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Em San Martino polenta e vino, graças a informação dada pelo compositor sobre a inspiração para a composição da parte A do rondó21, baseado nas notas realizadas no sino da igreja de São Marttino, foi possível pensar na referência de modo que a interpretação fosse

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Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=msnccnBw9qo&feature=youtu.be

20 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=rQxIU87KvU4&feature=youtu.be 21 Na primeira citação direta da entrevista no item 2.4.1.

influenciada. Aqui, foi decidido deixar as notas soarem, dando especial destaque ao sol inicial de cada compasso, por ser a nota de tônica.

Exemplo audiovisual nº 8 – Recorte inicial de San Martino polenta e vino – Parte A do rondó

Fonte: Alves (2018h)22.

Ter conhecimento das referências melódicas, bem como da forte influência cultural italiana possibilitou também, sobretudo nesse quarto movimento, a definição do caráter que seria usado na interpretação. Aqui, os ritmos e as melodias muitas vezes evocam a tarantella e possuem uma forte característica dançante e lúdica. Um bom exemplo disso é o recorte entre os compassos 101 a 146, que exigiram cuidados voltados ao destaque rítmico e no tratamento contrastante das dinâmicas, para alcançar a característica alegre da dança popular.

Exemplo audiovisual nº 9 – Recorte entre os compassos 101 e 146 de San Martino polenta e

vino

Fonte: Alves (2018i)23.

Em San Martino polenta e vino, assim como em Tra Caravaggio e Casalecchio, foram identificados dois compassos que o compositor Colombo de Freitas não executa em sua gravação. Trata-se de dois compassos iguais (conforme destacado em azul na Figura 23), sendo o primeiro enumerado 193 e o segundo enumerado 200.

Figura 23 – Recorte dos compassos 193 ao 200 de San Martino polenta e vino

Fonte: Colombo de Freitas (2014).

Aqui, a hipótese é, como em Tra Caravaggio e Casalecchio, a de que houve um pequeno erro de revisão e que estes dois compassos não deveriam contar na versão final. Para manter a interpretação segundo a gravação do compositor, foi decidido ignorar ambos os compassos 193 e 200.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho, foi primeiramente levantada a hipótese de que quanto mais o intérprete conhecer acerca da obra que se pretende executar e sobre o universo musical que a compõe, mais opções e autoridade ele terá para fazer as escolhas que irão compor a sua performance final. Foi comentado também, mais especificamente na introdução do texto, a importância dos compositores-intérpretes para o violão e como o conhecimento deles sobre as possibilidades e limitações do instrumento contribuem para a criação de um repertório idiomático. A partir daí, foi feita a proposta de mediante uma análise focada nos idiomatismos de uma obra específica, neste caso, a Fantasia-Sonata Dell’Immigrazione, do compositor brasileiro Thiago Colombo de Freitas, compor uma performance.

Para iniciar o trabalho sobre a obra escolhida, foi realizada uma entrevista com o compositor, onde foram levantadas questões sobre as referências utilizadas por ele; algumas de suas características composicionais, forma de pensar a composição, etc. Tal entrevista teve grande importância para a pesquisa, pois já de início confirmou vários pressupostos, como por exemplo a gama de referências da cultura italiana dentro do processo de composição da obra e também o seu caráter sinfônico, intentado pelo próprio compositor.

Iniciada a análise, foram levantados vários dados importantes acerca da Fantasia- Sonata, tais quais, por exemplo, as melodias de obras italianas que Colombo de Freitas utilizou como temas para compor seus quatro movimentos, além de outras referências à cultura italiana como as evocadas nos títulos de cada movimentos. Feito isso, também foram elencados usos idiomáticos do instrumento e levantadas características recorrentes do compositor na obra.

Na última fase, foram apresentados alguns exemplos de onde o conhecimento das características idiomáticas da obra pôde ajudar nas decisões performáticas. Houve especial destaque para a questão melódica, pois ter identificado previamente as melodias usadas por Colombo de Freitas como temas, possibilitou uma clareza na escolhas referentes ao que deveria ser destacado ou não, por exemplo. Graças a isso, pôde ser demonstrado como a hipótese inicialmente levantada estava correta. Embora muitos outros detalhes concernentes à performance, como digitações, postura, escolhas de timbres, e outros, sejam quase sempre de cunho pessoal, a pesquisa mostrou-se positiva, no sentido de que tudo o que havia sido obtido nas análises, de alguma forma influenciou nas decisões interpretativas do presente pesquisador.

