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4. A TRAJETÓRIA DA ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMILIA EM PORTO

4.2 O ESF EM PORTO ALEGRE

A cidade de Porto Alegre iniciou o Programa de Saúde da Família no ano de 1995, através de uma parceria entre a Secretaria Municipal de Saúde e o Grupo Hospitalar Conceição (GHC). Tal projeto fora aprovado por debates realizados no Conselho Municipal de Saúde da cidade.

O GHC é uma rede pública de hospitais e postos de saúde porto-alegrense, que realiza atendimento pelo SUS. É formado por quatro hospitais de grande porte e mais 12 postos de saúde do serviço de saúde comunitária. Vinculada ao Ministério da Saúde, forma a maior rede pública de hospitais do Sul do país, com atendimento exclusivo ao Sistema Único de Saúde.

Em 1996, o projeto foi aprovado e os critérios foram definidos para a implantação das primeiras unidades de ESF. Tais critérios seriam os seguintes: as unidades a serem implementadas de ESF seriam nas regiões da cidade que observassem indicadores

socioeconômicos desfavoráveis, em áreas em que estavam ocorrendo assentamentos, em regiões com indicadores epidemiológicos mais desfavoráveis e, por fim, as equipes do PSF deveriam ser instaladas em conjunto com as unidades públicas já existentes, configurando uma rede assistencial que abrangeria todo o território selecionado (LEÃO, 2009, p. 66).

No ano de 1996 foram implantadas, portanto, as primeiras 24 equipes de ESF da cidade de Porto Alegre. O sucesso do primeiro ano do programa se deu, em grande parte, ao convênio firmado entre a Prefeitura e as associações de moradores, o que possibilitou a utilização de espaços físicos nas associações pelas equipes, além da contratação de moradores das regiões onde foram implantadas ESF e posterior capacitação. Segundo Gralha e Marais (2007), no ano de 1997 foram montadas mais quatro equipes. Em 1998 o crescimento foi menor, sendo implementada somente uma equipe. Todos os profissionais contratados foram efetivados através da CLT, cabendo à prefeitura repassar os recursos para os intermediários, que neste caso eram as associações de moradores. Na ocasião, a prefeitura de Porto Alegre firmou convênio com 24 associações comunitárias devidamente regularizadas (GRALHA; MORAIS, 2007).

O convênio com as associações de moradores durou até o ano 2000, quando a SMS decidiu modificar a relação existente em relação à ESF e passou a contratar uma única intermediária, no intuito de realizar toda a gestão, a partir de então, de forma terceirizada. Esta intermediária seria a Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Faurgs).

A Faurgs é uma entidade privada sem fins lucrativos, que, segundo seu estatuto (disponível on-line: <http://www.faurgs.ufrgs.br/>), tem como principais objetivos: colaborar na elaboração e execução de projetos de pesquisa, ensino, extensão e desenvolvimento institucional, científico e tecnológicos aprovados pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com atuação em todo território nacional, em benefício de toda a comunidade; prestar serviços remunerados à UFRGS e à comunidade; realizar e promover atividades científicas e culturais; conceder bolsas de estudo e de pesquisa, de graduação, pós-graduação e extensão; e promover, difundir e coordenar a cooperação técnica entre organizações e instituições nacionais e estrangeira.

Dessa forma, no ano 2000, a Prefeitura Municipal de Porto Alegre (PMPA) celebrou convênio para a gestão das unidades básicas do PSF de Porto Alegre com a Faurgs. Tal

convênio foi um importante marco para a terceirização completa da gestão dos recursos públicos destinados à saúde. A partir deste fato, a Faurgs passou a ser responsável pela seleção e contratação dos profissionais de saúde que atuariam nos PSFs de Porto Alegre.

A partir do convênio supracitado, entre os anos de 2000 e 2007 (período de vigência do convênio com a Faurgs), as contratações de médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem e agentes comunitários de saúde da Capital se deram pelo regime das Consolidações das Leis Trabalhistas, sem que houvesse processos públicos de seleção. Em 2001, já sob a gestão da Faurgs, houve a implementação de mais seis equipes do PSF. Em 2002 foram inauguradas mais 21 novas equipes, além de três equipes de saúde bucal.

No entanto, houve um percalço na relação entre PMPA e Faurgs, no ano de 2005. Um parecer jurídico do próprio município concluiu que o pagamento de uma taxa de administração não estava previsto no contrato, sendo, portanto, irregular. Por conta de tal parecer, a PMPA suspendeu o pagamento dessa taxa (cerca de 240 mil reais mensais, equivalentes a 10% do valor contratado). No entanto, a Faurgs não concordou com este parecer, alegando que o valor da taxa administrativa era necessário para custear despesas de administração dos contratos. Por não ocorrer nenhum tipo de acerto entre os envolvidos, o convênio foi rompido em julho de 2007. Nessa data, a taxa administrativa (que estava sendo discutida judicialmente) estava acumulada em uma dívida de 2,8 milhões de reais da Prefeitura com a Faurgs.

