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Esclarecimento aos moradores sobre o projeto de habitação

Desde o ano de 1997, a Prefeitura Municipal de Florianópolis (PMF) desenvolvia um projeto habitacional na comunidade Novo Horizonte, região que fica às margens da BR 282, através do Programa Habitar Brasil, descrito no primeiro capítulo deste trabalho. No segundo semestre de 1999, recebeu a confirmação sobre a liberalização dos recursos do Habitar Brasil BID. Tal fato foi a garantia da continuidade do projeto de habitação na região Chico Mendes. Esta informação está registrada em ata do dia 20 de outubro de 1999, em reunião entre a Prefeitura e a Comissão de Habitação.

As obras de regularização fundiária e construção de casas no Novo Horizonte pelo programa Habitar Brasil aconteceram entre os anos de 1997 e 2000. No decorrer da leitura das primeiras atas ficou claro que, durante este período, a Prefeitura dialogava com a Comissão de Habitação sobre a possibilidade de se concretizar um projeto de habitação que envolvesse toda a região Chico Mendes.

Assim é importante ressaltar que os representantes das associações estavam avisados da continuação do projeto de habitação, mas grande parte dos moradores não. A melhoria para a região Chico Mendes, visualizada pela Comissão de Habitação, justifica o acordo desta com a Prefeitura, aceitando o projeto sem que o mesmo fosse amplamente discutido entre as comunidades da região. Entretanto, tal fato foi responsável pelo surgimento dos primeiros conflitos entre os moradores com os representantes comunitários e a Prefeitura. A postura da Comissão de Habitação foi muito criticada pelos moradores e a perda da confiança na Comissão estimulou a eleição de novos representantes para as associações de moradores, assim como a eleição de uma nova comissão para acompanhar o projeto de habitação36.

Já a Prefeitura, que tinha em mãos a confirmação do programa, estava frente à necessidade de realizar o cadastro sócio-econômico da população e conseguir as assinaturas favoráveis dos moradores ao projeto de habitação e frente à restrição temporal imposta pelo Programa Habitar Brasil BID. Para desempenho destas tarefas, iniciou prontamente (final de 1999) um processo de esclarecimento à população através de reuniões com lideranças comunitárias e assembléias nas três comunidades

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Esta eleição aconteceu somente em 2000, mas foi em final de 1999, a partir das assembléias com a prefeitura, que os moradores perceberam que a comissão já havia aceitado o projeto de habitação sem que eles estivessem sabendo. Nesse meio tempo o cadastro das famílias já estava sendo realizado juntamente com a coleta de assinaturas dos termos de adesão ao projeto.

envolvidas. Estas três comunidades foram divididas em 5 setores, setor A, B, C, D e E. Não há hierarquia entre os setores, a divisão deu-se como forma de organizar a remoção das pessoas e o início das obras do projeto de reestruturação. Esse período de esclarecimento da Prefeitura com a região teve início em 1999, quando se deu uma assembléia geral com os moradores, mas intensificou-se no decorrer do ano de 2000. Com cada setor a Prefeitura realizou uma assembléia.

A Prefeitura deu início aos esclarecimentos sobre o projeto de habitação através das assembléias, informando às comunidades sobre o novo projeto de habitação, esclarecendo dúvidas e ressaltando a necessidade de fazer o levantamento das famílias que entrariam no plano, para que estas assinassem o termo de adesão. E, ao mesmo tempo, também disponibilizou equipes compostas por assistentes sociais e agentes de saúde da região para realizarem o cadastro sócio-econômico e colherem as assinaturas de adesão ao projeto.

Durante a realização do cadastro sócio-econômico, alguns moradores assinaram o termo de adesão mesmo que não estivessem informados sobre seu conteúdo, todavia muitos não assinaram. O avanço das discussões esperado pela Prefeitura nas assembléias não aconteceu e os questionamentos dos moradores sobre o projeto não couberam nos prazos delimitados pelo BID.

Assim, a Prefeitura deu continuidade ao processo de esclarecimento aos moradores por meio de encontros individuais nos escritórios regionais, findando com a assinatura dos mesmos ao termo de adesão. Já os moradores através dos líderes comunitários e da Comissão de Habitação organizaram-se em parcerias com a UFSC, particularmente o Departamento de Arquitetura e Urbanismo através do Professor Lino Peres e o Departamento de Ciências Jurídicas, a fim de obterem as informações não contempladas pela Prefeitura e, com isso, defenderem seus interesses. O debate da comunidade com esta instituição resultou na criação de diretrizes que serviram de base para a criação de uma proposta de reurbanização alternativa e inclusiva, a qual não foi aceita pelo poder municipal. Dentre as diretrizes destacam-se:

a) manter a identidade e conformação social e espacial das comunidades, garantindo-se as condições adequadas de habitabilidade, serviços e infra- estrutura; b) programa paisagístico [arborização e equipamentos]; c) reestruturação viária e de acessos, mantendo e fortalecendo os espaços comunitários existentes, evitando-se a ruptura do tecido como ocorre com a proposta da Prefeitura; d) arquitetura progressiva e revisão da proposta da Prefeitura com aumento dimensional dos ambientes [três e quatro quartos com área para depósito ou outra destinação]; e) utilização de mão-de-obra

local; f) área para estacionamentos por unidade e coletiva; g) transparência e inter-relação dos setores envolvidos como Comunidade, Prefeitura e Universidade. (PERES, 2000, p. 14).