Posto isso, como pôde se constatar e expor através deste trabalho, as expectativas com relação à riqueza de citações e referências à música e cultura italiana na obra Fantasia-Sonata

Dell’Immigrazione estavam corretas. Vê-se aqui, que o compositor usou das mais variadas

formas de evocar, através de referências musicais ou não, aspectos que se relacionassem com a imigração dos italianos ao Brasil, adaptando-os à sua maneira criativa e de acordo com a sua necessidade de expressar-se; estabelecendo assim, um idioma musical específico para a obra em questão.

Por fim, espera-se que este trabalho fomente o interesse pela obra do compositor Thiago Colombo de Freitas e que os resultados aqui obtidos, futuramente, sirvam de referencial teórico para o estudo da peça analisada, norteando qualquer um que deseje compreende-la e interpretá-la.

REFERÊNCIAS

ALVES, Raphaell Mota & LIRA, Ezequias Oliveira. Fantasia-Sonata Dell’Immigrazione: uma abordagem preliminar sobre suas referências in CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA (ANPPOM), XXVII, UNICAMP. Campinas - São Paulo, Anais. 2017.

ALVES, Raphaell Mota, Exemplo audiovisual 1. 2018a. 1 vídeo. Disponível em:

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https://www.youtube.com/watch?v=jkCLttauyzg&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

____________. Exemplo audiovisual 3. 2018c. 1 vídeo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=B3srP4vhdNQ&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

____________. Exemplo audiovisual 4. 2018d. 1 vídeo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=f6d9rRqcPsg&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

____________. Exemplo audiovisual 5. 2018e. 1 vídeo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=a3_RAySIMKM&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

____________. Exemplo audiovisual 6. 2018f. 1 vídeo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=msnccnBw9qo&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

____________. Exemplo audiovisual 7. 2018g. 1 vídeo. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=aRUXpwo6RFo>. Acesso em: 08 novembro 2018. ____________. Exemplo audiovisual 8. 2018h. 1 vídeo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=rQxIU87KvU4&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

____________. Exemplo audiovisual 9. 2018i. 1 vídeo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=wGfDgroIOCY&feature=youtu.be>. Acesso em: 08 novembro 2018.

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APÊNCICE A – ENTREVISTA SOBRE A OBRA FANTASIA-SONATA

DELL’IMMIGRAZIONE, PARA VIOLÃO SOLO, DO COMPOSITOR THIAGO

COLOMBO DE FREITAS.

Raphaell Mota Alves 06/03/2017 PERGUNTAS

PERGUNTA 1 – A Fantasia-Sonata Dell’immigrazione é a sua maior obra?

RESPOSTA: Depende, em minutagem para violão solo sim. Tenho obras maiores de câmara. PERGUNTA 2 – Ela é também a sua obra de maior fôlego? Se sim, por que?

RESPOSTA: Sim. É uma obra de forma sonata, de quatro movimentos, para instrumento solo... Tem muitas referências e de extratos diferentes, de modo que acho uma obra complexa dentro do meu catálogo.

PERGUNTA 3 – Em que ano e onde ela foi escrita e estreada?

RESPOSTA: Foi escrita em Bolonha, Itália, em 2015 e estreada no mesmo ano em Aveiro, Portugal, no Congresso Performa.

PERGUNTA 4 – Há diversas citações, homenagens e referências nela; tanto, referentes a locais da Itália, bem como a famosos compositores italianos do passado; tais quais o

Giuseppe Verdi (na melodia de ‘Va pensiero’) e o Catellnuovo Tedesco. Pode explicar um

pouco sobre cada uma dessas referências que compõem a obra e sobre os títulos de cada um dos quatro movimentos?