Dessa forma, após o fim do convênio firmado com a Faurgs, e com a Lei Federal das Organizações da Sociedade Civil para Interesse Público difundindo-se pelo território nacional, a prefeitura de Porto Alegre optou por transferir o gerenciamento de todas as equipes de ESF da capital para uma Oscip. As Oscips já foram estudadas no Capítulo 3 deste trabalho – já que compõe, desde sua lei de criação, um número crescente de instituições atreladas à administração pública. Segundo dados do Ministério da Justiça, que é o órgão responsável pela aprovação de novas Oscips e pela divulgação das informações financeiras destas em seu

site, existem hoje no Brasil um total de 6.311 (seis mil, trezentas e onze) entidades. Entre elas, consta a entidade denominada Instituto Sollus, sediada na cidade de São Paulo desde 3 de março de 2006. Um detalhe importante é que esse instituto deveria realizar, anualmente, a prestação de contas eletrônica, por meio do Cadastro Nacional de Entidades de Utilidade Pública do Ministério da Justiça (CNEs/MJ). Caso não seja feita a prestação, elas podem

perder a Certidão de Regularidade, que é prova de transparência da instituição, além de ser exigida pelos órgãos governamentais para o repasse de recursos públicos ou doações.

Após a finalização do contrato com a Sollus, fora efetuado um Termo de Ajuste de conduta (TAC), efetuado no intuito de refazer a ESF na cidade. Desta forma, em 28 de março de 2008, o poder executivo municipal encaminhou um projeto de lei à Câmara de Vereadores, com o intuito de criar o Departamento do Programa de Saúde da Família de Porto Alegre (Dpsf). Na Exposição de Motivos do Projeto de Lei do Dpsf era exposta a situação do Programa de Saúde da Família no município, após os insucessos dos contratos de terceirização com Faurgs e com a Oscip Sollus:

Os estudos demonstraram que a estrutura concebida para o PSF nesta Capital já deu sinais suficientes de sua obsolescência, necessitando ser aparelhada tanto no que pertine aos recursos humanos quanto aos recursos físicos. Neste sentido, a criação de um novo órgão público dentro da estrutura administrativa do SUS local é a figura que mais se amolda a tais necessidades, permitindo uma preponderância de fins e não de meios (PORTO ALEGRE, 2010a).

A votação ocorreu dia 17 de dezembro de 2009 e seu projeto de criação foi aprovado por unanimidade. No mesmo dia, momentos antes da aprovação do Dpsf, os vereadores aprovaram a proposta, também do Executivo, que prorrogou o contrato do PSF vigente à época. Dessa forma, ao mesmo tempo em que mantinha a contratação via Fundação Universidade de Cardiologia, no intuito de adequar-se às exigências dos órgãos fiscalizadores que ali interferiram. Portanto, em setembro de 2009, a prefeitura e a Fundação Universitária de Cardiologia (FUC) assinaram um convênio para o gerenciamento da Estratégia de Saúde da Família na cidade.

Tal convênio teve por finalidade a ampliação e consolidação da ESF, efetivando-o como política prioritária da atenção básica à Saúde em Porto Alegre (PORTO ALEGRE, 2007c). Tal convênio previa o gerenciamento inicial de 86 equipes de saúde da família e 12 equipes de saúde bucal. Dessa forma, em setembro de 2009, a FUC deu início a mais uma etapa de gerenciamento realizado por entidades não governamentais na ESF de Porto Alegre, continuando sua atuação até os dias de hoje, pois, embora o IMESF já esteja em funcionamento, como veremos adiante, ainda não conseguiu efetuar a contratação do efetivo total de funcionários, de modo que a contratação ainda é feita através do convênio com a FUC, em caráter temporário, enquanto o IMESF entra lentamente em funcionamento.

A população atendida pela ESF de Porto Alegre (IC/FUC), então chamada “adscrita”, está hoje na ordem de 252.509 pessoas, pertencentes principalmente, às comunidades mais carentes, que recebem assistência médica, de enfermagem, visitas domiciliares, além das realizações dos programas de prevenção, promoção, educação e manutenção da saúde. Some-se a isso as atividades desenvolvidas pelas equipes de saúde bucal, que prestam atendimentos odontológicos curativos e preventivos a uma clientela de aproximadamente 24 mil cidadãos. Dentre as atividades de prevenção de agravos, promoção social e educação sanitária, inúmeros eventos são realizados por todas as equipes junto às comunidades assistidas. Destacam-se os grupos de: Diabéticos e Hipertensos, Educação Alimentar, Saúde da Mulher, Corpo Saudável, Bem-Viver, Asma, Saúde Mental, Tabagismo, Gestantes, Melhor Idade, Terapia Comunitária, Sorriso, Saúde Bucal, Meninas Adolescentes, Planejamento Familiar, Pra-Nenê Coletivo, de Higiene Pessoal, Escovação Supervisionada, Caminhadas, Guardiões do Horto, Convivência e Artesanato, dentre outros.