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3. DADOS, MÉTODOS E PERFIL DOS ENTREVISTADOS

3.1 A escolha do método para coleta de dados

Fontes tradicionais de dados, como os Censos Demográficos e as PNAD, apesar de serem amplamente utilizadas para estudar a população idosa, não oferecem informações capazes de responder às questões que são objeto de investigação neste estudo. Por outro lado, a aplicação pura de questionários, configurando uma pesquisa amostral quantitativa, dificilmente conseguiria captar as informações necessárias ao desenvolvimento do estudo com a profundidade ou grau de especificidade devida. Assim, optou-se por empregar uma metodologia qualitativa, que permite analisar como e porque as situações se processam, tendo como ponto de partida a percepção dos idosos sobre sua realidade. Com isto, é possível ir além da identificação dos fatores associados à opção por morar sozinho, para focalizar, sobretudo, os mecanismos que norteiam a formação desse tipo de arranjo domiciliar.

Ao empregar dados de origem qualitativa não foi necessário fixar previamente as questões, possibilitando ao participante manifestar-se sobre temas não incluídos explicitamente no roteiro das entrevistas. Assim, foi possível colher uma gama de informações que facilitaram entender caminhos ainda pouco ou não explorados nos estudos que focalizaram o universo de idosos morando sozinhos tendo como fonte de dados pesquisas de natureza quantitativa.

Por meio da pesquisa qualitativa é possível explorar tópicos pouco compreendidos ou difíceis de serem captados por meio de outra metodologia. Assim, como afirma Simão (2006), a Demografia certamente pode, e deve, se valer dos resultados de pesquisas desta natureza para compreender de maneira mais detalhada os fenômenos que lhes são de interesse. Martinez (2002) enfatiza que a literatura gerontológica sugere a utilização de metodologias qualitativas no estudo dos vários aspectos da vida dos idosos, como forma de aprofundar os conhecimentos e, ao mesmo tempo, realçar os resultados encontrados nas pesquisas de caráter quantitativo. Dessa forma, demógrafos e gerontólogos podem se beneficiar de estudos desta natureza para explorar diversos aspectos referentes à vida desta população específica, que são os idosos que vivem sozinhos.

Weiss (1994) cita uma série de razões para se conduzir um estudo qualitativo, algumas das quais serviram para reforçar a utilização desta abordagem nesta tese e são citadas a seguir, juntamente com exemplos de sua aplicabilidade. Primeiro, a escolha da metodologia qualitativa é apropriada quando se deseja descrever de forma detalhada um evento ou um processo. No caso do presente estudo, por exemplo, pode-se ir além da apuração se o idoso gosta ou não de morar sozinho, permitindo que se tenha detalhes da forma de lidar com as dificuldades do dia-a-dia, observando até que ponto certos fatores podem influenciar sua satisfação. Uma abordagem mais detalhada pode permitir também que aspectos dificilmente identificáveis, como a influência da renda, das condições de saúde e de características pessoais na escolha por morar ou não sozinho sejam explorados.

Segundo, a pesquisa qualitativa permite a interação de perspectivas múltiplas, ou seja, um simples evento pode ser visto em sua totalidade, mesmo que no momento da resposta principal um determinado tema não tenha sido abordado. Nesta tese, a utilização da metodologia qualitativa permite observar, por exemplo, não só o motivo que levou os idosos a morarem sozinhos, como também, indiretamente, o que condiciona a formação deste arranjo domiciliar e a influência da independência financeira, condições de saúde e sua relação com família, amigos, filhos, irmãos e vizinhos.

Terceiro, a metodologia qualitativa é apropriada para descrever como um evento determinado ocorre ou o que ele acarreta, sob o ponto de vista do participante da pesquisa. Um exemplo de aplicabilidade nesta tese pode ser visto ao discutir o tipo de ajuda que os idosos recebem da família, de seus amigos e do governo. Além de quantificar a ajuda, pode-se observar como ela se dá e sua importância para a manutenção de um domicílio independente, assim como o que os idosos pensam sobre dar e receber ajuda, ou o quanto isso lhes incomoda.

Finalmente, Weiss (1994) destaca que a pesquisa qualitativa permite avaliar como os eventos são interpretados por uma população específica. Apesar do aumento no número e na proporção de idosos morando sozinhos ser uma realidade, é importante observar como os próprios idosos percebem este fato, o que eles pensam sobre esta experiência, e como interpretam este aumento de acordo com o que observam na sua comunidade, nos lugares que freqüentam e entre seus conhecidos. Assim, pode-se entender porque este aumento está ocorrendo e porque ele ainda não é maior ou menor do que o observado.

Em termos de pesquisa de natureza qualitativa, alguns métodos já conhecidos e difundidos podem ser utilizados para a coleta de dados como, por exemplo, a entrevista em profundidade, os grupos focais e a observação participante e não participante (Richardson, 1999). A escolha por entrevistas em profundidade, nesta tese, se deve à opção por dar mais liberdade ao entrevistado e, ao mesmo tempo, permitir um maior aprofundamento durante a conversa. Assim, foi possível que cada entrevistado relatasse sua própria trajetória, sem interrupções, e de maneira reservada, deixando-o mais à vontade para expor sua intimidade e falar de suas emoções. Além disso, as entrevistas individuais podem facilitar no recrutamento de participantes para pesquisa, uma vez que permitem maior flexibilidade de horário e local, além de possibilitar a inclusão de pessoas que tenham dificuldade de locomoção e deslocamento. Essas vantagens superam a possível perda de trocas nas experiências relatadas e justificam a opção por um tipo de coleta de informações que requer maior necessidade de tempo e disponibilidade por parte do entrevistador.