitui¸c˜ao em (3.2), de y pela fun¸c˜ao ϕ, origina uma identidade para todo o x ∈ D.
Exemplos:
(a) Considere a equa¸c˜ao diferencial de segunda ordem y′′+ y = 0 .
A fun¸c˜ao ϕ(x) = cos x, x ∈ R, ´e uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial. De facto, ϕ′′(x) + ϕ(x) = (cos x)′′+ cos x
= − cos x + cos x = 0
(b) A fun¸c˜ao ϕ(x) = 2√x , x > 0, ´e uma solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial x (y′)2= y y′− 1 ,
pois verifica-se que
x (ϕ′(x))2= ϕ(x) ϕ′(x) − 1 para todo o x > 0.
A experiˆencia com equa¸c˜oes diferenciais n˜ao ´e na realidade completamente recente. No estudo da primitiva¸c˜ao de fun¸c˜oes reais de vari´avel real contact´amos com equa¸c˜oes do tipo
y(n)= f (x) ,
onde n ∈ N e f ´e uma fun¸c˜ao cont´ınua no intervalo D. Considere a equa¸c˜ao diferencial de primeira ordem y′= cos x. Constatamos que todas as fun¸c˜oes y(x) = sin x+c, com c uma constante real arbitr´aria, s˜ao solu¸c˜oes da equa¸c˜ao diferencial. N˜ao se apresenta apenas uma solu¸c˜ao mas sim uma fam´ılia de solu¸c˜oes. Vejamos o caso da equa¸c˜ao diferencial de segunda ordem y′′= cos x. Todas as fun¸c˜oes y(x) = − cos x + c1x + c2, onde c1 e c2 s˜ao constantes reais, s˜ao solu¸c˜oes da equa¸c˜ao diferencial. Desta vez, a express˜ao de uma solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao, depende da concretiza¸c˜ao de duas constantes arbitr´arias. As pr´oximas defini¸c˜oes permitem classificar as solu¸c˜oes de uma equa¸c˜ao diferencial. Defini¸c˜ao 3.5
(i) Solu¸c˜ao geral de uma equa¸c˜ao diferencial de ordem n, ´e toda a solu¸c˜ao expl´ıcita da equa¸c˜ao diferencial, cuja express˜ao depende de n constantes reais.
(ii) Solu¸c˜ao particular de uma equa¸c˜ao diferencial de ordem n, ´e toda a solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial, que ´e obtida da solu¸c˜ao geral pela concretiza¸c˜ao de todas as n constantes reais.
(iii) Solu¸c˜ao singular de uma equa¸c˜ao diferencial de ordem n, ´e qualquer outra solu¸c˜ao expl´ıcita da equa¸c˜ao diferencial.
Defini¸c˜ao 3.6
Chama-se Integral geral de uma equa¸c˜ao diferencial de ordem n, a toda a equa¸c˜ao que define implicitamente o conjunto de solu¸c˜oes da equa¸c˜ao diferencial.
Exemplos:
(a) Considere a equa¸c˜ao diferencial
y′′+ y = 0 .
y(x) = c1cos x + c2sin x, x ∈ R, onde c1 e c2 s˜ao constantes reais, ´e solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ao diferencial. De facto,
y′′+ y = (c1cos x + c2sin x)′′+ (c1cos x + c2sin x) = −c1cos x − c2sin x + (c1cos x + c2sin x) = 0
para todo o x ∈ R.
A fun¸c˜ao y(x) = 2 sin x, x ∈ R, ´e uma solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao diferencial (escolheu-se c1= 0 e c2= 2). A fun¸c˜ao y(x) = 0, x ∈ R, ´e outra solu¸c˜ao particular da equa¸c˜ao diferencial.
(b) Verifique que
y(x) = 1
x + 1 + c ex com c ∈ R, ´e solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ao diferencial
y′+ y = x y2.
A fun¸c˜ao constante y(x) = 0, x ∈ R, ´e uma solu¸c˜ao singular da equa¸c˜ao diferencial. (c) Considere a equa¸c˜ao diferencial
x(y′)2− y y′+ 1 = 0 .
y(x) = c x + 1/c, x ∈ R, com c ∈ R \ {0}, ´e solu¸c˜ao geral da equa¸c˜ao diferencial. A fun¸c˜ao y(x) = 2√x , x > 0, ´e uma solu¸c˜ao singular da equa¸c˜ao diferencial (recorde o exemplo (b) na p´agina 58).
(d) Considere a equa¸c˜ao diferencial de primeira ordem y y′ = x .
y2= x2+c, com c ∈ R, ´e integral geral da equa¸c˜ao diferencial. A deriva¸c˜ao impl´ıcita da equa¸c˜ao anterior permite obter a equa¸c˜ao diferencial.
´
E importante observar que nem todas as equa¸c˜oes diferenciais tˆem solu¸c˜ao e, mesmo que uma equa¸c˜ao diferencial tenha solu¸c˜ao, pode n˜ao ser poss´ıvel determinar a sua solu¸c˜ao geral (ou o seu integral geral). Para determinadas equa¸c˜oes diferenciais ´e poss´ıvel mostrar que existe solu¸c˜ao ou que a solu¸c˜ao quando existe ´e ´unica. Estes assuntos n˜ao est˜ao no entanto no ˆambito destas notas.
O problema da determina¸c˜ao de solu¸c˜ao de uma equa¸c˜ao diferencial que satisfa¸ca em simultˆaneo determinadas condi¸c˜oes num ponto de um intervalo D, ´e designado como
problema de valores iniciais ou problema de condi¸c˜oes iniciais. Trˆes situa¸c˜oes distintas podem ocorrer. Existe uma ´unica solu¸c˜ao, existe mais do que uma solu¸c˜ao ou n˜ao existe solu¸c˜ao. A apresenta¸c˜ao de condi¸c˜oes suficientes que garantam a existˆencia de solu¸c˜ao n˜ao faz parte do ˆambito destas notas. Considere o problema
x(y′)2− y y′+ 1 = 0 y(0) = 1
que consiste na determina¸c˜ao da solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial x(y′)2− y y′+ 1 = 0 que verifica a condi¸c˜ao y(0) = 1. Recorde o exemplo (c) nesta p´agina. Uma solu¸c˜ao para o problema ´e a fun¸c˜ao y(x) = x + 1, x ∈ R.