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II. HIDROLOGIA E PROCESSOS EROSIVOS

2.1. Hidrologia de Encosta

2.1.1. Rede de Fluxo nas Encostas e Processos Erosivos

2.2.1.2. Equilíbrio de Forças na Vertente

A forma tridimensional modelada pelos processos de denudação atuantes no presente ou no passado que representam a conexão dinâmica estendida do interflúvio ao meio do leito fluvial e da superfície do solo ao limite superior da rocha não intemperizada é denominada vertente (DYLIK, 1968, DALYMPLE et al., 1968 apud CHRISTOFOLETTI, 1974).

Tal definição é composta por algumas características fundamentais para a análise dos processos morfodinâmicos responsáveis pela configuração atual dessas formas de relevo, além dos mecanismos causais deles derivados. Pode-se destacar o dinamismo dos processos geomórficos nas vertentes, cuja morfologia atual resulta dos diferentes processos de erosão e deposição, derivados das flutuações climáticas e/ou de eventos orogenéticos (escala geológica) e processos geodinâmicos recentes, naturais ou acelerados, quase sempre determinados pela influência do homem (escala humana).

Genericamente, Colângelo (1990) afirma que, sob condições habituais, os diversos mecanismos do sistema vertente atuam para ajustar formas, material e processo em cada setor favorecendo o equilíbrio. Em termos práticos, no setor convexo de alta vertente, mais arenoso, a permeabilidade do solo deve ser mais elevada que no setor côncavo basal mais argiloso. Ao mesmo tempo, maior permeabilidade significa maior taxa de infiltração e de abastecimento do lençol freático e diminuição do escoamento superficial no setor de alta vertente. Esse mecanismo ajusta-se às condições locais de maior erodibilidade do solo,

regulando o volume de runoff e diminuindo o risco de erosão acelerada. Ao contrário, em direção à baixa vertente, a erodibilidade decresce em função dos crescentes teores de argila, possibilitando que os efeitos do escoamento superficial, acelerado e avolumado pelas contribuições de montante, não gerem danos, a não ser que haja desequilíbrios de origem climática ou interferência humana.

Segundo Bigarella (2003), entre os processos que ativam a ruptura dos materiais estão aqueles relacionados à alteração das condições internas (alteração do nível freático, abertura de fraturas de tensão etc.), externas (geometria do talude, descalçamento de base) e à influência da água reduzindo a resistência, através de cargas hidrostáticas laterais. Nessas condições, os materiais saturados tendem a ter suas propriedades alteradas e a modificar seu comportamento físico e mecânico, tornando-se mais susceptíveis a distintos processos erosivos, dentre eles os movimentos de massa.

Nessa perspectiva, os movimentos de massa resultam do desequilíbrio entre a força de cisalhamento e a força de resistência ao cisalhamento, expressos na Lei de Coulomb da mecânica dos solos (LACERDA e SANDRONI, 1985; LACERDA, 1997). A força de cisalhamento está estreitamente relacionada à força gravitacional, à carga sobrejacente dos materiais (força normal) e à declividade do terreno.

Já a força de resistência ao cisalhamento depende das variáveis: coesão (por cimentação e aparente) e fricção interna do solo. A coesão resulta da “cimentação” das partículas de rocha ou de solo, não sendo controlada por forças compressivas, mas pelas propriedades das partículas produzidas através da união química dos óxidos, componentes orgânicos, carbonato sílica e alumínio (LIMA, 1998). Nesse caso, a coesão aparente distingue-se da coesão por cimentação, pois resulta da força da pressão capilar da água contida nos solos (pressão externa), que é determinada pelo tamanho e pela forma das partículas, pelo tipo de argilo-mineral e pelo conteúdo de água e pelo tamanho dos poros no solo (SELBY, 1990).

Assim, em locais com fortes declividades em setores retilíneos (por exemplo) poderá haver a manutenção do material sobrejacente se este apresentar quantidade suficiente da fração areia e baixo grau de seleção, capazes de gerar a força de fricção necessária para compensar a elevada força de cisalhamento. No caso de elevados teores de umidade nos materiais de baixa vertente seriam suficientes para instabilizá-los e fazê-los escorregar, talvez mesmo em condições normais de drenagem, se neles não houvesse a quantidade necessária de argila, material capaz de absorver grandes quantidades de água antes de se desagregar. Poderiam assim que o aporte e acúmulo destes materiais devem favorecer a condição de estabilidade no setor côncavo basal, sob condições hídricas habituais. De maneira geral, enquanto na alta vertente a sustentação das massas superficiais ocorre devido à fricção mecânica, própria de areias, na baixa vertente a sustentação se deve à mobilização de coesão química, própria das argilas (COLÂNGELO, 1995).

Por outro lado, a fricção interna do solo constitui-se numa variável que depende de algumas características relacionadas ao solo, tais como: grau de aspereza, variação de profundidade e tamanho das partículas, densidade aparente e mineralogia dos agregados. No que compete à mineralogia, geralmente nos horizontes mais inferiores de solos menos alterados observa-se aumento na concentração relativa de mica e suas formas transformadas, como a ilita e a vermiculita. Esses minerais de argila possuem maior superfície especifica e são mais expansivos que a caulinita e a gibsita, garantindo maior poder de transmissão de plasticidade e coesão à massa do solo (COLÂNGELO, 1990).

Outra característica importante é que os ângulos de fricção interna aparente são muito próximos para materiais da mesma litologia, mas apresentam diminuição progressiva e significativa quando ocorrem mudanças litológicas, como de granitóides para migmatitos e destes para micaxistos. As causas podem estar relacionadas ao progressivo aumento de siltes micáceos em direção aos micaxistos, cujas partículas exibem formas placóides, provocando a diminuição do ângulo de fricção interna devido a maior orientação de tais partículas. Em segundo

lugar, a existência de minerais de argila do tipo 2:1, principalmente ilita, que apresenta estrutura foliar (COLÂNGELO, 1990).

As condições de ruptura dos materiais estão também relacionadas a determinadas propriedades mecânicas. Estas são influenciadas pelo teor de umidade presente na massa envolvida e pelo estado de energia dessa água, a qual é responsável pelo controle da magnitude e diferenciação dos fluxos ao longo da encosta em superfície e subsuperficie (FERNANDES, 1990). Desta forma, o potencial mátrico (medidas de sucção ou poro-pressão negativas), a poro- pressões positivas (pressão além da saturação ou excesso de água) e a umidade do solo em diferentes profundidades e em diferentes posições da encosta constituem-se em variáveis vitais para a análise dos movimentos de massa, porque caracterizam a magnitude e o sentido dos fluxos d’água no interior dos solos.

Portanto, o equilíbrio no sistema de vertente é condicionado por mecanismos ligados às propriedades (internas) dos materiais, fatores ambientais locais (falhas geológicas, configuração topomorfológica) e das forças gravitacionais atuantes nas partículas individuais e nas massas de solos e rochas ao longo de tais superfícies.

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