Em entrevista com assistentes sociais percebeu-se que a Secretaria de Habitação, Trabalho e Desenvolvimento Social da Prefeitura de Florianópolis não tinha experiência de implantação de um projeto de tamanha complexidade e nem preparo técnico para tal desafio, particularmente em relação ao trabalho direto com as pessoas. Além disso, sendo o HBB um projeto piloto, a Prefeitura não tinha todas as respostas para as perguntas dos moradores, muito ainda estava sendo pensado e decidido. Já entre os líderes, a falta de informação se transformou, em alguns casos, em resistência ao projeto.

Na visão dos técnicos da Prefeitura, que não contavam com tamanha resistência dos moradores, a implantação do projeto de habitação já estava decidido, pois traria uma melhora significativa para a vida dos habitantes e para o aspecto físico do bairro. Os recursos estavam garantidos, sendo que precisavam apenas do consentimento dos moradores para dar início às obras que tinham um prazo de 3 anos para seu desenvolvimento. O argumento exposto aos moradores era de que se eles não aceitassem os termos do projeto, o mesmo seria levado para outro lugar.

Entretanto, a região Chico Mendes, como qualquer outro bairro, é composta por famílias com diversas especificidades que, por mais que precisassem, não estavam esperando pelo projeto habitacional e portanto ainda não estavam prontas para ele. Havia moradores que queriam vender suas casas para tentar a sorte em outro lugar. Famílias que haviam acabado de construir ou reformar suas casas e foram informadas que seriam demolidas, porque as residências eram de madeira ou porque no local estava previsto a abertura de uma rua. Iriam morar em novas casas porém com a ressalva de que teriam que fazer novo investimento, pois a indenização da atual residência seria apenas o valor de entrada para a nova casa, a qual seria financiada no prazo máximo de 25 anos.

Havia famílias vivendo em condições extremamente precárias e desumanas, sob o risco da casa desabar ou com os filhos doentes pela excessiva umidade da construção e, por isso, desejavam se mudar rapidamente para outro lugar para terem um teto sobre suas cabeças, independente dos compromissos que teriam que assumir.

Entre os moradores o projeto também era percebido como algo que traria melhorias fundamentais para suas famílias, principalmente entre as mais carentes.

Entretanto, as divergências eram muitas e precisavam ser resolvidas antes de iniciar as obras. A questão que mais provocou discussões foi a de como adaptar um projeto padrão a uma região composta por famílias com diferentes expectativas.

Os moradores queriam a casa, mas não estavam dispostos a pagar tanto tempo por ela, principalmente porque não sabiam se teriam condições financeiras para assumir tal responsabilidade.

Então, por um lado, estava a Prefeitura empenhada na realização de assembléias com os moradores para repasse de informação e resolução dos problemas de urgência e, por outro lado, estavam tanto os moradores, divididos, ansiosos por informações mais consistentes sobre o projeto, quanto as lideranças comunitárias que tentavam, com muito custo, articular entre as situações emergenciais de moradia de alguns e os interesses coletivos.

A dificuldade da Prefeitura centrou-se em como trabalhar com as pessoas envolvidas. Afinal de contas, toda uma logística deveria ser pensada, pois o projeto aconteceria no local de atual moradia dessas pessoas, influenciando diretamente sobre o cotidiano delas. Terrenos seriam desapropriados, casas seriam demolidas e as famílias deveriam ser transferidas para um local provisório.

O projeto teve três ações integradas: obras de infra-estrutura, regularização fundiária e desenvolvimento comunitário. Para realização das assembléias e início das obras, como já dito, a região foi divida em 5 setores. Várias assembléias entre Prefeitura, Comissão de Habitação e moradores foram realizadas, durante o ano de 2000, para esclarecimento dos moradores. O cadastro sócio-econômico e as assinaturas dos termos de adesão terminaram em final de 2000 e o processo foi avaliado pela Prefeitura como satisfatório, pois o projeto teve boa receptividade. Foi aceito com 89% dos termos assinados e as obras físicas se iniciaram em 2001.

Quando as obras se iniciam num setor, as famílias são removidas para os alojamentos provisórios, as casas velhas são demolidas e no lugar são feitas as ruas e as casas novas. Assim que estas ficam prontas, as famílias retornam para as casas e as obras iniciam-se em outro setor. Existe a possibilidade de negociação quando um morador prefere residir em outro local dentro da região. A Prefeitura se encarrega de viabilizar a mudança dos moradores.