RESPOSTA: O total das referências eu mesmo não sei se dou conta de explicar, uma amiga me disse que ouviu o “Cai, cai, balão”, que eu não tinha pensado, mas está lá mesmo, mas, enfim, muitas foram pensadas. O primeiro movimento é baseado numa canção vêneta muito cantada pelos filhos e netos dos imigrantes que vieram para o sul do Brasil: a Verginella. Ela cumpre um papel de segundo tema da forma sonata, ainda que não seja um tratamento muito clássico da forma. Se chama “Tra Casalecchio e Caravaggio” (Entre Casalecchio e Caravaggio) porque fiz quando morava num distrito de Bolonha chamado Casalecchio di Reno e nasci em Farroupilha, RS, cidade famosa pelo santuário de N. S. do Caravaggio. Então representa esses dois tempos da minha vida, numa ligação imaginária, “fantástica”. O segundo se chama Va Pensiero porque é uma melodia tirada quase que literalmente do coral de Verdi do mesmo nome. O que fiz foi “arranjar”, num estilo bem neo-romântico, com acompanhamento em 3 contra 2 ou 4 da melodia, meio à moda Beethoven, pra dar uma referência. O terceiro é muito inspirado no estilo do Tedesco, mas é baseado na canção La Campagnola, também folclórica italiana, mas que aparece só na parte central, com um caráter bem humorístico. O quarto, San Martino Polenta e Vino é uma deturpação da frase “A San Martino castagne e vino” (para São Martinho, castanhas e vinho) que é falada, como tradição, na semana de São Martinho que culmina na festa de São Martinho, que é no inverno, mas eu

não lembro mais o dia exato. Nessa semana eu fiquei ouvindo o sino da igreja de São Martinho e ele tinha 5 notas, que eram tocadas em ordens aleatórias, raramente todos juntos, formando todas as possibilidades combinatórias das 5 notas equivalentes ao primeiro tetracorde duma escala maior. Esse é o “A” do rondó. Depois ele é feito inteiramente de citações, acho que não tem nada “meu” ali. Tem uma melodia que eu acho que ouvi na infância, mas não tenho nenhuma certeza, tem pedaços costurados de “La Bella Polenta” (canção brasileira de imigrantes italianos) por todo o movimento, tem um pedaço da trilha sonora do filme “L'Armata di Brancaleone di Norcia” (O Exército de Brancaleone), tem a retomada de quase todos os motivos usados nos outros movimentos. Procura! Hahaha.

PERGUNTA 5 – A obra possui pelo menos três afinações; e no todo, não usa em nenhum dos seus quatro movimentos a afinação padrão (E – B – G – D – A - E) do violão. O uso das afinações alternativas, unidas a uma linguagem que aproveita grande parte da extensão do violão, deu à esta Fantasia-Sonata certo ‘ar’ sinfônico. Esse uso da scordatura é comum em seu idiomatismo para composições e arranjos? Se sim, explique um pouco do processo.

RESPOSTA: Não é comum, na verdade eu quase não uso, tenho uma peça chamada Bugio en Rondeau que usa 5ª em G e 6ª em ré, o resto é basicamente sexta em D ou E e o resto tradicional. Ironicamente é uma das peças mais tonais entre as minhas composições, digo isso porque normalmente as scordaturas são usadas em peças mais modas, vide exemplo das famosas canções lídias do D'Angelo e Koyunbaba do Domeniconi. No Brasil já se usou bastante as afinações de viola caipira, mas também pode-se dizer que é num ambiente modal. Já a minha sonata é super tonal, sempre com clara direcionalidade, clara relação dominante- tônica. Acho que tu teve uma percepção bem interessante ao dizer que dá “um ar sinfônico”, era isso que eu queria e acho que as scordaturas podem ter colaborado. A peça é muito pensada sinfonicamente, até já pensei em fazer uma versão orquestral. Ops, agora lembrei que tenho alguns arranjos com a sexta em C e a 5º em G, o que não é nada comum. Enfim, eu uso mas não abuso das scordaturas, haha.

PERGUNTA 6 – Se há alguma outra informação sobre a obra, que não foi abordada neste questionário, mas que você, como compositor, julga de importância para uma melhor compreensão da peça, exponha aqui.

RESPOSTA: Acho que as perguntas dão conta do que eu penso da peça em geral, além disso eu gosto da contribuição do interprete, gosto que ele jogue a sua própria subjetividade na obra. Claro que, se tu me perguntar mais coisas sempre vou lembrar de algo mais.

ANEXO B – PRINT DO COMENTÁRIO DO COMPOSITOR THIAGO COLOMBO SOBRE MINHA INTERPRETAÇÃO DE UM TRECHO DA FANTASIA-SONATA

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